Da Redação
Poesia De Mãos Dadas, de Drummond, e humor de Laerte, contra a brutalidade da fala de Bolsonaro &.
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas…”
O ombro amigo e divino é oferecido no desenho de Laerte para chorar o resultado das urnas.
DIÁRIO feito após as eleições com artigos e notícias na imprensa
Terça-feira: 14 de maio de 2019
Folha de S.Paulo – De super-herói a lacaio
Moro precisa mais de Bolsonaro do que o contrário, e o presidente sabe disso
Joel Pinheiro da Fonseca
A passagem de Sergio Moro pelo Ministério da Justiça em sua caminhada para o Supremo prometia ser a marcha triunfal rumo à coroação.
Primeiro, institucionalizar o combate à corrupção tal como feito pela Operação Lava Jato. Na sequência, sentar-se na mais alta corte do país para não deixar os corruptos impunes. Agora, graças aos tropeços políticos, o trajeto parece mais um longo corredor polonês de humilhações. E de destino incerto.
Moro se apequena diariamente em sua relação com o governo do qual topou participar. Teve sua indicação de Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária vetada pelo presidente, pela qual teve de pedir desculpas públicas.
Aceitou o papelão de tirar foto com o ex-ministro Vélez Rodríguez e anunciar a “Lava Jato da Educação”. Mantém um silêncio constrangedor sobre as fortes evidências de corrupção que circundam a família Bolsonaro.
Tem sido sumariamente ignorado quando o assunto é liberar as armas de fogo (o decreto mais recente foi anunciado publicamente antes mesmo do parecer do Ministério da Justiça).
E agora observou o governo abrir mão da promessa de manter o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) sob sua alçada para facilitar a aprovação da reforma administrativa junto ao Congresso.
Moro precisa mais de Bolsonaro do que o contrário. Para virar ministro, largou a magistratura. Se sair do governo sem uma cadeira do STF, fica sem nada e com a reputação manchada não só pelo fracasso de sua gestão como pela subserviência e parcialidade demonstradas. Bolsonaro sabe disso. E é por isso que em todas as ocasiões em que apoiar seu superministro lhe custa alguma coisa, opta por desautorizá-lo.
Dizer em público que indicará Moro para o STF é balançar na frente do ministro a recompensa prometida; lembrá-lo de que todas as humilhações terão valido a pena lá na frente. Mas 2020 está longe. Se Moro em cinco meses foi de superministro e herói nacional a uma figura apagada e diminuída, será que nesse ritmo ele dura mais um ano e meio?
E, se durar, será aceito pelo Senado? Rejeitar um indicado para o Supremo seria inédito, indicaria o estágio terminal da crise entre Executivo e Legislativo. Nos dias que correm, já não é impensável.
Assim, Moro vai engolindo todos os sapos que o governo lhe apresenta, e ainda tem que fazer cara de quem gostou. Tem que trilhar um caminho difícil entre a subserviência e a insubordinação. A cada passo em falso, perde estatura.
A outra possibilidade seria abraçar de vez a política e se lançar candidato. Mas se quiser manter sua força perante a opinião pública terá que demonstrar força e não servilismo.
Bolsonaro usou a bandeira anticorrupção para crescer politicamente sem jamais fazer nada pela causa. A realidade de seu gabinete (e de seus filhos) parece mostrar um político imerso na pequena corrupção da política brasileira e talvez com vínculos ainda mais sórdidos.
Moro continuará em silêncio, para não desagradar o chefe que não lhe concede o mesmo respeito e cujas propostas populistas dificultam seu trabalho?
Ou fará jus à reputação que construiu ao longo de anos de perseguição implacável –e de alto grau técnico– à corrupção no país? Melhor arriscar tudo e permanecer um herói do que aceitar tudo e se transformar no lacaio abjeto de um projeto de poder inescrupuloso.
Terça-feira: 14 de maio de 2019
Valor – Os trunfos do presidente e do superministro
Por Maria Cristina Fernandes | De São Paulo
Ao assumir o Ministério da Justiça debaixo de um bombardeio, Sergio Moro valeu-se do discurso de que iria para o governo porque sua pauta havia sido aceita pelo presidente. Acusado de ter aderido ao vencedor de uma disputa em que o principal concorrente era seu prisioneiro, Moro se defendeu dizendo que o presidente havia aderido à sua pauta, e não o contrário.
O ministro voltou a usar o mesmo argumento ao ser fritado em praça pública pelo presidente da República na entrevista à Rádio Bandeirantes. Ao dizer que assumira o compromisso de indicar Moro ao Supremo porque o ministro havia aberto mão de 22 anos de magistratura, Bolsonaro tentou colar a barganha no ministro.
Permitiu a livre interpretação de que Moro não foi para o governo em busca de realizar seu projeto de combate à corrupção mas de uma prebenda. Antecipa assim sua defesa contra futuras alegações de uma saída motivada pela frustração da pauta anticorrupção.
Não fez questão de defender os superpoderes de Moro. Ao contrário. Disse que se o conselho que controla atividades financeiras no país, o Coaf, voltar para o Ministério da Economia, não oferecerá problemas para o ministro da Justiça, que mantém boas relações com Paulo Guedes.
E foi além. O Coaf, disse, deve se manter independente. Só não pode vazar informações. Depois de deitar e rolar em cima dos vazamentos da Lava-Jato contra seus adversários na política, o presidente teve que amargar o expediente, desta vez, contra seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que teve sua movimentação bancária exposta antes da quebra oficial do sigilo autorizada ontem pela justiça federal no Rio.
Se Bolsonaro atraiu Moro para o governo para neutralizá-lo, com sucessivas derrotas, e uma promessa irrealizável, como a da vaga no Supremo, porque exposta a 18 meses de intempéries, o ministro da Justiça também tem seu trunfo na queda de braço com o presidente.
O principal são as relações da família Bolsonaro com as milícias. Com ou sem Coaf, Moro tem como avançar nas investigações que hoje cercam o senador Flávio. Se Fabrício Queiroz ainda não teve um mandado de prisão expedido contra si é pelas salvaguardas de um momento político ainda muito distante da sucessão presidencial.
A despeito dos desgastes enfrentados desde sua posse como ministro, Moro mantém popularidade capaz de rivalizar com o presidente da República no seu eleitorado. E poderá turbiná-la ainda mais se, ao prosseguir na sua pauta, como tem dito, cruzar com o caminho do filho e, por que não dizer, do próprio presidente.
As crescentes hostilidades de Bolsonaro contra os militares de seu governo ajudaram ainda a selar velha aliança da farda com o antigo togado. Agraciado pelo então comandante do Exército, o general Eduardo Villas-Boas, com a principal condecoração da arma, a Ordem do Mérito Militar, em 2017, Moro foi alvo, na semana passada, em pleno tiroteio entre o capitão e seus generais, de singela homenagem.
Villas-Boas compareceu à sessão da Comissão de Segurança da Câmara que ouviu o ministro sobre o pacote anticrime. Com o tuíte da véspera, contra o preferido do presidente, Olavo de Carvalho, demonstrara desencanto com seu escolhido em 2018. Com sua presença, sinalizou que seu encanto já tem nova guarida.
Segunda-feira: 22 de abril de 2019
Consultor Jurídico: Legítima defesa
Inquérito do Supremo se destina a proteger independência de ministros
Por Márcio Chaer
A Folha de S.Paulo desta segunda-feira (22/4) informa que o Judiciário está emperrando há um ano a “maior etapa da ‘lava jato’”. A referência é à prisão de doleiros ou operadores financeiros que, embora não julgados, são descritos pelo jornal como responsáveis “por movimentar ilegalmente quantias bilionárias”.
O mesmo Judiciário que vem atrapalhando a “lava jato”, publicou-se recentemente, mudou a jurisprudência para dar à Justiça Eleitoral a incumbência de julgar crimes conexos a delitos relacionados a eleições. Cometeu-se um “pequeno erro” nesse noticiário. Na verdade, não houve mudança alguma. Desde sempre, ou seja, desde o primeiro Código Eleitoral e da primeira Constituição brasileira que tratou do assunto, cabe à Justiça Eleitoral os tais crimes conexos.
O “Judiciário” de que tratam os dois casos acima é o Supremo Tribunal Federal. Para que o STF deixe de “emperrar” a “lava jato”, esse mutirão formado por procuradores, delegados, juízes e jornalistas criou uma espécie de agência de notícias e propaganda para difundir o material de seu interesse.
Foi essa agência que divulgou, dez dias atrás, uma informação destinada a comprometer o presidente do STF, ministro Dias Toffoli. O delegado Filipe Hille Pace, aproveitando-se da agonia de Marcelo Odebrecht (que, nos próximos dias, vai saber se a “lava jato” o livra da prisão domiciliar), mostrou seu talento de ilusionista. Ele conseguiu que o empresário associasse Toffoli ao escândalo da empreiteira. Ao conferir a história, verificou-se a falsidade. Mas a fraude do delegado não mereceu qualquer atenção — toda ela destinada ao embate em torno da censura à publicação que divulgou a notícia dada pelo delegado.
O mesmo se deu quando se descobriu que o auditor Luciano Francisco Castro fraudou uma investigação criminal contra o ministro Gilmar Mendes e quando se divulgou que servidores não identificados haviam bisbilhotado as declarações de renda da família Bolsonaro. As apurações não andam.
Na sessão de julgamento do Conselho Superior do Ministério Público Federal deste mês, em que se absolveu o procurador Deltan Dallagnol de ofensas contra ministros da 2ª Turma do Supremo, fez-se uma revelação: Deltan já foi alvo de “dezenas de representações” por abusos. Mas foi absolvido por seus colegas em todos os casos, menos um, que se encontra “sob sigilo”. Ataca-se em público, mas se tem o privilégio de responder pelo ato em segredo (ouça a gravação, a partir do 53º minuto). Os colegas de Dallagnol concluíram não haver ofensa na imputação de que os ministros Gilmar Mendes, Toffoli e Lewandowski compõem uma “panelinha” que liberta bandidos e faz campanha a favor da corrução.
As investigações de procuradores lembram o caso em que a Polícia Federal, ao investigar a existência de grampo telefônico no gabinete do ministro Gilmar Mendes, anos atrás, não chegou a conclusão alguma. O que se investigava, então, era a suspeita de que a própria PF grampeara o ministro.
O inquérito instituído no STF para desmontar a agência de notícias e propaganda da “lava jato” é legal e legítimo porque não se pode fabricar pseudofatos, artificialmente, contra ninguém. Muito menos contra juízes, para constrangê-los a votar de determinada forma. Isso se chama publicidade opressiva.
É um ato de legítima defesa. A Polícia Federal e o Ministério Público Federal, como está visto, não podem investigar situações em que seus integrantes sejam autores ou coautores dos atentados que compõem o escopo da investigação. Na Itália e na Alemanha, por exemplo, delegados, procuradores ou juízes podem ser suspensos ou removidos pela própria corte — demonstradas graves falhas no exercício das funções — desde que a deliberação seja aprovada por 2/3 dos votos do plenário.
Márcio Chaer é diretor da revista Consultor Jurídico e assessor de imprensa.
Domingo: 21 de abril de 2019
Época – Guilherme Amado – Por que o grupo de Toffoli decidiu ir fundo contra internautas no inquérito das fake news
Ministros receberam a informação de que empresários bolsonaristas estão por trás de críticas virtuais à corte
Existem diferentes razões que levaram Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski a, sob o comando do presidente da Casa, criar e manter o inquérito que procura investigar quem, na visão deles, coloca a segurança institucional do STF em risco.
Entretanto, a parte da investigação que toca às redes sociais, ou seja, as duas ações de busca e apreensão que foram feitas, têm origem numa forte informação que chegou a este grupo de ministros.
Toffoli foi informado de que, por trás das críticas virtuais feitas ao STF, há empresários que doaram para Jair Bolsonaro nas eleições do ano passado e que continuam apoiando o governo do presidente.
Embora eles não apontem quais são os indícios, a suspeita desses ministros é que haja algo orquestrado, com dinheiro privado, contra o tribuna
Sábado: 20 de abril de 2019
Folha de S.Paulo – Governo Bolsonaro é só uma escala técnica na rota do Partido dos Procuradores
Demétrio Magnoli
O voo suicida do STF concentrou as atenções, desviando os olhares do fenômeno que motiva o inquérito
A crise institucional em curso transbordou como crise constitucional pelas decisões do STF de agir, simultaneamente, como parte, promotor e juiz no inquérito das fake news e de impor censura à divulgação de notícias. Curiosamente, o governo Bolsonaro tem relação apenas lateral com uma crise cujos protagonistas são o próprio STF e a corrente jacobina do Ministério Público.
Atuando em dobradinha, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes conduzem um inquérito abusivo já na origem aos descaminhos da truculência. Desconhecendo os limites da lei, acalentam a ilusão de que seus alvos se deixarão intimidar. O fruto prático de seus atos arbitrários é a desmoralização do STF —ou seja, exatamente a finalidade buscada pelos promotores da campanha difamatória disseminada nas redes sociais. O recuo de Moraes, revogando o ato de censura, restabelece parcialmente a legalidade. Falta, ainda, devolver as prerrogativas de investigar e acusar a quem a detém, ou seja, ao Ministério Público.
O voo suicida do STF concentrou as atenções, desviando os olhares do fenômeno que motiva o inquérito. Não são meia dúzia de haters de redes sociais: há anos, como subproduto tóxico da Lava Jato, a corrente jacobina dos procuradores engajou-se num projeto de poder.
Os sinais iniciais emergiram em maio de 2017, na “operação Joesley Batista” e no artigo de Rodrigo Janot que denunciava “o estado de putrefação de nosso sistema de representação política”. O procurador-geral enunciava, então, nada menos que um objetivo estranho à missão judicial da Procuradoria: limpar a República, substituindo a elite política tradicional por uma outra, pura e casta. É essa meta que os pretendentes a Robespierres continuam a perseguir.
Janot foi protagonista circunstancial numa engrenagem que alastrou suas bases pelo Ministério Público, extravasou para setores da Polícia Federal e da Receita e se disseminou entre militares da reserva e políticos (tanto governistas como de oposição). Hoje, o projeto de poder tem seu próprio candidato presidencial, que atende pelo nome de Sergio Moro, e seu veículo oficioso de mídia, que é o site censurado pelo ato ilegal do STF. Bolsonaro flerta alegremente com a engrenagem, sem se dar conta de que seu governo é apenas uma escala técnica na rota imaginada pelo Partido dos Procuradores.
Mundo afora, da Rússia à Turquia, o populismo vale-se do pretexto do combate à corrupção para quebrar as mediações institucionais que limitam o poder do governo. O núcleo da Lava Jato ganhou popularidade ao atacar eficazmente a corrupção sistêmica que envenena a política brasileira. Dessa plataforma, nasceu o projeto do Partido dos Procuradores, que agora esculpe as investigações segundo as necessidades de seu objetivo político. É nessa lógica que se inscreve a ofensiva contra a Corte Suprema.
“Tenho vergonha do STF” —a frase lançada por um obscuro advogado contra Lewandowski funciona como palavra de ordem da campanha de mídia. O site O Antagonista publica fragmentos de notícias verídicas, mas descontextualizadas, oferecendo munição aos guerrilheiros das redes, que as convertem em petardos difamatórios contra os magistrados escolhidos como alvos. Pretende-se, no fim, eliminar as restrições legais à perseguição de inimigos políticos do Partido dos Procuradores. Nas Filipinas, o governo Duterte fez da “guerra às drogas” o alvitre para execuções extrajudiciais. No Brasil, faz-se da “guerra à corrupção” o pretexto para assassinatos de reputações.
O exército da difamação opera nas sombras, combinando vazamentos seletivos com torrentes de desinformação impulsionadas nos subterrâneos da internet. O STF tem a obrigação de expor os contornos da campanha criminosa por meio dos instrumentos legais, solicitando à Procuradoria inquéritos sobre fatos específicos. A luz do dia sempre é o melhor antídoto contra os combatentes das trevas.
Terça-feira: 16 de abril de 2019
O ministro antiFalcone
Pacote de Moro contra o crime vai fortalecer milícias
José Padilha – cinesta, diretor dos filmes “Tropa de Elite” (2007), “Tropa de Elite 2” (2010) e Robocop (2014)
Sergio Moro sabe que:
1 – As milícias são organizações criminosas controladas por policiais civis e militares corruptos e violentos;
2 – Esses policiais utilizam o aparato do Estado, como armas, helicópteros e caveirões, para expulsar o tráfico e dominar as favelas;
3 – As milícias cobram por proteção e dominam atividades econômicas importantes nas áreas que controlam: distribuição de sinais de TV e de gás de cozinha e transporte alternativo;
4 – As milícias decidem quem faz propaganda eleitoral nas suas áreas e financiam campanhas políticas;
5 – Milicianos e políticos ligados a milicianos foram eleitos no Brasil para cargos legislativos e executivos em níveis municipal, estadual e federal.
Mesmo sabendo de tudo isso, o ministro Sergio Moro declarou que as milícias representam a mesma coisa que as facções criminosas dentro das prisões, sugerindo que esses grupos operam como o varejo do tráfico de drogas.
Ora, o leitor sabe que sempre apoiei a operação Lava Jato e que chamei Sergio Moro de “samurai ronin”, numa alusão à independência política que, acreditava eu, balizava a sua conduta. Pois bem, quero reconhecer o erro que cometi.
Digo isso porque não há outra explicação: Sergio Moro finge não saber o que é milícia porque perdeu sua independência e hoje trabalha para a família Bolsonaro. Flávio Bolsonaro não foi o senador mais votado em 74 das 76 seções eleitorais de Rio das Pedras por acaso…
O pacote anticrime que Sergio Moro enviou ao Congresso —embora razoável no que tange ao combate à corrupção corporativa e política— é absurdo no que se refere à luta contra as milícias. De fato, é um pacote pró-milícia, posto que facilita a violência policial.
Se Sergio Moro tivesse estudado os autos de resistência no Brasil teria descoberto que:
1 – Apenas no Rio de Janeiro, a cada seis horas, policiais em serviço matam alguém;
2 – A versão apresentada por esses policiais costuma ser a única fonte de informações nos inquéritos instaurados em delegacias para apurar os homicídios;
3 – Como policial tem fé pública, a sua versão embasa a excludente de ilicitude, evitando a prisão em flagrante;
4 – A Polícia Civil, além de raramente escutar testemunhas ou realizar perícias no local dos assassinatos, tem mania de desfazer as cenas do crime para prestar socorro às vítimas, apesar de a maioria delas morrer instantaneamente em decorrência de disparos no tórax;
5 – Desde 1969, quando o regime militar editou a ordem de serviço 803, que impede a prisão de policiais em caso de “auto de resistência”, apenas 2% dos casos são denunciados à Justiça e poucos chegam ao Tribunal do Júri.
Aprovado o pacote anticrime de Sergio Moro, esse número vai tender a zero. Isso porque o pacote prevê que, para justificar legitima defesa, bastará que o policial diga que estava sob “medo, surpresa ou violenta emoção” —ou, ainda, que realizava “ação para prevenir injusta e iminente agressão”.
O hábito que os policiais milicianos têm de plantar armas e drogas nos corpos de suas vítimas para justificar execuções é tão usual que deu origem a um jargão: todo bom miliciano carrega consigo um “kit bandido”. Aprovado o pacote de Moro, nem de “kit bandido” os milicianos precisarão mais.
Sergio Moro nunca sofreu atentados e nunca lidou com a máfia. Mas o juiz Giovanni Falcone, em quem o ministro diz se inspirar, foi morto aos 53 anos de idade na explosão de uma bomba colocada pela máfia em uma estrada. Sua mulher e três seguranças morreram com ele.
O crime foi uma reação da máfia à operação “Maxiprocesso”, que prendeu mais de 320 mafiosos na década de 1980. Ela deu origem à operação “Mãos Limpas”, que mostrou que a máfia elegia e controlava políticos importantes na Itália.
Ora, no contexto brasileiro, é obvio que o pacote anticrime de Moro vai estimular a violência policial, o crescimento das milícias e sua influência política. Sergio Moro foi de “samurai ronin” a “antiFalcone”. Seu pacote anticorrupção é, também, um pacote pró-máfia.
Segunda-feira: 15 de abril de 2019
O Museu de História Natural de Nova York informou na segunda-feira (15/4) que o jantar de gala da Câmara Brasileira-Americana que vai entregar o prêmio de personalidade do ano para o presidente Bolsonaro, em 14/5, não vai mais acontecer em sua sede como estava previsto. Segundo o museu, o agendamento do espeço foi feito antes de as personalidades homenageadas serem escolhidas. “O evento, de nenhuma maneira, reflete a posição do museu de que há uma necessidade urgente de conservar a Amazônia, que tem profundas implicações para a diversidade biológica, as comunidades indígenas, mudança climática e o futuro da saúde do nosso planeta”, afirmou o museu na sexta-feira (12/4).
Sexta-feira: 12 de abril de 2019
O Globo: Charge Chico Caruso
Sexta-feira: 12 de Abril de 2019
Globo: Os 80 tiros em nossa consciência
Ruth de Aquino segundocaderno@oglobo.com.br
Também adoraria falar do outono, mas as folhas da estação estão vermelhas de sangue. E com manchas de sangue estavam as bandeiras do Brasil no enterro do músico e segurança Evaldo dos Santos Rosa, de 51 anos, fuzilado por soldados do Exército quando levava a família a um chá de bebê dominical. O Comando Militar do Leste primeiro disse que foi resposta a uma “injusta agressão” de “tiros de criminosos”. Depois, a versão mudou. Foi “um engano” porque Evaldo estava num carro igual ao de assaltantes.
Desculpe, senhor Exército, a desculpa não cola. Em nenhum país civilizado militares fuzilam um carro sem sofrer um tiro, sem checagem da placa ou abordagem prévia. Modelo e cor de carro não podem levar a uma execução. Nem se fossem assaltantes. Em guerras convencionais, também seria execução. E só acontece num país desgovernado, que perdeu o rumo na segurança pública. Que faz do enfrentamento com violência máxima seu mantra para “reduzir a criminalidade”.
Cadê os tuítes do presidente da República e seus filhos? O general vice-presidente e os ministros também têm o dever de se pronunciar sem covardia ou mimimi sobre esse crime hediondo e a farsa montada pelos soldados. Eles foram afastados, presos. Não tenho ideia do desfecho do julgamento, mas nosso histórico de impunidade é desanimador.
Esse homicídio transcende o Rio de Janeiro. O ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, chamou o fuzilamento de “acidente lamentável” e o ministro da Justiça, Sergio Moro, de “incidente trágico”. Um fato isolado. Não. Não é dissociado de uma política anticrime que manda acertar a cabecinha. O governador do Rio, Wilson Witzel, após dias se recusando a emitir “juízo de valor”, cedeu às pressões e chamou de “erro grosseiro”. Incidente? Acidente? Erro?
Pensei sobre o que conversaria a família no momento do fuzilamento. Que música escutariam? O que programavam depois do chá de bebê? O pai tocava cavaquinho no grupo Remelexo da Cor, era segurança de creche e querido. O casal estava junto havia 27 anos. “Perdi meu melhor amigo”, gritava a viúva, Luciana Nogueira. “Saí do carro, pedindo que parassem. Gente, era o quartel! Eles continuaram a atirar. Ficaram de deboche.” Admiro Luciana por sua coragem ao sair do carro e implorar aos soldados protegidos por capacete, num destemor vindo da certeza da inocência e do amor à família. Escuto sua dor de soluços roucos.
Enquanto as autoridades não entenderem que são também responsáveis por gatilhos nervosos que matam inocentes, estaremos perdidos. Moro disse que “lamentavelmente esses fatos podem acontecer”. Não podem não, Moro. É bom explicar direitinho seu pacote anticrime que permite matar em situação de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Os soldados podem alegar tudo isso. E aí?
Não se permitam esquecer do Evaldo, da viúva e de seu filho de 7 anos que viu o pai morrer. Ninguém pode ser vítima da boçalidade de quem porta um fuzil em nome do Estado. Militares não nasceram para patrulhar as ruas. Bolsonaro não nasceu para ser presidente e, sim, militar. Foi o que ele disse. Numa semana assim, eu sou tomada de escusável medo, surpresa e violenta emoção. A sorte é que, por princípio, nunca terei uma arma. Nem vocação para matar.
Militares não nasceram para patrulhar ruas. Bolsonaro não nasceu para ser presidente. Não nascemos para ser fuzilados por engano.
Sexta-feira: 12 de abril de 2019
Veja – coluna do Noblat – Lamentável?
Por Maria Helena RR de Sousa
De vez em quando uma palavra se torna a campeã de audiência em comentários, posts e declarações sobre fatos ocorridos no Brasil. A que agora se impõe é “Lamentável”.
Seus sinônimos, lamentoso, deplorável, plangente, são derivados do verbo Lastimar que vem do latim lamentare; é sem dúvida uma bela palavra que define bem falar com tristeza, com sofrimento, sentir aflição, lastimar acontecimentos negativos.
Mas você, leitor, acha que é a palavra adequada para uma autoridade comentar o hediondo fuzilamento de Evaldo dos Santos Rosa, um carioca alvejado por 80 balas (oitenta) disparadas por soldados do 1º Batalhão de Infantaria Motorizado, na Vila Militar? O que ele estava fazendo? Estava em seu carro com a mulher e uma filha de sete anos a caminho de uma festinha familiar. A menina assistiu o fuzilamento de seu pai. A menina viu o pai que tanto amava estar ali ao seu lado e, de repente, não estar mais.
E qual foi o comentário do excelso ministro da Justiça, Sergio Moro, sobre esse crime horrendo? Bem, numa crise assustadora de falta de vocabulário disse que o incidente era lamentável!
Outro que lamentavelmente se expressou com tanta pobreza de espírito foi o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo Silva. Ele também acha que a morte do músico foi um incidente lamentável.
Já eu acho profundamente lamentável ter no Brasil autoridades que só se manifestam quando invectivadas pela Imprensa e nessa hora ficam tartamudos e só sabem fazer comentários paupérrimos.
Lamentáveis são muitos fatos que vêm acontecendo com regularidade neste país hoje Bolsolavista.
Lamentável, por exemplo, é o Rio de Janeiro ter um governador de Estado – o da faixa – que, ao ser perguntado sobre as incontáveis mortes ocorridas pela ação dos snipers que ele tanto elogiou em sua campanha, ações que ofendem nossa população, ter declarado o seguinte: “Witzel diz não fazer ideia de quantos foram mortos por snipers: ‘Não faz parte do meu trabalho acompanhar’.
Temos mais o que lamentar? Se temos! Eu por exemplo lastimo o quadrunvirato que governa o Brasil hoje em dia. Um pai e seus três filhos. O pai foi eleito. Os filhos pegaram carona. Isso, sim, é lamentável.
Os tiroteios, os snipers, o fuzilamento na Vila Militar, as mortes que tanto ferem o Rio de Janeiro, esses fatos não são apenas lastimáveis. São bárbaros, horrendos, desgraçados. São o prenúncio da barbárie que já vislumbramos no horizonte. E contra a qual não creio que tenhamos solução à vista.
Sexta-feira: 12 de abril de 2019
O Globo – A impunidade veste farda
Bernardo Mello Franco
O ministro da Defesa classificou o assassinato do músico Evaldo Rosa, fuzilado diante do filho de sete anos, como um “lamentável incidente”. O general Fernando Azevedo e Silva disse que o crime será apurado “até as últimas consequências” e que o Exército vai “cortar na carne”. Não foi o que aconteceu em outros casos recentes envolvendo militares no Rio.
Em novembro de 2017, uma operação do Exército com a Polícia Civil matou oito pessoas no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. Entre as vítimas da chacina, havia dois motoristas de Uber e um estudante. Depois de mais de dois anos, ninguém foi a julgamento. Entidades de direitos humanos acusaram o Exército de obstruir as investigações para proteger seus soldados.
Devido a uma lei sancionada pelo presidente Michel Temer, os militares envolvidos em crimes contra civis não podem mais ser processados na Justiça comum. Se um civil mata um militar, vai ao Tribunal do Júri. Se um militar mata um civil, é julgado por superiores na Justiça Militar. A mudança ressuscitou um privilégio criado pela ditadura em 1969.
Para a Procuradoria-Geral da República, a regra sancionada por Temer afronta a Constituição, contraria tratados internacionais assinados pelo Brasil e compromete a imparcialidade dos julgamentos.
Em junho de 2018, a procuradora Raquel Dodge pediu que o Supremo declare a lei inconstitucional e acabe com a blindagem fardada. A ação foi movida pelo PSOL há mais de um ano. Está parada no gabinete do ministro Gilmar Mendes.
“O direito internacional determina que graves violações de direitos humanos, como a chacina do Salgueiro e o ataque à família de Evaldo, devem ser investigados e julgados pela Justiça Civil. No Brasil, as Forças Armadas investigam homicídios cometidos pelas Forças Armadas. Isso não é um sistema independente”, diz Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch.
A entidade afirma que o fuzilamento do músico “é gravíssimo e demonstra a necessidade e a urgência de se revogar a lei de 2017”. Enquanto o Supremo não trata do assunto, a impunidade continua a vestir farda.
A impunidade é regra em crimes que envolvem militares. Julgá-los ficou mais difícil depois de 2017, quando Temer sancionou a lei que recriou o foro privilegiado da farda
Quinta-feira: 11 de abril de 2019
Valor: Um presidente indomável
Maria Cristina Fernandes
Ocupantes de oito cargos de primeiro escalão, os militares do governo deram à largada do presidente da República um duplo verniz de força e moderação. A ascendência sobre Jair Bolsonaro de um general cabeça-branca, comandante bem-sucedido em força de paz das Nações Unidas, e ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, deu forma à tutela.
O presidente alimentou a narrativa com discursos no plural majestático. De um lado, mostrou-se curvado aos valores outrora desprezados da hierarquia. Do outro, os generais, convencidos pelo poder de galvanizar as massas do insubordinado capitão, pareciam apostar que a parceria lhes devolveria prerrogativas perdidas e um novo status para os projetos militares.
Se os cem primeiros dias do governo mostraram algo, no entanto, é que Bolsonaro é um presidente indomável. A nomeação de um ministro como Abraham Weintraub é a coroação da vitória do radicalismo obscurantista sobre qualquer poder moderador do qual os generais deste governo acreditaram ou fizeram acreditar ser titulares.
De tutelado pela farda, Bolsonaro fez dela sua prisioneira
O presidente da República dá sinais crescentes de que prestigia as alas comandadas por seus filhos e pelo guru de Virgínia em detrimento dos militares que levou para o governo, a começar do seu protetor-mor, o cansado general Heleno Ribeiro, a cujas intervenções Bolsonaro hoje reage com cara de paisagem. Prestigiou Olavo de Carvalho em meio a um tuitaço deste contra seu vice-presidente e não fez um único desagravo aos petardos lançados na direção do seu ministro da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz.
Ao prestigiar os formuladores da doutrina bolsonarista de mobilização, em detrimento dos militares ou de sua base no Congresso, o presidente da República sinaliza o rumo de seu governo. A queda acentuada na popularidade ligou o sinal de alerta em relação à erosão do apoio institucional. Com a perda no capital político acumulado junto a empresários, investidores e parlamentares, Bolsonaro acelerou a aposta no núcleo duro de seu eleitorado, aquele que reage mais prontamente ao apelo ideológico da caça aos ladrões, corruptos e comunistas.
A entrevista do novo titular do MEC à Renata Agostini, de ‘O Estado de S.Paulo’ não poderia ter sido mais clara. Na educação, a liberdade de escolha e a propensão à indisciplina variam conforme a renda. Como só o analfabetismo explica o voto no PT, sua missão passa pelo resgate da ignorância política de 45 milhões de eleitores. Seria apenas risível não fosse Abraham Weintraub um gestor focado e azeitado com o secretário-executivo do Ministério da Economia, Marcelo Guaranys, inquilino de poderoso gabinete da Esplanada.
A origem no mercado financeiro de Weintraub é o dado mais diversionista da conjuntura. Com sua nomeação, Bolsonaro dá as costas aos militares e ao Congresso e contribui para a perda do apoio institucional a reformas caras ao mercado.
Bolsonaro cultiva suas brigadas com a lógica miliciana à qual pretende recorrer se o cerco ao governo se adensar. Não se limitará, porém, à aposta ideológica. Associa seus parceiros institucionais às desventuras em série do governo. Socializa os prejuízos à sua imagem e fatura sozinho os benefícios.
Boa parte do azedume do Congresso com a reforma da Previdência veio com a constatação de que, se aprovada, a proposta vitaminaria o discurso de Bolsonaro de que o fez sem se render ao achaque. Se derrotada, a culpa seria dos achacadores. O Congresso, assim, pagaria o pato de qualquer forma.
O presidente da República fechou a porteira das nomeações por decreto e entregou o cadeado para os militares, os mesmos a quem fingiu proteger com uma restruturação de carreira benevolente. Expôs a farda desejosa de recuperar prerrogativas ao desgaste da opinião pública. E, finalmente, ao abrigar a caserna também no segundo escalão amarrou o complemento de renda de pelo menos uma centena de oficiais reformados ao seu mandato.
O pelotão de desgastados percebeu o jogo e começou a unir forças. A central de tuítes instalada no Palácio do Planalto contra as ambições da base governista priva Rodrigo Maia de meios para arregimentar votos. De uma posição inicialmente hostil à reforma da seguridade dos militares, o presidente da Câmara fez uma inflexão em busca de aproximação com a farda que ameaça circunscrever o presidente da República às brigadas bolsonaristas.
A cada turnê de palestras em que aparece como o príncipe da moderação, Hamilton Mourão enche o tanque das brigadas. Os 80 tiros de Guadalupe abafaram todas as palmas que o vice-presidente tem colhido, até aqui, nos mais estrelados auditórios. O presidente da República deixou o plural majestático de lado e deixou que os próprios militares respondessem pelo crime que tirou a vida de um músico negro, com duas crianças no carro, a caminho de um chá de bebê.
Se Bolsonaro pode se defender de ter como vizinho um grande contrabandista de armas suspeito de assassinato e de ter protegido os currais eleitorais da família ao longo das últimas três décadas com a banda podre da polícia, os militares também podem se virar com os estilhaços em sua vidraça.
Em sua jornada para deslegitimar as opções ao bolsonarismo, o presidente da República também atingiu o ministro da Justiça. Com o projeto anticrime, Sergio Moro deu a Bolsonaro o discurso de que avança na agenda que o elegeu, mas colheu ainda mais antagonismos no Congresso e forneceu cumplicidade à profusão de guardas da esquina que têm atentado, sob fortes emoções, contra a segurança e a vida de inocentes.
Ao atrair Moro para o time de tuiteiros do governo, Bolsonaro acelera seu desgaste. O ministro da Justiça se afasta da condição de titular de uma pauta que se valeria do seu governo para se institucionalizar e assume seu lugar no picadeiro bolsonarista. Foi de lá que posou com um calendário que, a pretexto de atestar o titular da conta do Twitter, só provou que a um mês de 30 dias se sucede um de 31.
Moro deixou a condição de condestável da operação do fim do mundo por uma convivência mais próxima com milicianos impunes. Os militares deixaram sucessivas operações de garantia da lei e da ordem sem arranhões graves à sua imagem. Trocaram sua pauta por um governo que os expõe a um desgaste crescente. De portadores da tutela, passaram a prisioneiros do presidente da República e de suas brigadas.
cristina.fernandes@valor.com.br
Quinta-feira: 11 de abril de 2019
UOL – Blog Reinaldo Azevedo: TIRO PELA CULATRA 1: 64% rejeitam posse de armas; 72%, porte. E aí, Moro?
Nem tudo está perdido, creio, e parece que os brasileiros não enlouqueceram de vez. Não caíram no conto do “Justiceiro de Curitiba” — não ao menos no que respeita ao que ele chama de ” combate ao crime violento”. Refiro-me, claro, ao ministro Sérgio Moro, da Justiça, que faz, por sua vez, as vontades de Jair Bolsonaro. Não! Ninguém gosta de bandidos — a rigor, nem outros bandidos. Mas parece que os brasileiros perceberam o risco da carnificina. Pesquisa Datafolha, publicada na Folha de hoje, traz dados importantes, que devem levar os senhores parlamentares a uma grave reflexão. Até porque deixarão seu nome gravado na história a depender do que venham fazer.
Dizem que arma de fogo deveria ser proibida porque “representa ameaça à vida de outras pessoas” 64% dos entrevistados, contra 34% que acreditam que uma arma legalizada deve “ser um direito do cidadão para se defender”. A arma já gozou de mais prestígio: em novembro de 2017, por exemplo, o placar era 52% a 46%. A rejeição é especialmente alta entre mulheres (74%), jovens de 16 a 24 anos (69%) e pessoas com renda de até 2 salários mínimos (72%).
E que se note: não se está a falar aqui da proposta verdadeiramente aloprada de Bolsonaro, que é a generalização do porte de armas, o que está longe de ser consenso mesmo em seu governo, com especial ênfase entre os militares. Nada menos de 72% dizem que as pessoas não estarão mais seguras se andarem armadas, contra 29% que pensam o contrário.
UOL – Blog Reinaldo Azevedo – TIRO PELA CULATRA 2: Maioria rejeita absurdos do “pacote anticrime” de Moro
Nas alterações que propôs nos artigos 23 e 25 do Código Penal, Sérgio Moro, que consegue espancar a lógica com o mesmo desassombro com que espanca a língua portuguesa e o direito, confere, sim, licença para matar quando mistura legitima defesa com um tal “excesso escusável” e com o que chamo “morte preventiva”, que foi a alegação usada pelos soldados do Exército que despejaram 80 tiros no carro em que estava uma família que se dirigia para um chá de bebê, matando o músico Evaldo Rosa dos Santos. Por óbvio, a esmagadora maioria dos brasileiros acha que a polícia pode matar em legítima defesa (72% a 25%), mas rejeita a ideia (68% a 29%) de que a sociedade seria mais segura se os policiais matassem mais suspeitos. Nada menos de 81% se opõem à ideia de que policiais deveriam ter mais liberdade para atirar, mesmo havendo risco de atingir inocentes; 79% dizem que policiais que matam em serviço têm de ser investigados; 82% repudiam a não-punição de uma pessoa que alegue ter atirado em outra porque muito nervosa.
UOL – Blog Reinaldo Azevedo – TIRO PELA CULATRA 3: Com flexibilização, 80% dizem que não vão comprar arma
Segundo a pesquisa Datafolha, 73% nunca pensaram em comprar uma arma de fogo para se defender da violência. Mesmo com a flexibilização, já efetivada por meio de decreto por Sérgio Moro e Jair Bolsonaro, 80% não pensam em fazê-lo, o que é uma excelente notícia. A Polícia ainda está longe de contar com a confiança razoável da população: 51% dizem ter mais medo do que confiança, contra 47% que afirmam o contrário. A prisão é vista de maneira ambígua: 54% concordam com a afirmação de que quanto mais pessoas presas, mais segura estará a sociedade, o que é rejeitado por 42%. Não obstante, 62% avaliam que o encarceramento fortalece as organizações criminosas (contra 34%).
UOL – Blog Reinaldo Azevedo – TIRO PELA CULATRA 4: Vejam quais são os grupos mais chegados a uma pistola
A Folha traz alguns cruzamentos feitos pela pesquisa indicando quais são os grupos que mais gostam de armas:
“A ideia de que o cidadão tem direito à posse de arma legalizada para se defender é mais difundida entre homens (47%), pessoas de cor branca (44%), com formação em nível superior (40%) e com renda maior que 10 salários mínimos (40%).
Entre 71 cruzamentos disponíveis na pesquisa, a posse de armas como direito é majoritária em apenas sete deles: empresários (64%), partidários do PSL (73%) e do PSDB (60%), eleitores de Bolsonaro (54%), aqueles que avaliam seu governo como ótimo ou bom (59%), quem já possui arma de fogo (72%) e quem pretende comprar uma (81%).”
Não são dados surpreendentes, convenham.
O armamentismo foi um dos pilares da campanha de Bolsonaro. A sua primeira medida de governo, diga-se, com a devida escolta de Moro, foi a flexibilização da posse de armas.
Neste ano, no entanto, eventos com armas de fogo traumatizaram o país. E, em todos os casos, a resposta das autoridades de plantão foi pífia. Vejam o caso deste estupefaciente Wilson Witzel: ele preferiu mão comentar a tragédia ocorrida no Rio. Ele ainda não chegou a uma conclusão se a execução de um pai de família é algo que ele deva lamentar.
Quinta-feira: 4 de abril de 2019
Folha de S.Paulo – Lava Jato tem passado como um trator sobre a Constituição, diz advogado
Marcelo Nobre, 51, que integrou o CNJ, diz estar preocupado com o futuro da democracia
Rogério Gentile
O advogado Marcelo Nobre, 51, que integrou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), afirma estar muito preocupado com o futuro da democracia no Brasil.
“A Lava Jato tem passado como um trator sobre a Constituição e sobre o direito de defesa”, diz. “Se as instituições ficarem submissas a essas pessoas que se acham acima da lei, a gente acaba com a democracia no país.”
Nobre é filho do político, advogado e jornalista Freitas Nobre (1921-1990), conhecido por sua luta pela redemocratização do país. Costumava jogar bolinha de gude nos tapetes da Câmara dos Deputados enquanto seu pai discutia o país na tribuna.
O advogado afirma que juízes e procuradores têm atuado politicamente, que o “partido da Lava Jato” está em aliança circunstancial com o governo Bolsonaro e que a sociedade brasileira parou de pensar.
“É natural que uma pessoa, ao ser acusada, seja automaticamente condenada?”, pergunta o advogado, que não tem clientes na Lava Jato.
Nobre, que atuou na defesa de Eduardo Cunha no processo de cassação na Câmara, diz que é preciso haver um contraponto ao que o procurador Deltan [Dallagnol] e o ministro Sergio Moro falam. “Eles acham que existem heróis.”
Folha:Os princípios fundamentais da do estado democrático de direito têm sido atropelados?
Marcos Nobre: Há muitas formas de se acabar com a democracia. Antigamente, a democracia era atacada pela força. Hoje o ataque se dá pela pela desconstrução das instituições. Juízes de primeira instância estão esculachando o Judiciário. E isso afronta a democracia.
Folha: Como assim?
Marcos Nobre: Todo mundo quer ver corrupto preso. Mas numa democracia você precisa de um processo justo e de uma defesa plena. Como ter defesa plena, se as sentenças já estão prontas, se a decisão já está tomada previamente?
Folha: Isso tem acontecido? Sim. Outra questão inadmissível são essas prisões. O ato de se prender alguém virou um ato de vontade, não de direito. Prende-se para que hoje no país? Alguns já assumiram que prendem porque o passarinho preso canta [numa referência às delações].
Folha: E a prisão do Temer?
Marcos Nobre: Voltamos para a arena romana. A prisão do Temer, como a de tantos outros, se enquadra nessa questão de decisão como um ato de vontade, e não como um ato de direito. Quais foram os motivos para a prisão do Temer? Evitar a destruição de provas e garantir a ordem… São discursos que pegaram no direito para tentar fazer com que a decisão tenha validade. No fundo, foi um ato de vontade, e não de direito. Se estivéssemos numa normalidade, o que aconteceria? Temer seria intimado a depor. Ele tem residência fixa. Não sei nem se apresentou sua defesa. O que aconteceu é inadmissível na democracia. É preciso usar fuzil para prender uma pessoa que não é violenta? Que está apenas na fase inicial do processo. Um ex-presidente?
Folha: A Lava Jato atua politicamente?
Marcos Nobre: Os grandes homens públicos do passado não fizeram sucessores, e a política passou a ser feita no Brasil, de um modo geral, por pessoas não vocacionadas, sem habilidade e sem conteúdo. A política passou a ser desacreditada. Os jovens que gostariam de ir para a política ficaram desorientados. Então, estudaram, prestaram concursos públicos e entraram na Polícia Federal, no Ministério Público e na magistratura. E foram fazer política lá! Mas fazer política nesses cargos é complicado.
Folha: O senhor reconhece importância histórica na Lava Jato?
Marcos Nobre: Completamente. Sou a favor da Lava Jato, desde que tudo seja feita dentro da Constituição. A Lava Jato poderia ter feito muitas das coisas que fez dentro da Constituição. Só que a verdade é que ela tem passado como um trator sobre a Constituição, sobre o direito de defesa.
Folha: Em quais situações?
Marcos Nobre: Várias, muitas nem vieram a público. Falemos de um ato específico do Moro, o da gravação da presidente [Dilma]. Você pode não gostar dela, pode odiá-la. Mas o que não se pode é admitir que uma autoridade judicial descumpra a lei. Seja lá o objetivo que for. Ele gravou a presidente, divulgou os áudios e, depois, chamado pelo relator do processo no STF, pediu desculpas. E tudo ficou por isso mesmo. A sociedade tem comprado essas situações sem perceber que, numa democracia, todo mundo tem de estar abaixo da lei. Todo mundo! Não apenas os políticos. Juízes e promotores também.
Folha: O sr. falou em arena romana.
Marcos Nobre: Os acusados estão sendo jogados na arena para os leões. E a sociedade, no coliseu, dá like e dislike, decide se o acusado vive ou morre. O maior exemplo é o André Esteves, do BTG. Foi preso por um ato de vontade, não de direito. Quase faliu. O processo passou por todas as instâncias e todo mundo disse ok. Até que chegou para o Gilmar Mendes [STF], que percebeu a situação e teve a coragem de soltá-lo. Gilmar foi achincalhado. E estava certo! Tanto que Esteves foi absolvido depois na primeira instância.
Folha: O Judiciário está refém do like e do dislake?
Marcos Nobre: Sim, a sociedade brasileira parou de pensar. É natural que uma pessoa, ao ser acusada, seja automaticamente condenada? A acusação nunca erra? As pessoas tomam um partido sem avaliar todos os lados. Conheço um magistrado que vinha decidindo questões da Lava Jato de forma a preservar a Constituição. Passou a sofrer críticas por conta do seu posicionamento e teve problemas pessoais. Acabou refluindo.
O [procurador] Deltan Dallagnol diz que o Supremo vai julgar um processo assim e assado. Diz que, se o STF julgar assim, acaba com a Lava Jato. E a sociedade e parte da imprensa compram sua ideia… Se o STF decide diferente do que ele pensa, passa a ser malhado e achincalhado.
Um outro procurador [Diogo Castor] disse recentemente que o STF preparava um golpe à Lava Jato. Querer jogar a sociedade contra o STF é uma irresponsabilidade. O que ele está testando? O que ele está querendo? Se as instituições ficarem submissas, a democracia acaba. O Conselho Nacional do Ministério Pública deveria se debruçar sobre a atitude de alguns membros do Ministério Público. A lei é para todos.
Folha: Quando o sr diz que procuradores e juízes atuam politicamente, o partido deles é o da Lava Jato ou o do governo?
Marcos Nobre: O partido da Lava Jato e o partido do governo estão numa simbiose. Tem membro do partido da Lava Jato no governo. E o partido da Lava Jato foi buscar um fundo partidário.
Folha: É uma aliança circunstancial?
Marcos Nobre: Sim, circunstancial. Tem coisas que precisam ser ditas. Neste governo, apoiado pelo partido da Lava Jato, a negociação política foi substituída pela intimidação.
Folha: E aonde pode parar isso?
Marcos Nobre: No final da democracia. Se as instituições ficarem submissas a essas pessoas que se acham acima da lei, a gente acaba com a democracia.
Folha: Não é um exagero falar em risco para a democracia?
Marcos Nobre: Criminalizaram a política e estão tentando criminalizar o Judiciário e a advocacia. Em termos institucionais, o que estão tentando? O que estão buscando? Temos de tomar muito cuidado. Tem de haver uma frente ampla para defender a democracia. Tem de haver um contraponto ao que o Deltan e o Moro falam. A sociedade precisa parar de comprar essas ideias e olhar para o todo. Estou muito receoso.
Folha: O Moro quer chegar aonde?
Marcos Nobre: Acho que está numa dúvida enorme entre ser ministro do STF ou presidente da República. Vamos falar um pouco sobre ele. Há um conflito enorme entre o Moro juiz e o Moro ministro. Passou grande parte da vida como um filho único, mandando. O PlayStation era só dele. Como ministro, ganhou um irmão. Agora tem de dialogar e convencer as pessoas de que o seu projeto é o melhor para o país. Não pode ordenar. Não é assim que se faz politica com “P” maiúsculo. Negociar não significa fazer coisa errada.
Folha: A fama subiu à cabeça dos membros da Lava Jato?
Marcos Nobre: Não tenho dúvida nenhuma. Subiu à cabeça. Gostam da notoriedade. Mas não existem heróis. Somos seres falíveis. Heróis existem nos quadrinhos e nos filmes. Mas eles acham que existem heróis.
Quarta-feira: 3 de abril de 2019
O Estado de S.Paulo -‘É um fato inegável’, diz Gilmar Mendes sobre ditadura militar
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reagiu nesta terça-feira, 2, às manifestações que relativizaram o golpe militar de 1964, mas ponderou que as mensagens lidas nos quartéis após autorização do presidente Jair Bolsonaro não têm relevância porque também eram lidas em governos anteriores.
Questionado sobre a atitude do Planalto de autorizar “comemorações” do golpe militar, Gilmar Mendes declarou que não iria emitir opinião sobre o comportamento do governo, mas fez questão de marcar o período histórico como ditatorial.
“Eu vivi isso como estudante, a invasão da universidade e tudo o mais. Logramos superar essa ditadura. Isso é um fato inegável, pessoas sofreram violência, a ordem institucional foi rompida mais de uma vez e isso precisa ser dito de maneira muito clara”, declarou Gilmar após participar de debate no Teatro CIEE, em São Paulo, para discutir livro do jurista Rodrigo Mudrovitsch sobre representatividade governamental.
Sobre os eventos nos quartéis, Gilmar Mendes citou que a chamada “Ordem do Dia”, escrita pelo Ministério da Defesa, já era lida em outros períodos, inclusive no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do qual participou. “Isso não tem relevância em si mesmo”.
Temer. O ministro não quis se manifestar sobre os processos envolvendo o ex-presidente Michel Temer. Nesta terça-feira, 2, o emedebista se tornou réu em mais duas ações penais na Lava Jato no Rio e foi alvo de outra denúncia apresentada pela força-tarefa da operação em São Paulo. “Esse caso daqui a pouco volta lá [no STF]”, citou.
Quando questionado se a Lava Jato não teria sido “autoritária” ao prender o ex-presidente, Gilmar declarou: “Vocês escreveram isso em editoriais.”
Quinta-feira: 4 de abril de 2019
Folha de S.Paulo – Bolsonaro é incompetente político e limitado intelectualmente, diz cientista político
Para Sergio Fausto, superintendente do Fundação FHC, presidente estigmatiza a relação com o Congresso
Flavia Lima
Cientistas políticos criticaram nesta terça-feira (2) o desejo do mercado financeiro de ver o ministro da Economia, Paulo Guedes, à frente das negociações da reforma da Previdência com o Congresso.
A uma plateia formada basicamente por economistas, analistas e operadores do mercado, em evento organizado pelo Bradesco, o cientista político Luciano Dias disse que colocar Paulo Guedes na linha de frente da negociação com o Congresso é equivalente ao que ocorre nos filmes com o “mexicano no saloon” porque “ele vai ser o primeiro a levar tiro”.
Sergio Fausto, superintendente do Fundação FHC, afirmou ser improvável que Guedes ganhe vida própria no governo, se tornando um foco independente de poder porque, no regime democrático, o palco de negociação é o Congresso Nacional.
“Isso é sonho de uma noite de outono [do mercado financeiro]”, afirmou Fausto, num trocadilho que faz alusão à peça Sonho de uma Noite de Verão, de William Shakespeare, uma comédia em que os personagens vivem em devaneios.
Para Fausto, o custo de interação do governo com o Congresso é elevado porque o presidente Jair Bolsonaro estigmatizou essa relação.
Dias, que está à frente da CAC Consultoria disse que, ao se olhar apenas para a formação do governo, a perspectiva é de não aprovar reforma nenhuma. Ele não duvida, no entanto, que o governo Bolsonaro se dobre ao presidencialismo de coalização.
“O Congresso está jogando pelo manual, pelo que é razoável e racional. Falta Bolsonaro se adaptar a essa realidade e é isso que vai determinar o sucesso das reformas nos próximos dias”, disse Dias.
Para Dias, formar coalizações políticas é básico e necessário e o discurso de Bolsonaro, que privilegia o patriotismo ou o amor à nação, não é suficiente. “Se patriotismo fosse um fator, militares não estariam contribuindo só com 7% da reforma da Previdência”, disse.
Segundo Dias, o país está amarrado a uma certa armadilha de baixo crescimento, o que significa que a taxa de popularidade do presidente tem viés de baixa. Uma possível saída para o imbróglio, disse ele, será formar uma coalização de “notáveis”, com burocratas ligados a partidos.
Sergio Fausto afirmou que é “preciso ser politicamente muito incompetente para não aprovar uma reforma em meio à fraqueza da oposição e dos sindicatos e num cenário em que governadores, municípios e parte do Congresso se colocam a favor dela.
“Bolsonaro é incompetente do ponto de vista político e me parece muito limitado do ponto de vista intelectual. Uma pessoa que tem enorme dificuldade de compreensão da realidade”, disse
Quarta-feira: 3 de abril de 2019
O Estado de S. Paulo – Nomeado por Moro associou homossexualidade a ‘desvio’
Breno Pires / BRASÍLIA
Depois do recuo no convite à cientista política Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, está diante de uma nova polêmica. Na quinta-feira passada, Moro empossou o delegado federal aposentado Wilson Sales Damázio no mesmo colegiado, para uma vaga de suplente, com mandato de dois anos.
Damázio já comparou homossexualidade a “desvio de conduta” e, quando questionado sobre um caso de abuso sexual praticado por policiais, disse que “policial exerce um fascínio no dito sexo frágil. Eu não sei por que é que mulher gosta tanto de farda”. As declarações de Damázio foram feitas em 2013 ao Jornal do Commercio e lhe custaram o cargo de secretário de Defesa Social de Pernambuco.
O nome do delegado foi uma sugestão do diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Fabiano Bordignon. “Ele fez muitas coisas importantes para a segurança do País. Foi o primeiro diretor do sistema penitenciário federal. As declarações não podem resumir o currículo dele”, disse.
Em nota, o Ministério da Justiça afirmou que a escolha de Damázio foi “por questões técnicas”. “Quanto às suas declarações proferidas anos atrás, ele pediu desculpas na época e elas não refletem a posição do MJSP”, diz o texto. O Estado tentou contato com Damázio mas não obteve resposta
Segunda-feira: 1º de abril
Le Monde Diplomatique sobre a Justiça no Brasil sob o comando de Moro e de Bolsonaro
Domingo: 31 de março de 2019
Quinta-feira: 28 de março de 2019
Folha de S.Paulo: charge de Benett
Quinta-feira: 28 de março de 2019
O Estado de S. Paulo – Devidas?
Eugênio Bucci*
Na segunda-feira, o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros, portou mais um despautério diante das câmeras. A propósito da aproximação da data de 31 de março, declarou que “o presidente não considera 31 de março de 1964 golpe militar”. Foi uma performance e tanto. Ao pronunciar a expressão “golpe militar”, Rêgo Barros ensaiou um realce discreto, quase imperceptível, como se pretendesse sublinhar uma inadequação. Realçando as palavras “golpe militar”, a voz do porta-voz pareceu ter a intenção de evidenciar que esse conceito não serve para definir o que houve em 31 de março de 1964.
A intenção do porta-voz ficou patente logo em seguida, quando ele arriscou um voo ontológico sobre 1964: “Ele (o presidente) considera que a sociedade reunida e percebendo o perigo que o País estava vivenciando naquele momento, juntou-se, civis e militares, e nós conseguimos recuperar e recolocar o nosso país no rumo que, salvo melhor juízo, se isso não tivesse ocorrido, hoje nós estaríamos tendo algum tipo de governo aqui (o porta-voz faz uma pausa, também sutil) que não seria bom para ninguém. E o nosso presidente já determinou ao Ministério da Defesa que faça as comemorações devidas (a voz do porta-voz parece escandir as sílabas de ‘devi-das’, fazendo subir um grau o volume da enunciação) com relação a 31 de março 1964, incluindo uma ordem do dia patrocinada pelo Ministério da Defesa, que já foi aprovada pelo nosso presidente”.
Embora a rarefação de sentido dificulte a interpretação do fraseado (a cada cinco palavras o porta-voz parece esquecer-se do motivo pelo qual iniciara a oração em que se encontra), entendemos daí que, na visão dele e de seu superior, o regime que se estendeu entre 1964 e 1985 não constituiu uma ditadura. Quanto a isso o próprio Bolsonaro já se manifestou mais de uma vez, de voz própria. Em algumas ocasiões ele se referiu ao período ditatorial como um “regime com autoridade”. Agora o porta-voz vem agregar mais elementos a essa visão personalíssima da História.
Prestemos a “devida” atenção a esses novos elementos. As palavras do porta-voz não são propriamente notícia (sobretudo numa semana de outras turbulências, como os indícios de que a base do governo se vai esfarelando ao vento), mas escancaram, como poucas vezes se escancarou, a incompatibilidade entre a crença nebulosa que vai na cabeça presidencial e o fundamento axiológico que põe de pé a coerência interna da Constituição federal de 1988.
A Constituição de 1988 tem defeitos graúdos, já sabemos. Ela abriga contradições internas, tendo abrigado pontos de vista discrepantes. São inúmeras as tensões entre um artigo e outro, assim como são muitos os anacronismos e os excessos verborrágicos, em meio a um certo entulhamento de disposições tratando de assuntos que jamais deveriam ser regulados pelo texto constitucional (e sim por legislação ordinária). Mesmo assim, a Constituição de 1988 resiste. Por que resiste? A explicação é simples: ela sobrevive e vige porque está assentada sobre um consenso pétreo. Esse consenso é a premissa de que o que houve no Brasil de 1964 a 1985 foi, sim, uma ditadura que destroçou a vigência dos direitos humanos, a normalidade democrática e a transparência na administração pública, triturando cada um dos fundamentos da ordem constitucional que existia antes, e isso num grau tão profundo que o Brasil, depois de derrubar a velha ditadura, precisou providenciar uma nova Constituição. Foi a partir desse consenso que nasceu a Carta de 1988, até hoje vigente.
Em outras palavras, o período democrático que vivemos desde 1988 tem este pilar fundamental: a certeza de que o regime militar instaurado em 1964 foi uma ditadura e de que essa ditadura precisou ser posta abaixo para que pudéssemos erguer uma ordem baseada na liberdade, no respeito à dignidade humana e na democracia.
Nesse contexto, ao dizer que o golpe militar de 1964, na presidencial opinião, não foi um golpe, o porta-voz planta minas terrestres no alicerce da Constituição que temos. Quando diz que, graças ao golpe que não é golpe, o Brasil se livrou de ter hoje um governo “que não seria bom para ninguém”, está dizendo que os tiranos fardados que cassaram dos brasileiros o direito de votar para presidente e para governadores sabiam resolver sozinhos os impasses que o conjunto dos brasileiros não tinha competência para resolver. Logo, ele diz, com desinibida clareza, que, em certas situações, a democracia não é solução e que, sempre na opinião presidencial, há um erro originário na Constituição de 1988: o erro de ter tentado corrigir o estrago produzido pela ditadura militar. Segundo a locução da voz do porta-voz, é preciso revogar o princípio basilar da Constituição de 1988 e reabilitar o método, o autoritarismo e a violência da ditadura que não foi ditadura. Para ele, o que está fora de ordem não é a ditadura que torturava dissidentes políticos e dava sumiço em cadáveres, o que está fora de ordem é a ordem democrática que chama de ditadura a ditadura que, para o presidente, não foi ditadura. Eis por que, coerentemente, o presidente da República manda comemorar o golpe de 1964 como se não fosse golpe.
Por sorte, ou por dever de ofício, algumas vozes na Defensoria Pública da União e no Ministério Público Federal contestaram a voz do porta-voz. Essas vozes têm razão. A ordem emitida pela Presidência da República para que se façam as “comemorações devidas” do golpe talvez incorram em ofensas à lei e à Constituição. A ofensa maior, porém, não é a que se perpetra contra a norma jurídica, mas a que se lança contra a cultura democrática. Este governo, que não construiu nada positivo até aqui, tem sido efetivo em erguer um muro. Tijolo por tijolo, constrói uma obra só: uma barreira entre os cidadãos brasileiros e um regime de liberdade, que vai ficando para trás.
É consenso pétreo que o que houve no Brasil de 1964 a 1985 foi, sim, uma ditadura
Jornalista, é professor da ECA-USP
Quarta-feira: 27 de março de 2019
Veja.com – Governo arde a céu aberto e Bolsonaro indaga: o que tenho feito de errado?
Por José Benedito da Silva
O governo Bolsonaro derrete a cada dia. Nesta quarta-feira 27, o derretimento veio em forma de uma longa agonia, parte dela transmitida ao vivo pela TV, que exibiu nomes de peso da gestão acossados por membros do Congresso durante discussões sobre temas relevantes.
A agenda já era perturbadora. Nada menos que cinco ministros estavam convidados pelo Legislativo para expor, a parlamentares desconfiados, o que afinal o governo pretende fazer com o mandato que obteve nas urnas.
E não foram quaisquer ministros. Paulo Guedes (Economia), Sergio Moro (Justiça), Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Vélez Rodríguez (Educação) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde), todos à frente de pastas de primeiro escalão, foram para o debate.
Não deu para cantar muita vitória. O fato de cinco ministros desse calibre estarem tendo que explicar o que pretendem fazer evidencia uma certa fragilidade política do governo e a animosidade de parlamentares com o titubeio um tanto frenético que marca o início da gestão Bolsonaro.
Guedes, o mais importante deles, chegou a discutir com uma senadora (Kátia Abreu) e disse, quase em tom de desânimo, que, se a reforma da Previdência – o canto da sereia para o mercado – não passar, não tem como continuar no cargo.
“Se o presidente ou a Câmara ou ninguém quer aquilo (aprovar a reforma), eu vou me sacrificar ao trabalho dos senhores? De forma alguma, eu voltarei para onde sempre estive”, afirmou.
Moro foi questionado sobre o seu pacote anticrime e também disse que, se mudarem a proposta retirando dela o combate à corrupção, não concordaria. Teve de ouvir que a prioridade será dada a iniciativa semelhante do agora ministro do Supremo Alexandre de Moraes, que já ocupou seu cargo – e que não toca no tema.
O ex-juiz da Lava Jato chegou a dizer que topava que fosse assim, desde que levassem em conta também os pontos sugeridos em seus projetos e não contemplados pelo antecessor, entre eles o combate à corrupção.
Vélez aumentou a desconfiança sobre sua capacidade para o cargo e se enrolou em algumas perguntas – apelou até ao conterrâneo Pablo Escobar, o célebre traficante, para defender a militarização das escolas.
Também não tinha muito o que mostrar, já que gastou o seu tempo até agora nomeando e demitindo auxiliares, numa barafunda constrangedora, ou tentando emplacar pautas ideológicas que nem de longe tocam nos principais problemas da educação.
O mesmo pode-se dizer de Ernesto Araújo, outro auxiliar cujas credenciais para a função são cada vez mais questionadas. Na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, disse que não houve golpe em 1964 e que a tomada de poder pelos militares foi um “movimento necessário”.
Virou alvo de ironia do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), que disse que preferia que as perguntas fossem respondidas “pelo ministro nomeado, e não pelo ministro de fato”, numa alusão à participação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), presidente da comissão e cada vez mais influente em questões de política externa do governo.
Um pouco melhor se saiu Mandetta, mas é mau sinal que tenha gastado boa parte de seu tempo reforçando que não vai acabar com um programa criado na gestão petista, o Mais Médicos.
O tom geral nas inquirições aos ministros foi de desapontamento, incredulidade e até hostilidade. Isso no período em que deveria estar ocorrendo a tradicional lua-de-mel com o Congresso.
E o capitão? O capitão estava provocando confusão com estudantes do Mackenzie ao marcar uma visita ao palco de um célebre confronto durante a ditadura numa semana em que ele achou que era de bom tom pedir que a população e os militares comemorassem o aniversário do golpe de 1964.
Passou pelo constrangimento de ver uma juíza federal lhe intimar para explicar que tipo de festa cívica, afinal, estava propondo aos brasileiros. Ainda não respondeu.
Com os protestos se desenhando desde a véspera da visita, cancelou a agenda na universidade – o que esvaziou, mas não impediu as manifestações – e se refugiou em um habitat onde se sente seguro: o Comando Militar do Leste.
Mas ele ainda faria mais para incendiar a fogueira que, aos poucos, mas numa velocidade assustadora, vai consumindo o seu governo.
Achou, por exemplo, que tudo bem manter acesa a polêmica institucional com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que se arrasta há dias, em torno da inexistente articulação política de sua gestão.
Disse que entendia a irritação de Maia e que o outrora aliado estava abalado por “questões pessoais”, em referência à prisão do padrasto da esposa do deputado, o ex-ministro Moreira Franco, pela Lava Jato.
Maia foi com os dois pés na faixa presidencial. “Abalados estão os brasileiros, que estão esperando desde 1º de janeiro que o governo comece a funcionar. São 12 milhões de desempregados, 15 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza e o presidente brincando de presidir o Brasil”, disse.
Bolsonaro rebateu, dizendo lamentar e até mesmo duvidar que o deputado, peça-chave na reforma da Previdência, tivesse dito o que disse. “É uma irresponsabilidade”, declarou.
O mercado, que já gritou vivas ao novo mandatário, sentiu o golpe e disparou o alerta: o Ibovespa caiu quase 4% e o dólar chegou ao valor mais alto desde outubro, mês do triunfo eleitoral de Bolsonaro.
Não se sabe se há algum cálculo político no comportamento errático do governo, mas o fato é que, sem precisar da oposição, a gestão desmorona sob os olhares perplexos até de quem apoiou (ou ainda apoia) o projeto bolsonarista.
Um exemplo claro veio dos evangélicos, setor da sociedade que catapultou Bolsonaro ao poder e que, segundo recente pesquisa Ibope, é responsável pela maior fatia da população que ainda está com o governo.
Recém-eleito presidente da bancada evangélica, o deputado Silas Câmara (PRB-AM) afirmou, assim que tomou posse no cargo, também nesta quarta-feira, que é contra qualquer negociação do grupo que envolva participação no governo.
“A frente se afastará, por completo, de atuação política direta com o Executivo e voltará a ser a frente dos evangélicos em defesa da família, da vida e dos princípios cristãos”, anunciou.
E olhe que foi um dia em que os filhos do presidente, até então as maiores fontes de confusão, não deram o ar da graça. Talvez estejam guardando algo para esta quinta-feira, nunca se sabe, mas o fato é que não botaram lenha na fogueira.
Entre tantas sandices ditas e feitas, de manhã até a noite pela trupe bolsonarista, a frase do dia acabou sendo essa, proferida pelo presidente em entrevista na TV Bandeirantes “O que eu tenho feito de errado?”.
Alguém precisa esclarecer isso com urgência ao capitão.
Quarta-feira: 27 de março de 2019
Folha de S.Paulo – Festejo indevido
Opinião: Bolsonaro determina comemorações de golpe, no que felizmente deve ser contido
O porta-voz do Planalto, general Otávio Rêgo Barros, relatou na segunda-feira (25) que o presidente Jair Bolsonaro havia determinado ao Ministério da Defesa a realização de “comemorações devidas” dos 55 anos do golpe militar levado a cabo em 31 de março de 1964.
Não se sabe ao certo o que o mandatário entende por “comemorações devidas”. São conhecidas, entretanto, suas opiniões acerca do regime instituído pelo marechal Humberto de Alencar Castello Branco, que sufocou a democracia brasileira por duas décadas.
Elas não se resumem a considerar que se tratou de uma reação, com apoio de setores do empresariado e da classe média, ao fantasma da implantação de um governo de inspiração soviética no país, em meio aos embates da Guerra Fria.
Em sua vida pública, Bolsonaro, capitão reformado após carreira conturbada nas Forças Armadas, já teceu elogios ao que de pior aconteceu durante os anos de autoritarismo. É um entusiasta declarado, por exemplo, do coronel Carlos Brilhante Ustra, um notório torturador, a quem considera um herói brasileiro.
Num bem-vindo contraponto, autoridades de origem militar têm recomendado discrição ao governo e à caserna. Foi nesse sentido que se pronunciou o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, ao considerar, com bom senso, inadequado o uso da palavra “comemoração” para marcar a data.
Ao insistir no tom de celebração, o presidente mostra-se mais uma vez ambíguo quanto aos princípios democráticos que diz defender.
Parece evidente sua inclinação a atiçar setores mais extremados da opinião pública, que estiveram entre os primeiros apoiadores de sua candidatura presidencial. Com isso, estimula a polarização e o conflito, quando deveria estar empenhado em acalmar os ânimos.
Aviva-se artificialmente um debate que deveria estar, se não superado, sendo ao menos conduzido em termos mais racionais. Desde o golpe, toda a sociedade passou por um penoso processo de amadurecimento e aprendizado, que felizmente levou ao período de liberdades democráticas mais duradouro da história nacional.
Se há falhas no arranjo em vigor, tampouco se podem negar os avanços conquistados sob sua égide. Eliminou-se o descontrole inflacionário crônico e equacionou-se a dívida externa; estabeleceu-se um aparato de proteção social capaz de ao menos mitigar a pobreza e a desigualdade de renda.
Não é hora de tergiversações. Não há caminho para o Brasil fora da democracia e do Estado de Direito
Sexta-feira: 22 de março de 2019
Folha de S. Paulo: Chile, o que sobrou foi só o banho de sangue
Democracia, não a ditadura, deu estabilidade ao Chile
Clóvis Rossi
Onyx Lorenzoni, o chefe da Casa Civil de Jair Bolsonaro, festeja o fato de o ditador Augusto Pinochet ter lavado com sangue as ruas de Santiago (o que é verdade), mas ter promovido o sucesso econômico que perdura até hoje.
Sou obrigado a republicar aqui texto que saiu em dezembro para demonstrar, com estatísticas, que quem fez do Chile o que é foi a democracia e não a ditadura.
Antes, é sempre preciso deixar claro que, do meu ponto de vista, ditaduras são sempre nefastas, façam o que fizerem, tenham algum sucesso econômico ou sejam um miserável fracasso como é o caso da Venezuela.
Não vale, pois, dizer que Pinochet matou, torturou, exilou, fez desaparecer milhares de pessoas, mas arrumou a economia. Bobagem.
Aos números comparativos que importam:
1 – Crescimento econômico – De 1973, ano do golpe que entronizou Pinochet, a 1988, ano do plebiscito que vetou sua continuidade, o Chile teve um crescimento interessante, de 54,7%.
Mas, na democracia, a partir de 1990 e por um período equivalente, o crescimento foi mais do que o dobro (exatos 110%).
Consequência inevitável: a renda per capita chilena em 1990, na volta à democracia, era igual à do Brasil. Quinze anos, passou a ser 60% maior.
Logo, democracia, 1 x Pinochet, 0.
2 – Desemprego – Depois de um pico de 25% da população economicamente ativa, o desemprego na ditadura girou em torno de 18%, o triplo do que ocorria nos anos 1960.
O desemprego só voltou a patamares mais civilizados com a democracia. Terminou 2018 com 7,3%, menos da metade, portanto, dos trágicos índices do período Pinochet.
Logo, democracia, 2 x Pinochet, 0
3 – Pobreza e desigualdade – Nos anos finais da ditadura, a pobreza afetava quase a metade da população chilena. Com a democracia e o investimento público redirecionado para a área social, foi se reduzindo paulatinamente.
Em 2017, afetava 8,6% da população, um dos registros mais baixos da América Latina.
Já a desigualdade continua a ser uma chaga aberta na sociedade chilena, mas, de todo modo, se reduziu com a democracia. Quando medida pelo coeficiente de Gini (quanto mais perto de 1, maior a desigualdade), passou de 0,46 ao se instalar a ditadura, em 1973, para 0,57 quando a democracia chegou, em 1990.
Só em 2015, voltou aos níveis vigentes antes do golpe (estava então em 0,48).
Logo, democracia, 3 x Pinochet, 0.
4 – Política – Se a ditadura tivesse sido de fato o sucesso em que acreditam Lorenzoni e os Bolsonaros, Pinochet não teria perdido o plebiscito de 1988 sobre sua continuidade ou não. Tinha tudo na mão: absoluto controle dos meios de comunicação, partidos proscritos, opositores perseguidos, mortos, presos ou exilados.
Não obstante, 54,71% dos chilenos preferiram vetar o ditador. No ano seguinte, na eleição presidencial determinada pelo resultado do plebiscito, nova derrota do pinochetismo: ganhou o oposicionista Patricio Aylwin.
Mais: nas três eleições presidenciais seguintes, três novas vitórias dos oposicionistas, com Eduardo Frei (democrata cristão), Ricardo Lagos e Michelle Bachelet (socialistas).
Foi preciso esperar até 2010 para que assumisse um presidente conservador, no caso Sebastián Piñera. Com um detalhe relevante: ele votara pelo não à permanência de Pinochet no plebiscito de 1988.
Só neste quesito, portanto, dá democracia, 5 x Pinochet, 0.
5 – Por fim, reforma da Previdência chilena, a que dá água na boca dos economistas liberais de Bolsonaro. De fato, a reforma feita pela ditadura ajudou a sanear as contas públicas, mas em contrapartida, arruinou as contas privadas (dos aposentados).
O jornal paranaense Gazeta do Povo citou em dezembro estudo da Fundación Sol de 2015 que mostra que quase 91% da população recebia valores inferiores a 150 mil pesos mensais (equivalentes hoje a R$ 851) em um país em que o salário mínimo chegava então a 276 mil pesos (R$ 1.565).
É tão falho o modelo admirado pelos Bolsonaros que até um governo conservador como o de Piñera está propondo modificá-lo, por meio de projeto em tramitação no Congresso.
Posto de outra forma: a tentação da equipe de Bolsonaro é copiar um modelo que está sendo alterado por um motivo bem simples, apontado pela consultoria Eurasia, que não parece fazer parte de alguma conspiração do marxismo cultural: “Amplo consenso sobre a necessidade de incrementar as pensões baixas em meio ao descontentamento do público sugere que a reforma será aprovada” (relatório divulgado em 17 de dezembro).
O que o governo está propondo é criar o que chama de “pilar de solidariedade” para aumentar os fundos para os mais pobres e mudar o sistema de contribuições individuais gerenciadas por entidades privadas.
Os empregadores teriam que contribuir com uma nova taxa (de 4% do salário de seus funcionários), além dos 10% já pagos atualmente. O custo da reforma, calcula a Eurasia, ficará em cerca de US$ 3,5 bilhões (R$ 13,5 bilhões).
Tudo somado, o que ficou foi só o banho de sangue.
Clóvis Rossi
Repórter especial, membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.
Quinta-feira: 21 de março de 2019
O Globo – Análise – É difícil governar só para convertidos
Paulo Celso Pereira
Uma das origens da crise que fulminou o segundo governo da ex-presidente Dilma Rousseff estava na incompreensão da petista em relação ao resultado de sua reeleição. Após derrotar o tucano Aécio Neves pela menor margem vista em nossa história republicana, Dilma entendeu que a população lhe dera um salvo conduto para dobrar a aposta em seu estilo. Tratava-se do oposto. Em vez de processar o mea-culpa pelos muitos erros cometidos até então, Dilma fechou-se ainda mais em torno de seus seguidores incondicionais. Deu no que deu.
Desde que foi eleito, o presidente Jair Bolsonaro adotou postura semelhante. Em nenhum momento fez acenos aos derrotados e seguiu com ataques a inimigos reais e imaginários — em suma, todos que não partilham integralmente de sua visão de mundo. De fato foi o discurso radical que o tirou do baixo clero do Congresso e o levou ao papel de principal representante da direita brasileira. Mas sua chegada ao Planalto não foi consequência de um alinhamento da sociedade com o discurso extremista. Pelo contrário.
A principal razão para sua eleição foi a rejeição da maioria da sociedade a dar mais um mandato presidencial ao PT. Durante a campanha, as pesquisas mostravam que qualquer adversário, que não Fernando Haddad, bateria o então candidato do PSL no segundo turno.
Em vez de olhar para o resultado com humildade e buscar um caminho que unisse o país após quatro longos anos de crise política, o presidente optou pelo oposto. Desde outubro, suas manifestações são direcionadas essencialmente para o núcleo que o tirou do ostracismo, os militantes mais aguerridos da direita brasileira. Nessa trilha, Bolsonaro abriu mão inclusive de organizar uma base parlamentar que dê sustentação efetiva às reformas imprescindíveis para a retomada econômica.
A pesquisa Ibope divulgada ontem mostra que a estratégia está dando errado. A queda de 15 pontos percentuais na avaliação positiva do governo em dois meses é de impressionar. Para efeito de comparação, quando a crise de popularidade de Dilma começou, pouco depois da reeleição, sua avaliação despencou19 pontos no Datafolha igualmente num período de dois meses, entre dezembro de 2014 e fevereiro de 2015.
O patamar atual de Bolsonaro ainda é significativamente melhor que aquele do início do segundo governo da petista, mas há um ditado que deve servir de alerta: em pesquisa, o que vale é o “filme”, não a “foto”.
Quinta-feira: 21 de março de 2019
O Estado de S. Paulo – Após sofrer cobrança, Maia ataca Moro
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), reagiu à cobrança de Sérgio Moro para colocar o pacote anticorrupção em tramitação. Chamou o ministro da Justiça de “funcionário” de Bolsonaro e o acusou de “copiar” proposta de Alexandre de Moraes, discutida no ano passado.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acusou ontem o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, de desrespeitar um acordo do governo ao cobrar que o pacote anticorrupção seja discutido simultaneamente à reforma da Previdência. Maia afirmou que o ministro é “funcionário” de Bolsonaro e que se o governo quiser mudar a tramitação das propostas é só o presidente pedir. Sobre o pacote, disse ser uma “cópia” da proposta capitaneada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes.
“Funcionário do presidente Bolsonaro? Conversa com o presidente Bolsonaro e se o presidente Bolsonaro quiser, conversa comigo. Eu fiz aquilo que acho correto”, afirmou Maia. Mais cedo, Moro disse, no lançamento da Frente Parlamentar de Segurança, a chamada bancada da bala, que procuraria Maia para pedir celeridade ao pacote. “Vou conversar respeitosamente com o presidente da Casa.”
Moro reagia à decisão de Maia de criar um grupo de deputados que, por 90 dias, vai analisar o projeto antes de começar a discussão em uma comissão da Casa, o primeiro passo da tramitação. A medida, na prática, “trava” a discussão das propostas.
O presidente da Câmara afirmou que o ministro conhece “pouco a política”. “Acho que ele (Moro) conhece pouco a política. Eu sou presidente da Câmara, ele é ministro, funcionário do presidente Bolsonaro. Então, o presidente Bolsonaro é quem tem que dialogar comigo. Ele está confundido as bolas. Ele não é presidente da República. Não foi eleito para isso. Está ficando uma situação ruim para ele”, disse.
As afirmações do presidente da Câmara representam um novo revés para Moro como ministro. O ex-juiz da Lava Jato disse em mais de uma ocasião que deixou a magistratura pela possibilidade de tornar a legislação mais rigorosa e implantar medidas que ajudassem o País a combater a corrupção. Ele tem esbarrado, porém, na rejeição de parte dos parlamentares, que o acusam de ter criminalizado a atividade política.
Cópia. Maia ainda acusou Moro de “copiar” uma outra proposta discutida no ano passado por uma comissão de juristas presidida por Alexandre de Moraes. “O projeto é importante. Aliás, ele (Moro) está copiando projeto do ministro Alexandre de Morais, copia e cola. Então tem poucas novidades no projeto dele”, disse. “Vamos apensar um ou outro projeto, mas o prioritário é o do ministro Alexandre de Moraes. No momento adequado, depois de votar a Previdência, vamos votar o projeto dele. O que precisamos é que o ministério da Justiça diga, com a estrutura que tem, como fará combate ao crime organizado”.
A reação de Maia também ocorre após ele virar alvo de apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais por críticas à proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo. Ele também causou indignação entre militares por ter afirmado, anteontem, que a categoria chegou no “fim da festa” ao propor a reestruturação das carreiras como contrapartida a mudanças nas regras de aposentadoria.
Em nota enviada pela assessoria do ministério da Justiça, Moro afirmou que apresentou em nome do governo Bolsonaro, “um projeto de lei inovador e amplo contra crime organizado, contra crimes violentos e corrupção, flagelos contra o povo brasileiro”. “A única expectativa que tenho, atendendo aos anseios da sociedade contra o crime, é que o projeto tramite regularmente e seja debatido e aprimorado pelo Congresso Nacional com a urgência que o caso requer”, disse.
“Talvez alguns entendam que o combate ao crime pode ser adiado indefinidamente, mas o povo brasileiro não aguenta mais”, afirmou o ministro. “Essas questões sempre foram tratadas com respeito e cordialidade com o Presidente da Câmara, e espero que o mesmo possa ocorrer com o projeto e com quem o propôs. Não por questões pessoais, mas por respeito ao cargo e ao amplo desejo do povo brasileiro de viver em um país menos corrupto e mais seguro”, completou.
Reunião governamental, segundo o chargista Dorinho
Terça-feira: 19 de março de 2019
UOL – Blog Reinaldo Azevedo – Palocci: papo de que Sarkozy e Lula falaram de propina tête-à-tête é piada
Antonio Palocci, o delator que tenta a esperteza de dizer qualquer coisa, não se ocupando nem da verossimilhança
Não há muita coisa a dizer sobre o mais novo capítulo da delação de Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda do primeiro governo Lula e ex-ministro do Planejamento do primeiro governo Dilma. Nos dois casos, caiu porque seu padrão de conduta pareceu heterodoxo até aos petistas.
A mais nova bomba de traque deste gigante moral assegura que o então presidente Lula negociou propina diretamente com Nicolás Sarkozy, que presidia a França, num acordo para a compra de helicópteros e para a construção de submarinos nucleares — acordos que foram acompanhados de perto pelas respectivas cúpulas das Forças Armadas interessadas. Teria sido ali, tudo no “tête-à-tête.
Vamos lá. Todos sabem que eu não sou um fã ardoroso dos métodos empregados pelo Ministério Público Federal, não é mesmo? Acho que há abusos de várias naturezas na forma como atua para obter delações. O órgão rejeitou um entendimento do Palocci porque lhe pareceu que ele estava interessado apenas em livrar o próprio pescoço. E aí partiu para o vale-tudo.
Das pessoas dotadas de um mínimo de bom senso a especialistas em sacanagem, vamos convir: todos riem de escárnio da acusação desse gigante, que celebrou acordo de delação com a PF.
Vocês acham mesmo que os respectivos presidentes de duas grandes democracias, uma delas entre os cinco países mais ricos do mundo, combinam propina, quando combinam, em conversa direta? Isso está mais para a piada.
Há até uma questão prática: Lula não fala francês; Sarkozy não fala português. Imaginem os dois tratando de sacanagem com a presença de pelo menos duas testemunhas — sim, em conversas assim, cada um tem o seu para evitar erros, digamos, interessados…
Ah, sim: Lula, de fato, queria comprar os caças Rafalle, dos franceses. Chegou até a anunciar isso na viagem de Sarkozy ao Brasil. A escolha da Aeronáutica foi pelo sueco Gripen. E aí o ex-presidente é acusado de ter negociado vantagens também nesse caso, naquela que é, creio, a mais ridícula de todas as denúncias contra o petista.
Palocci é apenas alguém interessado em salvar o próprio pescoço e acha que Lula ainda tem ombros largos o bastante para o que lhe der na telha. Mas parece que perdeu até o sentido da verossimilhança.
Quarta-feira: 20 de março de 2019
O Estado de S.Paulo – Governo tira do ar entrevista de Bolsonaro que foi criticada
Planalto publicou áudio da fala do presidente à emissora americana Fox News em que diz que maior parte dos imigrantes que se mudam para os Estados Unidos ‘tem más intenções’; depois, removeu arquivo para substituí-lo por versão editada
Naira Trindade, Brasília
BRASÍLIA – Após a entrevista do presidente Jair Bolsonaro à Fox News repercutir mal nas redes sociais, o Planalto retirou o áudio do portal oficial do governo. A gravação, exibida na terça-feira, 19, em Washington (EUA), havia sido publicada na página oficial às 11h11. O material permaneceu disponível até 16h45. Depois, foi apagado.
Ao ser questionado pelo Estado, o Planalto a republicou às 18h45. Em seguida, a gravação foi novamente suspensa. Desta vez, para que fosse substituído o áudio bruto pelo editado e divulgado pela TV americana.
Bolsonaro concedeu a entrevista para o canal que faz cobertura favorável ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. À entrevistadora Shannon Bream, o presidente disse que a maior parte dos imigrantes que se mudam para os Estados Unidos “tem más intenções”. A declaração foi dada para justificar a posição favorável do brasileiro à construção do muro na fronteira dos Estados Unidos com o México.
É praxe a divulgação de áudios e transcrições de declarações do presidente da República na página oficial do governo. Procurado, o secretário de Comunicação, Alexandre Lara, disse ter havido um erro e que o material editado e veiculado pela Fox seria publicado novamente no site.
Equívoco
Ao ser questionado sobre o assunto, Bolsonaro voltou atrás na declaração sobre os imigrantes dada à Fox News. A jornalistas, o presidente se desculpou pela declaração. “Foi um equívoco meu, boa parte tem boas intenções, a menor parte não (tem boas intenções). Peço desculpas aí”, disse Bolsonaro.
Veja abaixo a íntegra da entrevista de Bolsonaro à Fox News (áudio em inglês): ttps://youtu.be/6VSEp5tf7lg
Mesmo assim, ele afirmou que tem “muita gente que está de forma ilegal” nos EUA, mas disse que isso é “uma questão de política interna”. “Eu também gostaria que, no Brasil, só tivesse estrangeiros legalizados e não de forma ilegal, como existe. Me desculpem mais uma vez o equívoco ou ato falho”, afirmou o presidente.
Ao comentar a isenção de visto de turista aos americanos, concedida pelo Brasil mesmo sem a reciprocidade dos EUA, Bolsonaro afirmou que alguém tem que “ceder o braço em primeiro lugar”.
“Não vemos nenhum americano indo para o Brasil para ganhar estabilidade via CLT, buscar emprego lá. E o contrário, para cá existe, mesmo não havendo qualquer garantia de CLT aqui. Então, há uma diferença e alguém tem que ceder o braço em primeiro lugar, estender as mãos em primeiro lugar, e fomos nós”, afirmou. / COLABOROU BEATRIZ BULLA, CORRESPONDENTE / WASHINGTON
Quarta-feira: 20 de marcço
O Globo: charge de Chico Caruso – Bolsonaro visita Trump
Quarta-feira: 20 de março de 2019
Folha: charge de Laerte
Quarta-feira: 20 de março de 2019
Veja: Gente, isso não é normal!
Trump e seu espelho
Por Ricardo Noblat
Não é normal que um presidente da República do Brasil se desmanche em elogios escancarados ao presidente da República de outro país, ou ao Chefe de Estado que acaba de visitar. Os elogios devem ser protocolares, discretos, quando nada para que não fique a impressão de que foi subserviente, ou de que se comportou simplesmente como um jeca.
Não é normal que um presidente da República do Brasil, ao cabo de uma viagem ao exterior, seja apontado pela imprensa estrangeira como um bajulador do anfitrião. Presidentes da República do Brasil já foram criticados pela imprensa internacional por outros motivos – uns por chefiarem governos ditatoriais, outros por se revelarem incompetentes, mas não por isso.
Não é normal que um presidente da República do Brasil interfira em assuntos internos do país que visita desejando a quem o recepciona que se reeleja, ou dizendo com todas as letras que acredita em sua reeleição. E se ela não acontecer? Como poderá contar no futuro com a boa vontade do novo governo que ele mesmo desejou que fosse derrotado?
Não é normal que um presidente da República do Brasil, em visita a outro país, faça declarações tão repulsivas contra seus compatriotas forçados um dia a deixarem o local onde nasceram à procura de melhores condições de vida. E que chegue ao ponto de afirmar que apoia a construção de um muro para separar o país que visita dos seus vizinhos.
Não é normal que um presidente da República do Brasil, em visita a outro país, deixe seu ministro das Relações Exteriores em posição subalterna para valorizar a presença de um dos seus filhos, parlamentar reeleito, cada vez mais influente nas decisões de política externa tomadas por seu pai, e fã de carteirinha do presidente do país visitado a ponto de merecer suas deferências.
Por fim, não é normal que um presidente da República do Brasil, em visita a outro país, peça para conhecer a sede de uma das maiores agências de espionagem do mundo, famosa ao longo de sua história por financiar golpes contra presidentes legitimamente eleitos, e manter bases secretas no exterior onde tortura presos políticos. Definitivamente, não é normal.
Se nenhuma dessas coisas é normal, seria possível engoli-las caso o resultado da visita configurasse um retumbante êxito – mas não. Por tudo conhecido até aqui, o visitante concedeu muito mais do que obteve. Dizem seus devotos que a boa química estabelecida entre ele e seu anfitrião dará preciosos frutos. O futuro a Deus pertence. O Deus do visitante sequer é o mesmo Deus do visitado.
Terça-feira: 12 de março de 2019
O Globo: O governo é refém de um lunático
Bernardo Mello Franco
Antes que os bolsonaristas mais aguerridos peguem em armas, um esclarecimento. O lunático do título não é quem vocês estão pensando. Refiro-me a Olavo de Carvalho, o guru que faz a cabeça do presidente.
O autoproclamado filósofo emplacou dois pupilos como ministros: o das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e o da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. As presepadas dos discípulos não saciaram o mestre. De seu escritório em Richmond, ele se dedica a semear intrigas e provocar novas crises em Brasília.
No fim de janeiro, Olavo se lançou numa cruzada contra o vice-presidente Hamilton Mourão. Chamou o general de “maluco”, “covarde”, “psicopata”, “charlatão desprezível” e “vergonha para as Forças Armadas”.
Como o vice não pode ser demitido, o ideólogo escolheu outros alvos. Na semana passada, o embaixador Paulo Roberto de Almeida o culpou por sua exoneração do Ipri, o instituto de pesquisas do Itamaraty. O diplomata havia chamado Olavo de “sofista” e “debiloide”.
Na sexta-feira, o guru da ultradireita surpreendeu ao pedir que seus alunos no governo, “umas poucas dezenas”, entregassem os cargos imediatamente. “O presente governo está repleto de inimigos do presidente e inimigos do povo, e andar em companhia desses pústulas só é bom para quem seja como eles”, dramatizou.
Era só jogo de cena. Na verdade, Olavo queria revanche após saber que alguns pupilos haviam sido rebaixados na hierarquia do MEC. A tática funcionou. Ontem Bolsonaro mandou Vélez demitir três militares que se contrapunham aos olavistas no ministério. O expurgo mostra que o governo é refém de um personagem que divulga teorias conspiratórias e se descreve como “apenas um véio lôco” no Facebook.
Além de ver comunistas em toda parte, Olavo promove uma campanha incansável contra as universidades e o jornalismo profissional. Não por acaso, é cultuado por blogs governistas que propagam “fake news”.
Há poucos dias, o blogueiro que difamou uma repórter do jornal “O Estado de S. Paulo” pediu doações em dinheiro para o guru. “Professor Olavo precisa da nossa ajuda”, justificou.
Quinta-feira: 14 de março de 2019
UOL – Blog Reinaldo Azevedo – TIROS NA RAUL BRASIL 1: Que moral é a nossa? Que ética é a dos políticos?
Não há aspecto positivo na tragédia havida em Suzano, em São Paulo. Eventos dessa natureza não devem se prestar a brocados morais de manual. Também não podem ser submetidos ao didatismo fácil. É preciso que sejamos um pouco mais reverentes com a dor dos outros se não queremos mergulhar na abjeção e no baixo proselitismo. O nefando tem de nos empurrar para a reflexão solidária em benefício dos outros e de nós mesmos: há algo que possamos fazer que caminhe no sentido contrário ao do horror? Sempre que aquilo que você disser — ou ajudar a espalhar — incentivar a intolerância e a violência, você estará apertando os gatilhos da escola Professor Raul Brasil. Sempre que você optar pela mansidão, estará colaborando para salvar vidas. Sim, é uma questão de escolha.
Nós, cidadãos comuns, escolhemos uma moral, um caminho pessoal, uma vereda para a nossa lenda pessoal e a nossa convivência com os que nos são próximos. E assim dizemos que mundo queremos. Os governantes escolhem uma ética porque também têm a força do exemplo e dispõem de instrumentos de política pública para fazer com que os países caminhem para um lado ou para outro. E, meus caros, a quantidade de asneiras ditas por aí, em meio a alguma sensatez, assombra.
O senador Major Olímpio (PSL-SP), por exemplo, fez um uso muito específico da tragédia. Viu nela a oportunidade de engatar seu proselitismo em defesa das armas e tomou como exemplo Donald Trump. Num encontro com sobreviventes de um massacre ocorrido em janeiro do ano passado na escola Marjory Stoneman Douglas, na Flórida, o presidente dos EUA teve uma ideia: “Se um professor tivesse uma arma, o massacre não teria ocorrido; ele teria atirado e seria o fim de tudo isso”.
A coisa é de tal sorte estúpida que nem errada consegue ser. Isso explica por que os EUA, com o mesmo IDH da Europa desenvolvida, tem mais de cinco homicídios anuais por 100 mil habitantes, enquanto, nos países europeus, essa taxa não passa de um. Claro, em confronto com os números do Brasil, mesmo o brutalismo americano cheira a poesia.
E assim fez Olímpio em São Paulo: “Se tivesse um cidadão armado dentro da escola, um professor, um servente, um policial aposentado lá, ele poderia ter minimizado o efeito da tragédia”. E ainda emendou: “O Estatuto do Desarmamento é uma farsa e tira o direito de o cidadão se proteger. Vamos, sem hipocrisia, chorar os mortos; vamos discutir a legislação, onde nós estamos sendo omissos”.
Olímpio, a exemplo de Trump, acredita que o remédio contra o que se deu em Suzano é haver mais armas. E quem discorda dele, por óbvio, só pode ser hipócrita. Agora pensem nos muitos milhares de escolas Brasil afora, algumas em áreas conflagradas e tomadas pelo narcotráfico e pelas milícias, com professores e funcionários armados, e os alunos em meio ao fogo cruzado, eventualmente armados também. Em vez de o senador pensar numa escola em que arma não entrasse, e já seria uma dificuldade gigantesca, ele quer uma outra, armada até os dentes.
Quinta-feira: 7 de março de 2019
O Globo – Obscenidades presidenciais
Bernardo Mello Franco
É difícil se chocar com as declarações de Jair Bolsonaro. O presidente já exaltou torturadores, elogiou um ditador pedófilo, disse que uma deputada não merecia ser estuprada porque era “muito feia”. Mesmo com este histórico, ele conseguiu causar escândalo ao divulgar um vídeo escatológico a pretexto de “expor a verdade” sobre o carnaval.
Bolsonaro não precisou sair do palácio para saber que foi malhado por blocos e escolas de samba. Em todo o país, foliões ironizaram trapalhadas do governo e entoaram coros contra o presidente. O laranjal que ronda o Planalto caiu na boca do povo. Nas ruas do Rio, para cada pierrô parecia haver alguém fantasiado de Queiroz.
A tuitada pornográfica foi uma clara tentativa de revide. Já seria uma atitude imprópria, mas ainda assim o presidente passou do ponto. Sua postagem ofendeu milhões de brasileiros que participaram da folia sem praticar as obscenidades do vídeo. Além disso, difamou a maior festa popular do país.
Segundo o Ministério do Turismo, o carnaval deste ano injetaria R$ 6,78 bilhões na economia. A festa atrai turistas, lota hotéis e gera empregos. No Rio, apesar da má vontade da prefeitura, era prevista a abertura de 72 mil vagas temporárias.
A pregação moralista já deu muitos dividendos a Bolsonaro, mas até aliados consideraram que ele se excedeu. O Planalto tentou consertar a lambança ontem à noite, negando a “intenção de criticar o carnaval de forma genérica”. Apesar do recuo, o estrago estava feito. Os tuítes repercutiram mal nas redes sociais e na imprensa, aqui e no exterior.
Se não fosse tão autocentrado, o presidente saberia que o carnaval sempre criticou quem está no poder. É uma tradição da festa, contra a qual não adianta se insurgir. Em 1912, o marechal Hermes da Fonseca mandou adiar os cortejos por causa da morte do Barão do Rio Branco. O povo brincou duas vezes e ridicularizou a ordem com uma marchinha: “Com a morte do barão / Tivemos dois carnavá / Ai que bom, ai que gostoso / Se morresse o marechá”.
Quinta-feira: 7 de março de 2019
Folha de S.Paulo – Oposição e aliado criticam Bolsonaro após publicações obscenas em rede social
Daniel Carvalho, Angela Boldrini, Igor Gielow
Integrantes da oposição e aliados de Jair Bolsonaro (PSL) reagiram nesta quarta-feira (6) às publicações obscenas recentes feitas pelo presidente da República em uma rede social. Já militares da ala que integra o governo e outros do serviço ativo viram em geral com reserva a publicação do post.
Na terça-feira (5), Bolsonaro compartilhou em sua conta oficial do Twitter um vídeo de uma cena que causou polêmica no Carnaval paulistano na qual um homem aparece dançando após introduzir o dedo no próprio ânus e um outro rapaz surge urinando na cabeça do que dançava.
Em sua publicação, Bolsonaro diz que não se sente “confortável em mostrar”, mas argumenta que tem “que expor a verdade para a população ter conhecimento e sempre tomar suas prioridades. É isto que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro. Comentem e tirem suas conslusões [conclusões]”.
Já na manhã desta quarta-feira, o presidente publicou uma pergunta: “O que é golden shower?” Golden shower é o nome popular (em inglês) para o fetiche de urinar na frente de um parceiro ou sobre ele.
Opositores de Bolsonaro defenderam a necessidade de “intervenção psíquica” e disseram que vão representar criminalmente por “crime de divulgação, sem o consentimento da vítima, de cena de sexo, nudez ou pornografia”.
Aliado de Bolsonaro, o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) afirmou que a publicação é “incompatível com a postura de um presidente, ainda mais de direita”, e a classificou como “bola fora”.
“Há muitas boas razões para criticar o Carnaval, não faltam problemas que poderiam ser evidenciados e evitados. Isso não justifica mostrar uma obscenidade para milhões de famílias por meio de uma rede social sob o pretexto de criticar a festa. Isso não é postura de conservador”, escreveu o parlamentar.
Líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP) disse acreditar que a intenção de Bolsonaro era chamar a atenção “para essas coisas sem limites”. “Acho que tem mais praticante do que pessoas que conhecem a terminologia”, afirmou, aos risos, o senador sobre o fetiche de urinar na frente de um parceiro ou sobre ele.
“O objetivo dele foi dizer que parcela da população perdeu seus limites morais, de cidadania. Vai muito no estilo Jair Bolsonaro de comunicação. Ele simplesmente vem mantendo o estilo de comunicação direta”, afirmou Major Olímpio, para quem não houve quebra de decoro e as publicações não são uma cortina de fumaça para as críticas de que Bolsonaro foi alvo durante o Carnaval em diferentes cidades.
Assessor especial internacional do Palácio do Planalto, Filipe Garcia Martins evocou o ex-presidente americano Theodore Roosevelt para argumentar que Bolsonaro recorreu ao “bully pulpit” (púlpito intimidador, em tradução livre) para postar o vídeo nas redes. O termo se refere a um palanque de destaque para se manifestar e ser ouvido, no caso a rede social em que o presidente tem 3,47 milhões de seguidores.
“Theodore Roosevelt dizia que a Presidência da República é um ‘bully pulpit’, uma posição pública que permite falar com clareza e com força sobre qualquer problema. Foi o que o presidente @jairbolsonaro fez ao expor o estado de degeneração que tomou nossas ruas nos últimos dias”, escreveu Martins.
“Se uma mulher se ajoelhasse para um homem heterossexual e este fizesse xixi na cabeça dela, as feminazis diriam que se trata de subjugar a mulher. Sendo um gay, pode?? Pois é, o problema não está no delito, mas Presidente ter compartilhado… Sei….”, escreveu a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) em sua conta no Twitter.
Em nota, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) condenou a postura de Jair Bolsonaro e afirma que o presidente, com objetivo de criticar as cenas, acabou viralizando-as e “produzindo repercussão oposta ao que preconiza o bom senso.”
“Esse episódio esdrúxulo, que permite diferentes leituras, revela que o Presidente continua pautando-se mais pelo fígado do que pela razão e a lucidez”, publicou a associação. “Os auxiliares mais próximos de Sua Excelência devem convencê-lo a descer de vez do palanque, informando-o que campanha eleitoral já terminou. Esperamos também que o alertem, para o bem da Nação, de que twittar não é o mesmo que governar”, conclui a nota.
Opinião dos militares
Já militares da ala que integra o governo e outros do serviço ativo viram em geral com reserva a publicação do post. Segundo três deles, ouvidos pela Folha, o tom alarmista da postagem e o baixo nível das imagens causou uma associação incorreta entre o episódio filmado e o Carnaval como um tudo.
Além disso, disseram esses oficiais, há uma vulgarização da imagem da própria instituição Presidência. A troca de mensagens ofensivas com comentaristas de sua postagem e o complemento desta quarta (6), quando Bolsonaro questionou o que é “golden shower” (a prática de urinar no parceiro/a), foram consideradas grosseiras e desnecessárias.
Aqui, as baterias se voltam contra Carlos Bolsonaro, o filho do presidente e vereador no Rio de Janeiro que é responsável pela sua vida nas redes sociais. É voz corrente entre aliados do mandatário que Carlos sempre controlou todas as postagens de Bolsonaro, desde a campanha.
O presidente dá seu aval, mas a confecção de textos e publicação de imagens e vídeos é coordenada diretamente por Carlos, com a ajuda de outros assessores.
A ala militar do governo vive em tensão permanente com dois dos três filhos políticos do presidente: o vereador Carlos e o deputado federal Eduardo, cuja influência na política externa sofreu um freio quando foram tocados temas sensíveis como a crise na Venezuela.
O terceiro herdeiro na política, o senador Flávio, é visto pelos fardados como uma fonte de problemas por seu envolvimento com o assessor Fabrício Queiroz, investigado por pagamentos irregulares a funcionários do então gabinete do filho de Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio.
Políticos petistas disseram que vão acionar Bolsonaro judicialmente pelo caso do Carnaval.
“Vamos representar Jair Bolsonaro pelo vídeo que postou. A lei 13.718, recentemente aprovada, tipifica o crime de divulgação, sem o consentimento da vítima, de cena de sexo, nudez ou pornografia”, escreveu no Twitter o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
Nas regras do Twitter, que incluem a política de privacidade e os termos de serviço que os usuários têm que respeitar para usar a plataforma, há uma série de diretrizes sobre conteúdo adulto.
“Consideramos conteúdo adulto qualquer mídia que seja pornográfica ou destinada a causar excitação sexual. Alguns exemplos incluem, mas não estão limitados a representações de: nudez total ou parcial, incluindo closes dos órgãos genitais, nádegas ou seios; simulação de ato sexual; ou relação sexual ou qualquer outro ato sexual envolvendo seres humanos, representações de animais com características humanas, desenhos, hentai ou animes”, dizem as regras do Twitter.
Mídias com conteúdo adulto devem ser marcadas como mídia sensível, o que não foi feito inicialmente no vídeo de Bolsonaro. Dessa forma, a depender do rigor da análise do Twitter, o presidente pode sofrer alguma punição, que pode variar desde a retirada do conteúdo do ar até a suspensão da conta, caso seja entendido que ele cometeu grave infração.
Cerca de duas horas após a publicação do vídeo foi colocada a marcação de mídia sensível, que funciona como um filtro prévio que requer que o usuário confirme que deseja ver o conteúdo.
A lei 1.079, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade, inclui entre os crimes contra a probidade na administração “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.
Líder da minoria no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), disse que, apesar da indecência das publicações, não acredita que isto seja suficiente para um processo de impeachment.
“Claramente ele infringiu a lei 1.079. Mas, por mais indecente, de todos os pontos de vista da indecência, que seja o presidente da República, esta publicação ainda não é o bastante para afastar alguém que teve 56 milhões de votos. Mas ele passou de todos os limites do razoável”, afirmou o senador, que também disse não ser possível solicitar exame de sanidade mental de Bolsonaro.
“Se fosse nos Estados Unidos, caberia ao Congresso pedir um exame de sanidade do presidente. Como não há este instituto no direito brasileiro, não cabe. Toda pessoa sabe que existem limites. A representação exige a postura para o exercício da função. Esse caso é de desrespeito à instituição Presidência da República. E também desrespeito ao país, à cultura nacional. O presidente da República, visivelmente, precisa de intervenção psíquica”, disse Randolfe.
Apesar disso, uma hashtag pedindo o impeachment de Bolsonaro era a mais comentada do Twitter na manhã desta quarta-feira.
O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), criticou o presidente na mesma linha. “Estamos diante de um quadro psiquiátrico grave e, politicamente, desastroso”, afirmou.
Segunda-feira: 4 de março de 2019
Folha de S. Paulo: Sem carta branca
Opinião
Recuo na nomeação de Ilona Szabó e intervenção de Bolsonaro na Previdência mostram os limites dos poderes de Moro e Guedes, supostos superministros
No episódio em que o governo convidou e desconvidou a especialista em segurança pública Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, o que chama a atenção de mais imediato é o grau de estupidez das hordas bolsonaristas mais radicais.
Colunista desta Folha e crítica de teses pró-flexibilização de posse e porte de armas, a pesquisadora foi chamada pelo ministro Sergio Moro, da Justiça, a compor um colegiado de funções meramente consultivas, na condição de suplente.
A escolha suscitou uma corrente de ataques de militantes direitistas nas redes sociais, à qual não ficou alheio, tudo indica, o presidente da República. Após um dia de alarido, Moro voltou atrás.
“Diante da repercussão negativa em alguns segmentos, optou-se por revogar a nomeação, o que foi previamente comunicado à nomeada e a quem o ministério respeitosamente apresenta escusas”, relatou uma nota oficial.
Não surpreendem, infelizmente, o sectarismo e a agressividade de comunidades digitais, fenômeno que também se observa à esquerda. Mais preocupante é que a demonização da divergência se estenda a condutas de governo.
O caso contribui, ademais, para desmistificar a condição de superministro atribuída a Moro desde a formação da equipe do presidente Jair Bolsonaro (PSL).
Evidente que o ex-juiz da Lava Jato, dada a sua reputação, tende a dispor de autonomia superior à média observada entre os colegas de primeiro escalão. Isso não significa carta branca —ou o poder de agir sem levar em conta as conveniências políticas do governo, mesmo as mais comezinhas.
O mesmo se pode dizer do titular da Economia, Paulo Guedes, também cercado da aura de superpoderoso. Na semana passada, ele passou pelo dissabor de acompanhar pela imprensa declarações de Bolsonaro indicando recuos na proposta de reforma da Previdência.
Conforme se noticiou, a entrevista concedida pelo presidente irritou o ministro e levou preocupação também à ala militar do Executivo. Nesses setores se fala em tentar limitar as manifestações públicas do chefe, a fim de evitar constrangimentos e dificuldades políticas. O plano não soa promissor.
A ideia de um mandatário voluntariamente tutelado por nomes de excelência técnica pode parecer sedutora —o próprio Bolsonaro a estimulou, em particular no caso de Guedes, seu “posto Ipiranga”, que tornou sua candidatura mais palatável a boa parte das elites intelectual e econômica do país.
Trata-se de uma ilusão, porém, imaginar que se possam delegar tão facilmente os poderes e as responsabilidades do presidente. Afinal, neófito e despreparado, foi ele quem obteve quase 58 milhões de votos há apenas quatro meses.
Segunda-feira: 4 de março de 2019 Folha –
O Jair é isso, Moro
Na hora em que abrir vaga no Supremo, a Ilona pode ser o senhor
Artigo de Celso Rocha de Barros*
A cientista política Ilona Szabó é uma especialista respeitada na área de segurança pública. Ao contrário do ministro do Meio Ambiente e da ministra dos Direitos Humanos, seus diplomas são de verdade, ela foi lá na faculdade, estudou, passou na prova, recebeu o título.
Seu currículo justifica sua nomeação para uma suplência do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Mas suspeito que o ministro da Justiça, Sérgio Moro, também a tenha nomeado para testar quanta autonomia, de fato, ele tinha.
Se foi isso, descobriu.
O superministro Moro não tem autonomia para nomear, para a suplência de um conselho consultivo, alguém de quem os seguidores do presidente da República no Twitter não gostem.
Szabó durou muito menos no cargo do que Murilo Resende Ferreira, indicado pelo ministro da Educação para organizar o Enem. Ferreira foi acusado de plagiar um texto de extrema-direita sobre “Escola de Frankfurt e feiura”. É até difícil saber o que era pior, ser de extrema-direita, ser plágio, ou ser sobre “Escola de Frankfurt e feiura”.
Mesmo depois das acusações, Ferreira foi realocado em outro cargo, ao contrário do que aconteceu com Szabó.
E contra ele não houve uma insurreição virtual como a da semana passada. Bolsonaro não o demitiu no dia seguinte às acusações, porque, afinal, pelo menos o texto plagiado era de extrema-direita. O trabalho original de Szabó não é.
O Jair é isso, Moro. Não vai mudar.
Suspeito que Sergio Moro, como muita gente que votou em Bolsonaro, tenha comprado a ideia de que o Jair era um político normal, que faria um governo de direita normal. Não é.
Na semana passada, Jair elogiou o ex-ditador pedófilo do Paraguai. O ministro da Educação tentou implementar um projeto de culto ao líder nas escolas. Vetaram a nomeação de Ilona Szabó.
Tudo isso em cinco dias.
Se as coisas não pareciam estar indo nessa direção até agora, era porque o Jair estava de licença médica.
Coisas que parecem bizarras em um presidente democrata fazem todo sentido em um ditador. Em várias ditaduras membros da família do ditador fazem o papel de instituições de governo.
Bolsonaro não tem ideia sobre como negociar com o Congresso, mas vocês têm certeza de que ele quer negociar com o Congresso? O purismo que se manifestou no caso Szabó é bizarro para um gestor de nosso presidencialismo de coalizão, mas em movimento fascista é a regra.
Para contraste: a esta altura do governo Lula, empresários e fazendeiros ocupavam posições chave no ministério. Palocci havia chamado a turma liberal do “Agenda Perdida” para sua equipe na Fazenda. O presidente do Banco Central era um deputado eleito pelo PSDB.
Fernando Henrique Cardoso nomeou como ministro da Cultura Francisco Weffort, um dos maiores intelectuais petistas.
Não, não é porque PT e PSDB fossem todos comunistas. É porque ambos disputavam a política democraticamente, e tinham todo interesse do mundo em conquistar eleitores do outro lado.
Não são esses os planos do chefe, ministro.
Por fim, um aviso. O senhor topa aderir ao programa “Viktor Orbán” de Bolsonaro? O senhor topa acobertar as picaretagens dos bolsonaristas, discriminar minorias, perseguir adversários do governo?
Se não topar, cuidado. Porque na hora em que abrir vaga no STF, a Ilona pode ser o senhor.
*Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).
Domingo: 3 de março de 2019
O homem velho deixa vida e morte para trás
Anatomia de uma fotografia
Luiz Fernando Vianna
A foto feita por Ricardo Stuckert puxou da memória, imediatamente, os versos de Caetano Veloso: O homem velho deixa vida e morte para trás/ Cabeça a prumo, segue rumo e nunca, nunca mais. Consultando-se a letra de “O homem velho”, composição de 1984, outros trechos se afinam com a imagem: A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol/ As linhas do destino nas mãos a mão apagou ; Luz fria, seus cabelos têm tristeza de néon/ Beleza, dores e alegrias passam sem um som .
Se as citações feitas aqui se estendessem aos dois versos finais, ficaria parecendo militância, devoção ao mito Luiz Inácio Lula da Silva – e quem certa vez o chamou de mito foi o insuspeito Aécio Neves. Mas é exatamente do contrário que se trata. O que se destaca na foto é o homem. No caso, um homem envelhecido, de 73 anos, avô de um menino que morrera na véspera, aos 7.
É claro que Lula sempre será ele e suas circunstâncias. Trata-se de um cabra nascido para morrer de fome em Pernambuco e que se tornou um dos presidentes mais populares do país. Há 11 meses, está preso, condenado pelo que o juiz Sergio Moro — hoje ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro — entendeu como atos de corrupção. E, certamente, uma parte significativa da população entende da mesma forma.
É por ser este personagem histórico que ele, na foto, tem em torno de si policiais armados de fuzis. Sabe-se que o aparato atende a regras legais, até para proteger o preso. Zelar por sua segurança é atribuição do Estado. Mas da imagem emana que alguma coisa está fora da ordem.
O policial federal à direita de Lula soa mais comum: usa óculos de lentes transparentes e lembra até o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ). Os outros são fortes, usam óculos escuros e vestem coletes com o brasão da Swat, sigla dada nos Estados Unidos a grupos policiais altamente preparados.
Os que discordam da condenação de Lula podem observá-lo na foto e afirmar: este é um preso político. Ao contrário do que dizem vários políticos, magistrados, empresários, jornalistas, aquele no centro da foto pode ser enxergado como um preso político. Mas outros vão dizer que qualquer detento célebre, de João de Deus a Fernandinho Beira-Mar, mereceria cuidado semelhante ou até maior.
Sendo ele um criminoso ou não, é impossível negar que se trata de um homem. E de um homem velho. Que já sobreviveu a um câncer. Que, há pouco mais de um mês, não pôde ir ao velório de um irmão porque Justiça e Polícia não autorizaram a tempo. Que estava naquele cemitério para ver pela última vez o neto de 7 anos.
O italiano Primo Levi sobreviveu aos campos de concentração da Segunda Guerra, inclusive Auschwitz, e pôde escrever livros terrivelmente belos sobre o que viu e viveu. Um deles tem como título É isto um homem?.
É a pergunta que se pode fazer àqueles que, nas redes sociais, vêm comemorando a morte de Arthur. E que se pode fazer a Eduardo Bolsonaro, que é um deputado federal e também é filho do atual presidente da República. Ele escreveu: “Quando o parente de outro preso morrer, ele também será escoltado pela PF para o enterro? Absurdo até se cogitar isso, só deixa o larápio em voga posando de coitado”. Tentou se corrigir em outro post, mas não pediu desculpas.
É isto um homem?
A dura resposta: sim. Hitler era, Stálin era, Trump é, Maduro é, larápios são, milicianos são. Os Bolsonaros e seus seguidores falam muito em defesa da “família”, mas não admitem a Lula nem o direito de chorar com a sua a morte de uma criança.
Lula já está de volta a sua cela, onde, ao que se sabe, não é fotografado. Não precisa “posar de coitado”. E, na foto de que estamos falando, ele não parece de forma alguma estar posando. A imagem mostra apenas que é isto um homem.
Duas informações:
Primo Levi se matou em 1987, aos 67 anos, 42 depois de sair de Auschwitz.
O autor deste texto tem uma filha da idade de Arthur. Não é possível dimensionar qual seria o tamanho da dor.
Sábado: 2 de março de 2019
Reinaldo Azevedo – Lula e a dor inominável do herói trágico: expresso aqui a minha solidariedade e explico por que o faço também por mim
Há milhões de brasileiros sofrendo neste exato momento pelas mais variadas razões. Podemos vislumbrar a dor de Lula porque ele é uma figura pública. Quem conhece a estrutura da tragédia clássica — recomendo aos que ignoram o assunto uma pesquisa — constata: ninguém jamais experimentou no Brasil, como ele, todos os relevos da vida do herói trágico. Já neste ponto, um desses idiotas do dedo rápido, sem nem o cuidado de abrir uma janela e procurar no Google o sentido da expressão “herói trágico”, sai vociferando: “Olhem o Reinaldo chamando Lula de herói…” A besta ao quadrado não se dá conta de que herói, na acepção de que trato, é um termo carregado de ambivalências.
Como acontece sempre, Fernando Pessoa sintetizou melhor do que outro qualquer o sentido do destino heroico, nesse particular sentido, no segundo poema de “Mensagem”:
Os Deuses vendem quando dão.
Compra-se a glória com desgraça.
Ai dos felizes, porque são
Só o que passa!
Baste a quem baste o que lhe basta
O bastante de lhe bastar!
A vida é breve, a alma é vasta:
Ter é tardar.
Foi com desgraça e com vileza
Que Deus ao Cristo definiu:
Assim o opôs à Natureza
E Filho o ungiu.
Não estou aqui a fazer uma leitura política do acontecimento doloroso que colheu a família de Lula, com a morte do menino Arthur, seu neto, de apenas sete anos. Enveredar por esse caminho seria reduzir a dor do avô, do pai, da mãe, dos familiares. Expresso a solidariedade de quem, sendo pai e avô ainda futuro, sente no peito a angústia insuportável só de imaginar o que nem digno de imaginação deveria ser.
Reitero: não há política aqui. Quando quero e acho pertinente, faço esse debate. Vivemos tempos de um notável emburrecimento. Lamento que idiotas convictos achem incompreensível que eu possa ser um adversário intelectual — nunca “adversário político” porque não faço política — do petismo e afirme, sem ambiguidades, que Lula foi condenado sem provas. E, por óbvio, sempre aceito a contestação: mas então que indiquem as páginas da sentença de Sérgio Moro — o juiz da condenação e hoje ministro do presidente com quem Lula não pôde concorrer em razão da condenação do juiz que virou ministro… — em que elas estão listadas. Ninguém o fará porque as provas não estão lá. “Disse que não trataria de política, mas está tratando, né?” É só para deixar claro que não fujo ao tema. Volto ao eixo deste post.
É verdade! Lula não é o primeiro a passar por essa dor. Todos os dias avôs perdem netos no Brasil. E não temos a chance de nos comover ou nos solidarizar porque não ficamos sabendo. Esse caso, envolvendo o menino Arthur, ganha relevo por ser o avô quem é. Usar, no entanto, os sofredores anônimos como justificativa para a impiedade, para a falta de empatia, é moralmente asqueroso. Há mais: manifestações detestáveis nas redes sociais assombram pela crueldade, pela estupidez, pela violência retórica.
Subjacente aos comentários indecentes, há o suposto combate à corrupção. Quem quer viver num mundo comandado por pessoas que, na pele de defensores implacáveis dos bens públicos, celebram a morte de uma criança porque também esse evento seria mais um justo castigo ao avô? Quem quer ter um Eduardo Bolsonaro como guia do seu humanismo? O seu tuíte restará como um emblema destes tempos. Escreveu: “Lula é preso comum e deveria estar num presídio comum. Quando o parente de um outro preso morrer, ele também será escoltado pela PF para o enterro? Absurdo até se cogitar isso. Só deixa o larápio em voga posando de coitado”.
Comentei a barbaridade no programa “O É da Coisa”. E disse a verdade ao afirmar que, ao ler tal mensagem, não senti repúdio intelectual apenas, mas também ânsia de vômito. Não era metáfora. Não era hipérbole. Era vontade de vomitar. Não que ele fizesse feio diante do pai. Indagado, certa feita, se achava que Dilma terminaria o mandato, Bolsonaro afirmou: “Eu espero que acabe hoje, infartada ou com câncer, de qualquer maneira”. Ah, claro, ele fez essa afirmação porque estaria preocupado com o Brasil.
Ignorar a dimensão profundamente humana da tragédia familiar não concerne à política, mas à psicologia. Só posso lhes dar um conselho, leitores: mantenham distância de pessoas assim. É bem provável que sejam psicopatas. A ignorância política tem cura; a psicopatia não.
Que Lula encontre força para se levantar, qualquer que seja o destino que lhe reserve a Justiça.
Há muitas pessoas que sofrem. Lula é hoje uma pessoa que sofre como poucas.
Tem a minha solidariedade. Sim, eu a expresso aqui por ele e por sua família, ainda que lhes possa ser irrelevante. Mas faço isso também por mim.
Porque há um momento em que só podemos ser salvos pela compaixão.
Sexta-feira: 1º de março de 2019
Luto
Sexta-feira: 1º de março de 2019
Estado.com – Cogitar saída para enterro só põe Lula ‘em voga posando de coitado’, diz Eduardo Bolsonaro
Deputado federal e filho do presidente Jair Bolsonaro escreveu que líder petista é um ‘preso comum’ e cogitar saída era ‘absurdo’
Matheus Lara, O Estado de S.Paulo
Para o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho de Jair Bolsonaro, a saída do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) da prisão em Curitiba para acompanhar o velório de um parente só coloca o petista “em voga posando de coitado”. Lula perdeu nesta sexta, 1, o neto Arthur, de sete anos, vítima de uma meningite.
O comentário foi feito no Twitter, em resposta do deputado a um usuário que publicou uma enquete a seus seguidores para opinarem sobre o tema. “Lula é preso comum e deveria estar num presídio comum”, escreveu Eduardo. “Quando o parente de outro preso morrer, ele também será escoltado pela PF para o enterro? Absurdo até se cogitar isso, só deixa o larápio em voga posando de coitado.”
Lula pediu à Justiça para deixar a prisão temporariamente para se despedir do neto. A juíza Carolina Llebos, da 12.ª Vara Federal, autorizou que ele vá ao velório. Anteriormente, a Justiça negou pedido semelhante feito pela defesa de Lula quando da morte de seu irmão, Genival Inácio da Silva, o Vavá, no mês passado. Na ocasião, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli interveio e liberou a ida de Lula a um encontro com familiares, mas a decisão foi tornada pública no mesmo momento em que o corpo de Vavá era sepultado.
Especialistas em Direito Constitucional e Penal afirmam que o ex-presidente tem direito de sair para ir ao velório do neto. “Lula foi impedido de participar do velório de seu irmão e, de última hora, conseguiu uma decisão inexequível, pois o corpo deveria ir até ele”, lembra João Paulo Martinelli ao Blog do Fausto Macedo, criminalista e professor de direito penal da Escola de Direito do Brasil (EDB), para quem a ida a cerimônias fúnebres é um direito fundamental.
Na opinião do advogado Daniel Gerber, professor de Direito Penal e Processual Penal, trata-se de uma questão de humanidade, que neste caso, supera qualquer regra. “Aquela liminar dada, anteriormente, pelo ministro Toffoli, presidente do Supremo, naqueles termos, sem dúvida, se incorpora no pedido do ex-presidente para este momento”, considera Gerber. “Justiça sem humanidade é tirania”.
E o caso Arthur, neto de Lula, é um exemplo.
Muitos haters festejaram; o deputado Eduardo Bolsonaro aproveitou para debochar dos sentimentos de Lula.
Milícias digitais espalham uma Fake News, responsabilizando indiretamente Lula pela morte de Arthur.
É, de longe, a pior Fake News na vida de Lula.
Pegaram uma mentira de 2010: Lula teria vetado a aplicação nas escolas de vacina contra meningite.
O site Forum esclarece a mentira:
A manchete afirma: “Lula veta projeto que incluía cinco vacinas no calendário da rede pública”. No entanto, o próprio texto esclarece que o projeto de lei vetado pelo ex-presidente falava sobre vacinas que já eram contempladas no calendário de vacinação ou haviam sido substituídas por outras composições que ofereciam maior proteção.
“O Brasil é o país que oferece gratuitamente o maior número de vacinas aos grupos populacionais alvo, estando disponíveis, atualmente, quarenta e três imunobiológicos. Tanto é assim, que das cinco vacinas descritas no projeto de lei, três já estão contempladas no calendário de vacinação. A pneumocócica conjugada sete valente já foi, inclusive, superada pela disponibilização de uma dez valente, que confere maior proteção”, diz parte do texto publicado no Diário Oficial da União”, relata dos trechos da matéria.
Quarta-feira: 27.2.2019
Folha de S.Paulo – O disparate do MEC
Opinião –A2
Após pedir a escolas que cantassem hino e repetissem slogan bolsonarista, ministro volta atrás
O grupo de ministros mais ideológicos do governo Jair Bolsonaro (PSL) dá a impressão de competir, dia a dia, pela produção de estultices. Nessa acirrada contenda, que envolve áreas relevantes, o titular da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, tem merecido destaque.
Já em seu discurso de posse, deixou claro o tipo de preocupação comezinha e paranoica que nortearia sua atuação. Atacou uma fantasiosa ideologia de gênero que estaria a conspurcar a formação dos jovens do país e disparou contra o fantasma do marxismo cultural.
No posto, o ministro pouco deixou ver, até agora, de seus planos para aspectos centrais do ensino do país —como elevar a qualidade do aprendizado e superar o gargalo do nível médio, para citar alguns.
Em vez disso, envolveu-se em decisões questionáveis, caso da nomeação de ex-alunos sem nenhum traquejo em gestão pública para postos relevantes da pasta. Num episódio constrangedor, acabou por exonerar um funcionário após a publicação de um edital que estabelecia critérios deficientes para a compra de livros didáticos.
Na coleção de declarações infelizes, disse que o turista brasileiro se comporta como um canibal, a furtar objetos de hotéis e aviões —um comportamento a ser corrigido, para ele, na escola. Também atribuiu erroneamente uma frase chula ao cantor Cazuza (1958-1990), o que ocasionou um pedido de desculpas à mãe do artista.
Na segunda-feira (25), Vélez houve por bem conclamar as escolas do país a um ato de civismo entrelaçado com propaganda do governo. Enviou por email a estabelecimentos públicos e privados uma mensagem na qual exortava alunos, professores e funcionários a se perfilarem para cantar o hino nacional diante da bandeira.
A carta, revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo, solicitava que as cerimônias fossem gravadas em vídeo, o que demandaria autorização dos pais. Apresentava, ademais, um texto a ser lido nas ocasiões.
“Brasileiros! Vamos saudar o Brasil dos novos tempos e celebrar a educação responsável e de qualidade a ser desenvolvida na nossa escola pelos professores, em benefício de vocês, alunos, que constituem a nova geração. Brasil acima de tudo. Deus acima de todos!”, dizia a peça, num endosso forçado ao slogan de campanha de Bolsonaro.
Tamanho disparate, que mais parece sátira ficcional de um movimento ufanista, não poderia deixar de provocar imediatas reações de repúdio. É espantoso que o ministro não as tenha previsto.
Diante da péssima repercussão, Vélez anunciou que reformularia a carta para suprimir a propaganda bolsonarista. Assumiu, parcialmente, um equívoco —foi o que mais fez neste início de gestão.
Quarta-feira: 27.2.2019
Folha de S.Paulo – Governo tenta exercer o poder com mentira e desinformação
Bruno Boghossian
Ao tentar apagar bobagens com lorotas, Bolsonaro e auxiliares ofendem os próprios eleitores
O chanceler Ernesto Araújo achou que poderia apagar uma bobagem com uma lorota. Depois de soltar uma besteira quando afirmou não saber se o regime da Coreia do Norte age com a mesma brutalidade de Nicolás Maduro, o ministro tentou colocar a culpa na imprensa.
Em uma postagem, Araújo reclamou que os jornais só passaram a chamar os líderes norte-coreanos de ditadores depois que o americano Donald Trump passou a negociar com Kim Jong-un. O chanceler talvez tenha achado que escaparia ileso com essa desonestidade flagrante. A verdade é que ele mentiu.
Há três gerações, a imprensa trata o governo norte-coreano como um regime autoritário. Em julho de 1994 os jornais noticiavam que o corpo de Kim Il-sung, “ditador que governou a Coreia do Norte por 46 anos” e avô de Kim Jong-un, seria carregado pelas ruas de Pyongyang. Araújo fingiu que não viu e só tentou limpar sua barra com aquela fantasia.
Alguns integrantes do governo querem exercer o poder com base na mentira. Depois de dizer à revista Veja que os brasileiros se comportam como canibais, o ministro Ricardo Vélez (Educação) primeiro alegou que suas palavras foram publicadas “fora de contexto”. Quando a gravação da entrevista foi divulgada, ele parou de enrolar e admitiu que foi “infeliz na declaração”.
O próprio Jair Bolsonaro, que se beneficiou de uma enxurrada de notícias falsas durante a campanha, também usa a enganação como método.
Nesta terça (26), o presidente fez propaganda de um item do pacote de Sergio Moro que pretende ampliar a coleta de DNA de criminosos. Bolsonaro se queixou de que “parte da mídia e pessoas de má-fé omitem propositalmente” detalhes do texto. Era mais uma trapaça: a ideia foi noticiada e debatida pelos jornais.
Um governo que se ergueu sobre uma plataforma popular apoiada por 57 milhões de votos não precisa recorrer à mentira. Ao apostar na desinformação para atacar a imprensa, o presidente e seus aliados acabam ofendendo seus próprios eleitores.
Quarta-feira: 27.2.2019
O Estado de S. Paulo –Educando bolsonaristas
Monica De Bolle
A má comunicação do governo Bolsonaro e a desarticulação da base podem comprometer seriamente a reforma.
Na semana passada, o governo apresentou uma boa proposta para a reforma da Previdência. Mais ambiciosa do que a de Temer para resolver os problemas de médio prazo das contas públicas, mais progressista do que a de Temer ao incluir alíquotas que aumentam de acordo com os salários, mais abrangente do que a de Temer ao incorporar Estados e municípios. Evidentemente, como em qualquer reforma dessa envergadura, há pontos para discussão e aprimoramento. Há também o receio de que o governo não tenha o traquejo necessário para evitar que a reforma seja substancialmente diluída. É sobre isso que pretendo tratar.
Bolsonaristas são um grupo heterogêneo dentro e fora do governo. Dentro há militares, ideólogos-religiosos e tecnocratas – mistura esquisita. Fora há ultraconservadores de direita, alguns religiosos outros não, gente que continua a ver fantasmas petistas por toda parte ainda que o partido esteja completamente desarticulado, e pessoas que simplesmente esperam do novo governo o necessário e urgente rumo para o País. Difícil achar muitos pontos em comum entre esses grupos, assim como é complicado encontrá-los dentro do governo. Dessas dificuldades e complicações surge, inevitavelmente, a necessidade de educar alguns – não todos – bolsonaristas.
Comecemos pelos ministros. O do Turismo tentou intimidar a Folha de S. Paulo após revelações comprometedoras, mas a liminar do cala a boca foi derrubada pela Justiça. Eis um bolsonarista cuja educação veio diretamente de um dos três Poderes da República. O ministro da Educação tentou emplacar o mote de campanha de Bolsonaro na cartilha das escolas, a ser repetido pelos alunos como autômatos todos os dias. Também tentou forçar a barra para que crianças e professores fossem filmados no ato de cantar o Hino Nacional. Nada contra o Hino Nacional – apesar do positivismo retumbante de sua letra, considero nosso hino belíssimo.
O problema é filmar crianças e adultos para que o Ministério da Educação pudesse agir como um big brother orwelliano. Não emplacou. A sociedade se manifestou de várias formas, inclusive por meio das redes sociais, o atual quinto poder da República Bolsonarista. O MEC foi obrigado a recuar da ordem que descumpriria vários artigos da Constituição, conforme alertaram especialistas. O ministro ideólogo de Bolsonaro foi educado de forma rápida e contundente. O ministro do Meio Ambiente bem que tentou esvaziar as notícias sobre seus fictícios diplomas acadêmicos. O quinto poder não permitiu, dando-lhe educação exemplar. O ministro das Relações Exteriores, assanhado com a possibilidade de se aproximar dos EUA dando declarações estapafúrdias sobre a Venezuela e a Coreia do Norte foi velozmente desautorizado pelos generais – esse anda recebendo educação dia sim, outro também. Aguardamos o aprendizado de Ernesto.
Tudo isso e mais alguma coisa – porque sempre tem mais alguma coisa – aconteceu em momento crítico, quando as atenções deveriam estar voltadas para a reforma da Previdência. Não à toa, Rodrigo Maia soltou advertência: a má comunicação do governo e a desarticulação da base podem comprometer .A má comunicação do governo e a desarticulação da base podem comprometer seriamente a reforma seriamente a reforma. Sobretudo se o País continuar a perder tempo com os devaneios de alguns de seus Bolsonaristas.
Nas redes sociais repete-se algo já visto na era petista. Em vez de as pessoas estarem concentradas em algum debate – bobo, raso, ou sério – sobre a reforma da Previdência, há profusão de xingamentos, intimidações, e até ameaças. Fui alvo disso recentemente. A educação dispensada não foi difícil. Afinal, em tempos de internet, certos bolsonaristas ou direitistas extremados assanhados podem até acreditar que são anônimos. Mas a internet é uma maravilha. Por lá, nada se perde e tudo se descobre, inclusive identidades de quem se acha protegido atrás de avatares e monitores de computador. O quinto poder da República, mais do que os outros, vale igualmente para todos.
Portanto, deixo o recado. Podemos perder todo o tempo do mundo educando os bolsonaristas que se acham os donos do Brasil – não são todos. Ou, podemos aprovar uma boa reforma da Previdência. Alea Jacta Est.
Sexta-feira: 22.2.2019
Folha de S.Paulo – Reinaldo Azevedo – Uma boa reforma e um governo ruim
Bolsonaro promove nova Previdência apesar do seu reacionarismo, não em razão dele
A proposta de reforma da Previdência é boa. O governo é ruim. Não se trata de ser sentencioso sobre o futuro —que só pertence a Deus, como dizem, porque a ninguém foi dado o dom da predição. A coitada da Cassandra, que recebeu esse presente literalmente de grego, conseguia, sim, enxergar o amanhã, mas ninguém acreditava nela, daí que fosse vítima de uma maldição, não de um privilégio. Cassandra evidencia que é preferível —e até mais rentável— ser um otimista abobalhado a um realista incômodo.
Na sexta passada (15), lembrei aqui o poeta Constantino Kaváfis e o texto “À Espera dos Bárbaros” —aqueles que chegariam para responder a todas as irresoluções dos romanos. Assim estamos nós com a reforma da Previdência. A mudança passou a ser uma condição necessária para o país ambicionar um outro padrão e um outro patamar de desenvolvimento, com mais inclusão e equidade social. Mas ela está longe de ser uma condição suficiente. É mentirosa a inferência de que todas as nossas iniquidades derivem das injustiças previdenciárias, que são flagrantes, ainda que o modelo em curso possa ser acusado de tudo, menos de justo.
É confortável e errado estabelecer um nexo causal entre um governo que se revela patologicamente reacionário e a sua determinação de promover a reforma, como se esta fosse a expressão econômica, material propriamente, de uma inflexão política que requer, para se efetivar, o que é lido como a espoliação dos mais pobres, a cassação de direitos, a marginalização dos oprimidos. Há uma mentira factual irrespondível nessa hipótese: a espinha dorsal do texto está na diminuição de privilégios brutais, embora os pobres também sejam alcançados pelas medidas.
Eu estaria intelectualmente mais tranquilo, com menos inquietações porque conheceria a resposta, se abraçasse essa perspectiva, que me parece ser a de alguns analistas de esquerda, ainda que peça escusas pelo reducionismo inevitável. Vislumbro uma contradição entre a reforma e o governo onde eles enxergam uma relação de congruência ou de causa e efeito: sim, reacionários, na caricatura e na vida real, estão sempre prontos a cassar direitos. Mas será ela um capítulo da luta de classes em desfavor dos mais pobres? É sustentável a tese de que é um desdobramento inevitável da vitória da extrema direita? O modelo que temos não traz em si, consolidada, a derrota do oprimido?
Reconheço, aponto e combato o caráter “direitopata” do governo de turno —já que o termo “esquerdopata” é de minha lavra, reivindico o antônimo—, mas entendo que a reforma da Previdência, escoimados eventuais exageros, é socialmente justa e economicamente “progressista”, para quem gosta dessa palavra. E não apenas porque corta mais de quem tem mais, mas porque o déficit previdenciário consome recursos que podem e devem ser aplicados no combate às tais iniquidades.
Sustento que Bolsonaro promove a reforma da Previdência apesar do seu reacionarismo, não em razão dele. Há, nesse caso, um hiato na cadeia de causalidades.
Os que combatem a agenda obscurantista dos Vélez Rodríguez, Damares e primitivos dessa ordem deveriam é se ocupar do risco de a reforma, ainda que amansada pelo Congresso, servir de alavanca para o retrocesso. E não porque ela vai, como sustentam alguns, cassar direitos, mas porque pode efetivamente dar início a um ciclo virtuoso na economia. Cuidado! Reacionários do insucesso podem ser estúpidos. Os do êxito podem ser mais estúpidos. Dispenso-me de recorrer à história.
A boa resposta não está em atacar a mudança com o intuito de conter a vanguarda do retrocesso. Isso seria uma burrice. O sensato é reconhecer o seu domínio autônomo —e essencialmente justo—, impedindo que a reforma necessária se confunda com a pauta que pretende transformar a escola em delegacia de polícia; que defende que um homem seja um homem e sua arma; que reivindica para as forças de segurança a licença para matar. Nesse caso, refiro-me explicitamente ao “Pacote Moro”, o Bolsonaro mais ou menos letrado —menos do que dá a entender, como revela o seu estoque gramatical—, cuja palavra ainda gera assentimentos reverentes de setores que, no entanto, veem no presidente, o que é verdade, a encarnação do atraso.
Temos uma proposta boa de reforma e um governo ruim. Porque ela é boa, não deveria ser desfigurada. Porque ele é ruim, não deve ser poupado.
Jornalista, autor de “O País dos Petralhas”.
Quinta-feira: 21.2.2019
O Globo – Artigo de Veríssimo – Simples
Jair Bolsonaro chegou ao poder levado pelo mesmo gosto pela simplicidade que elegeu Fernando Collor. Lembra do “Caçador de marajás”? Cansado de corrupção, descrente da política, seduzido pelo perfil de jovem empreendedor do candidato, o eleitor brasileiro viu em Collor a simplificação que queria e, no seu slogan fácil, um resumo do que o Brasil precisava. Não se tem notícia de um único marajá caçado por Collor, mas a imagem do moço intrépido perdurou até quase a autodestruição do seu governo. O fenômeno Bolsonaro também aconteceu como reação à corrupção e ao descrédito da classe política, mas sua maior semelhança coma vitória de Collor foi o mesmo apelo feito ao pensamento reducionista de um eleitor que quer tudo simples e inteligível.
Me admirei com a campanha eleitoral do Collor, naquela época. No primeiro filme da campanha, o candidato aparecia na nascente do São Francisco e comparava a trajetória do rio coma sua campanha, que começava pequena, sem o apoio de um partido importante e sem dinheiro, mas cresceria e em breve teria aforçado grande rio. Não faltou dinheiro para Collor, a campanha foi um sucesso e vendeu a ideia de um presidente diferente, puro como uma vertente.
Não se pode negar a competência de quem elegeu o Bolsonaro, transformando um político medíocre — com o mau hábito, para um candidato, de dizer o que pensa e depois negar que disse — no presidente mais improvável da História do Brasil. Faz pouco tempo que faixas pedindo intervenção militar começaram a aparecer nas manifestações de rua, vistas com reservas por alguns e indiferença por outros. Afinal, ninguém mais se lembrava da ditadura militar e dos seus excessos? Somos um país sem memória, paciência. As faixas se multiplicaram, e as primeiras pesquisas de intenção de votos mostraram Bolsonaro na frente, uma posição que não se alterou até sua eleição. Com Bolsonaro, voltaram os militares. (São tantos os militares no governo Bolsonaro que tem gente perguntando quem está cuidando dos quartéis).
Sexta-feira: 15.02.2019
Charge de Claudio Mor na Folha de S.Paulo
SSe
Quinta-feira: 14.2.2019
O Globo: O pit bull que morde o governo
Bernardo Mello Franco –
Jair Bolsonaro costuma chamar o filho Carlos de “meu pit bull”. Ontem o cão raivoso voltou a morder o governo. O Zero Dois atacou o secretário-geral da Presidência, Gustavo Bebianno. Chamou de mentiroso um dos ministros com gabinete no Planalto.
O tuíte de Carluxo abriu uma nova crise no bolsonarismo. O ministro já estava na berlinda desde que reportagens da “Folha de S.Paulo” revelaram um laranjal nas campanhas do PSL.Agora é fritado a fogo alto pelo filho mais próximo do presidente. O Zero Dois é vereador no Rio, mas prefere disputar poder em Brasília.
Na transição, ele escreveu que morte de Bolsonaro não interessaria “somente aos inimigos declarados, mas também aos que estão muito perto ”. A frase foi interpretada como um recado ao vice Hamilton Mourão.
Desta vez, o ataque foi mais direto. Carluxo desmentiu Bebianno, que disse ter falado três vezes com o presidente na terça. O relato foi uma “mentira absoluta”, rebateu o herdeiro do presidente. Ele também divulgou um áudio em que o pai se recusa a atender o ministro.
Os latidos do pit bull já causavam incômodo no governo, especialmente entre os ministros militares. Ontem, parlamentares aliados também reagiram. “O filho do presidente está tentando criar uma crise dentro do governo”, acusou a deputada Joice Hasselmann. “É uma coisa de louco”, acrescentou. Não foi a primeira a associar a palavra ao Zero Dois.
Bebianno presidia o PSL durante a campanha e era responsável pela divisão do fundo eleitoral. Há fortes indícios de que o partido desviou dinheiro público. A sigla informou à Justiça que direcionou quase R$ 700 mil a cinco candidatas que somaram apenas 2.348 votos. O ministro deve explicações, mas Carluxo elevou a pressão sobre o Planalto ao torpedeá-lo.
Sem cargos no governo, os filhos do presidente vão se especializando em fabricar crises. Antes da eleição, o Zero Três ameaçou fechar o Supremo com “um cabo e um soldado”. Depois o Zero Um entrou na mira do Coaf, sob suspeita de embolsar salários de assessores. Agora o tumulto tem origem no dedo nervoso do Zero Dois.
Terça-feira: 12.2.2019
Folha de S.Paulo – Vexame laranja
Opinião
Novo caso de candidatura de fachada repercute no comando nacional do PSL e no Planalto
Chegaram a um novo patamar de gravidade as evidências de que o PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, utilizou candidatas de fachada para manipular dinheiro público destinado ao financiamento das eleições do ano passado.
Já era mais que constrangedor, para a legenda e para o governo federal, o caso revelado por esta Folha no dia 4 de fevereiro, envolvendo o hoje ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio.
No comando do PSL em Minas Gerais, ele patrocinou o repasse de R$ 279 mil a quatro supostas postulantes a cadeiras na Câmara dos Deputados e na Assembleia Legislativa do estado —supostas, porque seu empenho na disputa lhes rendeu, em conjunto, pouco mais de pífios 2.000 votos.
Dos recursos transferidos, ao menos R$ 85 mil foram gastos para contratar serviços, também supostos, de quatro empresas ligadas de alguma maneira ao ministro ou a auxiliares de seu gabinete.
No domingo (10), este jornal noticiou outro episódio do gênero, de escala maior. Uma única candidata a deputada federal por Pernambuco recebeu R$ 400 mil para sua campanha. Ainda assim, não conseguiu mais que 274 votos —provavelmente porque a dinheirama só chegou a suas mãos em 3 de outubro, quatro dias antes da eleição.
A prestação oficial de contas de Maria de Lourdes Paixão, que é funcionária do PSL no estado, aponta que praticamente toda a verba pagou material de campanha em uma gráfica. Nos endereços fornecidos pela empresa, porém, não se encontra nenhum sinal de atividade.
O vexame, desta vez, chega ao comando do partido e ao Palácio do Planalto. O presidente da sigla, deputado Luciano Bivar, de Pernambuco, atribuiu a alocação dos recursos à direção nacional, na época a cargo do atual ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno. Este negou ter sido o responsável pela decisão.
As elucubrações canhestras de Bivar, para quem faltaria vocação política às mulheres, apenas tornaram o episódio mais vergonhoso.
Todo o dinheiro envolvido nos episódios veio dos cofres públicos. Depois de proibidas as doações empresariais, o mundo partidário elevou as verbas orçamentárias para o financiamento de campanhas —foram quase R$ 2,6 bilhões em 2018. A legislação determinou ainda que 30% dos postulantes devem ser do sexo feminino.
O PSL passou a hospedar Bolsonaro em janeiro do ano passado, e a união de conveniência contribuiu para que ambos superassem, em termos quantitativos, a condição de nanicos da política. Em todo seu primarismo, o esquema das candidaturas laranjas é mais um resquício da pequenez do passado recente a assombrar o governo.
Quinta-feira: 7.2.2019
Folha de S.Paulo – E o Queiroz? ESCOAFEDEU-SE!
Ilustrada – José Simão
E o Onyx é um dos poucos civis do governo! Mas é fabricado pela General Motors!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Charge do Duke: “Cadê o Queiroz? Escoafedeu-se”.
Rarará!
Piadas Prontas!
1) “Disney World poderá se instalar em Brasília.” Já está instalada! Só de Patetas tem mais de 300! E a Cinderela é a Michelle! E o Tio Patinhas, o Guedes! E o Lobo Mau, o Renan! Rarará!
2) “Roger Waters elogia Maduro e decepciona fãs.” E emociona a Gleisi! Ops, a Crazy Hoffmann! Agora a Crazy vai cantar: “Shine on You Crazy Maduro”. E “Another Brick in the Wall” traduziu para “Você é o Meu Tijolinho”. Rarará!
E esta: “Volto ao cargo amanhã, diz ministro do Turismo exonerado por Bolsonaro”. Mas ele usou laranjas para desviar recursos para campanha! Ô povo pra gostar de laranja! PSL: Partido Suco de Laranja! Rarará!
E o tuiteiro Marcos Cesar mandou avisar pro Flávio que NOSSA BANDEIRA JAMAIS SERÁ LARANJA!
Rarará!
E mais esta: “Crime de caixa dois deve pegar até oito anos de prisão, propõe Moro”. Então pega o Onyx! Que já tá aí do lado! Caixa quatro: 16 anos! Diz que o Onyx é um dos poucos civis do governo! Mas é fabricado pela General Motors! Rarará!
“Questionada sobre o diploma em direito constitucional, Damares responde: é título bíblico!.” E os da USP e da PUC ainda valem? O diploma foi dado por Moisés e a colação de grau foi no pé da goiabeira!
Rarará!
E apareceu um filho novo do Bolsonaro: Jair Renan! Já sei, ele é filho do Jair com o Renan! Aí eu fui pesquisar e achei uma foto dele: sentado no trono de “Game of Thrones” e com uma camiseta de uma arma disparando! O DNA da família! E sai desse trono que não te pertence! Pertence à mãe dos dragões. Usurpador!
Rarará!
“Filho vai morar em apartamento que Bolsonaro disse ter colocado à venda.” Eu acho que eu faria a mesma coisa! Rarará!
O Brasil é Lúdico! Olha essa loja de fardas em BH: Milicianos. Devia ser do Queiroz e do Flávio! Os Milicianos! Rarará!
Predestinado! Direto de Teresina: João Azedo e Brasileiro Escritório de Advocacia! Avisa pro Azedo que o Brasil azedou! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Quinta-feira: 7.2.2019
Blog do Reinaldo Azevedo
CONDENAÇÃO DE LULA 1: ex-presidente já estava condenado por um jeito de ver o direito antes do julgamento. É o mesmo do tríplex
A juíza Gabriela Hardt, que substituiu Sérgio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e 11 meses por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do sítio de Atibaia. Era um segredo de polichinelo. Escrevi algumas dezenas de vezes no blog que essa condenação era certa com a luz do dia. A situação do ex-presidente se complicou bastante. Vamos com calma. A sentença tem 327 páginas. A moldura do processo é a mesmíssima do sítio de Guarujá. Assim, não havia como ter outro desfecho. Porque Lula está sendo julgado pelos mesmos critérios e pela mesma, vamos dizer, escola de pensamento. Ainda que a juíza visse algum vício — e creio que não veja —, tomaria a decisão que tomou porque tal decisão jogaria luzes na condenação assinada por Sérgio Moro. Assim, e nos estritos termos da minha consideração, Lula já estava condenado antes mesmo de ser julgado. Resta saber se essa, vá lá, escola de julgamento e condenação vai vigorar também para os varões e varoas de Plutarco do bolsonarismo. A sentença tem, reitero, 327 páginas. Estou quase terminando a leitura.
CONDENAÇÃO DE LULA 2:
Na comparação com caso de Guarujá, resta evidente, desta vez, que o então presidente e família eram usuários do imóvel
O que há de diferente no caso do sítio no cotejo com o do apartamento — e, note-se: há diferenças contra e a favor de Lula? Nesse processo, há evidências inequívocas de que gente do entorno do então presidente atuou para deixar o imóvel ao gosto da família, com destaque para Marisa Letícia, mulher do ex-presidente. Mais: à diferença do que se deu no tríplex de Guarujá, era efetivamente frequentado pelo líder petista e sua família. Não há a menor dúvida de que o desembolso feito pelas empresas buscava agradar ao então presidente da República, com quem os senhores empreiteiros mantinham excelentes relações. Se bem se lembram, no caso do apartamento, fez-se um grande esforço para evidenciar a ligação entre Lula e o dito-cujo, mas tudo era muito frágil. Até que veio à luz um depoimento de Leo Pinheiro, da OAS. Bastou a sua palavra: o apartamento pertencia a Lula. No caso em questão, não há uma, mas várias palavras a asseverar: sim, o petista e familiares eram os reais usuários do sítio, que foi reformado com dinheiro de empreiteiros
CONDENAÇÃO DE LULA 3:
Empreiteiros negam em depoimento à juíza que recursos da reforma tinham origem nos contratos com a Petrobras
Juíza Gabriela Hardt: sua sentença segue os passos daquela dada por Moro
Mas há também depoimentos que, em tempos normais, contribuiriam para desmoralizar a acusação do Ministério Público. E a própria juíza Gabriela Hardt transcreve parte do que a defesa levou aos autos. Trecho do depoimento de Emílio Odebrecht:
Juíza: O senhor se lembra de ter falado com o senhor presidente, reclamado de alguma questão da Petrobrás, da dificuldade que a empresa estava tendo?
Emílio Odebrecht: Não (…). As minhas conversas que eu tinha com ele era efetivamente a forma da minha organização poder crescer, lutar e já ajudar o país a crescer, era a forma com que eu tinha, e se eu pudesse influenciar nessa direção era o que eu fazia, contribuía.
Mais um diálogo:
“Defesa: (…) senhor Marcelo, o senhor tratou pessoalmente sobre esses quatro contratos com o presidente Lula?
Marcelo Odebrecht:- Sobre esse ponto da denúncia, não houve, quer dizer, eu não fiz nenhuma tratativa direta ou indireta com o presidente Lula envolvendo contratos da Petrobrás.
Para onde essas e outras negativas conduzem a questão?
Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, que a juíza transcreve à página 3 de sua sentença, o dinheiro que custeou a reforma do sítio era parte da propina que Odebrecht e OAS pagavam para manter contratos com a Petrobras, a saber:
No caso da Obrechet:
- a) contratos da Petrobrás com o Consórcio RNEST-CONEST para obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima/RNEST;
- b) contrato da Petrobrás com o Consórcio Pipe-Rack para obras no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro/COMPERJ; e
- c) contrato da Petrobrás com o Consórcio TUC para obras no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro/COMPERJ.
Do Grupo OAS:
- a) contrato da TAG – Transportadora Associada de Gás, subsidiária da Petrobrás, com a Construtora OAS para construção do Gasoduto Pilar-Ipojuca (Pilar/AL a Ipojuca/PE);
- b) contrato da Transportadora Urucu Manaus S/A, subsidiária da Petrobrás, com o Consórcio GASAM, integrado pela Construtora OAS, para construção do GLP Duto Urucu-Coari (Urucu/AM a Coari/AM); e
- c) contrato da Petrobrás com o Consórcio Novo Cenpes para a construção predial para ampliação do CENPES (Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello).
Então ficamos assim: os mimos das empreiteiras no sítio de Atibaia, segundo a denúncia, derivam de seis contratos, certo? Logo, cabe ao órgão acusador apontar as provas de que assim as coisas se deram. Será que foi desta vez?
Quinta-feira: 7.2.2019
Folha de S.Paulo – Até a esquerda detona Maduro, menos os latinos que recebem mordomias
Clóvis Rossi
Personalidades que trabalharam com Hugo Chávez conversam com Juan Guaidó
Aviso ao pessoal do PT e do PSOL e de outros setores que se acham de esquerda e continuam apoiando a ditadura venezuelana: até personalidades que trabalharam com Hugo Chávez –esse grande ídolo de vocês todos– estão conversando com Juan Guaidó, o presidente da Assembleia Nacional e autoproclamado presidente encarregado da República.
À saída de um encontro na terça-feira (5), Héctor Navarro, ministro da Educação com Chávez, foi curto e grosso: “O governo de Maduro é o pior governo que a Venezuela teve em sua história”.
Navarro foi um dos membros da Plataforma em Defesa da Constituição que aceitou conversar com Guaidó. Trata-se de um grupo usualmente chamado de “chavistas dissidentes”, pessoal que trabalhou com Hugo Chávez mas não engole Nicolás Maduro.
Essa fatia da esquerda defende rigorosamente o mesmo que o Grupo de Lima e os países europeus que esta semana respaldaram Guaidó: “É preciso sair de Maduro, mas por uma via que está prevista na Constituição, democrática e pacífica”, disse Navarro.
Fora da Venezuela, há outros esquerdistas que, ao contrário do PT/PSOL e cia., perderam completamente a paciência com Maduro. Caso, por exemplo, de líderes da Frente Ampla chilena, coalizão de movimentos de esquerda criado faz pouco para tentar arejar a política local e introduzir uma cunha na polarização direita/esquerda tradicionais.
O deputado Pablo Vidal, de Revolução Democrática, um dos grupos da Frente Ampla, disse ao jornal La Tercera que “Maduro se converteu em ditador e a esquerda chilena não pode continuar sendo cúmplice dele”.
Apoiou-o seu colega Giorgio Jackson, um dos rostos do movimento estudantil de protesto, hoje deputado: “Lamentavelmente, as ações de Maduro progressivamente tornaram indistinguível o que ocorre na Venezuela do que ocorre em uma ditadura”, declarou.
Voltemos à Venezuela e ouçamos agora Manuel Sutherland, economista que foi conselheiro informal de Chávez nos seus primórdios e continua tão de esquerda que pertence à Associação Latino-Americana de Economia Marxista.
Sutherland tem uma explicação para o silêncio de boa parte da esquerda latino-americana em relação à ditadura venezuelana.
Em entrevista recente para Nueva Sociedad, revista da social-democracia alemã, Sutherland afirmou: “A esquerda latino-americana em geral ‘viveu’ do chavismo, quer dizer, uma infinidade de notáveis da esquerda desfilaram pelo país, recebendo suculentas diárias, dando entrevistas e prestando assessorias”.
Mais: “Centenas de líderes de pequenos partidos e organizações receberam generosa ajuda do governo bolivariano”.
Em português claro: é a famosa boquinha.
Sutherland sabe do que fala, pelo contato próximo que teve com Chávez e o chavismo, pelo menos o original.
Para ele, há um segundo motivo para a esquerda calar-se: quer se distanciar dos governos de direita (de Mauricio Macri, de Sebastián Piñera ou Jair Bolsonaro). Na busca desse distanciamento, perde a referência da realidade concreta, diz Sutherland, e “tratam de justificar honestamente políticas claramente errôneas e com consequências catastróficas para a classe operária e o povo venezuelano”.
Da turma da boquinha, nada a esperar. Mas os outros poderiam abrir os olhos, já não estarão sozinhos.
Quarta-feira: 6.2.2019
Folha de S.Paulo – Respostas vazias
Opinião –A4
A constatação de que nos últimos anos políticos e executivos ligados a grandes empresas e legendas tradicionais, como PT, PP, PMDB e PSDB, viram-se implicados em desvios de grande vulto não basta para transformar em inocente quem tenha incorrido em ilícitos de escala menos espetacular.
Subtrair milhões ou milhares de reais de recursos do contribuinte e aceitar vantagens de variadas proporções em prejuízo do bem público são ocorrências que devem ser consideradas malversações e enquadradas na lei.
Chama a atenção que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e alguns de seus auxiliares venham preferindo tergiversar acerca de episódios que, em pouco mais de um mês, já macularam a imagem de campeões da ética alardeada em campanha pelos atuais governantes.
Nesse curto interregno, soube-se —ou rememorou-se— que o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), recebeu colaborações eleitorais pelo caixa dois; que o titular do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foi condenado por improbidade administrativa.
No caso mais delicado para o Planalto, veio à tona que o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e seu pai, o presidente da República, mantiveram laços estreitos com Fabrício Queiroz, policial e ex-assessor parlamentar envolvido com operações financeiras suspeitas e milicianos do Rio de Janeiro.
De mais recente, descobriram-se evidências de que Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG), hoje ministro do Turismo, organizou um esquema de candidaturas artificiais em seu estado, para as quais distribuiu verbas públicas que chegaram a empresas ligadas a seu gabinete.
Em resposta ao último episódio, revelado por esta Folha, o ministro esquivou-se de oferecer explicações para os fatos apresentados —tarefa, reconheça-se, de alto grau de dificuldade. Preferiu recorrer ao surrado expediente de acusar uma tentativa de desestabilizar o governo com “denúncias vazias”.
Por sua vez, o titular da Justiça, Sergio Moro, levantou dúvidas sobre a consistência dos indícios. O ex-juiz da Lava Jato afirmou que as revelações sobre a conduta de Álvaro Antônio serão apuradas “se surgir a necessidade”.
A declaração do vice-presidente Hamilton Mourão poderia ser considerada mais incisiva, não fosse também inócua em seus rodeios. “Qualquer denúncia tem de ser apurada, a Justiça que faça seu papel. Se for verdadeira, é grave. Tem de ver até onde há verdade nisso aí.”
Coube ao porta-voz da Presidência, o general Otávio Rêgo Barros, sintetizar a retórica tortuosa com que o governo Bolsonaro vem tratando eventos incômodos. Afirmou tratar-se de “um assunto que deve estar restrito ao próprio ministro” —como se este estivesse na Esplanada brasiliense a turismo.
Quarta-feira: 6.2.2019
O Globo – Moro pôs a bola em campo
ELIO GASPARI oglobo.globo.com/opiniao editoria.artigos@oglobo.com.br
Sergio Moro lapidou o discurso desconexo de defesa de lei e da ordem que levou Jair Bolsonaro à Presidência da República. Para listar apenas alguns aspectos do pacote do ministro, homicida ficará trancado por, pelo menos, três quintos da duração da sentença; condenados na segunda instância irão para a tranca, e caixa 2 passará a ser crime. A repressão aos crimes de colarinho branco será tão dura quanto aquela que habitualmente atinge pessoas de pele negra. Essas propostas serão festejadas nos balcões das lanchonetes, por onde passam pessoas que têm medo de andar na rua à noite.
Moro quer trazer para o Direito brasileiro a instituição saxônica das “soluções negociadas”. Na essência, elas permitem um acordo entre réu e a promotoria. O cidadão reconhece sua culpa, negocia a redução da pena com o promotor e com isso descongestiona-se o Judiciário. Na teoria, faz sentido. Na prática, toda importação de regras do Direito saxônico equivale a tentar calçar um par de stilettos de Christian Louboutin nos pés de um jogador de futebol. O calo resultante da divulgação por Moro, no meio da campanha eleitoral, de um anexo irrelevante e inconclusivo da colaboração do ex-ministro Antonio Palocci está na memória política do país. Felizmente, Moro fala agora em “soluções negociadas”. Até há pouco falava em plea bargain, talvez para evitar uma das traduções possíveis e evitando a palavra “barganha”.
No Judiciário americano, todas as delações protegidas pela teoria curitibana da “bosta seca” teriam sido mandadas ao lixo. Lá, se um delator diz uma coisa, e outro diz o contrário, mexe-se na bosta seca, empesteia-se a sala e anula-se uma delas, ou as duas.
A solução negociada entre o réu e o Ministério Público pode ser um sonho de consumo. Contudo, no Brasil leis suecas convivem com uma realidade haitiana. No que vai dar, não se pode saber. Afinal de contas, o ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, da PM do Rio, jamais faria um acordo com a promotoria. O “Caveira”, Senhor da milícia de Rio das Pedras, era amigo de Fabrício Queiroz. Sua mãe e sua mulher foram empregadas por ele no gabinete de Flávio Bolsonaro porque, nas palavras do colega, “a família passava por grande dificuldade, pois à época ele estava injustamente preso.” Libertado, “Caveira” foi absolvido. Não se sabe por quê, está foragido. Na outra ponta, qualquer preso que está apanhando numa delegacia faz qualquer acordo.
Num ponto o projeto de Moro parece um jabuti. Quando ele diz que um juiz poderá deixar de impor uma pena ao agente público se “o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Falta definir “medo” e “violenta emoção”. Os policiais cariocas que mataram um cidadão que empunhava uma furadeira e outro que carregava um guarda-chuva tiveram medo, foram surpreendidos ou estavam emocionados?
A proposta de Moro acertou no atacado. Contém apenas lombadas no varejo, mas o Congresso terá tempo para aperfeiçoar o projeto, e pode-se acreditar que senadores e deputados não tentarão proteger o instituto do caixa 2. O surgimento de uma bancada com toques de demagogia haitiana será um contraponto à demagogia sueca. Nesse sentido Moro desviou-se das duas.
O ministro passou a vida no gabinete de juiz, onde sua caneta mudava a realidade. Na nova cadeira, fez tudo direito com a caneta, mas a realidade continuará a assombrá-lo. As milícias do Rio e as quadrilhas do Ceará expuseram-se logo que ele chegou a Brasília, e continuam lá.
Terça-feira: 5.2.2019
O Globo – Por qué no te callas, Vélez?
Bernardo Mello Franco
O ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, perdeu mais uma chance de ficar calado. Em entrevista à revista “Veja”, ele chamou os brasileiros de “canibais” e descreveu os contribuintes que pagam o seu salário como ladrões.
“O brasileiro viajando é um canibal. Rouba coisa dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião, ele acha que pode sair de casa e carregar tudo”, disse.
Vélez nasceu na Colômbia e fala português com sotaque. Ao tratar os brasileiros como bárbaros, insultou o país que lhe ofereceu passaporte e cidadania.
O professor também deu aula de desinformação. Atacou Cazuza, morto em 1990, por algo que ele nunca disse. A frase “Liberdade é passar a mão na bunda do guarda”, que Vélez atribuiu ao cantor, foi popularizada pelos humoristas do Casseta & Planeta.
O ministro ainda atacou a cineasta Carla Camurati por não ter retratado dom João VI como “um grande herói” em “Carlota Joaquina”. O filme é uma comédia, não um documentário. Reuniu um elenco estrelado e impulsionou a retomada do cinema brasileiro, que Vélez também parece desprezar.
Mais adiante, ele defendeu a volta das aulas de moral e cívica, impostas pela ditadura militar. A patriotada não vai tirar o Brasil da lanterna dos rankings internacionais de educação. Quem estuda o assunto sabe que os alunos precisam de reforço em disciplinas mais importantes, como matemática e ciências.
O besteirol de Vélez não se limita aos chavões reacionários. Em outra entrevista recente, ele disse ao “Valor Econômico” que as universidades “devem ficar reservadas para uma elite intelectual”.
De acordo com o IBGE, os brasileiros com ensino superior ganham 2,5 vezes mais do que os que têm apenas o ensino médio. A taxa de desemprego entre os diplomados é a metade da média nacional. Além de excludente, a tese do ministro é antieconômica.
Em 2007, o rei Juan Carlos silenciou Hugo Chávez com uma pergunta famosa: “Por qué no te callas?”. Vélez é fã da monarquia. Agora que virou ministro, deveria se aconselhar com o ex-soberano espanhol.
Sexta-feira: 31.1.2019
O Globo – Bernardo Mello Franco – O 1º de fevereiro de Flávio Bolsonaro
O 1º de fevereiro deveria marcar o apogeu político dos Bolsonaro. Depois de se instalar no Planalto, a família esperava celebrar a posse do deputado mais votado do país e do senador mais votado do Rio. O clima de festa foi quebrado pelas investigações que envolvem Flávio, o filho mais velho do presidente.
O zero-um foi aconselhado a desistir do mandato para estancar a sangria do clã. Ignorou os apelos, mas vai assumir sob forte pressão. Ontem ele teve uma amostrado que o espera, em breve passagem pelo Congresso.
Flávio ganhou uma recepção típica de políticos envolvidos em grandes escândalos. Assim que pisou no prédio, foi rodeado por um batalhão de repórteres. Ele apressou o passo, mas não conseguiu escapar do cerco.
Ao ouvira primeira pergunta, sacou uma desculpa surrada: “Está todo mundo vendo que eu sou vítima de perseguição ”. Em seguida, tentou desconversar :“Já falei o que tem [sic] que falar. Não tem novidade nenhuma”.
Não é bem assim. A primeira novidade virá amanhã mesmo. O ministro Marco Aurélio Mello deve cassar a liminar do colega Luiz Fux que blindou o senador. “A decisão sai na sexta-feira. As investigações estão paradas, não podem continuar assim”, disse à coluna.
Depois do dia 1º, a situação de Flávio tende a se complicar. Sem a proteção do foro privilegiado, seu caso deverá ser devolvido à primeira instância. Os promotores vão receber novas informações do Coaf. Se quiserem, também poderão avançar na apuração sobre os elos da família presidencial com as milícias.
Apesar dos 4,3 milhões de votos, o senador chega a Brasília enfraquecido. Isso explica sua mudança de tom ao falar de Renan Calheiros. Até outro dia, os Bolsonaro prometiam escantear o emedebista na disputa pelo comando do Senado. Agora podem ser obrigados a beijar sua mão para salvar o mandato do zero-um.
Amanhã deveria ser um dia feliz para Flávio Bolsonaro. Mas o ministro Marco Aurélio Mello deve melar a festa da posse. Ele indica que vai cassar a liminar que blindou o zero-um
Ao opinar contra o pedido de Lula para acompanhar o velório do irmão, um direito assegurado em lei, os procuradores de Curitiba escreveram que o ex-presidente “não é um preso comum”. Já tinha dado para perceber.
Terça-feira – 29 de janeiro de 2019
Sergio BOLSOMORO
Ministro corre risco se abdicar de convicções éticas
José Padilha
O governo Bolsonaro já ccomeçou carimbado por suspeitas gravíssimas de corrupção. Flávio Bolsonaro, senador eleito pelo Rio de Janeiro, está para lá de enrolado com as movimentações atípicas nas contas de seu ex-assessor e na sua própria conta.
Não precisamos de Sherlock Holmes, ou de Capitão Nascimento, ou mesmo do deputado Fraga para concluir o óbvio: ninguém movimenta recursos de maneira tão anormal quanto Flávio Bolsonaro e seu ex-assessor. Depósitos em dinheiro, feitos um seguidinho do outro, dia após dia… Se o cara não tem algo sério a esconder, no caso a famosa prática de receber parte do salário de funcionários da Alerj, podemos dizer que se esforçou muito para parecer culpado.
Aliás, o senador continua se esforçando para parecer culpado nas entrevistas que concede para tentar explicar o que parece ser inexplicável, e faz o mesmo em sua atuação no âmbito jurídico.
Seu pai, o presidente eleito para salvar os brasileiros da corrupção (real) de PT/PMDB, já o jogou do convés do barco: “Se errou, vai ter que pagar”. Presidente, ao que tudo indica, vai ter que pagar. Muito provavelmente por corrupção e desvio de verbas públicas, além de possível associação com milicianos. E não se esqueça: teve um capilé que foi parar na conta da primeira-dama…
O que me leva ao título deste artigo: Sergio Moro, o novo e poderoso ministro da Justiça, ungido pela eficiente luta contra a corrupção empreendida no âmbito da Operação Lava Jato, vai ficar assistindo a tudo isso sem fazer ou falar nada?
Queira ou não queira, ao aceitar o convite de Jair Bolsonaro para trabalhar no Ministério da Justiça, Sergio Moro avalizou implicitamente o governo Bolsonaro. Deu a este governo um carimbo de ética e de luta contra a corrupção. E, ao fazê-lo, colocou a sua biografia em jogo.
Lembro a Sergio Moro a famosa história do grande economista liberal Eugênio Gudin (1886-1986), que, apesar de ter controlado a crise econômica resultante da instabilidade política durante a transição do governo Vargas para o de Juscelino Kubitschek, pediu o boné assim que percebeu que o governo de Juscelino não seria orientado por visão liberal do controle dos gastos públicos.
Ou seja, não flexibilizou as suas convicções pessoais sobre a economia para se ater ao poder. (Espero o mesmo de meu amigo Paulo Guedes!) Pois bem: Sergio Moro vai flexibilizar as suas posições éticas para ficar em um governo que já nasce maculado?
Posto o problema está. Restam ao ministro três formas de lidar com ele: primeiro, pode calar e consentir. Segundo, pode pedir o boné. E, por fim, pode atuar decisivamente em favor de suas convicções éticas, colocando todo o aparato policial e jurídico que tem a sua disposição para investigar o senador Flávio Bolsonaro, dando um sinal claro para a sociedade de que, enquanto ministro, vai trabalhar pela justiça, doa a quem doer.
Em seu primeiro artigo como jornalista, Eugênio Gudin escreveu criticamente sobre a política de investimentos, conhecida como “50 anos em 5”, do então presidente JK. Consta que Gudin dizia o seguinte acerca das gastanças de Juscelino em Brasília: “O Juscelino era um bom rapaz, bem intencionado, mas muito playboy. Ele criou uma capital que não produz nada”. Sergio Moro criou um capital moral, e os brasileiros apostaram nele. Resta ver se este capital vai produzir algo de concreto.
Se não produzir nada, não chamarei o ministro Sergio de playboy, que isso ele não é. Mas, se o ministro Moro capitular em suas convicções éticas quando essas se aproximam dos Bolsonaros, corre o risco de ficar conhecido pela alcunha de Sergio Bolsomoro.
José Padilha
Cineasta, diretor dos filmes “Tropa de Elite” (2007), “Tropa de Elite 2” (2010) e “RoboCop” (2014)
Segunda-feira: 21.1.2019
Blog do Reinaldo Azevedo: Moro vai falar em Davos sobre transparência e combate à corrupção; caso Flávio hoje põe em risco reputação do ‘paladino anticorrupção
Sérgio Moro vai participar de vários painéis em Davos que tratarão de transparência e combate à corrupção e a crimes financeiros. Em seu discurso, Bolsonaro deve apresentá-lo, vamos dizer assim, como o seu xerife. Tanto o chefe como o seu subordinado viajam, nesse particular, num momento ruim. É pouco provável que a imprensa internacional vá cotejar a fala do ministro com o que se passa no Brasil. Por aqui, no entanto, suas intervenções certamente serão acompanhadas com atenção. O ainda deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL), senador diplomado e filho de Jair, está envolvido em uma enrascada que, a morrer no ralo das irresoluções, desmoraliza não apenas a intervenção do ex-juiz em Davos, mas a sua trajetória de paladino contra a corrupção.
Filho de Bolsonaro põe em dúvida política de promotores no dia em que pai viaja com o homem que condenou Lula e virou ministro
Flávio Bolsonaro decidiu ainda, aí em entrevista à RedeTV!, pôr em dúvida a isenção do Ministério Público Estadual. Afirmou que o objetivo da investigação é atingir o governo de seu pai e disse ter visto na Internet fotos de promotores com camisetas de protesto contra o impeachment de Dilma. Disse: “Não sei se é verdade, mas são evidências. Não estou fugindo, mas por que não dar tratamento igual para todo mundo?” Bem, “todo mundo”, quem? Que eu me lembre, há uma penca de deputados estaduais presos, além de dois ex-governadores e um ex-presidente da República. Acusar suposta predileção política de pessoas envolvidas no combate ao crime não fica bem na boca de um bolsonarista. Na noite deste domingo, Sérgio Moro, aquele que condenou Lula, embarcou com Bolsonaro para a Suíça na condição de superministro da Justiça. Flávio precisa melhorar a qualidade das respostas.
Flávio tenta demonstrar que não recorreu ao STF em busca de foro especial; argumentação é capenga. Ou: sim, cabe ao MPF atuar no caso
Flávio afirmou ainda o seguinte, aí sobre a decisão de recorrer ao Supremo:
“Não pedi foro privilegiado ao STF. O que fiz foi uma Reclamação, que é o remédio jurídico correto para perguntar ao Supremo Tribunal Federal, obedecendo a uma decisão do próprio STF, que lá atrás decidiu sobre o foro, e tem uma vírgula que diz assim: caso a caso, o Supremo Tribunal Federal dirá qual é o foro competente. Se é o Rio de Janeiro, o MP do Rio, ou se é Brasília, o MP Federal. Então, a decisão que o Supremo vai tomar é para onde é que tenho que prestar os esclarecimentos. Não tenho nada para esconder de ninguém. Tem origem. Não tem origem ilícita”.
Pois é… Ocorre que, além da Reclamação — que parte, sim, do pressuposto de que ele pode ter foro naquele tribunal, o que o próprio STF já rechaçou, com o apoio do bolsonarismo, diga-se —, sua defesa também entrou com um pedido de liminar para suspender a investigação que diz respeito a Fabrício Queiroz. Luiz Fux atendeu ao pedido. Certamente seu advogado o advertiu de que a liminar poderia atrasar por algum tempo a investigação, mas ela voltaria fatalmente para o Ministério Público Estadual do Rio. A razão é simples: ainda que Flávio venha a ser investigado na esfera criminal, o caso aconteceu antes de seu mandato como senador e não se deu em razão desse mandato. É bem verdade que, se o Ministério Público Federal quiser, há motivos para entrar no caso, isto é, para chamar a investigação para si: uma das funcionárias que repassava dinheiro para a conta de Fabrício é Nathalia Queiroz, sua filha, que deixou o gabinete de Flávio e foi transferida para o de Jair, quando deputado federal, em Brasília. Ocorre que ela morava no Rio, onde atuava como personal trainer. E, como se sabe, Fabrício depositou dinheiro na conta de Michelle, mulher do agora presidente da República.
Segundo Flávio, os 48 depósitos de R$ 2 mil e o pagamento de título de R$ 1 milhão estão ligados a imóveis; eis o “Ronaldinho” do “Mito”
Embora tenha se negado a falar sobre o caso para o Ministério Público Estadual e recorrido ao Supremo para suspender a investigação sobre Fabrício Queiroz, o senador eleito resolveu conceder entrevistas sobre o assunto. Segundo disse à TV Record, os 48 depósitos de R$ 2 mil que foram feitos na sua conta, em cinco datas, no prazo de um mês, entre junho e julho de 2017, e o pagamento de um título na CEF no valor de R$ 1.016.839 dizem respeito à transação de um imóvel. Por meio do título, ele estaria quitando o financiamento feito pela Caixa. Em seguida, teria resolvido vendê-lo por R$ 2,4 milhões. E o comprador teria pagado parte da aquisição em dinheiro. E Flávio fez o quê? Dividiu os R$ 96 mil em 48 envelopes de R$ 2 mil e resolveu depositar por meio do caixa eletrônico. Por que não fez o depósito de uma vez só na agência bancária que fica na Assembleia? Ele não disse. Demorou quase um mês para realizar todas as operações, a saber:
9 de junho de 2017: 10 depósitos no intervalo de 5 minutos, entre 11h02 e 11h07;
15 de junho de 2017: mais 5 depósitos, feitos em 2 minutos, das 16h58 às 17h;
27 de junho de 2017: outros 10 depósitos, em 3 minutos, das 12h21 às 12h24;
28 de junho de 2017: mais 8 depósitos, em 4 minutos, entre 10h52 e 10h56;
13 de julho de 2017: 15 depósitos, em 6 minutos.
Ah, sim: na entrevista à Record, Flávio afirmou que o salário de deputado é a menor parte de seus rendimentos. O maior volume viria da atividade empresarial —não especificou, porém, qual seria o negócio. Pelo visto, Bolsonaro também tem seu “Ronaldinho”, que foi como Lula se referiu certa feita ao talento empresarial de um de seus filhos.
Queiroz, o homem que movimentou R$ 7 milhões, mora em casa modesta na Zona Oeste do Rio; há o temor de que a grana tenha origem ainda pior
Queiroz, o homem que movimentou R$ 7 milhões em três anos, mora numa casa simples, em um beco, na Taquara, na Zona Oeste do Rio. Nada por ali faz supor o correntista de valores milionário ou o paciente que se interna para tratar de câncer no hospital Albert Einstein, que figura entre os melhores e mais caros do país. Como eu escrevia aqui à época em que o petismo dava as cartas, há ocorrências e coincidências que só acontecem no universo da política. Os R$ 7 milhões levaram o pânico para o Planalto, ao contrário do discurso oficial, porque se considerou que é dinheiro demais para a hipótese viciosa se limitar a uma simples “rachadinha” envolvendo o salário dos servidores, o que já seria crime: além de lavagem de dinheiro, também peculato. Os valores movimentados, segundo o que se sabe até agora, despertaram o temor de coisa mais grave. Alguém lembrou que o candidato de Flávio à Presidência da Assembleia era o deputado André Corrêa (DEM), que está em prisão preventiva, no âmbito da operação “Furna da Onça”. Ele é acusado de ter recebido R$ 100 mil mensais para votar de acordo com os interesses do amplo grupo então liderado pelo governador Sérgio Cabral. Há tudo no generalato da reserva que serve a Bolsonaro, menos tranquilidade. E Flávio não está ajudando.
Reportagem da Folha informa que senador eleito adquiriu imóveis ao custo de R$ 4,2 milhões em três anos; seu salário bruto é de R$ 25,3 mil
Reportagem da Folha desta segunda informa:
“Documentos obtidos em cartórios mostram que o então deputado estadual e hoje senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) registrou de 2014 a 2017 a aquisição de dois apartamentos em bairros nobres do Rio de Janeiro, ao custo informado de R$ 4,2 milhões. Em parte das transações, o valor declarado pelos compradores e vendedores é menor do que aquele usado pela prefeitura para cobrança de impostos. Nota: o salário de um deputado estadual do Rio é de R$ 25,3 mil brutos.
Domingo – 20.1.2019
O Globo – Elio Gaspari – Flávio quer anular provas de procuradores
A corrida do senador eleito Flávio Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal teve dois objetivos. O primeiro foi travar a investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro em torno dos “rolos” de seu ex-assessor Fabrício Queiroz. Daqui a poucos dias, o ministro Marco Aurélio Mello liquidará essa questão, destravando-a. O segundo, essencial, é a tentativa de anular as provas conseguidas pelos procuradores. Que provas? Isso não se sabe, pois o caso corre em segredo de Justiça e até bem pouco tempo Flávio Bolsonaro repetia que não está sendo investigado.
A nulidade das provas é o sonho de todo réu. Na última catedral da impunidade, a operação Castelo de Areia virou pó conseguindo-se anular as provas de que o Sol das roubalheiras nascia na caixa das empreiteiras. Depois dela vieram a Lava-Jato, Sergio Moro e deu no que deu.
Desde que os “rolos” de Queiroz se tornaram públicos, todos os seus movimentos ofenderam a boa-fé do público. Não atendeu a duas convocações do Ministério Público, passou por uma cirurgia e deixou-se filmar dançando. Já o senador eleito Bolsonaro considerou “plausíveis” as explicações que recebeu do exassessor. Que explicações?
Quem acompanhou a reação do comissariado petista diante das denúncias de corrupção nos governos petistas acredita que está num pesadelo. A melodia dos poderosos é a mesma. Onyx Lorenzoni diz que a oposição busca um terceiro turno. Em 2011, Dilma Rousseff disse a mesma coisa quando surgiu o rolo do patrimônio de Antonio Palocci, chefe de sua Casa Civil. A letra do samba é muito diferente, porque os “rolos” de Queiroz são cascalho quando comparados com as propinas bilionárias que rolaram durante o consulado dos comissários. O pesadelo estraga o sono de milhões de pessoas que votaram contra a roubalheira, o blablablá e a resistência dos petistas a uma autocrítica.
Todas as explicações dadas até agora partem da premissa de que a plateia é boba. Por exemplo: Fabrício Queiroz deixou de ser assessor de Flávio Bolsonaro no dia 16 de outubro, logo depois do primeiro turno da eleição, para cuidar do seu processo de aposentadoria. Por coincidência, sua filha, personal trainer no Rio e assessora de Jair Bolsonaro em Brasília, foi exonerada no mesmo dia (a essa altura a Polícia Federal já sabia que o Coaf estranhara a movimentação financeira de Queiroz.) Travas, silêncios, segredo de Justiça, corrida à “porcaria” do foro privilegiado e pedidos de nulidade das provas só servem para alimentar murmúrios maliciosos. Os promotores não tem pressa, só têm perguntas..
Segunda-feira: 21 de janeiro de 2019
Manchete da Folha de S.Paulo – Filho de Bolsonaro comprou R$ 4,2 mi em imóveis em 3 anos
Brasília e Rio de Janeiro
Período das aquisições coincide com o da movimentação atípica identificada pelo Coaf
Documentos obtidos em cartórios mostram que o então deputado estadual e hoje senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) registrou de 2014 a 2017 a aquisição de dois apartamentos em bairros nobres do Rio de Janeiro, ao custo informado de R$ 4,2 milhões.
Em parte das transações, o valor declarado pelos compradores e vendedores é menor do que aquele usado pela prefeitura para cobrança de impostos.
O período da aquisição dos imóveis pelo filho de Jair Bolsonaro é o mesmo em que o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) teria detectado movimentação de R$ 7 milhões nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, segundo reportagem do jornal O Globo publicada neste domingo (20).
O ex-motorista é investigado sob suspeita de ser o pivô de um esquema ilegal de arrecadação de parte dos salários de servidores do gabinete, prática conhecida como rachadinha.
Flávio começou na vida pública em 2002, tendo como único bem na época um Gol 1.0, segundo sua declaração de bens.
Em outro relatório, divulgado pelo Jornal Nacional, da TV Globo, sobre movimentações atípicas na conta do filho do presidente, o Coaf identificou um pagamento de R$ 1.016.839 de um título bancário da Caixa —o órgão não teria conseguido identificar a data exata e o beneficiário.
De acordo com os documentos obtidos em cartórios, Flávio registrou em junho de 2017 a quitação de uma dívida com a Caixa no valor aproximado de R$ 1 milhão para aquisição de um dos apartamentos que comprou, no bairro das Laranjeiras. Segundo dados de uma das escrituras, o débito foi pago em 29 de junho daquele ano.
Segundo informações cartoriais, Flávio comprou o imóvel na planta, por valor declarado de R$ 1,753 milhão.
Ele se desfez do bem em 2017, quando fez uma permuta, recebendo em troca uma sala comercial na Barra da Tijuca e um apartamento em na Urca, além de R$ 600 mil em dinheiro —sendo R$ 50 mil em cheque e R$ 550 mil sem descrição da forma de pagamento— para completar o negócio. Na escritura, o imóvel dado por ele tinha passado a valer R$ 2,4 milhões.
O novo bem, na Urca, teve valor registrado de R$ 1,5 milhão –vendido depois, em maio de 2018.
Em entrevista na noite de domingo ao programa Domingo Espetacular, da TV Record, Flávio afirmou que o pagamento do título bancário se refere à negociação imobiliária. Ele levou papéis, mas não quis mostrá-los, afirmando que a imprensa não é o foro adequado para esse tipo de esclarecimento.
Segundo ele, a parte recebida em dinheiro vivo explica os depósitos fracionados em sua conta bancária.
Na sexta (18), o Jornal Nacional revelou que o senador eleito recebeu R$ 96 mil em um período de cinco dias, entre junho e julho de 2017. Foram 48 depósitos no valor de R$ 2.000, realizados em espécie no autoatendimento da agência bancária que fica dentro da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio).
Segundo o senador eleito afirmou à Record, os depósitos foram fracionados em R$ 2.000 porque esse era o limite aceito no caixa eletrônico. No Itaú, único banco no qual o senador eleito tem conta declarada, o limite para depósito em espécie no caixa eletrônico é de fato R$ 2.000. Na Alerj, onde foram feitos os depósitos, há um autoatendimento do Itaú.
Outro apartamento adquirido pelo senador eleito entre 2014 e 2017 foi um na Barra da Tijuca, pelo valor de R$ 2,55 milhões. Para a compra, ele também pegou uma espécie de empréstimo, dessa vez com o Itaú, pelo valor de R$ 1,074 milhão.
O apartamento fica em uma das regiões mais nobres do bairro, na avenida Lúcio Costa, de frente para a praia, próximo do condomínio em que o pai tem casa.
No mesmo período, o senador eleito vendeu dois imóveis, um em Copacabana e outro também na Urca, pelo valor de, somados, R$ 2 milhões. Nos registros cartoriais também figura o nome da mulher de Flávio, Fernanda Antunes Figueira.
Atualmente, o salário de um deputado estadual do Rio é de R$ 25,3 mil brutos. Na entrevista à Record, Flávio afirmou que o salário de deputado é a menor parte de seus rendimentos. O maior volume viria da atividade empresarial —não especificou, porém, qual seria o negócio.
A Folha revelou em janeiro de 2018 que o presidente Jair Bolsonaro, à época deputado federal e pré-candidato, e seus três filhos que exercem mandato multiplicaram o patrimônio na política.
Com base em pesquisas cartoriais, a reportagem mostrou que até aquele mês eles eram donos de 13 imóveis com preço de mercado de pelo menos R$ 15 milhões, a maioria em pontos altamente valorizados do Rio, como Copacabana, Barra da Tijuca e Urca.
A Folha também mostrou em janeiro do ano passado que Flávio havia negociado ao menos 19 imóveis nos últimos 13 anos.
A maior parte são 12 salas do Barra Prime, um prédio comercial. Todas foram vendidas para a MCA Participações, empresa que tem entre os sócios uma firma do Panamá. Ela adquiriu as salas de Flávio em novembro de 2010 —45 dias depois de o deputado ter comprado 7 das 12 salas.
O senador eleito passou a ser protagonista da dor de cabeça do governo Jair Bolsonaro após a revelação das movimentações de Queiroz, em dezembro.
Quase um mês depois, agora ele é também foco do Ministério Público e demais autoridades. Com o agravamento da crise, o Palácio do Planalto iniciou estratégia para evitar que o episódio gere danos maiores.
A orientação recebida por integrantes da equipe ministerial é de que, a partir de agora, evitem comentar o tema em público, tratando-o como uma questão particular do filho do presidente.
O levantamento de dados pelo Coaf motivou reclamação do senador eleito ao STF (Supremo Tribunal Federal). Na semana passada, a corte suspendeu a investigação que envolvia Queiroz e Flávio.
A Folha enviou perguntas ao advogado e à sua assessoria no final da tarde e início da noite deste domingo, mas não obteve resposta.
Ranier Bragon , Camila Mattoso , Italo Nogueira e Ana Luiza Albuquerque
Sábado: 20 de janeiro de 2019
O Globo – Artigo de Dorrit Harazim – Não estava tudo dominado
Fosse o episódio de menor relevância, seria o caso de perguntar o que andam fumando os advogados de Flávio Bolsonaro — junto ou em separado do cliente. O pedido de suspensão pelo STF da investigação sobre movimentações financeiras atípicas de Fabrício Queiroz, o encrencado ex-assessor do então deputado estadual e hoje senador, mais parece fruto de uma bad trip do que uma estratégia de defesa de causídicos para o filho 01 do presidente da República. Ficou escancarado que tem uma nau à deriva. Como se sabe, o pedido de suspensão foi acatado pelo plantonista no atual período de recesso da Corte, ministro Luiz Fux, a quem caberá conviver comesse apêndice na biografia. A partir de1º de fevereiro, ocaso passa a ser examinado pelo relator Marco Aurélio Mello, a quem caberá apalavra final sobre o domicílio jurídico da investigação. O time Bolsonaro pleiteia que ela deve migrar para o Supremo sob escudo do foro privilegiado reservado a deputados federais e senadores. Ou então a investigação prossegue sob alupado Ministério Público fluminense, onde originou. Como previsto, caudalosos argumentos jurídicos dos dois lados não faltam, da mesma forma que sempre é possível desenterrar estatísticas radicalmente opostas a respeito de qualquer causa.
Mas chama a atenção no jabuti entregue a Fux, além do súbito apreço pela figura do foro privilegiado, que ainda em 2017 o hoje presidente Jair Bolsonaro tachava de “privilégio porcaria”, o pedido de “ilegalidade das provas e de todas as diligências de investigação determinadas a partir dela”. Como assim? Zerar tudo? Mas tudo o quê? A perplexidade faz voar alto a imaginação. Desde a revelação publicada no “Estado de S.Paulo” em dezembro sobre a movimentação bancária atípica de Queiroz, passando pela abertura da investigação de 28 deputados listados na planilha do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ), nada do pouco que chega ao conhecimento público parece fazer sentido. Sobretudo no caso de Queiroz, o ora esquivo ora loquaz ex-assessor parlamentar, dublê de motorista e auto declarado talento para fazer dinheiro. Qualquer advogado de porta de cadeia poderia prever que a curiosidade geral se afunilaria em personagem tão próximo do clã do presidente, e que seria imperioso tomar alguma dianteira, mesmo que apenas cosmética, para saciar o interesse.
Seja por presunção demando, por certeza de poder alterar a pauta da mídia ou domar a curiosidade nacional, o time de Bolsonaro escolheu o caminho inverso: o de varrer para debaixo do tapete uma trama na qual existe um cheque de R$ 24 mil de Queiroz na conta da atual primeira-dama, em que duas filhas e a mulher do ex-assessor têm protagonismo, e nove funcionários do gabinete do filho do presidente recém-eleito repassam dinheiro para Queiroz em datas suspeitas. Noves fora o resto. Primeiro Queiroz é sumido, não comparece a depoimentos agendados, e reaparece num quarto do hospital Albert Einstein em São Paulo, convalescendo inclusive de uma cirurgia. Flávio Bolsonaro, por seu lado, afirma ter recebido uma versão plausível dos fatos e desdenha dois convites do Ministério Público para prestar depoimento, enquanto outros deputados também convocados acham mais prudente “colocar-se à disposição das autoridades”. Em meio ao indigesto vendaval, o presidente surge um tanto atordoado com a evolução de um novelo que talvez esperasse aquietar-se.
A este respeito, cabe, aqui, ressuscitar um ponto levantado pelo deputado federal Paulo Pimenta sobre a data em que Queiroz foi exonerado do gabinete de Flávio Bolsonaro: entre o primeiro e o segundo turnos da eleição do ano passado. Mais precisamente, 20 dias antes do início da operação que investiga o esquema de ilícitos na Assembleia fluminense. O parlamentar gaúcho, por arguto ou por petista, estranhou o fato de uma filha de Queiroz, Nathalia, também ter pedido demissão do cargo que ocupava em Brasília no gabinete de Jair Bolsonaro, no mesmo dia que o pai. Alguém teria sido avisado da ação da Furna da Onça que seria desencadeada pela Polícia Federal em conjunto com o Ministério Público?
Se foi e achou que estava tudo dominado, perdeu.
Sábado: 20 de janeiro de 2019
O Globo – Artigo de Bernardo Mello Franco – Tem laranja no liquidificador
Na segunda-feira, Jair Bolsonaro recebeu três modelos enfeitadas com coroas de princesa e faixas de miss. As moças foram a Brasília divulgar a Festa da Uva, o tradicional evento de Caxias do Sul. O capitão sorriu para fotos e ganhou um caixote de uvas colhidas na cidade gaúcha. Mas foi o cheiro de outra fruta, a laranja, que passou a impregnar o gabinete presidencial.
Com menos de um mês de governo, Bolsonaro está emparedado pelos rolos de Fabrício Queiroz. Na quarta-feira, seu filho mais velho apelou ao foro privilegiado para suspender a investigação e esconder as contas do ex-assessor. Conseguiu a liminar, mas deu bandeira. Ficou claro que o laranjal era bem maior do que se pensava.
Na noite de sexta-feira, o Jornal Nacional deu uma amostra do que parece vir por aí. Em apenas um mês, a conta bancária de Flávio Bolsonaro recebeu R$ 96 mil em dinheiro vivo. A grana foi fracionada em 48 depósitos de R$ 2 mil. O senador eleito virou suco antes de tomar posse.
O relatório do Coaf foi sutil. Apontou uma “suspeita” de “artifício” para impedir o rastreamento dos depósitos. Em outra passagem, citou uma circular do Banco Central para explicar que esse tipo de operação pode “configurar indícios” de lavagem de dinheiro. Não seria o único crime na cena. Os depósitos em série reforçam a suspeita de que Flávio embolsava parte dos salários dos assessores. O esquema é comum no baixo clero da política, habitat natural da família do presidente. Se confirmado, caracteriza crime de peculato, o desvio de dinheiro público para uso pessoal. Uma das curiosidades do caso é a data dos depósitos. O Coaf detectou as operações atípicas entre junho e julho de 2017. Na época, a Lava-Jato fazia três anos e o pai de Flávio já rodava o país como pré-candidato ao Planalto. Outro descuido foi o uso de um caixa eletrônico na Assembleia Legislativa do Rio, onde há controle de entrada e câmeras de segurança.
A revelação joga no liquidificador tudo o que os Bolsonaro já disseram sobre o escândalo. Na ausência de um mordomo, o presidente tentou jogar a culpa no motorista. Agora ficou difícil separar os saques do funcionário dos depósitos na conta de Flávio. O Planalto alega que o rolo do primeiro-filho não seria problema do governo. O discurso poderia colar se Queiroz não fosse tão próximo do presidente e não tivesse assinado um cheque de R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro.
Hoje o colunista Lauro Jardim revela que a movimentação bancária do motorista foi muito superior ao que se sabia. A notícia enfraquece ainda mais a versão do presidente para o cheque em nome da primeira-dama. Com tanto dinheiro circulando em sua conta, Queiroz não teria nenhum motivo para pedir um empréstimo. Bolsonaro vai para Davos, mas o cheiro de laranja continuará no ar.
Sábado: 20 de janeiro de 2019
Manchete de O Globo: Coaf: ex-assessor de Flávio Bolsonaro movimentou R$ 7 milhões em 3 anos
Volume de depósitos em contas de Fabrício Queiroz superar o valor revelado em dezembro
Lauro Jardim
Foi de R$ 7 milhões, entre 2014 e 2017, a movimentação financeira nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). É o que consta os arquivos do Coaf, orgão federal de controle das atividades financeiras. Queiroz ecerceu funções no gabinete de deputado estadual de Flávio na Alerj até 15 de outubro de 2018. Em dezembro passado, foi revelado que, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, havia circulado R$ 1,2 milhão pela conta corrente de Queiroz. O Coaf registrou que passaram por sua conta R$ 5,8 milhões nos dois anos anteriores, totalizando R$ 7 milhões em três abnos. Até hoje Queiroz não apresentou explicação ao Ministério Público sobre a origem dos recursos. As investigações estão suspensas por decisão do ministro Luiz Fux, do STF.
Os R$ 7 milhões de Queiroz
O Coaf sabe muito mais do que já foi revelado sobre o caso Fabrício Queiroz, o ex-motorista de Flávio Bolsonaro. Nos arquivos do órgão federal de controle de atividades financeiras consta que Queiroz transacionou um volume de dinheiro substancialmente maior do que o que veio a público em dezembro.
Além dos famigerados R$ 1,2 milhão, movimentados atipicamente entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, passaram por sua conta corrente mais R$ 5,8 milhões nos dois exercícios imediatamente anteriores. Ou seja, no total Queiroz movimentou R$ 7 milhões em três anos. Segundo o próprio Jair Bolsonaro disse em entrevista, Queiroz “fazia rolo”. Haja rolo.
Pontas soltas
Flávio chegou a dizer, no início de dezembro, que ouviu de Queiroz “uma história bastante plausível” sobre o R$ 1,2 milhão. E enfatizou: “a gente não tem nada a esconder”, numa frase em que atrelou o seu destino ao de Queiroz.
O que dirá agora sobre essa montanha de dinheiro? Pela relação dos dois, imagina-se que o senador eleito saiba desses R$ 7 milhões. Quando o MP do Rio voltar a se debruçar sobre o caso —as investigações estão suspensas desde quinta-feira passada por uma decisão de Luiz Fux, mas a tendência é que sejam retomadas —as explicações de Queiroz sobre suas atividades paralelas terão que ser mais convincentes do que as dadas até agora em declarações ao SBT.
Entre os vários mistérios desse rolo, um permanece intacto: como alguém que movimentou tantos milhões de reais em três anos mora numa casa modestíssima de uma viela da Taquara, na Zona Oeste do Rio de Janeiro?
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
Sensacionalista – Bolsonaro libera arma e filho usa pistolão para se livrar da Justiça
Flávio Bolsonaro é o primeiro a se beneficiar pelas regras que flexibilizam a posse de armas. O filho do presidente conseguiu uma liminar para livrar o assessor Fabrício Queiroz da investigação.
Queiroz pediu uma pizza para comemorar, mesmo convalescente. Para não comer nada pesado, ele pediu uma pizza de laranja.
Queiroz conseguiu se livrar porque tem Moro Privilegiado.
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
Editorial – Folha de S.Paulo – Canetada inexplicável
Decisão de Fux deixa o STF exposto a críticas e aumenta o constrangimento para os Bolsonaros
Causou enorme perplexidade a decisão tomada pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, de suspender a investigação sobre as atividades de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).
Queiroz, como se sabe, foi identificado em relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) como responsável por movimentações financeiras no valor de R$ 1,2 milhão —incompatível com seu patrimônio e ocupação profissional no ano analisado.
Foram 176 saques em espécie de sua conta (cinco deles no mesmo dia) num total de mais de R$ 300 mil. Houve repasses de oito funcionários ou ex-funcionários ligados ao gabinete do então deputado estadual. A mulher e duas filhas do ex-assessor são citadas no relatório, que registra, ainda, depósito de R$ 24 mil em favor da atual primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Uma das filhas, Nathalia, trabalhou para Flávio antes de ser contratada pelo gabinete de Jair Bolsonaro, na época deputado federal pelo PSC. Como revelou esta Folha, ela atuava como personal trainer no mesmo período.
Quanto ao dinheiro recebido por Michelle, Bolsonaro alegou, ainda antes da posse, que seria parte de pagamento de um empréstimo por ele concedido a Queiroz, seu amigo pessoal e colega de pescaria.
Até aqui, tanto o ex-assessor, por declarados problemas de saúde, quanto Flávio se esquivaram de prestar esclarecimentos.
As evidências de irregularidades são enfáticas e documentadas. Demandam apuração por parte das instâncias competentes. A decisão de Fux, contudo, mesmo que transitória, foi em sentido contrário. O ministro acatou pedido da defesa para que se aguarde o início da nova legislatura, em fevereiro, quando Flávio contará com a prerrogativa de foro dos senadores. Os advogados pretendem ainda que se considerem ilegais as provas colhidas.
Caberá a outro ministro carioca, Marco Aurélio Mello, relator do caso, decidir após 31 de janeiro, quando termina o recesso do Judiciário.
Lembre-se que, no ano passado, o STF considerou que o foro especial de parlamentares se restringe a atos praticados no exercício do mandato e em decorrência dele.
A canetada de Fux gerou protestos de representantes de amplo arco ideológico e partidário. Do PT ao DEM, passando pelo conservador MBL (Movimento Brasil Livre), levantaram-se vozes para deplorar o que parece uma manobra destinada a cercear as investigações.
Para um governo que chegou ao poder acenando com vigoroso repúdio à corrupção, as circunstâncias vão se tornando constrangedoras. Será uma lástima —e acarretará inevitável efeito desmoralizador— se as instituições da República se curvarem a interesses de ocasião para tomar decisões casuísticas em prejuízo da transparência e do império da lei.
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
Folha de S.Paulo – Defensor de fim do foro, Moro já chamou prerrogativa de escudo para impunidade
Ministro disse no passado que direito, agora invocado por Flávio Bolsonaro, é ‘resquício aristocrático’
Camila Mattoso/Brasília
Agora ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro, Sergio Moro defendeu ao longo da sua carreira na magistratura o fim do foro especial.
Em eventos, palestras e entrevistas, o ex-juiz federal declarou diversas vezes que a prerrogativa ia contra a ideia de democracia. Moro já disse que o foro é um “resquício aristocrático” e que é um escudo para impunidade.
O assunto voltou à tona nesta quinta-feira (17), quando o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) conseguiu no STF (Supremo Tribunal Federal) suspender as investigações sobre seu ex-assessor Fabrício Queiroz.
O filho do presidente entrou com uma reclamação na corte, pedindo que o inquérito fosse retirado da primeira instância. O ministro Luiz Fux acatou a solicitação provisoriamente.
A Folha questionou o ministro, via assessoria de imprensa, sobre a decisão de Fux, mas não obteve resposta.
Flávio argumentou ao Supremo que, embora não tenha tomado posse, já foi diplomado, o que lhe conferiria foro especial perante o Supremo —a nova Legislatura só se inicia em 1º de fevereiro.
O principal investigado do caso é o ex-assessor do senador eleito, que movimentou R$ 1,2 milhão em um ano, segundo um relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
O ex-juiz federal disse no passado que o foro é um “desvirtuamento do STF”, porque os ministros acabam tendo de se ocupar “com casos concretos” e não podem ficar com “temas constitucionais que impactam toda a sociedade”.
“Eu até imagino a frustração de um ministro que quer discutir temas constitucionais relevantes como ensino religioso, cotas e questões da execução, até a prisão em segunda instância, e fica preso para decidir busca, apreensão e quebra de sigilos. É um desvirtuamento [da função do STF]. Isso tem que ser mudado”, disse Moro em outubro de 2017, em evento em São Paulo.
Na época, ele fazia uma defesa sobre a necessidade de mudança do foro privilegiado.
“[O foro] fere o princípio da igualdade. E em uma democracia, a ideia principal é que todos devem ser tratados de maneira igual perante a lei”, afirmou em outra oportunidade, em 2015.
Em maio do ano passado, por unanimidade, o STF decidiu restringir o foro especial para deputados federais e senadores.
A partir de então, a corte passou a ter o entendimento de só processar e julgar casos em que os crimes tenham sido cometidos em razão do cargo e durante o mandato.
Episódios que não se enquadram nesses critérios —como é, em tese, o relativo a Flávio — são agora remetidos às instâncias inferiores.
A decisão de Fux é provisória. Vice-presidente da corte, ele está de plantão durante o recesso dos demais ministros.
O ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, vai analisar e decidir sobre o tema na volta ao trabalho, em 1º de fevereiro.
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
O Globo – Blog Lauro Jardim: Jair, Carlos e Eduardo se calam sobre Flávio e Queiroz
Já se passou um dia da matada no peito de Luiz Fux no caso Flávio Bolsonaro. Nem seu pai Jair e nem seus irmãos Eduardo e Carlos — os três vorazes tuiteiros — ousaram fazer qualquer manifestação de apoio ao “zero um”.
Sexta-feira: 18.1.2019
O Globo – Quem quer foro?
por Merval Pereira
O grave nesse caso do senador eleito Flávio Bolsonaro é que atinge o combate à corrupção, base da candidatura vitoriosa de seu pai, o presidente Jair Bolsonaro. Além de estar envolvido de maneira direta na movimentação atípica do motorista Fabrício Queiroz, pois sua mulher recebeu depósitos dele em sua conta, Jair Bolsonaro vê um de seus filhos tentando escapar de uma investigação criminal que pode desvelar a raiz da corrupção política brasileira.
Há entendimento generalizado, que poderia ou não ser confirmado nessa investigação, de que parlamentares de maneira geral, seja em que nível for, com raras e honrosas exceções, financiam suas campanhas e suas vidas pessoais ficando com uma parte do salário de seus funcionários. Ou às vezes nomeando funcionários-fantasmas.
Cada deputado estadual tem direito a nomear até 15 assessores, e a investigação do Coaf analisa movimentações atípicas de assessores de diversos deputados na Assembléia Legislativa do Rio, entre eles Flavio.
Utilizando-se de uma prerrogativa parlamentar presumida, já que o foro privilegiado foi limitado pelo próprio Supremo a atos cometidos durante o mandato parlamentar e relativos a ele, Flavio Bolsonaro busca impedir a investigação, abrindo um flanco na atuação do clã Bolsonaro. Tanto que nenhum dos irmãos, nem mesmo o pai presidente, saiu em defesa dele.
A decisão do ministro Luis Fux de mandar suspender o processo enquanto o relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Marco Aurélio Mello, não decide, não poderia ser outra. Não havia atitude diferente a tomar, explica Fux, pois caso o relator venha a concordar com a tese de que as provas são inválidas, por exemplo, considerará a reclamação procedente, e as investigações feitas nesse intervalo seriam anuladas.
A atitude do filho de Bolsonaro de tentar impedir que a investigação prossiga desmente que ele seria o maior interessado em esclarecer todo o episódio, como alardeava. Desmente também declarações de seu pai, o hoje presidente Jair Bolsonaro, contra o foro privilegiado, uma delas, em vídeo, feita ao lado do próprio Flávio, que não abriu a boca, mas concordava com a cabeça.
Bolsonaro sugere nessa fala que só quer foro privilegiado quem tem culpa no cartório. Além disso, a atitude demonstra que seu filho Flavio quer proteger Queiroz, pois todos os envolvidos iriam para o STF por conexão. Há ainda em torno do caso diversas questões não esclarecidas, a última delas relativa à internação do motorista no Hospital Albert Einstein em São Paulo para operar um câncer. Quem custeou seu tratamento, já que ele não tem, em tese, dinheiro para isso?
O concreto é que Flavio Bolsonaro usou o foro privilegiado de senador, que ganhou ao ser diplomado em 18 de dezembro, para barrar as investigações, alegando que o Ministério Público do Rio utilizou-se de subterfúgios para evitar o controle do STF das investigações.
Ao conseguir dados da movimentação bancária de Flavio através do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o conhecido COAF, hoje nas mãos de Moro, mas na ocasião ligado ao Ministério da Fazenda, o Ministério Público do Rio teve acesso a dados referentes ao período em que ele já era senador, o que invalidaria as provas decorrentes.
Na decisão que suspendeu a investigação sobre Fabrício Queiroz, o ministro Luiz Fux considerou que somente o STF poderá avaliar em que medida o caso pode envolver Flávio Bolsonaro, que será empossado senador em fevereiro.
Os dois ministros do Supremo, Fux e Marco Aurélio, votaram da mesma maneira no julgamento do foro privilegiado, a favor da restrição mais ampla, o que indica que o relator do caso não vai acatar o pleito da defesa de Flavio. Mas o ministro Fux não pode tomar uma decisão baseado numa presunção.
O intrigante é que, ao levar o caso para o Supremo, Flavio Bolsonaro corre o risco de incluir seu pai na investigação, pois ele está envolvido diretamente. O presidente já deu uma explicação plausível, a de que a soma depositada na conta de sua mulher se trata de pagamento de uma dívida de Queiroz com ele. Como o caso aconteceu antes de Bolsonaro ser eleito presidente, não pode resultar em processo contra ele enquanto estiver no cargo. Mas investigações podem ser feitas.
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
O Globo: Caso Queiroz: Investigação parou, mas desgaste continua
por Bernardo Mello Franco
Não precisou do cabo nem do soldado. Na terceira semana de governo, o Supremo Tribunal Federal forneceu o primeiro alívio à família Bolsonaro. O ministro Luiz Fux mandou parar a investigação sobre Fabrício Queiroz, o motorista de R$ 1,2 milhão.
O pedido foi de Flávio Bolsonaro, o filho mais velho do presidente. Na semana passada, ele disse que não era investigado e que não tinha “nada a ver” com os rolos do ex-assessor. Dias depois, pensou melhor e pediu socorro ao Supremo. Fux matou no peito e chutou a bola para o mato.
Em dezembro, o senador eleito defendia que as suspeitas fossem esclarecidas “para ontem”. Agora apelou a uma manobra jurídica para brecar a investigação. Ele já havia faltado a um depoimento marcado pelo Ministério Público do Rio. Imitou o ex-assessor, que tem usado atestados médicos para adiar o encontro com os promotores.
O caso Queiroz mostra que a chegada ao poder já mudou as convicções da família presidencial. Na campanha, Jair e Flávio gravaram um vídeo contra a blindagem dos políticos com mandato. “Eu não quero essa porcaria de foro privilegiado”, disse o chefe do clã, enquanto o herdeiro concordava com a cabeça. Eleito senador, ele não esperou a posse para reivindicar a proteção. Bastou o primeiro escândalo e o discurso moralista ficou para trás.
Os Bolsonaro não foram os únicos a mudar de ideia. Em novembro, Fux votou a favor da limitação do foro a atos praticados no execício do mandato. Agora blindou o filho do presidente num caso anterior à eleição. Quando o motorista operava sua caixinha milionária, o futuro senador ainda ainda dava expediente na Assembleia Legislativa do Rio.
A investigação parou, mas o desgaste continua. Com o recurso de Flávio ao Supremo, o caso Queiroz se instala de vez na Praça dos Três Poderes. Em fevereiro, pode ganhar novo impulso ao chegar à mesa do ministro Marco Aurélio Mello. Fux atirou uma boia, mas o primogênito de Bolsonaro ainda corre o risco de se afogar.
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
O Estado de S. Paulo – Recurso de filho de Bolsonaro desgasta governo
Para auxiliares do presidente, estratégia usada por Flávio para se defender é um ‘tiro no pé’ porque contamina o Palácio do Planalto
Vera Rosa Tânia Monteiro / BRASÍLIA
O pedido feito pelo senador eleito Flávio Bolsonaro (PSLRJ) ao Supremo Tribunal Federal (STF) para a suspensão das investigações relativas a movimentações financeiras de seu ex-assessor Fabrício Queiroz causou mal-estar no Palácio do Planalto. Nos bastidores, auxiliares do presidente Jair Bolsonaro e ministros disseram que a estratégia usada por Flávio tem potencial para provocar mais desgaste ao novo governo.
Ao solicitar a suspensão das apurações, o filho de Bolsonaro alegou que o cargo de senador lhe confere foro especial no STF. Embora não tenha tomado posse – o que ocorrerá em 1.º de fevereiro –, Flávio já foi diplomado.
A argumentação contradiz discurso do presidente, que sempre disse ser contrário ao foro privilegiado. Além disso, houve incômodo no Planalto com o fato de Flávio sustentar que nada tinha a ver com essa situação e agora pedir para que as investigações envolvendo seu ex-assessor fossem suspensas.
Ao conceder a liminar, o ministro Luiz Fux, do STF, disse que deferia a solicitação do senador eleito “até que o relator da presente reclamação (Marco Aurélio Mello) se pronuncie quanto ao pedido de avocação do procedimento e de declaração de ilegalidade das provas que o instruíram”.
A estratégia usada por Flávio foi classificada por dois auxiliares de Bolsonaro como “um tiro no pé” porque pode contaminar o governo. Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) considerou a movimentação de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz, de janeiro de 2016 a janeiro de 2017, incompatível com seu patrimônio.
Aliados de Bolsonaro afirmaram que Flávio não deveria ter recorrido ao STF porque, com a iniciativa, deu a entender que teme a investigação. Em nota, a assessoria do filho do presidente declarou que a solicitação foi feita tendo em vista “nulidades diversas, como a quebra dos sigilos bancário e fiscal do senador para fins de investigação criminal, sem autorização judicial”. Jair Bolsonaro não se manifestou ontem sobre o assunto.
Militares.
Até agora, o núcleo político do governo tentava separar Bolsonaro de Queiroz. Mesmo assim, os militares sempre diziam que o ex-assessor deveria dar explicações o mais rápido possível para que não pairasse qualquer dúvida sobre o caso.
Em recente entrevista ao Estado, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, declarou que Queiroz precisava esclarecer os depósitos feitos na conta dele. “Acho que o problema é o Queiroz”, disse.
O chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno Ribeiro, chegou a afirmar que as explicações dadas por Queiroz careciam de mais “consistência”.
Sexta-feira: 18 de janeiro de 2019
O Estado de S. Paulo – Flávio Bolsonaro trava no STF investigação sobre ex-assessor
Ministro Luiz Fux atende a pedido do senador eleito e paralisa análise das movimentações financeiras de Queiroz
Constança Rezende / RIO
Rafael Moraes Moura Teo Cury / BRASÍLIA
O ministro Luiz Fux, do STF, atendeu a pedido do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e determinou a suspensão da investigação sobre movimentações financeiras atípicas do ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz. A decisão vale até que o ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo no STF, analise o caso quando o tribunal retomar as atividades, em 1.º de fevereiro. Fux também deixou para Marco Aurélio a decisão sobre o pedido de Flávio Bolsonaro para que as “provas” que “instruíram” a investigação sejam declaradas ilegais. Caberá a Marco Aurélio determinar se a investigação deve ficar ou não no STF. A suspensão da apuração ocorre na semana em que o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, disse que pode encerrar a investigação e propor ação penal sem que Queiroz e Flávio prestem depoimento. As movimentações financeiras de Queiroz foram apontadas em relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), revelado pelo Estado em dezembro. O documento foi enviado ao MPF na Operação Furna da Onça, que prendeu dez deputados estaduais suspeitos de receber propina.
O vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, atendeu a um pedido do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e determinou a suspensão da investigação sobre movimentações financeiras atípicas do ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz. A decisão de Fux paralisa a apuração e vale até o ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo no Supremo, analisar o caso depois que o tribunal retomar as suas atividades, em 1.º de fevereiro.
Fux também deixou com Marco Aurélio a decisão sobre o pedido de Flávio para que as “provas” que “instruíram” o procedimento de investigação criminal sejam declaradas ilegais. Marco Aurélio vai determinar se a investigação ficará ou não no STF.
Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), revelado pelo Estado em dezembro do ano passado, apontou movimentações atípicas de servidores da Assembleia Legislativa do Rio. O órgão constatou que, de janeiro de 2016 a 31 de janeiro de 2017, Queiroz movimentou mais de R$ 1,2 milhão em uma conta bancária. A quantia foi considerada incompatível com a renda do servidor, perto de R$ 23 mil mensais. Outros funcionários e ex-funcionários de 21 deputados também são investigados.
Neste período de pouco mais de um mês, Queiroz e Flávio faltaram aos convites para depor no procedimento criminal do Ministério Público fluminense.
A suspensão da apuração sobre as movimentações financeiras do ex-assessor ocorre na mesma semana em que o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, disse que pode encerrar a investigação e propor ação penal sem que Queiroz e Flávio prestem depoimento. A decisão de Fux foi tomada anteontem, horas depois de a defesa do senador eleito entrar com uma reclamação na Corte.
Reservadamente, um ministro do STF considerou que a reclamação feita pela defesa de Flávio levou o caso, até então circunscrito ao MP do Rio, para o Supremo – abrindo a possibilidade de a Procuradoria-Geral da República a investigar o senador eleito e, eventualmente, atingir até o presidente Jair Bolsonaro.
No período investigado, Queiroz fez repasses de R$ 24 mil para a primeira-dama, Michelle Bolsonaro. O dinheiro, segundo o presidente, era parte do pagamento de uma dívida com ele, feito na conta de sua mulher. Nathalia Melo de Queiroz, uma das filhas do ex-assessor, foi funcionária do gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara.
Foro.
O foro privilegiado – duramente criticado pelo presidente quando ainda era deputado – foi utilizado por Flávio para fundamentar os pedidos de suspensão das investigações e de anulação das provas. Em vídeo intitulado “Quem precisa de foro privilegiado?, publicado em março de 2017, Flávio aparece ao lado do pai, que diz: “Eu não quero essa porcaria de privilégio”.
Ao acionar o STF, a defesa de Flávio ressaltou que, em 14 de dezembro do ano passado, depois das eleições, o Ministério Público fluminense pediu informações ao Coaf referentes ao período de 2007 para cá sobre dados sigilosos do senador eleito, o que representaria “usurpação de competência do Supremo”.
Em maio do ano passado, a Corte reduziu o alcance do foro privilegiado para os crimes cometidos no exercício do mandato e em função do cargo – Fux foi um dos sete ministros que votaram a favor desta tese. Na ocasião, foi enfático na restrição do alcance do foro: “Ora o candidato exerce um cargo, ora exerce outro. Quando o processo baixa, ele não anda. Se ele baixa e não anda, quando ele voltar já está prescrito. Então é preciso, efetivamente, que ele tenha um juízo próprio e que o Supremo seja reservado somente para os ilícitos praticados no cargo e em razão dele”, afirmou Fux.
No despacho, o ministro destacou que Flávio foi diplomado no cargo do senador da República, “o qual lhe confere prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal”. Ao suspender as investigações, Fux apontou que cabe ao Supremo decidir se tem ou não competência para cuidar do caso. O ministro afirmou que suspendeu as investigações com o “fim de proteger a efetividade do processo”.
Em entrevista ao Estado, ele defendeu sua decisão. “Tomei uma medida de urgência provisória até o pronunciamento do ministro Marco Aurélio, que deve ocorrer daqui a nove dias úteis, quando acaba o recesso. A minha atuação antecedente e independente em todos os processos demonstra não ser inerente à minha atuação suspender investigações fundadas.”
Quarta-feira: 16 de janeiro de 2019
Programa humorístico Tá no Ar, da Globo, faz paródia de Bolsonaro e seu estilo de governar.
https://www.youtube.com/watch?v=1OGXE0l20Po
Sexta-feira: 11.1.2019
Folha de S.Paulo – Dra. Rosangela Moro, chega de mimimi
Raquel Landim
Advogada fez post no Instagram pedindo que as pessoas parassem de reclamar
Na terça-feira (8) à noite, Rosangela Moro, esposa do ministro da Justiça, Sérgio Moro, fez um post no Instagram pedindo que as pessoas parassem de reclamar e esperassem para ver a que veio o novo governo.
Em tom patriótico, a advogada dizia que os brasileiros precisam se conscientizar que somos um só povo para permitir o avanço do país. E completava: – “chega de mimimi, espere e assista”.
O apelo de Rosangela faz eco ao dos demais apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PSL) nas redes sociais, que enxergam qualquer notícia negativa sobre a nova administração como uma torcida contra o país.
A esposa de Moro não revelava no post, mas provavelmente ela se referia naquele momento a confusão sobre o aumento da alíquota do IOF: o presidente disse que o imposto havia subido, mas foi desautorizado por um subordinado.
É verdade que o novo governo só tem 15 dias, mas depois dessa vieram muitas outras: redução do imposto de renda que não ocorreu, o vai e vem sobre a venda da Embraer, a não confirmada idade mínima da reforma da Previdência, o presidente demitido da Apex que se recusa a deixar o cargo. E isso para ficar só na economia.
Rosangela Moro me fez lembrar Dilma Rousseff – isso mesmo, a ex-presidente petista. Na campanha de 2014, Dilma não perdia a oportunidade de atacar os “pessimistas”, aqueles que “torciam contra o país”, os “arautos da crise”.
A economia já dava todos os sinais de que caminhava para uma severa recessão, mas a então mandatária se recusava a admitir o óbvio e se defendia, acusando os críticos de não serem a favor do Brasil. Deu no que deu.
É claro que o Brasil hoje vive outro momento. Bolsonaro tem os mercados a seu favor, ainda na expectativa de que sua equipe de liberais consiga implementar as reformas que o país tanto precisa.
Mas apontar os problemas não é antipatriótico. Chama-se fiscalização e é o trabalho da imprensa. É bom os bolsonaristas já irem se acostumando. Depois da repercussão do post, a esposa de Moro apagou a publicação – ainda bem. Afinal, Dra Rosangela, chega de mimimi.
Sexta-feira: 11 de janeiro de 2019
Folha de S.Paulo – Filho de Bolsonaro propõe revisão histórica sobre ditadura em livro didático
Declaração ocorre em meio a recuo do governo federal em edital de obras escolares
Após o Ministério da Educação anular um polêmico edital de livros didáticos, o presidente, Jair Bolsonaro (PSL), e seu filho deputado, Eduardo, fizeram publicações nas redes sociais em que atacam supostas doutrinações de esquerda na educação e em materiais escolares.
O presidente compartilhou mensagem de um usuário citando que há “picuinhas com as decisões” do presidente sobre educação enquanto publica imagens de materiais que tratariam o socialismo de forma positiva. Já o filho propõe revisionismo histórico sobre ditadura e chama ex-combatentes de esquerda de assassinos.
Bolsonaro já defendeu a tortura e disse que o regime militar entre 1964-1985 no Brasil não foi uma ditadura, o que contraria os fatos históricos. O presidente apoia o movimento Escola sem Partido que tem entre suas premissas mostrar os supostos dois lados dos conteúdos ensinados na escola.
Eduardo Bolsonaro publicou no Twitter mensagens em que afirma que a ditadura militar é mal retratada pelos livros didáticos. “Um povo sem memória é um povo sem cultura, fraco. Se continuarmos no nosso marasmo os livros escolares seguirão botando assassinos como heróis e militares como facínoras.”
Ele diz que o Brasil precisa ser passado a limpo. “Os militares saíram em 1985 e até hoje vejo matérias na imprensa mentido sobre o que foi aquele período, só p/enaltecer a PTzada”.
No Instagram, o presidente compartilhou uma publicação de um usuário que afirma que: “o jornalismo brasileiro está tentando arrumar picuinhas com as decisões do @jairbolsonaro sobre a educação no Brasil. Esse mesmo jornalismo ignorou completamente isso aqui”. Após a frase, aparecem reproduções de supostas páginas de livros didáticos citando o socialismo, uma foto do que seria o centro de difusão do comunismo em uma universidade federal. Outra imagem é de uma reportagem da revista Veja em que aparece a foto de Che Guevara.
A revisão de livros didáticos como forma de combate a supostas doutrinações de esquerda será um dos focos do governo e tem sido articulada desde antes da posse do presidente e do ministro, Ricardo Vélez Rodriguez. Essa é a principal agendas na área de Educação do governo Bolsonaro.
A Folha revelou nesta quarta (9) que um edital para compra de livros didáticos foi alterado e deixou de exigir das editoras obras com referências bibliográficas e o compromisso com a agenda da não violência contra as mulheres, promoção das culturas quilombolas e dos povos do campo. As obras poderiam ter erros também.
Após a repercussão negativa, o governo soltou nota afirmando que suspendeu a nova versão e que a culpa era do governo Michel Temer. Já o ex-ministro da Educação negou a autoria das modificações.
Depois, o governo instalou uma sindicância com o objetivo de, segundo o MEC, apurar algum erro ou troca de versões. Esse erro teria feito com que o texto que suprimia exatamente esses trechos acabasse publicado, de modo equivocado.
Sexta-feira: 11 de janeiro de 2019
Valor – ‘Não sei o que fazem fora do gabinete’, diz Flávio
Por Cristian Klein | Do Rio
O deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) deixou de comparecer ontem a audiência no Ministério Público do Rio para dar explicações sobre a movimentação atípica de R$ 1,2 milhão, identificada na conta de seu ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz, mas concedeu entrevista sobre o caso ao SBT, exibida à noite. Aos promotores, Flávio Bolsonaro alegou que não teve acesso aos autos da investigação, e, em mensagem publicada no Facebook, afirmou que só teria sido notificado do convite para depor na segunda-feira, 7 de janeiro, às 12h19. Em nota, o MP informou que o procurador-geral de Justiça encaminhou ofício à presidência da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) no dia 21 de dezembro.
Na entrevista à TV, Flávio Bolsonaro afirmou que o escândalo seria uma perseguição política, para “tentar desestabilizar” o governo do pai, o presidente da República Jair Bolsonaro, e repetiu que precisa de tempo e acesso aos autos para dar explicações ao MP. “É o tempo de eu tomar ciência do que é, se tiver que produzir algum documento e levar lá ao Ministério Público, esclarecer e ficar longe dessa coisa, que eu não tenho nada a ver com isso. Vou lá sepultar qualquer dúvida que eles tenham em relação à minha pessoa”, disse.
Ao mesmo tempo, Flávio argumentou que a movimentação atípica apontada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) pode ser explicada pelos rendimentos de Queiroz como policial militar e assessor parlamentar, além dos depósitos feitos na conta pela mulher dele, Márcia, e pelas filhas Nathália e Evelyn. “Se você pega o salário dele no meu gabinete mais o que recebe na Polícia Militar e mais o que os familiares depositavam na conta dá quase esse valor [de R$ 1,2 milhão]”, disse Flávio.
Para justificar a diferença, porém, Queiroz já alegou que fazia bicos de segurança e vendia carros usados – embora não tenha apresentado ainda os recibos. Flávio afirmou que não “está fazendo a defesa” de Queiroz e disse que ele tem que ir, “o quanto antes”, ao Ministério Público. Mas o ex-assessor já faltou a quatro depoimentos, os dois últimos sob justificativa de que precisa cuidar de um câncer de cólon. Queiroz foi submetido a uma cirurgia para a retirada do tumor no dia 1º, no hospital Albert Einstein, em São Paulo. A mulher e as filhas também faltaram a depoimento no MP, na terça-feira, e a defesa alegou que elas se mudaram temporariamente para a capital paulista para cuidar de Queiroz.
A suspeita é de que a conta do ex-assessor tenha sido usada para Flávio receber parte ou a totalidade dos salários dos funcionários lotados em seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio. A conta de Queiroz recebeu depósitos de oito ex-funcionários, entre eles o da mulher e das filhas. Flávio Bolsonaro afirmou que não sabe “o que as pessoas do meu gabinete fazem da porta para fora” e que os casos de movimentações atípicas relacionadas a outros 21 deputados estaduais não têm recebido a mesma atenção. O senador eleito se comprometeu a escolher nova data e horário para depor no MP, uma prerrogativa que tem como parlamentar.
Quinta-feira: 10 de janeiro de 2019
O Globo: charge de Chico Caruso
A charge mostra as disputas entre Onix Lorenzoni, chefe da Casa Civil, e Paulo Guedes, ministro da Economia. Mais: Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, envolvido com movimentações movimentações atípicas em sua conta de 1,2 milhão de reais e que levantaram crise em torno do presidente eleito Jair Bolsonaro, pai de Flávio. E o ministro Moro, da Justiça, que não vê nada o que Queiroz faz ainda que o ex-assessor tenha dito em entrevista ao SBT que faz dinheiro.
Quinta-feira: 27 de dezembro de 2018
O Estado de S.Paulo ‘Sou um cara de negócios. Eu faço dinheiro’, diz Queiroz sobre caso Coaf
Pivô do principal problema político do presidente eleito Jair Bolsonaro, ex-assessor de Flávio Bolsonaro falou pela primeira vez sobre movimentações atípicas em sua conta
O ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), Fabrício Queiroz, falou em público pela primeira vez sobre as movimentações atípicas de R$ 1,2 milhão em sua conta, apontadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e que levantaram uma crise em torno do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), pai de Flávio.
Em entrevista ao SBT, ele atribui o dinheiro a seus negócios com venda de carros, diz que não é laranja. Queiroz, contudo, não explica os depósitos feitos em sua conta por funcionários do gabinete e familiares empregados por Flávio e o presidente eleito.
“(Eu ganhava) cerca de R$ 10 mil por mês (como assessor)”, disse Queiroz. “Ainda tinha da minha ex-funcao. cerca de R$ 10 mil a R$ 11 mil. (Por mês), em torno de R$ 23 mil. Sou um cara de negócios. Eu faço dinheiro”, disse Queiroz. “Compro, revendo, compro, revendo, compro carro, revendo carro, sempre fui assim. Gosto muito de comprar carro em seguradora, na minha época lá atrás, eu comprava um carrinho, mandava arrumar, vendia.”
Perguntado sobre os depósitos feitos em favor da futura primeira-dama Michelle Bolsonaro, Queiroz disse que “nosso presidente já esclareceu. Tinha um empréstimo de R$ 40 mil. Foram 10 cheques de R$ 4 mil. Nunca depositei R$ 24 mil.”
Ele disse que falará apenas ao Ministério Público sobre depósitos feitos em sua conta por familiares e outros funcionários dos gabinetes de Flávio e de seu pai. “Esse mérito do dinheiro, eu quero explicar ao MP. São pessoas da minha família. Eu gero o dinehiro da minha família. Minhas filhas trabalham comigo desde os 15 anos. Quando tinha vaga (nos gabinetes), eu pedia para empregá-las. Minha filha que sempre cuidou da mídia do deputado dará esclarecimento.”
Queiroz disse que não é “laranja” de Flávio Bolsonaro e saiu em defesa do senador eleito, com quem diz não ter mais contato. “Não tenho falado com ele. É a coisa mais triste do mundo. Me abati muito. O que ele está passando na rua achando que eu tenho negociata, pelo amor de Deus, isso não existe. No nosso gabinete, não se falava em dinheiro. Toda hora tinha gente pedindo dez reais, mas não se dá dinheiro, não se fala em dinheiro. É covardia atribuir a Flávio o que está acontecendo. Não sou laranja, sou trabalhador.”
O ex-assessor diz não estar “fugindo” e diz que chegou a achar que seria preso. “Em momento algum estou fugindo. Quero depor na frente ao promotor. Agradeço ao promotor por não me prender. Falei: ‘vou ser preso’. Pedi exoneração para cuidar da minha reforma e do meu problema de saúde. Foi uma surpresa isso. Caiu como uma bomba para mim e minha família.”
Entenda o caso Coaf
Queiroz passou a ser o pivô do principal problema político do presidente eleito Jair Bolsonaro quando o Estado revelou, no dia 6 de dezembro, que um retalório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) apontou movimentações atípicas em suas contas.
Segundo o documento, o ex-assessor do senador eleito, Flávio Bolsonaro, movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. Uma das movimentações foi o depósito de um cheque de R$ 24 mil na conta da futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro - no início de dezembro, Bolsonaro disse que o cheque era o pagamento de um empréstimo. O Estado revelou ainda que funcionários do gabinete de Flávio chegaram a depositar 99% do que receberam no período na conta de Queiroz, e que a maioria das transferências foram feitas no dia ou em datas próximas ao pagamento na Alerj.
Esta é a primeira vez que o ex-assessor fala publicamente sobre o assunto. Por duas vezes, Queiroz alegou problema de saúde para não comparecer ao depoimento que seria prestado ao Ministério Público nos dias 19 e 21 deste mês. No dia 7 de dezembro, Flávio Bolsonaro disse ter conversado com Queiroz, e afirmou que ele teria lhe dado “explicações convincentes” para o episódio, mas não disse quais seriam elas. O MPRJ informou que também pedirá para que Flávio Bolsonaro preste esclarecimentos sobre o caso, no dia 10 de janeiro.
De acordo com Queiroz, ele precisará fazer uma cirurgia por conta de um tumor maligno no intestino. “Tenho uma cirurgia pra fazer no ombro (esquerdo). estava com problema na urina, tosse. E foi constatado um câncer. É um câncer maligno, indicado sem nem pegar a biopsia. Vou ser submetido a outros exames e (o médico) me disse que temos que operar o mais rápido possível. É um tumor grande no intestino. As fezes passam fininho. Não estou fugindo do MP. Quero prestar esclarecimento.“
Quinta-feira: 27.12.2018
G1 – Ex-assessor de Flávio Bolsonaro citado pelo Coaf diz ao SBT que não é laranja
https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/12/26/ex-assessor-de-flavio-bolsonaro-citado-pelo-coaf-diz-ao-sbt-que-nao-e-laranja.ghtml
Nome de Fabrício de Queiroz apareceu em relatório sobre movimentações financeiras atípicas de funcionários da Assembleia Legislativa do Rio.
Fabrício de Queiroz, ex-assessor do deputado estadual e senador eleito pelo PSL, Flávio Bolsonaro, deu uma entrevista nesta quarta-feira (26) ao SBT. É a primeira vez que Queiroz fala depois que o nome dele apareceu em um relatório do Coaf sobre movimentações financeiras atípicas de funcionários e ex-funcionários da Assembleia Legislativa do Rio. No caso de Fabrício de Queiroz, a movimentação foi de um R$ 1,2 milhão durante um ano, segundo o Coaf.
Entre as transações, estão R$ 24 mil depositados na conta de Michele Bolsonaro, mulher de Jair Bolsonaro. O presidente eleito informou que este valor se refere ao pagamento de parte de uma dívida de R$ 40 mil que Queiroz tinha com o próprio Bolsonaro. O relatório do Coaf foi elaborado para a Operação Furna da Onça, que prendeu dez deputados estaduais do Rio em novembro.
Na conta de Fabrício, o Coaf encontrou depósitos de funcionários do gabinete do deputado Flávio Bolsonaro e, também, de parentes de Fabrício, que trabalhavam no gabinete. Queiroz foi convocado duas vezes pelo Ministério Público para prestar depoimento, mas faltou as duas vezes, alegando problemas de saúde. Na entrevista ao SBT, Queiroz alegou que o dinheiro era fruto de negócios que fazia.
“Eu sou um cara de negócios. Eu faço dinheiro. Compro, revendo. Compro carro, revendo carro. Sempre fui assim. Gosto muito de comprar carro em seguradora. Na minha época, lá atrás, comprava um carrinho, mandava arrumar, vendia”, contou Queiroz.
Ao SBT, o ex-assessor Fabrício de Queiroz repetiu a explicação do presidente eleito Jair Bolsonaro sobre o depósito de R$ 24 mil reais na conta da futura primeira-dama, Michele Bolsonaro.
“Nosso presidente já esclareceu, tive um empréstimo de R$ 40 mil, passei dez cheques de R$ 4 mil. Nunca depositei R$ 24 mil”, disse Queiroz.
Fabrício Queiroz disse ao SBT que só vai explicar os depósitos de funcionários do gabinete em sua conta bancária ao Ministério Público. Essa é a principal questão que o MP quer esclarecer e que o assessor não explicou na entrevista exibida nesta quarta-feira. Mas negou que ele e os funcionários repassassem parte de seus salários ao deputado Flávio Bolsonaro.
“No nosso gabinete, a palavra lá é: não se fala em dinheiro, não se dá dinheiro. Toda hora bate alguém no gabinete pedindo R$ 10, pedindo remédio. É proibido falar em dinheiro no gabinete, nunca, nunca. Isso é uma covardia rotular o que está acontecendo comigo ao deputado Flávio Bolsonaro. Eu não sou laranja. Sou homem trabalhador, tenho despesa imensa por mês”.
Na entrevista ao SBT, Queiroz negou que Flávio Bolsonaro tenha alguma coisa a ver com a sua movimentação bancária.
“Eu me abati muito, minha calça está caindo… Aí eu falei, caramba, acabou minha vida, eu era amigo do cara, o que ele está passando na rua, entendeu, achando que eu tenho negociata com ele, pelo amor de Deus, isso não existe, eu vou provar junto ao MP”.
Na entrevista ao SBT, Fabrício Queiroz falou ainda sobre os problemas de saúde que, segundo ele, o impediram de prestar depoimento no Ministério Público. Ele disse que tem uma cirurgia marcada para fazer no ombro. Mencionou um problema na urina e uma tosse forte e afirmou que descobriu um câncer no intestino.
Segundo Fabrício Queiroz, o médico disse que o tumor é maligno e que ele precisa ser operado o mais rapidamente possível.
Quarta-feira: 26.12.2018
Folha de S.Paulo – Cadê o Fabrício Queiroz?
Elio Gaspari
O caso do assessor dos Bolsonaro só fez piorar, pois a estratégia do silêncio é suicida
O PM Fabrício Queiroz continua sumido. Quem conhece o mundo das malfeitorias garante: “É suicídio”. Ele não aparece em casa e não compareceu aos depoimentos combinados com o Ministério Público.
Admita-se que esteja com os nervos em pandarecos, pois passou de amigo da Primeira Família para o centro de uma rede de movimentações financeiras pra lá de suspeitas. Seu ex-chefe, o senador eleito Flávio Bolsonaro, diz que ouviu seu relato e achou-o “bastante plausível”. Só se poderá confiar nessa plausibilidade depois que o relato se tornar público.
Uma coisa é certa: a história segundo a qual Queiroz deixou a assessoria de Flávio Bolsonaro no dia 15 de outubro para tratar de sua aposentadoria não fica em pé.
Ele foi exonerado no dia seguinte ao aparecimento da notícia de suas movimentações bancárias “atípicas”. Além disso, no mesmo dia, foi exonerada sua filha Nathalia, que estava lotada no gabinete de Jair Bolsonaro, em Brasília. Quando os dois tornaram-se “ex-assessores”, faltavam 13 dias para o segundo turno.
O silêncio de Queiroz faz com que suas movimentações financeiras “atípicas” continuem apenas como algo suspeito. Um depósito de R$ 24 mil na conta da mulher de Jair Bolsonaro já foi explicado por ele como parte do pagamento de um empréstimo pessoal.
O presidente eleito reconheceu que não informou a transação à Receita Federal, mas atire a primeira pedra quem já não fez isso com uma pessoa de suas relações.
Outros murmúrios, saídos de fontes anônimas, falam em venda de objetos eletrônicos a conhecidos. Coisa de R$ 600 mil ao longo de 13 meses, caso se olhe só para o que entrava em sua conta. Mesmo assim, o feirão de Queiroz movimentava quantias muito superiores ao seu rendimento como suboficial da PM e assessor de um deputado estadual.
Queiroz não é um PM qualquer. Além da ligação com os Bolsonaro, sua folha é a de um militar premiado. Foi homenageado pela Assembleia Legislativa e ganhou a medalha Pedro Ernesto.
Há anos, como soldado, recebeu o abono, hoje extinto, dado aos PMs por atos de bravura em confrontos com bandidos. Era a “gratificação faroeste”. (Quando esse benefício foi instituído, em seus confrontos a PM do Rio matava duas pessoas e feria uma. Dois anos depois, matava quatro para cada ferido.)
Está nas livrarias “O Infiltrado – Um Repórter dentro da PM que mais mata e mais morre no Brasil”, de Raphael Gomide. Em 2007 ele fez concurso para a PM do Rio, passou pelo treinamento e serviu por 22 dias como soldado. Lá, um ex-comandante da corporação admite que a “gratificação faroeste” foi um estímulo à “cultura da violência”.
O silêncio de Queiroz pode ser eficaz para quem olha para o tempo político. É suicídio porque esse tempo nada tem a ver com o do Ministério Público. Os procuradores não têm pressa, têm perguntas. Se ele movia tanto dinheiro porque transacionava com mercadorias, deverá dizer de quem as comprava e para quem as vendia.
A esperança de que Queiroz passe pelo Ministério Público administrando um silêncio seletivo é suicida. Peixes grandes como Marcelo Odebrecht e Antônio Palocci tiveram a mesma ilusão. Queiroz é um lambari, sua movimentação financeira não compraria um dos relógios com que as empreiteiras mimavam maganos.
Contudo, sua trajetória e seu silêncio são ilustrativos do que vem junto com a “cultura da violência”. Ele foi da PM para um gabinete na Assembleia Legislativa do Rio, empregou parentes e tem a confiança da Primeira Família da República, cujo chefe elegeu-se presidente com uma plataforma moralista e justiceira.
Quarta-feira – 26.12.2018
O Globo – Lauro Jardim (por Guilherme Amado)
O Natal de paz dos Bolsonaro
A uma semana da posse, Jair, Eduardo e Carlos Bolsonaro passaram o Natal ontem puxando briga no Twitter. Os alvos foram partidos de esquerda, a imprensa e até o Facebook. Um Natal em paz.
Folha de S.Paulo – Reação seletiva
Pablo Ortellado
Direita faz campanha contra o fechamento de páginas no Facebook, mas silencia sobre o desaparecimento da maior fábrica de notícias hiperpartidárias
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, se manifestou publicamente, pelo Twitter, no sábado (22) contra o fechamento de dezenas de perfis e páginas de direita no Facebook, entre eles o perfil do deputado eleito pelo Paraná Paulo Martins (PSC), o ex-coordenador do MBL no Paraná Eder Borges e uma das maiores páginas de notícias hiperpartidárias de direita, a República de Curitiba.
Não é a primeira vez que Bolsonaro e seu campo político criticam o Facebook por retirar páginas e perfis que violam sua política de autenticidade, que impede a criação de perfis falsos ou enganosos e as manipulações feitas a partir deles. Curiosamente, na ação desse tipo que mais impactou o seu campo político, em plena campanha eleitoral, Bolsonaro e seus aliados se calaram.
Em julho, quando centenas de páginas do MBL foram suspensas por violarem a política de autenticidade da plataforma, a direita promoveu uma grande campanha contra o que chamou de censura. Na ocasião, o MPF de Goiás pediu sucessivos esclarecimentos à empresa para comprovar os vínculos das páginas com o MBL. Apenas parte desses esclarecimentos foram tornados públicos.
No começo de agosto, foi a vez de o Twitter ser alvo de críticas por pedir que contas de direita com comportamento suspeito passassem por um processo simples de verificação de identidade. A direita reagiu lançando a hashtag #DireitaAmordaçada.
No episódio da semana passada, chama a atenção a conexão entre as páginas e os perfis suspensos.
Embora a nota do porta-voz do Facebook tenha se limitado a dizer que as exclusões fazem parte do trabalho permanente de remover “páginas e perfis que estavam violando nossas políticas de autenticidade”, o fato de as páginas e os perfis serem do Paraná, do mesmo campo político e terem sido excluídos na mesma ação sugere que podem fazer parte de uma mesma rede articulada, assim como aconteceu com o MBL em julho.
Mas enquanto as ações das plataformas nos três episódios foram respondidas com amplas campanhas de protesto, o caso de maior impacto no campo da direita foi recebido com silêncio.
No dia 22 de outubro, o Facebook removeu páginas e perfis operados pela rede RFA, responsável pelos mais influentes sites de notícias hiperpartidários em operação no Brasil. As páginas compunham simplesmente a maior rede de apoio à campanha de Bolsonaro no Facebook.
Sua supressão, em plena campanha eleitoral, praticamente não foi lamentada pelos atores da nova direita e não gerou grandes protestos. A diferença de comportamento neste e nos outros casos deveria pelo menos levantar suspeitas.
Quinta-feira: 20.12.2018
Estadão: Ex-assessor de Flávio Bolsonaro adia depoimento
Advogado de Fabrício Queiroz alega problema de saúde e pouco tempo para analisar autos; Coaf apontou movimento atípico em conta
Constança Rezende – Rio
Ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), Fabrício José Carlos de Queiroz faltou ontem ao depoimento que prestaria ao Ministério Público Estadual do Rio. O MP informou, por nota, que o advogado do ex-funcionário da Assembleia Legislativa fluminense alegou problemas de saúde do cliente e pouco tempo para analisar os autos da investigação.
A audiência para esclarecer movimentações atípicas na conta do ex-servidor do Legislativo, apontadas em relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) revelado pelo Estado, foi remarcado para amanhã. Segundo o MP-RJ, os advogados de Queiroz informaram os problemas no início da tarde de ontem. O ex-assessor estaria em ‘atendimento para realização de exames médicos de urgência, acompanhado de sua família.
A investigação corre sob sigilo. É conduzida pelo Grupo de Atribuição Originária em Matéria Criminal do MP-RJ. A reportagem não conseguiu contato com os advogados de Queiroz ontem.
Nessa semana, o MP-RJ informou que abriu 22 procedimentos de investigação criminal com base no relatório do Coaf. O documento apontou movimentações atípicas em contas de ao menos 75 assessores de deputados estaduais. Entre os investigados está Queiroz, que também é policial militar.
O Coaf identificou movimentação atípica de mais de R$ 1,2 milhão em conta de Queiroz entre 1º de janeiro de 2016 e 31 de janeiro de 2017. Para o órgão federal, que produziu o documento na Operação Furna da Onça, que investiga corrupção no Legislativo fluminense, a renda do ex-assessor é incompatível com esse montante.
Da conta de Queiroz, identificou o Coaf, saíram R$ 24 mil depositados em nome da futura primeira-dama, Michele Bolsonaro. O presidente eleito, Jair Bolsonaro, disse que tratava do pagamento de uma dívida de R$ 40 mil do policial militar com ele. Bolsonaro não apresentou documentos comprovando suas afirmações e evita falar no assunto.
O Coaf também detectou que a conta de Queiroz recebeu repasses regulares de outros funcionários de Flávio. O Estado mostrou que mais da metade desses depósitos ocorreu no dia de pagamento de salários na Alerj ou até três dias úteis depois.
Uma das funcionárias que fizeram repasses a Queiroz foi sua filha Nathalia. Ela foi assessora de Flávio e, depois, de Jair Bolsonaro na Câmara de Deputado. No período, tinha outra atividade profissional no Rio, como personal trainer. O Estado mostrou que a servidora repassou ao pai o equivalente à maior parte do que ganhou.
Desde a divulgação dos dados, Queiroz não se justificou em público e está desaparecido. Para a reportagem, o ex-assessor disse que não sabia nada sobre o assunto. O nome de Queiroz consta na folha de pagamento da Alerj de setembro com salário de R$8.517. Ele era lotado com cargo em comissão de Assessor Parlamentar III, símbolo CCDAL-3, no gabinete de Flávio. Conforme o relatório do Coaf, ele acumulava rendimentos mensais de R$ 12,6 mil da Polícia Militar. Queiroz foi exonerado em 15 de outubro.
Anteontem, Flávio Bolsonaro afirmou ‘não ter a menor dúvida’, de que as denúncias que envolvem seu assessor tinham ele e o presidente como alvo. O parlamentar disse considerar mal explicado o fato de que apenas questões envolvendo seus assessores terem se tornado públicas, quando haveria ‘um monte de gente lá nessa situação também’.
‘Erro’ – No dia 12, em transmissão ao vido no Facebook, o presidente eleito disse que nem ele nem Flávio são investigados no caso. ‘Se algo estiver errado, que seja comigo, com meu filho, com Queiroz, que paguemos a conta desse erro, que nós não podemos comungar com o erro de ninguém’, declarou.
Terça-feira: 18.12.2018
Folha: Um escândalo didático
Hélio Schwartsman
São Paulo – Imagine, dileto leitor, que estejamos em 2021. Já transcorreu um pouco mais da metade do mandato presidencial de Jair Bolsonaro. Seu plano econômico, capitaneado pelo ex-ministro Paulo Guedes, fracassou. O governo não conseguiu equilibrar as contas públicas, o desemprego aumentou, empresas estão quebrando e a inflação vem aumentando resolutamente a cada mês.
Numa situação dessas a notícia de que a mulher do presidente recebeu um cheque de R$ 24 mil do ex-assessor de um dos filhos, cuja movimentação bancária é incompatível com seus rendimentos declarados, teria boa chance de resultar em impeachment.
Fernando Collor, vale lembrar caiu por causa de um Fiat Elba; Dilma, devido a pedaladas fiscais. Mas é importante não confundir os gatilhos das deposições, que podem ser motivos banais ou graves, com o contexto político-econômico que as determinou, isto é, com crises graúdas. Em 2005, com a economia em forma, Lula sobreviveu ao mensalão.
Como Bolsonaro acaba de ser eleito e ainda não teve tempo de produzir seus próprios desastres econômicos e políticos, é improvável que o Coafgate venha a causar-lhe grandes problemas aproximadamente. Acredito que as autoridades irão levar a investigação em banho-maria, para utilizá-la como trunfo político em caso de emergência.
Embora ainda não haja elementos fáticos para afirmar nada com segurança, a operação flagrada pelo Coaf cheira a ‘pedágio’, a prática ilegal, mas corriqueira entre parlamentares, de apropriar-se de parte de salários de seus assessores.
Mesmo que não dê em nada, o escândalo é didático, pois mostra que Bolsonaro só é mito na cabeça de seus seguidores mais cegos. O padrão ético do futuro presidente e seus familiares é, como o da maioria dos homens, produto do meio em que vivem, que, no caso é o baixo clero da política, repleto de ‘pedágios’, funcionários-fantasmas e outras espertezas antirepublicanas.
Terça-feira: 18.11.2018
Folha: Charge de Laerte
Quarta-feira: 12.12.2018
Charge de O Globo sobre o Coafgate
Quarta-feira: 12.12.2018
Sensacionalista: Charge a respeito de Moro quando confrontado com o Coafgate que envolve a família Bolsonaro
Terça-feira: 11.12.2018
Folha de S.Paulo – Explicação de Bolsonaro sobre cheque representa a velha e carcomida política
Ranier Bragon
Caso exige resposta cabal e irrefutável em vez de silêncio ou embromação
As explicações, ou melhor, a falta de explicações do presidente eleito, Jair Bolsonaro, sobre o cheque de R$ 24 mil na conta de sua mulher, Michelle, mostra todo o esplendor da nossa velha, bolorenta, carcomida, decrépita, putrefata política.
Eleito para pôr termo às “práticas do passado” —expressão que repetiu em sua diplomação, nesta segunda-feira (10)—, para mudar tudo isso aí, como se portou Bolsonaro diante da revelação de que um ex-assessor de seu filho Flávio movimentou uma minifortuna em uma infindável triangulação bancária, incluindo o cheque para Michelle?
Depois de um período mudo, afirmou que o dinheiro era o recebimento de uma dívida e que nada declarou à Receita. No mais, disse que não é ele quem tem que se explicar.
E sobre o trabalho que uma filha do assessor exerceu em seu gabinete na Câmara dos Deputados por quase dois anos? “Pelo amor de Deus, pergunta para o chefe de gabinete. Eu tenho 15 funcionários no gabinete!”
Seus futuros ministros também não se saíram muito melhor. Onyx Lorenzoni (Casa Civil) deu o velho e bom chilique pra tentar afastar repórter abelhudo. Sergio Moro (Justiça) desapareceu em meio a tchauzinhos em looping na primeira vez em que foi questionado. Na segunda, disse que seu futuro chefe já “apresentou algum esclarecimento”.
Por mais admirável que seja a docilidade que acometeu o coração de Moro desde que ele aposentou a toga, há muito ainda a ser esclarecido.
Uma suspeita de tal gravidade exige satisfação imediata, acompanhada de provas, extratos bancários, testemunhos. O motorista é quem tem que responder? Traga-o à baila. Ou então diga por que ele não dá as caras. Acometeu-se de uma terrível amnésia e não sabe o suposto trabalho que a filha do assessor lhe prestou por quase dois anos? Passe a mão no telefone e pergunte ao seu chefe de gabinete: “Fulano, que raios exatamente fez/fazia a fulana?”.
Se Bolsonaro não vê necessidade em dar essas explicações, me desculpem, não há nada de novo no front.
Terça-feira: 11.12.2018
O Globo – Assessores citados pelo Coaf evitam aparecer e já preparam defesa
JULIANA CASTRO E IGOR MELLO
Ex-assessor do deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL) e citado em relatório do Coaf por conta da “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017, o policial militar Fabrício José Carlos de Queiroz mora em uma casa simples e sem pintura externa, em um beco no bairro da Taquara, na Zona Oeste do Rio.
Na viela onde Queiroz mora com a mulher, Márcia Aguiar, os imóveis são colados uns aos outros. No beco há varais improvisados do lado de fora das casas, fios emaranhados e canos aparentes. Na casa de Queiroz, um adesivo rasgado com as fotos do presidente eleito Jair Bolsonaro e de seu filho Carlos, vereador no Rio, está colado na fachada. No segundo andar, que tem a laje sem revestimento, tapetes secavam no parapeito ainda sem janela.
No portão que dá acesso ao conjunto de aproximadamente 70 casas, distribuídas em uma rua mais larga e vielas, há um aviso de que a área é monitorada 24 horas.
O GLOBO esteve ontem na residência de Queiroz, mas não encontrou nem ele e nem a mulher, Márcia. Vizinhos confirmaram que o casal vive na casa.
O relatório do Coaf que cita Queiroz foi anexado à Operação Furna da Onça, que prendeu deputados estaduais. O Ministério Público do Rio já tem procedimentos em curso, que correm sob sigilo, para investigar possíveis irregularidades cometidas por servidores da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), com base no relatório do Coaf. O MP não esclarece se as movimentações financeiras de Queiroz estão sob investigação.
O Coaf elaborou relatórios a pedido do Ministério Público Federal. Os procuradores ressalvam que a identificação desse tipo de movimentação não configura um ilícito por si só.
NOVA ROTINA NO GABINETE
Na Alerj, a repercussão do caso alterou a rotina do gabinete de Flávio. Normalmente aberto ao público, o local passou boa parte da tarde com portas trancadas.
O relatório do Coaf cita que a conta de Queiroz recebeu repasses de oito funcionários e ex-funcionários do gabinete de Flávio. O GLOBO procurou duas delas ontem no local. Horas depois de um assessor afirmar que elas estavam presentes, o chefe de gabinete de Flávio, Miguel Angelo Braga, admitiu que elas não foram à Alerj por estarem tratando de suas defesas:
—Estão buscando informações para os esclarecimentos que já estão com data marcada para ser prestados (ao MP). Não estão aqui pelo assédio da imprensa. Não estão podendo vir pelo constrangimento.
Terça-feira: 11.12.2018
Folha de S.Paulo – Bem-vinda, velha política!
Joel Pinheiro da Fonseca
O ‘mito’ já está se desfazendo para revelar o que de fato Bolsonaro sempre foi
Bolsonaro chegou à Presidência representando a revolta contra o sistema. O sentimento que o elevou ao poder —o mesmo que se viu, por exemplo, na greve dos caminhoneiros— é francamente revolucionário. Foi o voto de confiança numa figura messiânica que prometia, com a sua força redentora, “acabar com essa palhaçada” que é a velha política brasileira.
Foi um verdadeiro feito de marketing que um deputado com 27 anos de Câmara, boa parte deles no PP, que loteou a política carioca com seus filhos, um membro do baixo clero do que há de mais velho na política nacional, tenha conseguido se vender como um renovador radical que veio para limpar tudo. Antes mesmo de iniciar o mandato, contudo, a imagem do “mito” já está se desfazendo, para revelar o que ele de fato sempre foi: um velho político.
As revelações do Coaf sobre as transações suspeitas do ex-assessor de Flávio Bolsonaro apenas ilustram o fato. É cedo para tirar qualquer conclusão, mas é uma possibilidade que Flávio Bolsonaro cobrasse mesada dos cargos comissionados de seu gabinete. Se for isso mesmo, ele apenas fez o que tantos políticos e partidos brasileiros sempre fizeram. É como a política brasileira funciona.
O caixa dois, o “dízimo” para o partido ou para o representante, o carguinho para amigos e familiares, a aliança com indivíduos suspeitos. Tudo isso é ruim, e o Brasil será um país melhor quando essas práticas forem menos abrangentes. Mas isso dependerá de reformas do sistema, e não da perseguição implacável a cada um dos que simplesmente jogaram o jogo e tiveram o azar de serem pegos. Não é, portanto, um motivo para demonizar o novo governo.
Bolsonaro surfou a onda jacobina dos que estão prontos a cortar a cabeça de qualquer pequena transgressão das regras, ou até de qualquer suspeita de transgressão. Seus militantes eram taxativos: o PT? Totalmente corrupto. Alckmin? Escândalo das merendas. Marina? Foi do PT. Se aplicássemos a mesma condenação inflexível ao governo Bolsonaro —a Onyx Lorenzoni, que já admitiu ter recebido caixa dois, ao ex-assessor de Flávio Bolsonaro, à contratação da Wal do Açaí, ao ministro do Meio Ambiente que é réu na Justiça—, ele próprio iria para a guilhotina.
A única dúvida agora é saber se ele governará como político ou se tentará ainda manter o discurso antipolítico da campanha. Bolsonaro diz que governará sem “toma lá dá cá”. Fará diferente de Temer, que para aprovar suas medidas abriu as portas dos ministérios e as torneiras das emendas parlamentares?
Até agora, a promessa parece estar sendo cumprida, mas isso não é necessariamente bom. Bolsonaro tem, em suas nomeações, praticado apenas o “toma lá”, sem nenhuma expectativa que as bancadas e partidos beneficiados “deem cá” qualquer contrapartida. Está entregando o país a ruralistas, militares, evangélicos e ideólogos da extrema direita sem exigir nada em troca (como apoio a medidas impopulares mas necessárias ao país). Não tem sido um espetáculo edificante ou particularmente virtuoso e arrisca nos deixar, por exemplo, sem uma boa reformada Previdência.
A política é o exercício de conciliar interesses e ideias contraditórios. Isso por vezes é feio e fere nosso purismo ético e ideológico, mas a única alternativa é a violência. Salvo um golpe, Bolsonaro ou governará fazendo política ou não governará. Melhor já ir se acostumando à realidade como ela sempre foi.
Terça-feira: 11.12.2018
Folha de S.Paulo – Saques de ex-auxiliar de Flávio Bolsonaro ocorriam após depósitos de valor similar
Padrão que se repetia nas maiores retiradas de dinheiro é característico de contas de passagem
Os maiores saques feitos em 2016 pelo policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), foram precedidos, geralmente na véspera, de depósito de valores de mesmo patamar.
Essa movimentação é característica de uma conta de passagem, na qual o real destinatário do valor creditado não é o seu titular. O uso de dinheiro em espécie nas duas pontas da operação reforça esse indício.
Queiroz foi citado num relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) como tendo apresentado uma movimentação financeira atípica de R$ 1,2 milhão em 2016. O alerta se deve tanto ao volume como à forma com que as transações foram feitas. O documento, contudo, não é o suficiente para apontar algum ato ilegal.
O Ministério Público do Rio de Janeiro instaurou uma investigação criminal sigilosa com base no relatório, que cita membros do gabinete de 22 deputados estaduais –entre eles Flávio Bolsonaro.
Do total movimentado, R$ 324,8 mil se referem a saques e R$ 216,5 mil a depósitos em espécie –os demais valores são transferências identificadas, entre outras operações.
Dos 176 saques realizados pelo policial militar naquele ano, 50 foram de valores acima de R$ 2.000. Apenas um, contudo, superou os R$ 10 mil, no qual a comunicação ao Coaf é automática.
Na maioria desses casos, o saque foi precedido de um depósito em espécie de valor em patamar semelhante. Nenhum, contudo, acima dos R$ 10 mil.
Nos dias 16 e 17 de fevereiro, por exemplo, Queiroz fez três saques de R$ 5.000 cada um, totalizando R$ 15 mil. O movimento foi acompanhado de cinco depósitos em espécie feitos em sua conta entre os dias 15 e 17 de fevereiro, que somam R$ 15,3 mil.
Movimento sincronizado também ocorreu em junho, quando nos dias 14 e 15 ele fez dois saques de R$ 5.000, tendo recebido no mesmo período em depósito de dinheiro vivo R$ 13,2 mil.
A ocorrência desses saques maiores mantém como padrão o fato de ocorrerem poucos dias após depósito em espécie de patamar semelhante. Em 35 dos 50 casos de retiradas acima de R$ 2.000, depósito acima do mesmo valor ocorreu até um dia antes –algumas vezes, no mesmo dia. Ampliando o intervalo entre o depósito e o saque para três dias, a sincronia se repete em 40 dos 50 maiores saques de Queiroz.
A correlação entre depósitos em dinheiro vivo e saque imediato também fica evidenciado em dezembro, quando o total sacado aumenta muito, assim como a entrada de dinheiro vivo.
No último mês do ano, por 12 vezes ele fez retiradas de dinheiro vivo acima de R$ 2.000, num total de R$ 58 mil. O volume de entrada também cresce e alcança R$ 41,6 mil distribuído em oito depósitos em espécie.
Procuradores, policiais federais e auditores fiscais afirmam que o uso de dinheiro vivo em transações bancárias costuma ter como objetivo ocultar o destinatário ou remetente dos recursos. A prática dificulta a identificação dos responsáveis pelas transações.
Uma das hipóteses já levantadas é de que o policial militar fosse o responsável por recolher uma parcela dos salários de assessores do gabinete de Flávio Bolsonaro –sete aparecem no relatório transferindo recursos a Queiroz.
Essa é uma prática comum no Legislativo, embora ilegal. Os recursos arrecadados podem tanto servir para campanhas políticas como para entrega ao titular do gabinete, entre outras possibilidades.
Não há até o momento, contudo, qualquer indício sobre o destino do dinheiro sacado por Queiroz. O relatório do Queiroz não foi localizado para comentar as informações do relatório. Flávio Bolsonaro afirmou que o ex-assessor lhe deu explicações plausíveis que deverão ser dadas ao Ministério Público Federal quando convocado.
Terça-feira: 11.12.2018
Folha de S.Paulo – Time, revigorada, se volta contra ataques ao jornalismo
Pessoas do Ano da revista são jornalistas que assumiram ‘riscos em busca de verdades maiores’
Nelson de Sá
SÃO PAULO
Três meses depois de ser adquirida pelo bilionário de tecnologia Marc Benioff, revigorada revista americana Time, fecha o ano em defesa do próprio jornalismo, por meio daqueles que “assumiram grandes riscos em busca de verdades maiores”.
Foi assim que o editor-chefe da publicação, Edward Felsenthal, anunciou os nomes na rede NBC, na manhã desta terça (11). “Ficou claro que a manipulação e o abuso da verdade são o fio condutor de muitas das principais notícias deste ano”, acrescentou.
Citou a cobertura da Arábia Saudita, o regime totalitário que emboscou Jamal Khashoggi, colunista saudita do Washington Post que encabeça a lista de homenageados. Ele teria sido assassinado por ordem do homem-forte do país, Mohammed bin Salman.
“Sua morte desnudou a verdadeira natureza de um príncipe sorridente, a absoluta falta de moralidade na aliança americano-saudita e –na cascata de feeds de notícias e notificações, compartilhamentos e links– a centralidade da questão pela qual Khashoggi foi assassinado: Em quem você confia para relatar a notícia?”, escreve a Time, no texto de apresentação “Os guardiães e a guerra à verdade”.
A editora de Khashoggi no WP, Karen Attiah, agradeceu via Twitter lembrando uma frase do próprio colega, “Alguns partem para permanecer”.
Também estão entre as “pessoas do ano” a Redação do americano Capital Gazette, que teve cinco jornalistas mortos por um atirador em junho, a fundadora do site filipino Rappler, Maria Ressa, e dois repórteres birmaneses da agência Reuters, Wa Lone and Kyaw Soe Oo.
O Rappler, que cobre criticamente o governo de Rodrigo Duterte, acaba de ser acusado de fraude fiscal, o que pode levar a uma prisão de dez anos para Ressa.
Wa Lone and Kyaw Soe O já estão cumprindo uma pena de sete anos de prisão, por reportagens sobre a perseguição à minoria rohingya em Miamar, governado por Aung San Suu Kyi.
Enfatizando o caráter global da escolha deste ano, a revista cita outros quatro exemplos de perseguição governamental a jornalistas, como as prisões de Shahidul Alam em Bangladesh e de Amal Habani no Sudão, a expulsão de Victor Mallet de Hong Kong, na China, e as ameaças de apoiadores de Jair Bolsonaro a Patrícia Campos Mello, no Brasil.
Terça-feira: 11.12.2018
Globo – Merval Pereira – Bolsonaro deve explicação no caso de Queiroz
O presidente eleito, e agora diplomado, Jair Bolsonaro chega ao momento da posse devendo uma explicação plausível sobre o caso de Fabrício Queiroz, seu amigo pessoal há 40 anos, como afirmou, e motorista de seu filho, senador eleito Flávio Bolsonaro, que teve um movimento financeiro detectado pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) de R$ 1,2 milhão tendo um salário de R$ 8,5 mil por mês.
A explicação do presidente para vários depósitos, num total de R$ 24 mil, para a futura primeira-dama Michelle, é plausível: tratar-se-ia de pagamento de um empréstimo, que não foi declarado no Imposto de Renda. Até aí, nada grave.
É normal ajudar funcionários em dificuldade, e receber pagamentos parcelados, tudo de maneira informal. Não declarar no IR pode ser uma falha, nunca um crime. A coisa começa a pegar quando o presidente, e seu futuro ministro da Justiça, Sergio Moro, consideram que, com a explicação, o caso sai de suas alçadas e vai para a do próprio Fabrício.
Nem mesmo do filho Flávio é cobrada qualquer explicação para a movimentação de dinheiro de seus funcionários na Assembleia Legislativa, onde atuava como deputado estadual.
É claro que, mesmo que tenha dado uma explicação para o caso de sua mulher, o comportamento dos filhos alcança o presidente, assim como as acusações contra Lulinha alcançam Lula, mesmo que as quantias conhecidas sejam consideravelmente menores.
À boca pequena sabe-se, sem que tenha sido investigado e comprovado ainda, que parlamentares de maneira geral, com raras exceções, e em todos os níveis de representação, costumam, e não é de hoje, cobrar um pedágio de seus funcionários.
Como os salários nesses casos são muito acima do mercado de trabalho — outra disfunção do Legislativo —, os funcionários não se incomodam de dar uma parcela para quem os contrata. Mas é um procedimento completamente ilegal, como é ilegal a utilização de caixa 2 para financiamento de campanhas eleitorais, mas todo mundo fazia, ou faz, como está revelando a Operação Lava-Jato. Inclusive o deputado Onyx Lorenzoni, futuro chefe do Gabinete Civil, que admitiu o uso de caixa 2.
Nesse caso, a suspeita é que o motorista Fabrício servia de laranja para a família Bolsonaro, recebendo em sua conta a porcentagem de cada um dos funcionários de Flávio. Este deveria ser um caso simples de ser desmentido.
Mas como até agora, passados vários dias da denúncia, o motorista não apareceu para dar uma explicação crível para tamanha movimentação financeira — R$ 600 mil recebidos e saídos de sua conta —, fica cada vez mais difícil acreditar que nada de errado tenha acontecido.
É preciso definir se aconteceu o esquema e, em caso positivo, por quantos anos a família Bolsonaro se utilizou dele, que até agora não foi desmentido por provas consistentes. Além do próprio Jair Bolsonaro, deputado federal por 27 anos, que empregava até mesmo uma funcionária que vendia açaí em Búzios, há Flávio, hoje senador eleito que era deputado estadual, o deputado federal Eduardo, anteriormente deputado estadual, e o vereador Carlos.
O futuro ministro da Justiça, Sergio Moro, que terá a seu pedido, para melhor combater a corrupção, o Coaf como órgão subordinado, não deveria dizer que, para ele, a explicação do presidente eleito está dada. Não é razoável exigir que fizesse uma crítica ao presidente ou à sua família, mas não deveria banalizar o assunto.
Se tratar assim todos os indícios de lavagem de dinheiro que aparecerem na sua frente, terá mudado de atitude diante dessas irregularidades. Logo ele, um juiz rigoroso com os mínimos indícios, e que tem demonstrado que eles, quase sempre, levam a descobertas de esquemas de corrupção graves.
Bolsonaro se elegeu, entre outras coisas, por apresentar-se como um combatente contra a corrupção. O convite a Moro para integrar seu ministério teve o sentido de reafirmar simbolicamente essa luta, e por isso foi aprovado pela opinião pública.
Não se pode ser Catão com os outros sem ser Catão consigo mesmo.
Terça-feira: 11/12/2018
Valor – Moro diz que é ‘inapropriado’ opinar sobre caso do Coaf
Por André Guilherme Vieira, Marcelo Ribeiro, Fábio Pupo e Edna Simão | De São Paulo e Brasília
Futuro ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro disse ontem que não deve esclarecimentos sobre as movimentações bancárias realizadas por ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), consideradas suspeitas por relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – órgão de inteligência do Ministério da Fazenda que está sendo transferido para a Pasta que será chefiada pelo ex-juiz federal.
Segundo o documento, um dos ex-assessores do filho do presidente eleito Jair Bolsonaro, Fabrício José de Carlos Queiroz, movimentou mais de R$ 1,23 milhão entre 1º de janeiro de 2016 e 31 de janeiro de 2017. O Coaf também registrou depósito de R$ 24 mil efetuado por ele na conta da futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Em entrevista coletiva, Moro disse que não é seu papel opinar ou interferir em casos como este.
“Não cabe a mim dar explicações sobre isso. O que existia no passado, com ministros da Justiça opinando sobre esses casos concretos, é inapropriado. O ministro da Justiça não é uma pessoa que deve ficar interferindo nesses casos concretos e eu, na verdade, nem sou ainda ministro da Justiça”, disse.
Na avaliação de Sergio Moro, se houve “pessoas cobrando uma posição, mas assim, as pessoas [mencionadas] que têm de prestar os esclarecimentos”.
O futuro ministro da Justiça disse ainda que Bolsonaro já apresentou esclarecimentos. Entretanto, de acordo com ele, se o caso não for completamente esclarecido, as investigações devem prosseguir.
“Os fatos têm de ser esclarecidos. O presidente já apresentou os esclarecimentos, têm outras pessoas que precisam prestar os seus esclarecimentos, e os fatos, se não forem esclarecidos, têm de ser apurados”.
Na quinta-feira, antes do caso ganhar repercussão, Moro gravou uma entrevista que concedeu ao programa de televisão do jornalista Roberto Cabrini, do SBT, prevista para ir ao ar ontem. Na conversa, o ex-juiz federal defendeu que as polícias e os órgãos de controle devem ter liberdade de ação para realizar o trabalho de investigação da corrupção. “Precisa dar liberdade aos órgãos de controle para fazer o seu trabalho. Às polícias, tanto a Polícia Federal quanto as polícias estaduais, também a Polícia Rodoviária Federal, a [Controladoria-Geral da União, ministério cuja função é a defesa do patrimônio público] CGU. Todos os órgãos que estão envolvidos nessa atividade de apuração da corrupção”, afirmou Moro.
Segundo o futuro ministro, é preciso que as investigações ocorram sob tutela de equipes que trabalhem conjuntamente.
“Tem de tratar isso com inteligência. Por exemplo, os crimes são complexos de serem investigados, é necessário criar equipes de investigação conjunta, com corpo funcional significativo para conseguir solucionar esses crimes com a velocidade e efetividade necessárias”.
Sobre as primeiras medidas que adotará no ministério, Moro destacou a elaboração e encaminhamento de medidas legislativas com o propósito de endurecer a legislação que dispõe sobre organizações criminosas e o cometimento de delitos de natureza violenta. Para Moro, também é preciso aumentar a taxa de esclarecimento de crimes.
“Esses dois [crimes] também são problemas muito sérios que o Brasil vivencia hoje. [Há] taxas de homicídio escandalosas com um grau, por exemplo, de descoberta dos culpados muito reduzida. As organizações criminosas [estão] cada vez mais fortes e [é preciso] iniciar um ciclo virtuoso”.
Na entrevista, o futuro ministro da Justiça pareceu realista sobre a expectativa de obtenção de resultados com suas propostas de combate ao crime.
“Ninguém espera acabar com esses problemas em um mês, dois meses, e talvez até mesmo um mandato presidencial não seja suficiente. Mas, começando a resolver o problema, gerando uma perspectiva de ciclo virtuoso, isso já vai ser um grande começo”, opinou o ex-juiz federal que conduziu a Operação Lava-Jato, em Curitiba, de março de 2014 a novembro deste ano.
Segunda-feira: 10/12/2018
Globo.com – Fabricio Queiroz: 100 horas mudo
Constatação: decorridos quatro dias e meio após a revelação do relatório do Coaf, que aponta “movimentação atípica” em suas contas, Fabrício Queiroz continua mudo.
Não deve, portanto, estar sendo fácil para o ex-motorista de Flavio Bolsonaro arrumar uma explicação plausível para ter movimentado R$ 1,2 milhão no prazo de doze meses.
Assim como os Bolsonaro (e seus bolsominions) estão na defensiva pela primeira vez desde o início da campanha eleitoral.
Segunda-feira: 10/12/2018
Rede TV – Blog Reinaldo Azevedo – CUBANOS DE BOLSONARO?
1: Aposta de eleito e filhos é que imprensa e opinião pública vão esquecer caso do motorista de R$ 1,2 milhão
A aposta dos Bolsonaros — do pai, Jair, e dos filhos, Flávio em particular, é que o assunto da movimentação financeira de Fabrício Queiroz, ex-motorista e segurança do senador eleito da família, acabe morrendo, caindo no esquecimento da população e da imprensa. Queiroz movimentou, como se sabe, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017 mais de R$ 1,2 milhão. Neste domingo, o presidente eleito voltou a se referir ao assunto e afirmou que é o ex-assessor de seu filho quem tem de das explicações. Indagado se via a coisa toda com naturalidade, afirmou o presidente eleito: “Ele tem que explicar, pode ser, pode não ser”. Mas tentou minimizar a coisa, sugerindo tratar-se de pequenos valores transacionados entre pessoas próximas e familiares: “Um ao longo de um ano transferiu 800 reais. O outro transferiu 1.500 reais, poxa.”
2: Família precisa se livrar da suspeita que de que mantinha relação à moda cubana com funcionários
Bem, as explicações, até agora, são muito fracas, e a família Bolsonaro precisa eliminar a desconfiança de que vigora entre os funcionários…
3: É claro que a suspeita é a de que família fica com parte do salário dos seus funcionários
Tanto o presidente eleito, Jair Bolsonaro, como seus filhos estão fazendo um esforço danado para que o imbróglio envolvendo Fabrício Queiroz, o ex-motorista de Flávio, não se pareça com aquilo que se parece: a suspeita óbvia é a de que Queiroz fosse um arrecadador, para a família Bolsonaro, de salário dos funcionários do agora senador eleito. E, por óbvio, sobra o questionamento se a prática não seria uma constante nos respectivos gabinetes dos quatro políticos: além de Jair e Flávio, também Eduardo e Carlos. Uma coisa e certa: a prática do motorista, amigo pessoal do presidente eleito, pode ser considerada tudo; corriqueira não é. Até porque a família inteira do ex-assessor, mulher e duas filhas, está enredada no caso.
4: Nada menos de 9 funcionários de Flávio depositaram R$ 184 mil na conta de motorista, incluindo mulher e duas filhas
Ora, nada menos de nove assessores de Flávio Bolsonaro depositaram dinheiro na conta de Queiroz, somando, em um ano, R$ 184 mil. Desse total, pouco mais de R$ 84 mil saíram da conta de Nathalia, uma de suas filhas, que estava lotada no gabinete de Flávio e depois foi transferida para o de Jair. No mesmo dia, 12 de junho de 2016, Evelyn, a irmã, foi nomeada. Nos seis dias seguintes, os saques em dinheiro da conta de Queiroz, o pai das duas, chegaram a R$ 58 mil. Além das filhas e da mulher — Márcia Oliveira Aguiar — repassaram dinheiro ao motorista os seguintes funcionários: Agostinho Moraes da Silva, Jorge Luís de Souza, Luiza Souza Paes, Raimunda Veras Magalhães, Wellington Rômulo da Silva e Marcia Cristina Nascimento dos Santos.
5: Presidente eleito diz que prática de empréstimos é comum em quartel e imprensa. Em imprensa, não é!
No sábado, Jair Bolsonaro tentou ver a coisa toda com naturalidade. Disse: “Se você pegar teu ciclo de amizade na imprensa, num quartel, num hospital, é normal entre aqueles funcionários um ajudar o outro, é normal acontecer isso daí. E não foi diferente na Câmara, na Assembleia Legislativa. A gente se socorre de gente que está ao lado e não de terceiros. Natural”.
Bem, não sei como é num quartel ou num hospital. Na imprensa, não é comum acontecer, não. Até porque, né?, se jornalista pretende ser bem-sucedido tomando empréstimo de amigo, o negócio é pescar em águas de outra categoria: a chance de pedir a um colega ainda mais duro do que ele próprio é razoável. Não! Bolsonaro fale, então, pelo quartel… Na imprensa, não é assim, não. E, quero crer, motoristas não atuam como bancos informais em nenhuma categoria.
6: Tom de membros da família é mais cordato e cuidadoso do que o de Onyx, que pega uma carona no caso
O tom dos Bolsonaros em relação ao assunto, no entanto, está muito menos estridente e mais cuidadoso do que o empregado na sexta por Onyx Lorenzoni, que resolveu ter um chilique quando indagado a respeito, misturando, note-se, a investigação prévia de que ele próprio é alvo — acusado por delatores da JBS de recebimento de dinheiro por meio de caixa dois — com as suspeitas que recaem sobre a família do presidente eleito. Como havia sido ameaçado por Bolsonaro com a BIC da demissão, parece que Onyx lembrou ao chefe que todos, agora, estão no mesmo barco.
7: Transferir dinheiro lícito não é crime, claro! MPF vai decidir se pede abertura de inquérito
A questão, por enquanto, é mais política do que jurídica ou policial. Não é proibido transferir dinheiro para a conta de terceiros, não importa se a pessoa é motorista, presidente, assessor parlamentar ou camelô das insatisfações alheias. Só que esses recursos não podem ser oriundos de atividades ilícitas ou obtidos de forma fraudulenta. A eventual transferência de uma parcela do salário de funcionários de um deputado federal, estadual ou vereador para o titular do mandato constitui crime. Por enquanto, está caracterizado o que pode ser chamado de “acontecimento estranho”, acompanhado de “notáveis coincidências”. O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) não acusa ninguém de nada porque não é a sua função. A bola, agora, estará com o Ministério Público Federal. Caso o órgão determine a abertura de um inquérito policial, certamente aqueles nove funcionários, incluindo os três membros da família de Fabrício Queiroz, serão chamados a prestar depoimento.
8: Ex-mulher acusou agora presidente eleito de ocultar patrimônio e renda; depois fizeram as pazes; levantamento da Folha aponta patrimônio registrado de R$ 13 milhões
Uma nota: em processo de 2008, Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher de Bolsonaro, o acusou de ocultação de patrimônio em sua declaração oficial de 2006, quando foi candidato a deputado federal (e venceu). À Justiça Eleitoral, declarou bens no valor de R$ 433.943,00 mas Ana anexou uma relação de bens e de imposto de renda que somava um patrimônio real de R$ 4 milhões em valores da época. Ana também alegou no processo que a renda do deputado superava, então, os R$ 100 mil mensais, apesar de a soma de suas rendas conhecidas como deputado e militar da reserva ser de R$ 35.300. Não ficou clara a origem do resto do dinheiro. Ela acusou ainda o ex-marido — os dois fizeram as pazes depois — de ter furtado US$ 30 mil e mais R$ 800 mil (R$ 600 mil em joias e R$ 200 mil em dinheiro vivo) de um cofre em uma agência do Banco do Brasil, caso registrado em boletim de ocorrência no mesmo dia do furto (26 de outubro de 2007). Alberto Carraz, gerente do BB e amigo de Bolsonaro até hoje, confirma apenas que o conteúdo sumiu. Levantamento feito pela Folha no ano passado evidencia que os bens que estão em nome de Bolsonaro e de seus filhos chegam, em valores de mercado, a R$ 13 milhões.
Segunda-feira: 10/12/2018
Folha de S.Paulo – Onyx conduziu depoimento do Coaf em CPI sobre mensalão
Leandro Colon
Futuro ministro questionou papel do órgão no esquema investigado no governo Lula
“A pergunta é: onde é que estava o Coaf no mensalão?”, questionou Onyx Lorenzoni antes de abandonar entrevista na sexta (7) ao se irritar com a insistência dos repórteres para que comentasse as suspeitas sobre a movimentação financeira do motorista de Flávio Bolsonaro, filho do presidente eleito.
Falta memória ao futuro ministro da Casa Civil do governo de Jair Bolsonaro. As notas taquigráficas do Congresso podem ajudá-lo a recuperá-la. Às 10h21 do dia 10 de janeiro de 2006, uma terça-feira, foi aberta uma sessão da CPI dos Correios para ouvir o então presidente do Coaf, Antônio Gustavo Rodrigues.
Criada no ano anterior, a comissão parlamentar investigou o esquema do mensalão do governo Lula.
O deputado Onyx era o sub-relator de Normas de Combate à Corrupção e conduziu o depoimento do presidente do Coaf naquele dia, na sala 2 da ala Senador Nilo Coelho, no Senado. Foi o primeiro a indagá-lo sobre a atuação do órgão de controle financeiro do governo federal.
Onyx, aliás, agradeceu Rodrigues, em nome da CPI, pela presença. Depois de uma longa fala, o deputado perguntou sobre normas do Banco Central, eventuais falhas de fiscalização financeira e o alcance do Coaf.
Rodrigues detalhou o modelo de trabalho do órgão e seus limites de ação, sobretudo em relação a investigações em torno de uma transação considerada atípica. “Se você não tem outros elementos que circunstanciem aquela movimentação, diria que é praticamente impossível você chegar a identificar tudo”, disse.
No depoimento de quase seis horas, ele contou aos parlamentares que desde 2003 o Coaf recebia informações de volume grande de saques em espécie por parte da SMPB, empresa de Marcos Valério, o operador que abasteceu o mensalão pago a políticos da base do governo petista.
Ofícios do Coaf entregues à CPI mencionam essas e outras retiradas. Foram informações essenciais para a investigação. Onyx pode ler mais sobre elas na página 764 do volume 2 do relatório final da comissão.
Segunda-feira: 10/12/2018
Folha de S.Paulo – Bolsonaro queima a largada
Celso Rocha de Barros
Depósito de assessor dispara todos os alarmes de quem investiga corrupção
A verdade é que ninguém estava pronto para um escândalo desses já agora.
Acabamos de sair da pior campanha eleitoral de nossa história, e mesmo os derrotados da eleição estavam aproveitando a trégua para respirar e se reorganizar. A maioria dos eleitores brasileiros votou em Bolsonaro, e, como convém a maiorias eleitorais no mês entre a eleição e a posse, ainda se permite ter esperança com o novo governo. Em não se tratando de reeleição, alguma lua de mel sempre é concedida ao recém-eleito.
Até porque, qual a probabilidade de aparecer uma denúncia de corrupção quente, antes da posse, que não tenha aparecido na campanha?
Pois é.
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) detectou que Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador recém-eleito Flávio Bolsonaro, movimentou em 2016 e 2017 muito mais dinheiro do que poderia, plausivelmente, ter ganho com suas fontes de renda conhecidas. Entre os vários depósitos suspeitos feitos por Fabrício, R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro, nossa nova primeira-dama.
O presidente recém-eleito, aparentemente, achou que ainda não estava suficientemente envolvido no escândalo e resolveu dizer que ele, Jair Bolsonaro, emprestou dinheiro para Fabrício Queiroz e que o depósito para a primeira-dama seria pagamento do empréstimo.
Olha, sinceramente, se era para inventar um negócio desses, era melhor ter pedido ajuda ao Olavo. Ele teria contado que Queiroz era do Foro de São Paulo, que o dinheiro havia sido roubado por George Soros usando a Lei Rouanet, que Bolsonaro nasceu no Quênia, enfim, algo que tampouco nos convenceria, mas, ao menos, nos manteria entretidos.
Assessor de político depositando dinheiro para a família do chefe é o tipo de coisa que dispara todos os alarmes de quem investiga corrupção. Na mesma hora em que as denúncias foram publicadas, por exemplo, o cientista político Sérgio Praça lembrou do caso do esquema de distribuição de dinheiro de PC Farias no governo Fernando Collor.
E, falando em gente que investiga corrupção, o que Sergio Moro pretende fazer? O novo ministro da Justiça não poderá continuar evitando perguntas sobre o assunto, e é bem ruim que as tenha evitado até agora.
Se um acusado da Lava Jato, sentado no banco dos réus, contasse essa história do empréstimo, Moro acreditaria?
Os bolsonaristas sabem que sofreram um golpe duro. Excepcionalmente, a bolsosfera calou-se. Afinal, o pessoal precisa manter sua credibilidade, e a tese do empréstimo de Bolsonaro para Fabrício não é tão plausível quanto, digamos, a história de que Haddad distribuiu mamadeiras com bico de pênis nas creches de São Paulo.
Por um lado, é terrível para o governo Bolsonaro que sua imagem de honestidade tenha trincado já na saída. É um governo eleito na onda da Lava Jato, um governo com Sergio Moro no Ministério da Justiça. É muito ruim que tenha sido pego fazendo uma operação com tanta cara de centrão.
Mas também é verdade que o clima de ressaca pós-campanha não favorece o tipo de onda de opinião pública que, com essa denúncia na mão, em outro momento, poderia ameaçar um mandato.
De qualquer forma, é melhor que Bolsonaro tenha como sustentar seu governo em mais do que sua reputação de incorruptibilidade. Mês que vem começa o ajuste econômico.
Quinta-feira: 6.12. 2018
Folha de S.Paulo – Votaram em quem?
Ranço autoritário talvez seja razão para ‘esclarecidos’ votarem em Bolsonaro
Contardo Calligaris – Psicanalista, autor de ‘Hello Brasil’ e criador da série Psi (HBO)
No segundo turno das presidenciais, vários amigos e conhecidos votaram em Haddad, “tapando o nariz” sobre o cheiro do PT. Outros, com sentimentos parecidos, anularam seu voto.
Para outros, porém, a decepção falou mais alto do que qualquer desconfiança: votaram em Bolsonaro para votar contra o PT, cansados da corrupção, do aparelhamento do Estado e da incompetência do governo Dilma.
E, ainda, vários amigos e conhecidos meus votaram em Bolsonaro positivamente, ou seja, não contra o PT, mas por aquilo que o candidato propunha: mais segurança, menos corrupção e uma guinada liberal na economia.
A maioria desses amigos e conhecidos bolsonaristas declara de antemão que despreza os ranços bizarramente caretas da campanha de Bolsonaro. Mas eles sequer se preocupam com isso, pois lhes parece óbvio que os evangélicos e os TFPs não irão interferir na vida de ninguém.
Esses dois grupos dos eleitores de Bolsonaro que eu conheço —os que afirmam que votaram contra o PT e os que dizem que votaram para uma mudança econômica sem a qual o país iria pelo ralo— têm algo em comum: nas conversas que eu presenciei, eles afirmam que votaram em Bolsonaro e, a seguir, também afirmam que eles não concordam com o moralismo tacanho, por exemplo, dos futuros ministros da Educação ou das Relações Exteriores.Relações Exteriores.
“A cada vez que via a Gleisi Hoffmann na TV, queria votar mais no Bolsonaro, mas não tenho nada a ver com Malafaia, viu?” “Votei nele, sim, mas sou totalmente feminista; o que importa hoje é permitir ao país uma virada modernizadora, justamente.”
Claro, entre os eleitores de Bolsonaro, deve haver uma parte grande de indivíduos explicitamente engajados no projeto de impor aos outros as regras de conduta que eles idealizam (e que eles mesmos, aliás, mal conseguem seguir). Os indivíduos que gostam de regrar a vida dos outros, eu chamo de boçais —salientando que os boçais não são uma prerrogativa do eleitorado de Bolsonaro, eles existem no espectro político inteiro.
Os bolsonaristas com quem converso não são boçais: eles dizem que votaram quer seja contra o PT, quer seja para promover uma reforma liberal da economia —sem por isso apoiar em nada as ideias ou o temperamento autoritário dos que gostariam de regrar o comportamento dos outros.
Agora, a questão está justamente aí: “eles dizem” isso MUITO. À força de escutar negações preventivas que não eram solicitadas nem por mim nem por ninguém, comecei a duvidar delas.
Para a psicanálise, a negação não solicitada é suspeita: “Sonhei com uma mulher mais velha, loira como minha mãe, mas não era minha mãe, não era mesmo”. Claro, claro…
Da mesma forma, negando com força sua adesão à agenda mais boçal da base de seu candidato, talvez esses eleitores estejam revelando uma adesão que eles mesmos, racionalmente, ignoram.
Para esses eleitores que se consideram “esclarecidos”, o ranço autoritário, antidemocrático, homofóbico, misógino e racista não seria algo que eles tiveram que engolir (tapando o nariz) para acabar com o PT ou para ter uma política econômica liberal. Na verdade, para eles, o tal ranço talvez seja a verdadeira razão para eles votarem em Bolsonaro —uma razão que eles escondem de si mesmos.
Não só no Brasil, ao longo dos últimos 30 anos, constituiu-se uma classe média aparentemente esclarecida, ou seja, que compartilha, em tese, o ideal social-democrata que parecia prevalecer no mundo.
Mas 30 anos é muito pouco, e a mudança pedida é muito grande: essa classe supostamente esclarecida engoliu mas não digeriu quase nada das “conquistas” das últimas décadas —nem o feminismo, nem o MeToo, nem os direitos das minorias raciais e sexuais— e, no fundo, nem os próprios direitos civis.
Ao contrário, o aparente triunfo dessas reivindicações as tornou mais indigestas para essa classe, que certamente gostava de seus pequenos privilégios mais do que ela admitia.
Seu racismo, sua misoginia e sua homofobia ficaram como uma espécie de pequena dor de dentes, quase esquecida. Até o dia em que alguém veio liberá-los, ou seja, conclamar que não era vergonhoso pensar nada do que eles não se permitiam mais pensar.
Alguns foram para a rua caçar veado. Outros foram para exterminar vermelhos. Outros ainda, para censurar e chantagear professor. Outros, os mais modestos, disseram que eles não concordam, mas, enfim, é preciso salvar o país, não é?
Quarta-feira – 5.12.2018
Folha de S.Paulo – Moro cria armadilhas para si mesmo ao defender Onyx em caso de caixa 2
Bruno Boghossian
Repasse pode ser investigado pela PF, que será subordinada ao novo ministro da Justiça
Rigoroso sob a toga, Sergio Moro revela ser um político um pouco mais tolerante. O futuro ministro da Justiça emitiu um salvo-conduto para o colega de governo Onyx Lorenzoni nesta terça (4). O ex-juiz disse que o deputado, suspeito de ter recebido R$ 200 mil da JBS via caixa dois, tem sua “confiança pessoal”.
Moro fez a defesa de Onyx um dia depois que Edson Fachin determinou a abertura de um procedimento no STF para apurar o caso. Parte da investigação pode ficar com a Polícia Federal —que é subordinada exatamente ao seu Ministério da Justiça.
Na nova função, Moro deixou para trás as amarras que o impediam de fazer comentários públicos sobre casos em andamento. Mas o figurino de Brasília também exige cautelas e responsabilidades.
Há duas armadilhas nesse caso. O ex-juiz se tornou um corregedor do governo Jair Bolsonaro e afirmou que recomendará a demissão de ministros atingidos por denúncias consistentes. Se surgirem provas de que Onyx recebeu dinheiro ilegalmente, Moro será obrigado a desdizer sua “confiança pessoal” no colega.
A segunda arapuca está no constrangimento que seus comentários podem criar dentro da PF. Ao aceitar o convite de Bolsonaro, Moro declarou que o caso não era um problema porque Onyx “admitiu o erro, pediu desculpas e tomou providências para repará-lo”. Os agentes que passarem a investigar o caso se sentirão obrigados a concordar com o chefe?
No início do ano, Fernando Segovia foi demitido do comando da Polícia Federal depois de fazer comentários sobre o inquérito contra Michel Temer no caso dos portos. O então diretor-geral disse em uma entrevista que os indícios contra o presidente eram “muito frágeis”, antes mesmo que a apuração fosse concluída.
Moro promete rigor nas investigações contra políticos e pretende reforçar o grupo da PF responsável por inquéritos contra autoridades. Já que Onyx admitiu ter recebido ao menos um pagamento da JBS, o ex-juiz deveria evitar desgastes desnecessários e deixar o caso correr.
Terça-feira: 4.12.2018
Blog do Reinaldo Azevedo -Primeiros passos de Moro demonstram que não será nem ministro da Justiça nem da Segurança: continuará a caçar políticos e não vai descer no palanque
Por: Reinaldo Azevedo
Leio na Folha:
“Sob o comando do futuro ministro da Justiça, Sergio Moro, a nova direção da Polícia Federal pretende reestruturar e reforçar o grupo responsável por investigar perante o STF (Supremo Tribunal Federal) crimes cometidos por ministros e políticos em exercício do mandato.”
(…)
Comento
Moro será ministro da Justiça e da Segurança Pública. Há uma boa chance de que não seja nem uma coisa nem outra e se dedique apenas a usar a musculatura que ganhou no Poder Executivo para seu trabalho de expurgos na política.
Na prática, o que se vai ter um é a política sob permanente vigilância de um grande chefe de polícia que terá instrumentos para transitar nos bastidores dessa mesma… política.
Os que estiverem no Executivo e não pertencerem à grei dos militares, de Paulo Guedes e do próprio Moro devem tomar especial cuidado. E os parlamentares que tratem de disfarçar até mesmo a respiração. J. Edgar Hoover tinha no comando do FBI menos poderes do que Moro terá no Ministério da Justiça. É pouco provável que o ex-juiz queira ficar 37 anos no cargo. Certamente planeja voos maiores.
A estrutura que montou até agora não tem a menor intimidade com o combate à insegurança pública. Ele vai continuar, e deixou isso claro na palestra que deu em Madri, com o seu trabalho de suposta depuração da política.
É compreensível que esse ministro da Justiça não queria saber de assuntos que seriam de sua competência, como a Funai, por exemplo.
O negócio dele é caçar os ditos criminosos do colarinho branco, posar para fotos e depois expedir alguma sentença moral.
Afinal, gente, ele não é um político, certo?
Não sei de Jair Bolsonaro vai descer algum dia do palanque. Uma coisa é certa: Moro não vai.
Segunda-feira: 3.12.2018
Blog do Reinaldo Azevedo – Até Moro admite em seminário em Madri que perguntou a si mesmo se não tinha ido longe demais. Uma resposta à sua angústia: foi, sim!
Por: Reinaldo Azevedo
E o político Sérgio Moro, futuro ministro da Justiça, segue firme no seu papel de paladino da moralidade e de herói sem mácula, agora falando no seminário promovido pela Fundação Internacional para a Liberdade, em Madri, presidida pelo escritor peruano Mario Vargas Llosa, Nobel de Literatura, que mediou a mesa. Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, também estava convidado, mas não compareceu, alegando problema de saúde.
Moro explicou por que decidiu deixar o Judiciário e ocupar um cargo no Executivo. Queria mais poder. Afirmou, informa a Folha:
“Como gostamos de futebol, temos no Brasil uma expressão segundo a qual alguém diz estar cansado de levar bola nas costas. Meu trabalho no Judiciário era relevante, mas tudo aquilo poderia se perder se não impulsionasse reformas maiores, que eu não poderia fazer como juiz.”
Afirmou ainda:
“Durante estes quatro anos [de atuação na Lava Jato], me perguntei se não tinha ido longe demais na aplicação da lei, se o sistema político não iria revidar. Esse caso ia chegar ao fim, e era preciso que gerasse mudanças institucionais. Me senti tentado pela possibilidade de fazer algo mais significativo, não pela posição de poder”.
O ex-juiz não explicou o que seria “ir longe demais na aplicação da lei”. Como as palavras fazem sentido, “ir longe demais” significa o que significa: ignorar a própria lei sob o pretexto de aplicá-la. Como se nota, até ele próprio tem essa desconfiança. E, mais uma vez, fica claro que o agora político Sérgio Moro vê a políticas pelas lentes das desconfiança, com olhos de adversário — menos, claro!, quando se trata de falar de seu chefe, Jair Bolsonaro, em que enxerga um democrata exemplar.
O que ele poderá fazer no Executivo? Vamos ver. Terá a Polícia Federal nas mãos, por exemplo. Será que, no futuro, em algum seminário, na condição de ex-ministro, terá a chance de dizer: “Eu me perguntei se não tinha ido longe demais no uso da polícia…”
Para Moro, o governo Bolsonaro vai endurecer não “contra a democracia, mas contra a grande corrupção, o crime organizado e o violento, que a afetam”. Bem, meus caros, estamos por dias. Em menos de um mês, o governo começa, e então veremos, pelas ações, o que significa a retórica do governo Bolsonaro.
Para encerrar: até Moro se perguntou se não tinha ido longe demais… Seu adoradores na imprensa jamais se fizeram essa pergunta, não é mesmo? Com raras exceções, é claro!
Ah, sim, respondo à sua angústia: foi, sim! Mais de uma vez, ignorou a lei sob o pretexto de aplicar a lei.
Mas chegou lá e, hoje, é um dos vice-reis do Brasil.
Sexta-feira: 30/11/2018
Valor Econômico – De boca fechada
Por José de Souza Martins
O presidente eleito da República, radicalmente diferente de Lula, seu êmulo, fala pouco. Quando candidato, deixou a palavra com as redes sociais. O Twitter tem-lhe permitido dizer tudo quase sem dizer nada. Quem o lê inventa o complemento da mensagem, conforme a mentalidade de cada um. Pode ter sido bom para ganhar a eleição. Mas os algoritmos ideológicos dessas mensagens cifradas municiam os protagonistas da nova era política com opiniões que na verdade são concepções do senso comum e do cotidiano. É no terreno da incerteza intencional que o novo governo vai sendo montado.
Já a postura lulista de falar demais baseou-se e baseia-se num outro tipo de cumplicidade dos acólitos que traduzem a fala barroca do líder em língua ideológica e em diretriz partidária. O que se revelou um erro de quem se julga no mundo, mas não vê o mundo.
No caso de Bolsonaro, os extraordinários poderes das redes sociais e dos púlpitos pentecostais encarregaram-se de elaborar a imagem ficcional de um candidato da ordem. Não o que ele é, mas o que querem que ele seja. Como ocorreu com Lula, ele não sabe e nunca saberá quem de fato é, politicamente. Chegamos à era do poder da incerteza.
É fenômeno da mesma qualidade que caracterizou a ascensão de Luiz Inácio ao poder. Nesse caso, a população demonstrou, mais em 2002, menos em 2006 e menos ainda em 2010, que se insurgia contra a voracidade de ganhos e de poder de setores insaciáveis e inescrupulosos da elite.
A carta do PT ao povo brasileiro, no entanto, foi uma declaração de adesão a eles e um reconhecimento público de que pelo poder o partido estava disposto a aceitar a cooptação. E foi o que aconteceu. Lula e Dilma presidiram a República, mas o PMDB e seus aliados a governaram. Relembrando a frase de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, em “O Leopardo”, de que tudo deve mudar para que tudo fique como está.
Com mensagem radicalmente oposta à do petismo e do lulismo, Bolsonaro não é deles diferente no essencial. Seu silêncio pode estar refletindo o esgotamento do vocabulário de campanha, o da língua do antipetismo.
No caso dos dois, Lula e Bolsonaro, um sociólogo não pode deixar de identificar o uso instrumental de técnicas da etnometodologia do cientista social americano Harold Garfinkel. Em pesquisa financiada pelo Pentágono, ele desenvolveu um método sociológico de experimentação científica em que o pesquisador induz a interação social com o paciente, que alguns definem como vítima. Questiona seu senso comum para, na reação, suscitar o preenchimento dos vazios da relação social com o mero senso comum.
Sua ciência comprovou que o homem cotidiano tende a solucionar os estados de anomia, de ausência de ordem, como a que vivemos agora, retornando ao que era antes de seus ímpetos de mudança. A tendência social espontânea não é pela revolução, mas pela continuidade do mesmo. É o que estamos vendo no processo político brasileiro desde a campanha eleitoral de 2002.
Os indícios, porém, de fragilidade da ordem social imaginária, de manipulação, que a eleição sugere, podem ser apontados. Em 2002, do total de eleitores inscritos, 54,2% não votaram em Lula, 62,5 milhões de eleitores, 10 milhões mais do que os que nele votaram. Esse foi o seu índice de potencial ilegitimidade, fator de desaprovações e desconfianças, vácuo de legitimidade num caminho de potencial queda final. Essa é a base da dúvida política num regime democrático.
Agora, em 2018, o índice dos que não votaram em Bolsonaro é mais alto, 60,8% dos inscritos, 89 milhões e meio de eleitores, 32 milhões mais do que os que nele votaram. Seu índice de potencial ilegitimidade é muito maior do que o de Lula em 2002.
É aí que a cultura da boca fechada fará, e já está fazendo, seu estrago. É uma cultura de recusa do pensamento crítico, que Bolsonaro e os bolsonaristas, equivocadamente, definem como de esquerda. Equivocadamente, também, porque quem recusa a legitimidade da esquerda no mundo moderno fatalmente recusa a democracia cujos adeptos estão indicados no número dos que recusaram o voto ao vencedor. Isso não quer dizer que esse seja o número dos esquerdistas. Quer dizer apenas que esse é o número dos adversários potenciais do pensamento tosco e unilinear da direita.
As escolhas frágeis e tendenciosas na área da educação e da ciência sugerem muito claramente que o governo será inaugurado como um programa de guerra contra ideias, contra o conhecimento e contra a cultura. Serão, provavelmente, 39% contra 61%. Um jeito problemático de inaugurar um governo com a pretensão de ser um governo da ordem com base numa orientação política de guerra aberta contra o cerne da civilização, que é a da diversidade social e de ideias.
José de Souza Martins é sociólogo. Professor Emérito da Faculdade de Filosofia da USP. Membro da Academia Paulista de Letras. Entre outros livros, autor de “Desavessos – Crônicas de Poucas Palavras” (Com-Arte).
Sexta-feira 30/11/2018
Folha de S.Paulo: As perigosas teorias da conspiração da família Bolsonaro
Raquel Landim
- O vereador Carlos Bolsonaro (PSL) fez uma acusação gravíssima nesta quarta-feira (28) em uma rede social. Segundo ele, a morte do presidente eleito Jair Bolsonaro interessaria “não apenas aos seus inimigos, mas também aos que estão muito perto, principalmente após sua posse”.
Se houvesse alguma chance de ser correto o que ele diz, as ações despencariam, o dólar dispararia, os veículos de comunicação estariam em polvorosa e as forças de segurança deveriam ser acionadas. Afinal, estaria em risco a segurança do futuro mandatário do país.
O vereador, contudo, faz suas acusações levianamente. Apenas pede aos seus seguidores que “pensem e entendam o enredo diário”. Ou seja, que deduzam pelos acontecimentos que se algo parece ser verdade, deve ser verdade. Difícil um caso que encaixe melhor no conceito de fake news.
As irresponsáveis declarações de Carlos, que chegou a ser aventado pelo pai para ocupar a secretaria de Comunicação do novo governo, foram apenas um exemplo das teorias conspiratórias da família Bolsonaro.
Muito mais grave do que isso, por causa das suas consequências práticas, foi a decisão do presidente eleito de retirar a candidatura do Brasil para sediar a COP-25, conferência anual da ONU de combate ao aquecimento global, que acontece em 2019.
Bolsonaro formou sua convicção com base numa estapafúrdia ideia de que o Acordo de Paris ameaça à soberania nacional, porque envolve o chamado “triplo A” – uma faixa de preservação ambiental que englobaria a Amazônia, os Andes e o oceano Atlântico.
O presidente eleito insiste nessa história desde a campanha, mesmo já tendo sido esclarecido mais de uma vez por autoridades e órgãos de imprensa que o tratado simplesmente não prevê nada disso.
Com base em maluquices como essa e inspirada numa direita radical que ignora evidências científicas, a família Bolsonaro já foi responsável pela indicação de dois ministros polêmicos em áreas sensíveis: o diplomata Ernesto Araújo, no Itamaraty, e o professor Ricardo Vélez, no ministério da Educação.
O presidente eleito e seus filhos —os três políticos com mandatos eletivos e próximos ao pai— parece que ainda não se deram conta de que agora representam o governo brasileiro. Decisões de políticas públicas não podem ser tomadas com base em teorias conspiratórias, mas, sim, em dados, evidências e análises aprofundadas. Eles precisam entender isso rapidamente, sob o risco de enorme prejuízos aos país ou de a sociedade simplesmente parar de levá-los a sério.
Raquel Landim
Repórter associada da Folha, escreve sobre economia há 18 anos.
Quinta-feira: 29.11.2018
Folha de S.Paulo – Moro num país tropical
Janio de Freitas
Voltamos a ser um país atrasado de um povo atrasado
A torrente de acusações judiciais que, de repente, voltou a cair sobre Lula, Dilma Rousseff e até Fernando Haddad —em contraste com o presente antecipado de libertação do delator Antonio Palocci— até agora não teve êxito algum em sua função extrajudicial. Não fez parecer que a continuidade de acusações nega a finalidade, nas anteriores à eleição, de impedir a candidatura de Lula e sua previsível vitória.
O próprio beneficiário do efeito extrajudicial, Sergio Moro, facilitou o fracasso. Ao renegar a afirmação de que jamais se tornaria político, e incorporar-se ao governo que ajudou a eleger, mais do que desmoralizou o seu passado de juiz —como disse que aconteceria, se passasse à política. Tornou mais desprezível a imagem do futuro governo e do país exposta a cada dia pela imprensa mundial.
Voltamos a ser um país com algumas originalidades musicais, carnavalescas, geográficas, mas um país atrasado de um povo atrasado. E não há o que responder.
Onde, no mundo não atrasado, um juiz faria dezenas de conduções coercitivas ilegais, prisões como coação ilegal a depoentes, gravações ilegais de acusados, parentes e advogados, divulgação ilegal dessas gravações, excesso ilegal de duração de prisões, e sua impunidade permanecesse acobertada por conivência ou medo das instâncias judiciais superiores? Condutas próprias de ditadura, mas em regime de Constituição democrática.
No mundo não atrasado, inexiste o país onde um juiz pusesse na cadeia o líder da disputa eleitoral e provável futuro presidente, e deixasse a magistratura para ser ministro do eleito por ausência do favorito.
O juiz italiano da Mãos Limpas tornou-se político, mas sua decisão se deu um ano e meio depois de deixar a magistratura. Moro repôs o Brasil na liderança do chamado subdesenvolvimento tropical, condição em que a Justiça se iguala à moradia, à saúde, à educação, e outros bens de luxo.
A corrupção financeira tem equivalentes em outras formas de corrupção. A corrupção política, com transação de cargos ou postos no Legislativo, por exemplo. A corrupção sexual, a corrupção do poder das leis por interesses políticos ou materiais. Combater uma das formas não gera a inocência automática em outras.
A maneira mesma de combater a corrupção pode ser corrupção imaterial. Ao falar dessa variedade de antiética e imoralidades, no Brasil fala-se até do Supremo Tribunal Federal. A transação do seu presidente, Dias Toffoli, e do ministro Luiz Fux com Michel Temer, para um aumento em que os primeiros e maiores beneficiários são os ministros do STF, ajusta-se bem a diversos itens daquela variedade.
Sergio Moro é dado como futura nomeação de Bolsonaro para o Supremo. Muito compreensível.
Quarta-feira: 28.11.2018
O Globo – A viagem do chanceler –
Bernardo Mello Franco
O novo chanceler está irritado. Ernesto Araújo não gostou das críticas à sua escolha para o Itamaraty. Nessa ele tem razão. Em geral, as reações foram de preocupação e espanto. Fora da bolha bolsonarista, ninguém esperava ver um militante da alt-right no comando da política externa brasileira.
As críticas deveriam ter convencido o futuro ministro a moderar o tom. Ele escolheu o caminho oposto. Em artigo na “Gazeta do Povo”, voltou a se apresentar como um cruzado contra “pautas abortistas e anticristãs”. Também atacou o “alarmismo climático”, como se os estudos sobre o aquecimento global fossem meros boatos de WhatsApp.
Araújo se aproximou do mundo real ao comentar a repercussão da sua escolha. “Alguns jornalistas estão escandalizados, alguns colegas diplomatas estão revoltados”, constatou. Depois voltou a orbitar o seu mundo particular, onde o “marxismo cultural” estaria por trás de uma trama “para que as pessoas não nasçam”.
Dirigindo-se a um interlocutor imaginário, o novo chanceler julgou necessário informar que não precisa de uma camisa de força. “Quando me posiciono, por exemplo, contra a ideologia de gênero, contra o materialismo, contra o cerceamento da liberdade de pensar e falar, você me chama de maluco”, queixou-se.
Depois ele retomou a pregação contra as Nações Unidas, que o Brasil ajudou a fundar depois da tragédia da Segunda Guerra. “No idioma da ONU, é impossível traduzir palavras como amor, fé e patriotismo”, escreveu.
Enquanto Araújo defende ideias exóticas e bajula o novo chefe, prometendo se guiar por sua “mão firme e confiante”, cresce a sensação de o Itamaraty pode ter papel decorativo em sua gestão.
Ontem o deputado Eduardo Bolsonaro assumiu funções de chanceler e anunciou um regime de metas comerciais para os embaixadores. Os que “não trouxerem resultado”, disse, serão removidos de seus postos.
Em visita a Washington, o filho do presidente desfilou com um boné onde se lia a inscrição “Trump 2020”. A turma ainda não subiu a rampa do Planalto e já quer decidir o próximo ocupante da Casa Branca.
Quarta-feira: 28.11.208
O Estado de S.Paulo: Futuro chanceler afirma que vai ‘libertar o Itamaraty’
Em artigo, Ernesto Araújo diz querer combater o ‘marxismo cultural’ e ‘acabar com a ideologia em política externa’
Rodrigo Turrer, O Estado de S.Paulo
O futuro ministro das Relações Exteriores do governo Jair Bolsonaro, Ernesto Araújo, escreveu em artigo publicado na segunda-feira no jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, que vai “acabar com a ideologia em política externa”, e que o presidente eleito confiou a ele a missão de “libertar o Itamaraty” do “marxismo cultural”.
O novo chanceler afirma que pautará sua atuação pelo combate a políticas que compactuam com o que classifica como “alarmismo climático”, “pautas abortistas e anticristãs em foros multilaterais” e a “destruição da identidade dos povos por meio da imigração ilimitada”.
Araújo diz que para “extirpar das relações internacionais brasileiras a ideologia do PT”, é preciso combater o “marxismo cultural”, que busca controlar não mais os meios de produção material, mas de produção intelectual. “Quando me posiciono contra a ideologia de gênero, contra o materialismo, contra o cerceamento da liberdade de pensar e falar, você me chama de maluco. Mas se isso não é o marxismo, com estes e outros de seus muitos desdobramentos, então qual é a ideologia que você quer extirpar da política externa?”, pergunta ao leitor.nRead invented by Teads
‘Torre de marfim’. No começo do texto, Araújo diz que “parte da imprensa e dos colegas diplomatas” esperava que Bolsonaro escolhesse um chanceler que mantivesse a política externa em uma torre de marfim, “sob a desculpa de que a política externa é algo demasiado técnico para ser entendido por um simples presidente da República, muito menos por seus eleitores”. Alguém que “saísse pelo mundo pedindo desculpas”, alguém responsável por “frear o ímpeto de regeneração nacional”.
Para o futuro chanceler, no entanto, a nova política externa precisa traduzir a “sagrada voz do povo”, entendida como a voz do presidente eleito. Essa voz, segundo Araújo, deve ser autêntica e não “dublada no idioma da ONU, onde é impossível traduzir palavras como amor, fé e patriotismo”.
Adotando o discurso “antiglobalista”, Araújo diz que “em uma democracia, a vontade do povo deve penetrar em todas as políticas”, mas que a “mídia” e a burocracia globalista “que gostam tanto de falar em democracia, não sabem disso. Perguntam-se, assustadas: ‘O que vão pensar de mim os funcionários da ONU, o que vai dizer de mim o New York Times, o que vai dizer The Guardian, Le Monde?’”, escreveu o embaixador.
O futuro ministro defende que o País precisa de “alguém que entenda de ideologia” para acabar com ela no Itamaraty, ao reconhecer suas “causas, manifestações, estratégias e disfarces”. “Vencida na economia, a ideologia marxista, nas últimas décadas, penetrou insidiosamente na cultura e no comportamento, nas relações internacionais, na família e em toda parte”, afirma. “Se você repudia a ‘ideologia do PT’, mas não sabe o que ela é, desculpe, mas você não está capacitado para combatê-la e retirá-la do Itamaraty ou de onde quer que seja. Ao contrário, você está ajudando a perpetuá-la sob novas formas.”
Por fim, Araújo diz que estudou os intelectuais marxistas para poder combatê-los. Segundo ele, não basta dizer “não existe mais ideologia no Itamaraty”. “Ou basta pronunciar ‘pragmatismo’ como uma palavra mágica que se instalará sozinha? Gramsci, Lukács, Kojève, Adorno, Marcuse estão rindo da sua cara. Ou melhor, não estão rindo, porque marxista não tem senso de humor”, finaliza Araújo.
Quarta-feira: 28.11.2081
Folha de S.Paulo – Guru de Bolsonaro diz que não existem intelectuais da esquerda do seu nível
Júlia Zaremba, Washington
Para Olavo de Carvalho, movimento conservador brasileiro está atrasado e mostra ‘inexperiência horrível’
Apontado como guru do presidente eleito, Jair Bolsonaro, e de seus filhos, o escritor Olavo de Carvalho, 71, diz que não existem intelectuais da esquerda do seu nível e que seus detratores não passam de difamadores. “A situação é, assim, intelectualmente catastrófica”, afirmou, durante entrevista concedida à Folha nesta segunda (26).
O autor dos livros “O Jardim das Aflições” (1995) e “O Imbecil Coletivo” (1996) vive em Richmond, capital do estado da Virgínia (EUA), desde 2005. E nem mesmo a vitória de um governo conservador o motiva a voltar para a sua terra natal. “Quero ficar aqui no mato até morrer”, diz.
Para ele, o movimento conservador brasileiro está atrasado e mostra uma “inexperiência horrível”. Novas lideranças e uma “direita treinada” poderiam mudar os rumos do conservadorismo.
Apesar de ter emplacado dois ministros no novo governo (Ricardo Vélez Rodríguez para a Educação e Ernesto Fraga Araújo para o Itamaraty), ele conta que não mantém uma relação próxima com o futuro presidente brasileiro. Mas diz que toparia virar conselheiro dele por “R$ 100 ao mês”.
Também não descarta por completo a possibilidade de se tornar embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Mas isso não o agradaria, segundo ele: “Na embaixada não posso nem fumar meu cachimbo, porra!”. O escritor conta que indicou outra pessoa para o posto, mas não quis revelar o nome.
Usuário ativo de redes sociais —em uma delas, acumula mais de 500 mil seguidores—, Carvalho elogia a estratégia de comunicação da campanha de Bolsonaro com os eleitores: sem intermediários, inspirada na usada pelo presidente americano, Donald Trump.
Avalia, contudo, que a campanha do presidente eleito foi um caos, sem coordenação. O que não foi, necessariamente, ruim. “O que aconteceu foi uma colaboração popular espontânea”, afirma.
A imprensa está entre seus alvos preferenciais. Afirma que a opinião conservadora foi banida dos jornais e que ninguém pode falar em Deus sem ser chamado de fundamentalista pela mídia.
Critica ainda o movimento Escola sem Partido (por ter sido proposto antes da realização de uma pesquisa que comprove a hegemonia da esquerda nas instituições de ensino), a educação sexual nas escolas (que incentiva “mais putaria”), os “gayzistas” (que, segundo ele, querem impor seu modo de ser aos outros) e a ideia de aquecimento global.
O sr. tem sido descrito como o guru de Bolsonaro e emplacou dois ministros no novo governo. Tem mantido contato com o presidente eleito? Como é sua a relação com ele?
Minha relação com ele é, literalmente nenhuma. Eu tive um hangout (conversa por aplicativo) com ele. Conversei com ele por telefone três vezes, com o filho umas duas ou três, dois deles estiveram aqui por algumas horas. Isso foi tudo.
Como foi a conversa com Jair Bolsonaro?
Nem lembro mais do que conversamos. Mas foi uma conversa muito boa, muito simpática. Desde 2014, eu vi que Bolsonaro era um dos dois ou três deputados que não estavam metidos em corrupção. Eu disse: voto nesse cara para qualquer cargo que ele se candidatar. Se para presidente, então vai ser presidente.
Em entrevista à Folha no ano passado, o sr. disse que um dos filhos de Jair Bolsonaro pediu um aconselhamento antes das eleições.O que disse?
Primeiro, que tem que centrar na segurança pública. Temos que garantir que brasileiros que saem para a rua para trabalhar vão voltar vivos. O resto pode ficar para depois. Se fizer um governo de merda do começo até o fim, mas resolver esse problema, acabar com 70 mil homicídios ano, você já é herói nacional.
O sr. chegou a indicar algum dos dois ministros diretamente para Bolsonaro?
Sim. Coloquei no Facebook, creio que coloquei também na área de mensagens do Eduardo Bolsonaro (em rede social). Foi tudo. Eu sei que o Bolsonaro lê as minhas coisas e a gente está vendo que leva bastante a sério. Eu fico muito lisonjeado com isso.
Pretende sugerir mais algum nome para o novo governo?
Eu não. Já esgotei meu estoque de ministros. Sugeri esses dois simplesmente porque me ocorreu na hora. Sugeri o ministro da Educação porque o Bolsonaro, em um discurso, disse que iria me convidar para ministro da Educação. Não quero ser ministro, então indico alguém. Então rejeitei e indiquei o Ricardo Vélez Rodriguez, que é pessoa altamente capacitada.
O sr. sinalizou que gostaria de ser embaixador brasileiro nos Estados Unidos.
Não, não. Eu nunca disse que gostaria. Disse que, se me convidassem, o único cargo que eu poderia aceitar seria o de embaixador. Caso, é claro, não houvesse pessoa outra mais qualificada. Acabei até sugerindo um nome. Não vou dizer quem, é porque não foi divulgado ainda.
Mas o sr. chegou a receber algum convite para ser embaixador?
Não. Me ofereceram dois ministérios, da Educação e da Cultura. Eu rejeitei os dois. Se fosse para aceitar um cargo público, o único que eu aceitaria seria esse. Por quê? Motivo muito simples, eu odeio isso, isso para mim seria a minha morte. Mas o Brasil precisa de dinheiro. E onde é lugar para buscar dinheiro? É aqui, porra!
Por que seria tão ruim assumir o cargo?
Não sirvo para esse negócio de ser burocrata. Na embaixada não posso nem fumar meu cachimbo, porra! Esse cargo é para gente que tem cara de pau, que gosta de encenar papéis. Eu não. O único cargo que eu posso exercer é o de Olavo de Carvalho, tá entendendo?
Espera manter relação próxima com o presidente? Aconselhando, talvez?
Depende dele. Se me quiser como conselheiro, eu viro conselheiro e cobro R$ 100 por mês.
O deputado Eduardo Bolsonaro está nos Estados Unidos nesta semana para estreitar as relações entre Brasil e EUA. Pretende se encontrar com ele?
Não pretendo. Ele está em Washington, eu odeio ir para Washington. Aliás, eu odeio sair aqui da minha casa (Olavo vive em Richmond, no estado da Virgínia). Sou do mato, não da cidade.
Um dos motivos que o levou a sair do Brasil foi a chegada do PT ao poder. A eleição de Jair Bolsonaro o motivou a voltar? Não, preguiça. Tenho 71 anos, o que vou fazer aí? Quero ficar aqui no mato até morrer, sossegado.
As eleições resultaram em uma onda conservadora. Em uma entrevista em 2016, o sr. afirmou que seus livros ajudaram conservadores a sair do armário. Acredita que influenciou de alguma forma a situação política atual no Brasil?
O que eu fiz foi o seguinte: arrebentar com a hegemonia intelectual esquerdista em algumas áreas do país. Isso eu fiz basicamente com dois livros, na verdade, três: “A Nova Era e a Revolução Cultural”, “O Imbecil Coletivo” e “O Mínimo que Você Precisa Saber para não Ser um Idiota”. Esses três livros provocaram um furor no meio esquerdista, mas nunca foram respondidos à altura. No mundo, a intelectualidade esquerdista também caiu. Sobraram só dois que pensam, que são David Harvey e o Antonio Negri. Como a intelectualidade brasileira é dependente do exterior, a queda da intelectualidade esquerdista internacional provocou o fim da intelectualidade esquerdista brasileira.
O sr. acredita que exista algum intelectual de esquerda à sua altura no Brasil?
Mas nem pensar! Não existe. Não é que não está à altura minha, não está à altura dos meus alunos. A situação é assim, intelectualmente catastrófica. E à medida que a inteligência cai, sobem os maus instintos. A raiva, o nervosismo, o desejo de vingança, todo um quadro de sintomatologia neurótico e até psicótico.
Em quais aspectos o sr. acredita que é mal compreendido pelos críticos?
Não tenho nenhum crítico, crítico é o sujeito que examina e analisa as ideias do outro, nunca nenhum cara da esquerda fez isso. O que fazem, como [o jornalista] Gilberto Dimenstein, é pegar frase solta —que ouviu em programa de rádio, olhou no Facebook— mudar o sentido, mudar a construção da frase, para dar sentido imbecil. Não tenho críticos, só difamadores na esquerda brasileira.
O sr. é um crítico do Foro de São Paulo, que reúne partidos e organizações de esquerda. Como vê a Cúpula Conservadora das Américas, criada por representantes da direita latino-americana?
Eles estão criando resistência conservadora com 28 anos de atraso. E sem a ajuda da mídia. O Foro de São Paulo jamais teria chegado a existir e crescer sem a cumplicidade da mídia. A começar pela Folha de S.Paulo, que manteve o Foro em segredo por quase 18 anos. Escuta, quando houve na América Latina outra organização que congregasse quase 200 partidos políticos e mais de uma dúzia de chefes de Estado? Isso é um nada? Um clubinho de fim de semana? A mídia inteira acobertou esse imenso crime. A mídia brasileira é criminosa. Todas essas organizações são criminosas.
O sr. considera todo o trabalho da mídia criminoso?
Claro que todo o trabalho, não. Existe algum criminoso que na vida só cometa crime? Não faz sentido. O maior criminoso do mundo também toma banho, faz cocô, faz compras para a família, dirige automóvel. Nada disso é criminoso. A Folha também faz coisa que não é criminosa.
Criminalizar a mídia não pode enfraquecer a democracia?
Não. Democracia começou a ser praticada agora. Como é possível um país com 60%, 70% de cristãos e conservadores não existir um partido conservador, uma rádio conservadora, um jornal diário conservador, uma universidade conservadora, nada? Todos os canais foram tampados pela esquerda. Acha que isso é democracia? É ridículo. É tirania. Sistema de manipulação. Agora acabou. Agora começamos a ter democracia. Ninguém vai impedir vocês de falar. Se impedissem, eu seria o primeiro a combater. Pode falar o que quiser, agora, tem que ser responsável pelo que diz. Vai instaurar censura? Eu sou 100% contra, combateria censura até o fim.
Como resolver a situação?
Aparecerem novos órgãos de mídia, que possam concorrer com esses aí, dar voz a quem nunca teve. A opinião conservadora foi banida. Hoje no Brasil ninguém pode pronunciar a palavra Deus sem ser chamado de fundamentalista ou obscurantista por praticamente toda a mídia.
Qual pode ser o impacto do novo governo no movimento conservador?
Provavelmente a destruição desses corruptos, que são os esquerdistas, deve animar um pouco os conservadores, mas eu não sei se isso vai acontecer. Na verdade, em vez de esperar que governo anime os conservadores, são os conservadores que têm obrigação de se reunir para dar apoio ao governo.
O movimento conservador no Brasil falhou?
Não sei. Não tenho capacidade para julgar. Negócio está começando, é cedo. Porém, o fato é que ele faz tudo muito atrasado. E às vezes vai com inabilidade, com inexperiência horrível. A direita é a posição majoritária da nação brasileira, e isso foi demonstrado na eleição de maneira mais do que suficiente, mas você não tem uma direita treinada. O pessoal da direita acordou agora. Foi apenas a opinião popular que se manifestou. Mas não tem ainda lideranças suficientes.
Como poderia melhorar?
Começa a formar uma intelectualidade capacitada. Depois, talvez, apareça classe política. Mas os acontecimentos se precipitaram e o povo elegeu um governo conservador. Antes de tudo isso. Não temos nenhuma intelectualidade pronta. Para não dizer nenhuma, eu formei aí algumas 15, 20 pessoas. Precisava ter cem vezes mais do que isso. Agora, organização não tem nenhuma. A própria campanha do Bolsonaro foi um caos.
Por que considera que a campanha foi um caos?
Eu acompanhei a coisa. Aquilo não tinha coordenação nenhuma. Não tinham dinheiro para fazer campanha. O que aconteceu foi colaboração popular espontânea. Através da internet, WhatsApp, Twitter, sem ganhar nada. Eu mesmo fiz. Vou votar nesse cara, recomendo que façam o mesmo. Eu botei um montão de vezes, milhões de pessoas fizeram isso, e isso foi a campanha Bolsonaro, a primeira campanha popular da nossa história.
Como o sr., que foi um dos primeiros intelectuais a investir na comunicação direta com o público, avalia a estratégia de comunicação da família Bolsonaro com o eleitorado?
Tem que ser assim. Se a mídia não nos dá espaço, temos que abrir o nosso próprio espaço. Hoje eu tenho mais leitores do que qualquer órgão da grande mídia no Brasil, através do meu blog e Facebook. Isso é tudo. Se fosse esperar espacinho na mídia, estaria esmolando na porta até hoje.
O presidente não tem espaço na mídia?
Agora são obrigados a dar algum espaço. Porém a tempestade de informação que cai em cima dele, dos ministros dele, em cima de mim, como se eu fosse autor do governo Bolsonaro, é uma coisa gigantesca, que mostra a total inconformidade da mídia com um governo de direita.
Como classifica o governo Bolsonaro?
Espero que seja governo conservador. O que caracteriza conservadorismo nos lugares onde há uma tradição conservadora? Primeiro economia de livre mercado. Em segundo lugar, a moral judaico-cristã, que aceita grupos minoritários, mas não aceita que ditem normas para a maioria, não pode. Tem espacinho deles lá no canto, mas não queiram mandar na maioria. Como fazem hoje. Terceiro lugar, lei e ordem. A lei existe para ser cumprida e lugar de bandido é na cadeia, ponto final.
Quais seriam esses grupos minoritários querendo ditar normas?
Gayzistas, em primeiro lugar. Hoje em dia tornaram obrigatório achar lindo a relação homossexual. Já leu Graciliano Ramos? Certamente não era um reacionário. Em livro de memórias, conta que tinha nojo físico de homossexual. O que pode fazer para controlar isso? Tem que calar a boca? É um criminoso porque sente isso? Não tem direito de sentir? Eu não sinto isso, pessoalmente, sou um anarquista. Não me escandalizo. Se tem emoção que não tenho é escândalo. Pode viver a sua vida sexual do jeito que quiser. Outra coisa é querer impor como valor universal perante o qual todos têm que se ajoelhar.
Quem está impondo como valores? Não se trata de liberdade?
A mídia inteira propaga essa mentira idiota de que existe genocídio antigay no Brasil. Quando você vai ver, quantos homicídios de gays tiveram? Duzentos e poucos, cento e poucos. Em país que tem 70 mil homicídios por ano. Provando que o fenômeno não existe, mas continuam a fazer todo mundo se sentir culpado. Você é virtualmente um genocida.
Em 2017, um levantamento realizado por uma organização que defende os direitos dos homossexuais apontou um recorde de mortes por homofobia no Brasil: 445 lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBTs) foram mortos.
Não, não. Lesbocídio já foi totalmente desmascarado, isso é falso. Muitas morreram em tiroteio, outras traficando drogas, outras mortas por suas parceiras que certamente não eram heterossexuais, e assim por diante. E mesmo 400, o que são 400 em lugar com 70 mil por ano.
Não acredita que exista crime motivado por orientação sexual?
Pode haver, mas isso é raridade. Evidente que só psicopata fará um negócio desse. Matar um cara porque é homossexual? Pelo amor de Deus! Eles querem dizer que a sociedade é homofóbica. Mas quando vai ver, número de gays mortos por garotos de programa que são eles próprios gays é imenso.
Jair Bolsonaro chegou a afirmar para uma revista que seria incapaz de amar um filho homossexual. O que o sr. pensa dessa declaração?
Olha eu nem acredito que ele pense seriamente nisso, ele falou em momento de fraqueza. Sabe como é repórter, provoca, provoca até você dizer enormidade. Já fizeram comigo, quanto mais não vão fazer com ele. Atitude em si é sinceramente absurda. Mesmo que filho tenha todos defeitos do mundo tem que continuar amando.
O sr. defende que a normalidade democrática é a concorrência “efetiva, livre, aberta, legal e ordenada” entre direita e esquerda. Mas em entrevista à Folha, em 2013, afirma que alguns tipos de esquerda “devem ser expulsas da política e dos canais de cultura”. Acredita que o mesmo deve acontecer com alguns setores da direita? Quais?
Existem ainda os remanescentes dos tempos dos militares, espécie de direita truculenta. Mas eles não têm expressão cultural. São estudantes, comerciantes da esquina, uns zé manés. Nas manifestações de 2013, 2015, apareceram alguns tipos, mas muito poucos e irrelevantes.
Quais seriam os grupos da direita truculenta?
No meio intervencionista, muita gente. Falavam que tinha que matar, começavam com histórias. Claro que são doidos. Não são pessoas que vão realmente matar alguém. Nunca quebraram um nariz de comunista, ficam em casa fazendo homicídios eletrônicos, irrelevantes. Não há periculosidade nessa pessoa. Eu mesmo recebia mensagens. Ficaram loucos da vida comigo quando disse que um golpe militar seria simplesmente impossível, que os militares não o fariam. Até me ameaçaram de morte. Isso foi entre 2013 e 2015.
O sr. afirmou que o novo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, tem sido avaliado de forma pueril. Quais ideias e propostas dele o sr. acredita que não estão recebendo o devido destaque?
O pessoal diz, ah, pode ter diploma, mas é direitista. É direitista sim, mas é governo de direita. Eles não querem cara que é de direita, não pode ter ministro direitista, governo direitista. Essa é uma ideia pueril. Por isso que a democracia vai ter que aceitar o rodízio de partidos no poder. Ele até o momento, que eu saiba, concentrou a sua atenção no problema da alfabetização. Ele sabe que sistema de alfabetização adotado no Brasil por força da esquerda vai ter que mudar. O método sócio-construtivista só forma analfabetos e provoca até lesão cerebral. Tem que voltar ao velho método fônico, beabá, como era nos anos 60, 70. Tem que voltar já. Não sei como ele vai fazer isso. Esse é um ponto. Se ele fizer isso, salvou o Brasil.
O sr. critica o Escola sem Partido e defende que haja um debate científico que quantifique a hegemonia comunista no ensino antes que sejam tomadas ações. Como fazê-lo, na prática?
No começo dos anos 90, sugeri a empresários, instituições militares, instituições de cultura, várias vezes, uma pesquisa vasta sobre a dominação comunista nas universidades e na mídia. Ninguém prestou a menor atenção. Por exemplo, nas universidades, o que tem que ser feito é um recenseamento das teses de mestrado e de doutorado apresentadas nas áreas de filosofia, letras e ciências humanas. Ali já vai ver influência comunista maciça. E ver ao longo dos anos a deterioração na qualidade das teses. Além do recenseamento, fazer várias técnicas cruzadas, inclusive pesquisa de opinião, de eleitorado, da votação.
O novo ministro apoia o Escola sem Partido. Pretende aconselhá-lo de alguma forma sobre a questão?
Eu não saio dando conselho para ninguém, só respondo o que me perguntam. Se o pessoal do Escola sem Partido [entenda a proposta do Escola sem Partido] quiser os meus palpites, eu lhes dou. Se não quiserem, quiserem continuar fazendo do jeito deles, que façam. E ministro também está ali para fazer as coisas do jeito que quiser. Eu não sou desses intelectuais ativistas, assanhados para influenciar o curso das coisas.
Mas nos anos 90 sugeriu a proposta para outros. Por que não agora?
Eu não tenho dinheiro para fazer a pesquisa. Precisa de pelo menos 30, 40 pesquisadores para fazer isso, meu Deus do céu. Se pudesse fazer sozinho já teria feito.
Mas acha que não vale nem sugerir isso para o novo ministro?
Agora é tarde, porque em primeiro lugar todo o pessoal da esquerda já está alertado e podem simplesmente falsificar os dados. Ainda vale a pena fazer, mas com esse risco.
O sr. diz que “não existe caminho das pedras. O Brasil só pode ser melhorado cérebro por cérebro”.
O Brasil precisa acumular experiência. O povo precisa acumular experiência. Por isso sou muito a favor de o governo consultar o povo. Precisamos acabar com história de elite pseudointelectual que acha que sabe tudo. Boa parte está na mídia. Precisamos dar voz ao povo, chance de decidir a sua vida.
A solução seria uma democracia plebiscitária, por exemplo?
Não sei se uma solução, mas acho que uma coisa saudável. Não sei se coisa formalmente publicitária como plebiscitária, mas acho, sim, que governo tem que aprender a ouvir o povo. Coisa que nenhum governo fez, absolutamente nenhum. Todos vieram com soluções prontas que interessavam sobretudo ou aos seus partidos ou grupos de interesses econômicos.
O que o sr. pensa sobre educação sexual nas escolas?
Quanto mais educação sexual, mais putaria nas escolas. No fim, está ensinando criancinha a dar a bunda, chupar pica, espremer peitinho da outra em público. Acham que educação sexual está fazendo bem, mas só está fazendo mal. O Estado não tem que se meter em educação sexual de ninguém.
Como trabalhar nas escolas com a prevenção da gravidez precoce, DSTs e abusos sexuais?
Sou professor de matemática e aparece aluna minha grávida. O que eu tenho com isso? A mãe e pai dela que resolvam, meu Deus do céu.
Mas aí não seria matemático ensinando, mas outro professor, como um psicólogo ou educador sexual.
Não, educadores sexuais são os piores. Vêm com mil teorias mirabolantes e sempre têm agenda secreta. Estado não tem que se meter na educação sexual de ninguém. Nunca se meteu na minha, graças a Deus nunca me deu uma porra de educação sexual e não me fez falta nenhuma.
O que fazer no caso de famílias disfuncionais, de jovens mais carentes?
A sociedade se organiza para isso. Aqui nos Estados Unidos, todo mundo faz trabalho voluntário para alguma entidade. Todo mundo. Para chegar a precisar do governo, só em último caso. Primeiro procura ajuda no bairro dele, na rua, na igreja, nos clubes. Agora, temos que educar a sociedade brasileira para ser solidária, ajudar uns aos outros. Já dizia Santo Agostinho, a base da sociedade humana é o amor ao próximo. Não é sacanear o próximo. Pensam que governo é super-homem, que vai resolver tudo? Não pode, pô. A sociedade que precisa resolver.
Mas ao falar para a sociedade resolver, não estaria sendo um pouco otimista?
Não, não espero que isso se faça rapidamente. Sei todas as dificuldades. Mas vejo o seguinte: se vir os defeitos das minhas próprias ações que mudaram totalmente o panorama cultural e político em 20 anos. Se eu que sou zé mané fiz tudo isso, outras pessoas também podem fazer coisas grandes. Pessoas que tenham coragem, lancem grandes projetos, vão em frente, não fiquem esperando o governo fazer.
O sr. conheceu o novo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Fraga Araújo, há cerca de um ano, correto?
Mais ou menos um ano. Um amigo veio aqui e o trouxe. Era um cara que queria conhecer. Comecei a ler artigos dele no blog, fiquei muito impressionado com a cultura do cara, que vai muito além da média dos diplomatas brasileiros. E da mídia, nem se fala.
O novo chanceler escreveu em um blog que “quer ajudar o Brasil e o mundo a se libertarem da ideologia globalista”. Acha que esse é o caminho?
Mas é claro, tem que fazer isso amanhã. Esse negócio está ferrando com o mundo, um bando de louco presunçoso. Junta lá 200 banqueiros que acham que porque são cheios de dinheiro são todos gênios e que têm a solução para os problemas do mundo. Se acompanhar ao longo do tempo o diagnóstico que esses caras faziam, e soluções que propunham, vê que são todos idiotas, endinheirados, presunçosos. Nos anos 70, 80, pelo Clube de Roma, tinham uma tese assim: em cinco anos, todas as estradas do mundo estarão congestionadas e não haverá mais trânsito. Portanto nós temos que parar de fabricar automóveis agora. Os caras vêm com essa pseudociência, com estupidez do aquecimento global, do peido da vaca.
O senhor não acredita aquecimento global?
Claro que não, nem que exista, quanto mais causado por seres humanos. Há 17 anos não se constata nenhum aumento de temperatura. Como aquecimento global para por 17 anos?
Um levantamento de que aquecimento global pode superar 1,5 grau Celsius até 2040. Acha que não é verdade?
Poderia, no futuro. Falo coisas que acontecem, não que podem acontecer. Igual à polêmica que fazem com Bolsonaro. Viu o número de crimes futuros que atribuem ao Bolsonaro? Não crimes passados. Passado é Lula, turma do PT, a imprensa. Inventam que Bolsonaro vai cometer crime no futuro. Aquecimento global não conseguiram provar que existe. O tempo em que se podia confiar nas instituições de ciência já acabou. Nos últimos 30, 40 anos, o que teve de corrupção na área da ciência é uma coisa terrível. Eu, por via das dúvidas, não confio em cientistas com menos de 60 anos.
A Organização Meteorológica Mundial afirmou que 2017 foi, junto com 2015 e 2016, um dos três anos mais quentes desde 1880. Possível que tenha três ou quatro anos mais quentes, mas na curva geral, não há aquecimento global nenhum. A temperatura sobe e desce. Vamos aguardar os anos seguintes para ver o que acontece.
O que podemos esperar da política externa do novo chanceler?
Esperar não sei, só desejar. Espero que saiba lidar com problema com devida habilidade. Porque ao sair chutando o pau da barraca e fazendo guerra ao globalismo, você se dana. Tem que ir devagar e com muito cuidado, preservando as parcelas de soberania que nós ainda temos. Tem que aprender a negociar, fazer o que o Trump está fazendo aqui. E insistir mais nas relações bilaterais do que nos acordos multilaterais que amarram o país.
O sr. disse que liberalismo virou extrema direita. O que classifica como extrema direita?
Por exemplo, o Ricardo Vélez Rodriguez. Um monte de gente da mídia escreveu que o homem é de extrema direita. Mas ele é um liberal clássico. Como liberal clássico pode ser de extrema direita? Eu não classifico nada como extrema direita. Acho que negócio de extremo é prova de burrice. As correntes políticas não estão em escala como essa da mecânica dos fluidos. Quando sobe lado, baixa outro. Não é assim.
Como o sr. classificaria Jair Bolsonaro?
Ainda não sei. Sei que é um sujeito de alma conservadora. Apegado à moral cristã, à lei e ordem, são elementos conservadores, mais consentimentos conservadores do que ideologia conservadora. Ideologia acho que não tem nenhuma.
Por que não?
Não tem doutrina. Ideologia pressupõe sempre uma doutrina organizadíssima, do começo ao fim. O pessoal não sabe o que é ideologia. Uma ideologia é um sistema de pensamento inteiramente coerente do princípio até o fim. É fórmula pronta para ser decorada e aplicada. Isso aí o Bolsonaro não tem. Como eu também não tenho. Temos que nos contentar com as ideologias inventadas e projetadas para cima de nós por vigaristas.
Quarta-feira: 28.11.2018
Balaio do Kotscho: GENERAIS, DEM, BANCADAS BBB, FILHOS, TEMER E GURU ALOPRADO: EIS A CARA DO NOVO GOVERNOemDe 20ho
“Voltamos a ser um país atrasado de um povo atrasado” (Janio de Freitas).
“Ministério MM: só tem milico e maluco. Ou é conservador ou é cristão século 11” (José Simão).
***
Só faltou um M, caro Macaco Simão: de malaco. Também tem vários no elenco.
Após um mês frenético de transição (ou será transação?), já dá para ver como será a cara do novo governo.
Fora os superministros Paulo Guedes e Sergio Moro, que correm em raia própria, sem dar bola para o capitão, o que resultou até agora foi um ministério que, com boa vontade, pode ser chamado de escalafobético.
Ali se misturam generais de pijama; parlamentares do velho DEM (ex-Arena); refugos do governo Temer; os pentecostais, pistoleiros e latifundiários das bancadas BBB (boi, bala e bíblia); ultra neoliberais do Posto Ipiranga, um ex-juiz no papel de xerife e os ministros indicados pelo guru aloprado Olavo de Carvalho, o “filósofo” caçador de ursos e grande mentor da nova ordem.
Com este zoológico ministerial, que remonta a tempos imemoriais, não deveria espantar ninguém que o capitão reformado aos 33 anos, agora eleito presidente da República, bata continência ao receber em sua casa, logo cedo, na manhã desta quinta-feira, no bunker da Barra da Tijuca, um assessor de Donald Trump, John Bolton, conhecido como “senhor da guerra”.
Esta semana, seu filho Eduardo, deputado e escrivão de polícia, autonomeado embaixador plenipotenciário do país nos Estados Unidos, já tinha posado fagueiro e feliz, em Washington, com um boné de Trump 2020. Qual é a surpresa?
Brasil acima de tudo e Deus acima de todos? Pois, sim…
Que Brasil é esse em que um governo se humilha desse jeito antes mesmo de tomar posse?
O deslumbramento do herdeiro deputado em seu périplo pela matriz é a síntese, o retrato acabado de um governo disposto a fazer do Brasil novamente simples colônia, um pária global.
Ao desistir de sediar a Conferência do Clima, marcada para o próximo ano no Brasil, e abrir baterias contra o Acordo de Paris, Bolsonaro já escancarou sua submissão ao império trumpiano.
Por falar em império, lembrei-me de um jantar, durante a campanha eleitoral de 2002, em que Lula e seu vice, o empresário José Alencar, foram a um jantar com Olavo Setúbal, o lendário patriarca do banco Itaú.
Toda vez que os dois candidatos falavam no que pretendiam fazer, caso fossem eleitos, Setúbal reagia com a mesma frase e sua voz de trovão, desdenhando deles:
“O império não vai deixar!”
Até que uma hora, Alencar, um grande empresário multinacional de Minas, perdeu a paciência, e retrucou:
“Que império é esse, doutor Olavo?”.
Diante da inocência do convidado, o banqueiro subiu nas tamancas:
“Ora essa, que império? O grande império americano, você não sabe?”.
José Alencar deixou de lado seu jeito maneiroso de mineiro do interior e também ergueu a voz:
“Pois fique sabendo, doutor Olavo, que se isso acontecer nós vamos pegar em armas e defender o Brasil”.
Até Lula tomou um susto.
Afinal, na parceria capital-trabalho formada pelos dois para a eleição que os levou à vitória em 2002, os papéis agora estavam invertidos.
Lula era, até então, o metalúrgico radical e, Alencar, o empresário moderado escalado para acalmar os mercados.
Governaram o país por oito anos e recolocaram o Brasil no papel de destaque que lhe cabia no mundo, respeitado até pelo império americano de Barack Obama, de quem Lula viraria amigo de infância. Eram outros tempos.
Assistimos agora a um filme de época, em branco e preto, rodando ao contrário, até aquele tempo do doutor Olavo, em que o Brasil beijava as mãos e se ajoelhava diante dos poderosos do mundo.
Se não fosse tudo real, diria que estamos vivendo um pesadelo coletivo sem dia nem hora para acabar.
E ainda faltam 33 dias para a posse.
Vida que segue.
Em tempo: viajo amanhã para um retiro espiritual no interior de São Paulo, perto das montanhas da Serra da Mantiqueira, na esperança de me desligar um pouco deste trem fantasma que avança sobre nós. Segunda-feira, vai começar tudo de novo.
Quinta-feira: 22.11.2018
Folha – Editorial – República dos réus
Denúncias de malfeitos, comprovadas ou não, são arma conhecida na disputa partidária
“Eu também sou réu no Supremo, e daí?” —assim reagiu o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), a informações publicadas por esta Folha acerca das relações de sua futura ministra da Agricultura e a JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista.
Quando ocupava uma secretaria do governo de Mato Grosso do Sul, a deputada Tereza Cristina (DEM) concedeu incentivos tributários à empresa, para a qual também arrendava uma propriedade.
A partir de delação da JBS, a política estadual de benefícios está no centro de uma apuração sobre pagamento de propina, mas a parlamentar não é alvo de inquérito.
Mais reveladora foi a declaração de Bolsonaro diante de questionamentos sobre o escolhido para a pasta da Saúde, também motivados por reportagem deste jornal.
“Nem é réu ainda”, disse, a respeito de Luiz Henrique Mandetta, também do DEM sul-mato-grossense, investigado por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois em um projeto de informatização no estado.
O presidente eleito —que responde a ação por incitação ao estupro no Supremo Tribunal Federal— experimenta o inevitável conflito entre a pregação moralizadora da campanha eleitoral, quando prometia cadeia a adversários, e as condições objetivas para a formação da equipe de governo.
Entre citados em delações, investigados, réus e condenados, nomes de quase todo o espectro partidário nacional estão envolvidos nas operações de combate à corrupção deflagradas nos últimos anos.
Bolsonaro, que explorou com habilidade o sentimento de indignação popular, tem agora a ingrata tarefa de distinguir a gravidade e as circunstâncias de cada caso.
Nem mesmo o principal ícone da Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro, escapou de tal destino. Na condição de próximo ministro da Justiça, teve de minimizar o fato de seu futuro colega de gabinete, Onyx Lorenzoni (Casa Civil), ter recebido dinheiro da JBS pelo caixa dois.
Denúncias de malfeitos, comprovadas ou não, são arma conhecida na disputa partidária nacional. O PT —cujo candidato ao Planalto, Fernando Haddad, acaba de se tornar réu sob acusação de corrupção— destacava-se no uso de tal expediente nos anos 1980 e 1990.
Mais tarde, a legenda culparia o sistema político pelos crimes cometidos no governo. Por frágil que se mostre a desculpa, será instrutivo ver como o neófito Bolsonaro vai lidar com o mesmo sistema.
edolha.com.b
Quarta-feira: 21.11.2018
Folha de S.Paulo – A ‘sala vermelha’ da tortura
Futuro da tortura depende do futuro do torturador, e militares já receberam essa lição
Elio Gaspari
Baseado em documentos da Justiça, o repórter Rafael Soares mostrou que quatro cidadãos presos na madrugada de 20 de agosto durante uma operação militar em favelas da Penha, no Rio de Janeiro, denunciaram torturas sofridas num quartel da 1ª Divisão de Exército.
Eles teriam sido levados para uma “sala vermelha”, onde três pessoas com os rostos cobertos e sem fardas deram-lhes “madeiradas” e chicotearam-nos com fios elétricos.
Um deles informou que a sessão durou cerca de 20 minutos. Todos eram interrogados para identificar traficantes da região. O grupo permaneceu no quartel por 17 horas, até ser levado para uma delegacia. Continuam presos, acusados de traficar drogas.
Durante a operação nas favelas da Penha, do Alemão e da Maré, traficantes mataram um cabo e dois soldados do Exército. Foram presas 86 pessoas e apreendidos 15 fuzis, 27 pistolas e 11 granadas de mão.
A despeito das baixas, essa pode ter sido a ação mais eficaz das forças da ordem desde o início da intervenção militar na segurança do Rio.
Num primeiro momento, a denúncia dos presos levados para o quartel da 1ª DE foi desprezada. Depois que surgiram novas informações, o comando militar decidiu investigar o caso.
Desde fevereiro, quando sete pessoas foram mortas no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, paira sobre uma tropa do Exército a suspeita de ter praticado uma chacina. No caso, poderia ter havido um confronto, mas ainda não se sabe o que aconteceu.
Na denúncia da tortura da “sala vermelha”, os presos teriam conexão com o tráfico e um deles é reconhecidamente viciado, mas o episódio teria ocorrido dentro de um quartel do Exército.
Está sobre a mesa dos comandantes militares a questão do esclarecimento das denúncias. A sabedoria convencional mostra que em certas épocas uma enorme parcela da opinião pública defende uma política de “mata e esfola”. Quando a maré vira, aqueles que ontem eram festejados como vingadores passam a ser vistos como torturadores.
Em 1974 os jornalistas credenciados na Secretaria da Segurança de São Paulo escolheram os melhores policiais do ano e o delegado Sérgio Fleury ficou em quarto lugar.
O acobertamento de violências corrói a disciplina militar. Só isso explica por que em 1943, no meio da guerra, o general Dwight Eisenhower ordenou ao seu amigo George Patton que se desculpasse diante da tropa formada por ter esbofeteado um soldado que, a seu ver, se acovardara. Patton comandava os gloriosos blindados americanos que entrariam na Alemanha.
Quando o torturador vê que seus superiores negam ocorrências das quais participou, passa a crer que faz parte de uma elite onipotente e inimputável. Além disso, o acobertamento cria uma trama de cumplicidades que se infiltra no serviço público, no Judiciário e mesmo na imprensa.
O espírito de corpo que a princípio acoberta defensores de uma ordem específica acaba se transformando num estímulo à ilegalidade, levando agentes para outras formas de delinquência. As cumplicidades criadas na administração do Rio de Janeiro e de alguns outros estados explicam boa parte da anarquia de seus sistemas de segurança.
A “tigrada” francesa que nos anos 50 baixou o pau na Argélia e varejou comunidades árabes terminou seus dias tentando matar o presidente Charles De Gaulle. A brasileira explodiu no estacionamento do Riocentro.
Num livro intitulado “Torture”, o professor americano Edward Peters tratou dessa questão com magistral clareza ao informar: “O futuro da tortura depende do futuro do torturador”. Se ele é aplaudido e promovido, ela se espalha. Se ele é condenado, ela acaba.
Quinta-feira – 22.11.2018
Veja – Bolsonaro anuncia Ricardo Vélez Rodríguez como ministro da Educação
Confirmação do filósofo à pasta foi feita por meio do Twitter na noite desta quinta-feira. Em blog, Rodríguez diz ter sido indicado por Olavo de Carvalho
ão Pedroso de Campos
Ricardo Vélez Rodriguez (Google Plus/Reprodução)
O presidente da República eleito, Jair Bolsonaro (PSL), anunciou na noite desta quinta-feira o filósofo colombiano Ricardo Vélez Rodríguez como futuro ministro da Educação. A indicação de Rodríguez, professor Emérito da Escola de Comando e estado Maior do Exército, foi feita por meio do Twitter, assim como Bolsonaro fez com os integrantes do primeiro escalão do governo que começa em janeiro.r M. Bolsonaro
✔jairbolsonaro
Gostaria de comunicar a todos a indicação de Ricardo Velez Rodriguez, Filósofo autor de mais de 30 obras, atualmente Professor Emérito da Escola de Comando e estado Maior do Exército, para o cargo de Ministro da Educação.
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Vélez Rodríguez se formou em Filosofia pela Universidade Pontifícia Javeriana em 1964, graduou-se em Teologia no Seminário Conciliar de Bogotá em 1967, concluiu o mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) em 1974, e o doutorado em Filosofia pela Universidade Gama Filho em 1982.
Professor associado da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o futuro ministro é autor de A Grande Mentira – Lula e o patrimonialismo petista, publicado em 2015. Em seu perfil no Facebook, refere-se a petistas como “mortadelas” e “petralhas”.
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Indicado por Olavo de Carvalho
Ricardo Vélez Rodríguez mantém um blog chamado “Rocinante”, referência ao nome do cavalo de Dom Quixote de la Mancha, do clássico de Miguel de Cervantes, “um espaço para defesa da Liberdade, da forma incondicional em que Dom Quixote fazia nas suas heroicas empreitadas”.
Em uma postagem datada do dia 7 de novembro e intitulada “Um roteiro para o MEC”, Vélez Rodríguez afirma que seu nome foi indicado a Bolsonaro, entre outros, pelo filósofo Olavo de Carvalho, conselheiro do presidente eleito e guru de seus filhos Flávio, Carlos e Eduardo Bolsonaro. “Amigos, escrevo como docente que, através das vozes de algumas pessoas ligadas à educação e à cultura (dentre as quais se destaca o professor e amigo Olavo de Carvalho), fui indicado para a possível escolha, pelo Senhor Presidente eleito Jair Bolsonaro, como ministro da Educação”, escreveu.
No mesmo texto, o indicado à pasta diz que vê uma “tarefa essencial” ao Ministério da Educação: “recolocar o sistema de ensino básico e fundamental a serviço das pessoas e não como opção burocrática sobranceira aos interesses dos cidadãos, para perpetuar uma casta que se enquistou no poder e que pretendia fazer, das Instituições Republicanas, instrumentos para a sua hegemonia política”.
Ainda em seu blog, o filósofo defende o polêmico projeto Escola sem Partido, que tem apoio de Bolsonaro e pretende combater suposta doutrinação política dentro das salas de aula. “Escola sem partido. Esta é uma providência fundamental. O mundo de hoje está submetido, todos sabemos, à tentação totalitária, decorrente de o Estado ocupar todos os espaços, o que tornaria praticamente impossível o exercício da liberdade por parte dos indivíduos”, observa em um texto divulgado em 5 de setembro de 2017.
deQuarta-feira: 21.11.2018
Folha – Frente Evangélica reage a nome de Mozart Ramos para a Educação
Integrantes da Frente Parlamentar Evangélica reagiram ao nome de Mozart Neves Ramos para o Ministério da Educação, informam Thais Arbex e Julia Chaib.
Tão logo o diretor do Instituto Ayrton Senna despontou como a escolha para a pasta, deputados desembarcaram no centro da transição de governo, em Brasília, para dizer a aliados de Jair Bolsonaro (PSL) que a indicação não seria bem recebida pelo setor.
Os evangélicos apontaram dois problemas. Disseram que Mozart não se identifica com o Escola Sem Partido, plataforma defendida por Bolsonaro e pelos religiosos, e que também não seria contra o que chamam de ideologia de gênero.
Os integrantes da frente ainda disseram que, se Mozart for oficializar, representará uma quebra à plataforma com a qual Bolsonaro se elegeu. Eles levaram o recado a Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que será o chefe da Casa Civil na próxima gestão.
Onyx tentou acalmar os aliados –Bolsonaro têm o apoio dos evangélicos– e disse que o martelo sobre a indicação de Ramos ainda não foi batido.
Terça-feira:20.11.2018
Blog do Reinaldo Azevedo: Colombo, um dos procuradores que lideraram a Operação Mãos Limpas, critica Moro por ter aceito cargo de ministro da Justiça
Por Reinaldo Azevedo, publicado em 20/11/2018 – 16:14
Na Folha. Volto sem seguida:
Gherardo Colombo, um dos procuradores italianos que lideraram a Operação Mãos Limpas, marco do combate à corrupção dos anos 90, afirma não entender as razões do juiz Sérgio Moro para aceitar o convite de Jair Bolsonaro (PSL) para entrar no mundo da política, comandando um superministério da Justiça e da Segurança Pública. “Pergunto-me por quais motivos ele não poderia continuar se ocupando da corrupção como juiz”, diz o ex-magistrado, hoje à frente de uma associação que ensina o bê-á-bá jurídico a jovens. Para Colombo, mesmo Moro sendo alvo de críticas de setores que o veem como parcial e abertamente antipetista, o agora ex-juiz poderia seguir em seu posto sem constrangimento.
De acordo com o entrevistado, isso ocorreria porque, no Brasil, expedientes como a interdição de pronunciamento fora dos autos e a possibilidade de substituição de um juiz cuja neutralidade seja posta em dúvida não têm a mesma força do que, por exemplo, na Itália. Além disso, Colombo levanta questionamentos sobre a adequação da “mentalidade de um juiz, necessariamente imparcial e independente” à chefia de uma pasta que tem a segurança pública em seu escopo.
A Itália tem um precedente de migração para a política de uma figura que se celebrizou no Judiciário. Foi o que aconteceu com Antonio di Pietro, colega de Colombo na Mãos Limpas. Em 1996, ele virou ministro no governo de Romano Prodi. Mas há algumas particularidades nesse caso. A primeira é a de que ele liderou a pasta de Obras Públicas, que não tinha relação com seu trabalho prévio. E Colombo frisa que Di Pietro esperou um ano e meio após o seu desligamento da magistratura para ingressar no Executivo.
Leia abaixo a entrevista, concedida por email.
O senhor acredita que a participação de Sergio Moro no governo Bolsonaro alimentará dúvidas sobre a imparcialidade de sua atuação na Lava Jato e sobre a operação como um todo?
Acredito que os juízes devem ser e parecer imparciais. Pergunto a você: que perguntas são feitas, diante dessa nomeação, por aqueles que acompanharam os acontecimentos da Lava Jato?
Moro disse que sua entrada na gestão Bolsonaro não deveria ser vista como recompensa pela sentença que enviou Lula para a prisão e que não pode viver “com base em um álibi falso de perseguição política [ao PT]”…
Faço uma pergunta análoga: as pessoas, sabendo que Bolsonaro era o antagonista de Lula, tenderão a relacionar as duas coisas, condenação e nomeação [para o ministério]?
O projeto de Moro de levar para o ministério métodos e práticas da Lava Jato, vista com olhos favoráveis por boa parte da opinião pública, é suficiente para justificar sua decisão de ingressar no governo?
Não existe o risco de que o ministro, ainda que apenas em nível subconsciente, seja levado a ver uma eventual corrupção de representantes da força política que o nomeou de uma forma diferente daquela como vê a corrupção de quem se opõe a essa força? Pergunto-me, por outro lado, por quais motivos ele não poderia continuar se ocupando da corrupção como juiz, uma vez que não existem, no Brasil, ao contrário da Itália, instrumentos como a possibilidade de substituição de um juiz, caso sua imparcialidade seja posta em dúvida, ou a proibição de que magistrados antecipem publicamente seu juízo. [Na verdade, existem, mas sua aplicação é menos recorrente no primeiro caso, e menos severa no segundo]. Para terminar, pergunto a você se a mentalidade do juiz, necessariamente imparcial e independente (de outra forma não seria juiz), pode coincidir com a de um ministro da Segurança.
Como a nomeação de Moro difere daquela do ex-procurador italiano Antonio di Pietro, seu colega na Operação Mãos Limpas, para o Ministério de Obras Públicas de Romano Prodi, em 1996? Ele foi criticado à época?
Di Pietro foi nomeado ministro cerca de um ano e meio depois de ter abandonado as investigações da Mãos Limpas. E o foi por um presidente do conselho [primeiro-ministro], Romano Prodi, que havia militado por muito tempo na Democracia Cristã, um partido com muitos membros investigados e também presos na Mãos Limpas. Por isso, a nomeação não provocou comoção; se suscitou críticas, elas foram bastante limitadas.
Se Moro tivesse esperado um pouco mais para entrar na política, o volume e a virulência das críticas teriam sido menores?
Para mim, um juiz que deseja assumir um compromisso político, principalmente se ele se tornou famoso por suas investigações, deveria abandonar definitivamente a magistratura e deixar passar um tempo razoável entre sua demissão e a entrada na política. Também deveria, em todo caso, assumir esse compromisso de maneira que não se pudesse nem sequer suspeitar de que a política influenciou suas decisões.
Comento
Como se vê, quem diz o que parece ser óbvio não é um defensor da corrupção ou alguém que ignore esse trabalho. Ao contrário: Colombo foi uma das estrelas da operação na qual Sérgio Moro diz se inspirar. Que nós, brasileiros, estejamos nos acostumando a literalmente qualquer coisa em matéria de estado de direito, quando se alega o combate à corrupção, bem, isso é um dado da realidade. Mas é claro que a prática causa estranhamento a especialistas de países em que se exige, além do respeito à ordem legal, também o cumprimento do decoro.
Moro, como é sabido, não fez e não vai fazer quarentena nenhuma. Ao contrário: ele havia decidido que permaneceria como dublê de membro do Judiciário e ministro nomeado até o dia 19 de dezembro. Só decidiu pedir exoneração porque foi aberto contra ele um procedimento no Conselho Nacional de Justiça para apurar se atuou de forma partidarizada quando juiz.
Segunda: 19.11.2018
Valor – Bolsonaro diz que o povo brasileiro não sabe o que é ditadura
Por Cristian Klein | Valor
RIO – O presidente eleito, Jair Bolsonaro, relatou à imprensa ter conversado por telefone nesta tarde com o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, político de extrema-direita cujas medidas contra minorias e imigrantes têm sido criticadas pelo Parlamento europeu. “[A Hungria] sofreu muito com o comunismo no passado; é um povo que sabe o que é ditadura. O povo brasileiro não sabe o que é ditadura aqui ainda”, disse Bolsonaro, ao defender a política do premiê húngaro.
O presidente eleito afirmou ter sido contra a “lei de imigração nossa que transformou o Brasil num país sem fronteiras”.
“Não podemos admitir a entrada indiscriminada de quem quer que seja simplesmente por que quer vir para cá”, disse, ao chegar de uma saída de 40 minutos que fez, alegadamente, a uma agência bancária.
Bolsonaro ainda criticou que organizações não governamentais (ONGs) recebam dinheiro público para defenderem imigrantes. “Se são não governamentais, por que receber dinheiro do governo? Nós não vamos dar tratamento específico para ONGs no Brasil. Empresas públicas não vão financiar ONGs para fazer campanha contra o interesse nacional no Brasil”, disse.
Domingo: 18.11.2018
Folha – ‘Eu também sou réu no Supremo, e daí?’, diz Bolsonaro sobre ministra que deu incentivos à JBS
Tereza Cristina concedeu incentivos fiscais ao grupo na mesma época em que manteve parceria pecuária com a empresa
RIO DE JANEIRO – O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), minimizou reportagem segundo a qual sua futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), concedeu incentivos fiscais à JBS enquanto manteve uma parceria pecuária com a empresa. À época, a hoje deputada federal era secretária do agronegócio de Mato Grosso do Sul.
“Eu também sou réu no Supremo, e daí?”, disse Bolsonaro, que responde a ação por incitação ao estupro.
Afinal de contas sou um ser humano, posso errar, e, se qualquer ministro tiver uma acusação grave e comprovada, a gente toma uma providência. Neste momento, ela goza de toda a confiança nossa”, disse, ao visitar a competição mundial de jiu-jítsu Abu Dhabi Grand Slam, no Parque Olímpico da Barra (zona oeste do Rio de Janeiro).
Segundo a reportagem, publicada neste domingo (18), a deputada arrendava uma propriedade em Terenos (MS) aos irmãos Joesley e Wesley Batista para a criação de bois e, ao mesmo tempo, ocupava o cargo de secretária estadual de Desenvolvimento Agrário e Produção, no governo de André Puccinelli (2007 -2014), que foi preso em julho sob acusação de corrupção.
A política de incentivos fiscais do governo estadual está no centro da delação premiada fechada pela JBS com a Procuradoria-Geral da República no capítulo que tratou da corrupção em MS.
Em um período de 13 anos, até 2016, teriam sido pagos R$ 150 milhões em propina.
Tereza Cristina, no entanto, não é alvo de investigação nem de processo no âmbito da delação premiada.
A deputada federal é processada pela JBS em razão do negócio entre eles, que foi fechado entre 2011 e 2012. A empresa cobra na Justiça um total de R$ 14 milhões, em valores atualizados.
Tereza Cristina nega irregularidade. Procurada, a JBS não se pronunciou.
Domingo: 18.11.2018
Eugênio Bucci: Quem gosta mais de desinformação?
Para as plateias de direita extremada, tanto faz se o divulgado é mentira ou verdade
A direita gosta mais de fake news do que a esquerda? Ou, em outros termos: as campanhas de candidatos de perfil “conservador” – os populistas, ultranacionalistas, que pregam soluções violentas para combater a criminalidade, elogiam governos autoritários, dizem defender a dita “família tradicional” e atacam gays e lésbicas – seriam mais propensas a lançar mão das fake news? Ainda não há dados conclusivos sobre isso, mas há indicativos fortes. Vejamos alguns deles.
Em 2016 o mundo descobriu, com um misto de surpresa e excitação, que jovens da Macedônia produziam conteúdos mentirosos para promover a candidatura de Donald Trump. Em seguida, repórteres do mundo inteiro foram atrás desses ativistas para entender suas razões. O que encontraram foi um tanto desconcertante. Os macedônios não tinham propriamente uma predileção pelo republicano loiro. Não queriam nem saber de política. O negócio deles era dinheiro. Eles apenas geravam notícias fraudulentas a favor de Trump e contra Hillary Clinton porque os eleitores dele eram fregueses mais vorazes que os dela. Um desses jovens, o designer Borce Pejcev, explicou tudo à Agência France Press: “Os conservadores eram mais propícios para fazer dinheiro, gostam das teorias da conspiração”.
Então, era isso. Os macedônios difundiam notícias fraudulentas a favor do republicano porque as plateias trumpistas compartilhavam mais as invencionices que eles punham na rede. Compartilhando mais, as plateias conservadoras geravam mais likes, mais cliques, mais audiência e, com isso, mais lucros. Tudo era uma questão de dinheiro. Ponto. Naquele momento, porém, fora o dinheiro, que era pouco, surgiu o primeiro sinal de que as multidões direitistas são as que mais gostam mais de fake news.
Num estudo publicado em janeiro deste ano, ainda sobre a campanha de 2016 nos Estados Unidos, os pesquisadores Brendan Nyhan, do Dartmouth College, Andrew Guess, da Princeton University, e Jason Reifler, da University of Exeter, encontraram a mesma tendência e anotaram: “Os usuários simpatizantes de Trump eram mais propensos a visitar sites identificados como disseminadores de fake news”.
Outra pesquisa, do Instituto de Internet da Universidade de Oxford, divulgada em 1.º de novembro, não desafinou da impressão geral. Em primeiro lugar, a pesquisa mostrou que a quantidade de junk news (um conjunto que agrega, além das fake news propriamente ditas, as mensagens de ódio, ou “discurso de ódio”, e as múltiplas versões de teorias conspiratórias) aumentou consideravelmente entre as campanhas de 2016 e de 2018 (as chamadas midterm eletctions). Em 2016, 20% das notícias analisadas eram junk news. Em 2018 o número subiu para 25%. Em segundo lugar, constatou que os grupos mais à direita sobrepujam os demais no uso das junk news.
Numa classificação que vai de zero (nenhuma interação com junk news) a cem (interação apenas com junk news), os perfis de extrema direita nas redes sociais tiveram nota 89, a mais alta de todas. A direita tradicional, como o Partido Republicano, ficou com 83. As páginas ligadas a causas classificadas como progressistas – grupos feministas ou defensores do direito ao aborto, por exemplo – receberam nota 49. A esquerda institucional, de oposição a Trump, teve nota 24. Por fim, sites jornalísticos marcaram 20 pontos.
O estudo de Oxford pesquisou também a campanha brasileira de 2018, cujos resultados foram anunciados um pouco antes. Em outubro o pesquisador brasileiro Caio Machado, um dos integrantes do levantamento, contou ao Estado sobre o que foi observado no Brasil (reportagem de Beatriz Bulla, correspondente em Washington, publicada em 5/10). Aqui a pesquisa mostrou que tanto partidários de Haddad como aliados de Bolsonaro recorriam às fake news e às junk news, mas, segundo Caio Machado, “apoiadores do Bolsonaro compartilham notícias falsas em maior amplitude e replicam quase todas as fontes identificadas como falsas”. Ou seja, a diferença entre um polo e outro não estaria na estratégia das duas campanhas (ambas se teriam valido de mentiras), mas na aptidão dos dois públicos: o público mais conservador seria mais propenso, também no Brasil, a espalhar as notícias fraudulentas.
Ainda outra pesquisa, do Instituto Datafolha, divulgada em 2 de outubro, mostrou que seis em cada dez eleitores de Bolsonaro se informavam pelo WhatsApp, enquanto, entre os eleitores de Haddad esse número caía para 38% (ou quase quatro em cada dez). Por fim, em 26 de outubro o site Congresso em Foco noticiou que as agências de fact checking Lupa e Aos Fatos e o projeto Fato ou Fake, do Grupo Globo, tinham desmentido, desde o início da campanha, um total de 123 notícias fraudulentas muito compartilhadas. Dessas, 104 eram contra Haddad e o PT e apenas 19 eram prejudiciais a Bolsonaro e seus aliados.
Para se ter uma ideia da boçalidade que deu o tom dessa campanha, uma das junk news contra Haddad assegurava que o candidato do PT teria dito que as crianças, ao completarem 5 anos de idade, seriam consideradas “propriedade do Estado” – e caberia ao Estado escolher o gênero da criança. Essa mentira caluniosa foi desmentida pelo projeto Fato ou Fake, no G1, em 2 de outubro.
Nada disso é conclusivo, evidentemente, mas vão se acumulando indícios convincentes de que as fake news (e as junk news) florescem mais nos canteiros do populistas ultraconservadores, ultranacionalistas e um pouquinho machistas. Por que será? Talvez – apenas talvez – porque a cultura política esteja atravessando uma mutação. As plateias da direita extremada parecem abrir mão do compromisso com os fatos e se encontram em rota de ruptura não apenas com as ideias de centro ou com as ideias de esquerda, mas com os próprios fundamentos da política democrática. Para essas plateias, se é mentira ou verdade, tanto faz.
*Jornalista, é professor da ECA-USP
Sábado – 17.11.2018
O Globo – charge de Chico Caruso
Quinta-feira: 15.11.2018
Brasil 247 – Imprensa Global já tira sarro do futuro chanceler
O Brasil já virou motivo de chacota na imprensa internacional por conta da indicação do diplomata Ernesto Araújo para chefiar o Itamaraty; jornal The Guardian, o mais respeitado da Inglaterra, publicou reportagem neste domingo, 15, cujo título é: “Novo ministro das Relações Exteriores do Brasil acredita que mudança climática é uma trama marxista“; “Ernesto Araújo – até recentemente um funcionário de nível médio que escreve sobre a ‘criminalização’ da carne vermelha, petróleo e sexo heterossexual – se tornará o principal diplomata do maior país da América do Sul. Sua nomeação, confirmada por Bolsonaro na quarta-feira, deve causar um arrepio no movimento climático global”, diz o Guardian
247 – O Brasil já virou motivo de chacota na imprensa internacional por conta da indicação do diplomata Ernesto Araújo para o cargo de ministro das Relações Exteriores do governo eleito de Jair Bolsonaro.
O jornal The Guardian, o mais respeitado da Inglaterra, publicou reportagem neste domingo, 15, cujo título é: “Novo ministro das Relações Exteriores do Brasil acredita que mudança climática é uma trama marxista”.
“Ernesto Araújo – até recentemente um funcionário de nível médio que escreve sobre a ‘criminalização’ da carne vermelha, petróleo e sexo heterossexual – se tornará o principal diplomata do maior país da América do Sul, representando 200 milhões de pessoas e a maior e mais biodiversa floresta da Terra, a Amazônia. Sua nomeação, confirmada por Bolsonaro na quarta-feira, deve causar um arrepio no movimento climático global”, diz o The Guardian.
O jornal inglês lembra que o Brasil foi onde a comunidade internacional se reuniu pela primeira vez em 1992 para discutir reduções nas emissões de gases de efeito estufa. Além disso, os diplomatas brasileiros têm desempenhado um papel crucial na redução do fosso entre nações ricas e pobres, particularmente durante a construção do acordo de Paris em 2015.
“Mas quando o novo governo tomar o poder em janeiro, o Ministério das Relações Exteriores que lidera esse trabalho será encabeçado por um homem que afirma que a ciência do clima é meramente ‘dogma'”, diz o jornal.
Quarta-feira: 14.11.2018
Folha – Lula diz em depoimento que prisão dele era um ‘prêmio’, segundo advogados
Essa foi a primeira vez que o ex-presidente deixou a prisão, na sede da Polícia Federal em Curitiba
Estelita Hass Carazzai
CURITIBA – Após quase três horas, terminou pouco antes das 18h desta quarta-feira (14) o interrogatório do ex-presidente Lula na Justiça Federal do Paraná —o primeiro depois de sua prisão e o primeiro à juíza substituta de Sergio Moro, Gabriela Hardt.
Durante o interrogatório, Lula afirmou que sua prisão era “um prêmio” na Operação Lava Jato. “Só não sei para quem”, declarou, segundo advogados.
Antes dele, depôs também o pecuarista José Carlos Bumlai.
Os dois são réus na ação sobre as reformas no sítio de Atibaia (SP), que era frequentado pelo ex-presidente —e que, segundo o Ministério Público Federal, pertencia de fato ao petista.
Advogados que acompanharam a audiência disseram que Hardt fez questionamentos incisivos, tanto quanto seu antecessor, e acharam o ex-presidente, detido desde abril, mais magro.
Essa foi a primeira vez que Lula deixou a prisão, na sede da Polícia Federal em Curitiba.
Mas José Roberto Batochio, que integra a defesa de Lula, afirmou a manifestantes que saiu “com o coração mais leve”, e disse que o político prestou um depoimento satisfatório.
Ao contrário de audiências passadas (este é o terceiro interrogatório de Lula na Justiça Federal do Paraná), o esquema de segurança foi reduzido, e apenas a praça em frente ao prédio foi interditada. Cerca de 150 manifestantes em apoio a Lula se concentraram no local, e não houve confrontos.
Aliados aproveitaram a ocasião para criticar Hardt, que irá conduzir os processos da Lava Jato até a escolha de um novo juiz titular.
“O chefe dela é ele [Moro]”, afirmou o deputado Paulo Pimenta (PT-RS).
“Não tem nenhuma diferença. É amiga dele [de Moro]”, disse a senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT. “Ele tirou férias para que a juíza substituta pudesse continuar o julgamento e seguisse o seu roteiro, que é condenar Lula.”
Hardt assumiria as ações mesmo que Moro tivesse pedido exoneração, enquanto durasse o processo de escolha do novo juiz titular —mas, nesse caso, por menos tempo. Com as férias de Moro, a escolha só será iniciada no final do ano.
Segundo a denúncia, as obras no sítio de Atibaia, que foram executadas pelas empreiteiras OAS e Odebrecht, teriam sido pagas com dinheiro desviado de contratos da Petrobras.
Lula nega as acusações e diz ser perseguido politicamente.
O depoimento estava marcado para o período eleitoral, mas foi adiado por Moro.
Terça-feira -13.11.2018
Folha de S.Paulo – A imprensa estrangeira e Bolsonaro
Brian Winter
Creio que a maior parte de nossas críticas a Bolsonaro tenham origem não na parcialidade mas sim na parte mais importante do trabalho de um jornalista: a observação
Um amigo me ligou esta semana com uma queixa: “Por que a imprensa estrangeira está sendo tão dura com Bolsonaro?”
É uma pergunta justa, e que tenho ouvido muitas vezes recentemente. E as respostas são complexas —o que pode nos dizer muito sobre o clima dos próximos quatro anos.
Para começar, uma nota pessoal: vivi em São Paulo entre 2010 e 2015 como repórter de uma agência internacional de notícias.
Hoje em dia, sou editor chefe de uma pequena revista sediada em Nova York e continuo a escrever regularmente sobre o Brasil, o que inclui artigos recentes alertando sobre o risco que Bolsonaro pode representar para a democracia e os direitos humanos. O que se segue representa minha opinião pessoal apenas, e não tem a intenção de falar por meus colegas.
É bom começar por uma autocrítica. Os jornalistas como grupo, quer no Brasil, quer nos Estados Unidos e em outros países, tendem a estar mais à esquerda do que a população em geral, ideologicamente.
Numerosos estudos apontam para esse fato, entre os quais uma pesquisa conduzida em 2014 por professores da Universidade de Indiana que constatou que a probabilidade de que um repórter americano se identifique como democrata é quatro vezes mais alta do que a de que ele se identifique como republicano. O motivo para que isso aconteça é causa de forte debate. Mas acredito que seja justo dizer que os jornalistas se sentem mais inclinados a gostar pessoalmente de Barack Obama ou Fernando Haddad do que Donald Trump ou Jair Bolsonaro, ainda que muitos deles trabalhem para deixar de lado seus sentimentos pessoais.
Isso posto, creio que a maior parte de nossas críticas a Bolsonaro tenham origem não na parcialidade mas sim na parte mais importante do trabalho de um jornalista: a observação.
No meu caso, estudei Bolsonaro por dois anos. Fiz entrevistas com ele, com seus filhos e com muitos de seus seguidores. E fica claro para mim que o ex-capitão do exército construiu sua carreira em torno da nostalgia pela ditadura, apoio à tortura, redução nas proteções às minoriais e aos suspeitos de crimes, e do desejo de permitir que a polícia mate com mais liberdade. Não se trata de declarações acidentais. declarações “acidentais”.
Essas posições são centrais para a identidade dele. Em quase três décadas de vida política, ele sempre foi muito coerente, embora seu tom tenha mudado um pouco, recentemente.
Assim, quando escrevo que a presidência de Bolsonaro pode prejudicar as instituições democráticas ou resultar na morte de mais pessoas inocentes, creio que eu esteja refletindo com precisão suas palavras e ideias, como deve um jornalista.
Bem, voltando à essência da pergunta de meu amigo: por que a imprensa estrangeira vem sendo tão dura?
Começarei por descartar uma acusação comum: a de que os estrangeiros não compreendem o Brasil. Sim, aqueles que vêm para uma visita curta muitas vezes escrevem besteiras; se as palavras “samba” ou “país do futuro” constarem do primeiro parágrafo, isso em geral é sinal de problema. Mas o destaque internacional maior que o Brasil obteve nos últimos anos, como produto do boom econômico da década de 2000 e mais a Copa do Mundo e a Olimpíada, produziu uma geração verdadeiramente excelente de jornalistas estrangeiros. Muitos deles viveram no Brasil por anos, viajaram muito pelo país e têm ótimas fontes.
Portanto, o que nos diferencia da mídia brasileira em nossa cobertura de Bolsonaro? Bem, observamos sua ascensão em um contexto mais internacional. Os 10 últimos anos viram o que Larry Diamond, cientista política da Universidade Stanford, define como uma “recessão democrática”, com deterioração de instituições e direitos na Polônia, Turquia, Indonésia, Venezuela e muitos outros países. As declarações de Bolsonaro sobre fechar o Congresso ou fazer uma limpeza nunca vista na história dos esquerdistas do Brasil parecem se enquadrar a essa tendência mundial. Jornalistas americanos como eu também tendem a ver ecos de Donald Trump — que Bolsonaro admira abertamente e a quem ele imitou.
É difícil escrever isso, mas as audiências para as quais escrevemos talvez se importem mais com a democracia do que a maioria dos brasileiros em 2018. Uma recente pesquisa do Pew Research Center mostrou que apenas 21% dos brasileiros viam um governo autoritário como ideia “muito ruim” —o resultado mais baixo entre todos os países pesquisados exceto a Rússia (13%) e a Indonésia (10%).
Outras pesquisas mostraram resultados semelhantes. Nossos alertas sobre as instituições e os direitos das minorias são vistos pelos brasileiros, para usar uma palavra que ouvi frequentemente, como mimimi.
Por fim, talvez tenhamos mais liberdade do que alguns de nossos colegas locais. Nas últimas semanas, ouvi queixas diretas de diversos jornalistas brasileiros que afirmam que seus patrões já os estão desencorajando de cobrir Bolsonaro de modo crítico, seja por motivos financeiros, seja por motivos ideológicos. Alguns repórteres estão frustrados, e já começaram a procurar novos empregos.
É importante que os jornalistas continuem a observar Bolsonaro cuidadosamente e que mantenham a mente aberta. Algumas de suas ações e declarações mais recentes indicam que teria adquirido mais respeito pela democracia e pelas instituições, ao se preparar para assumir a presidência. Alguns líderes evoluem ao compreender a seriedade do posto; as instituições brasileiras podem se provar mais fortes do que a maioria dos estrangeiros percebe.
Mas alguns comentários conciliatórios não apagam uma trajetória de quase três décadas. Bolsonaro continua a ter de provar que seu governo será conservador mas não autoritário, ao assumir. Nesse meio tempo, suspeito que boa parte das críticas à imprensa estrangeira vem do desejo de que calemos a boca, vistamos a camisa do time vitorioso e escrevamos apenas coisas positivas sobre o novo governo. Mas não é isso que os verdadeiros jornalistas —de qualquer nacionalidade— fazem. Como disse Katherine Graham, que foi publisher do jornal The Washington Post na era de Watergate, “notícia é aquilo que alguém deseja suprimir. O resto é só publicidade”.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Brian Winter é editor chefe da revista Americas Quarterly
Segunda-feira – 12.11.2018
Valor – Ouviram do Ipiranga
Fernando Limongi
Bolsonaro continua em campanha. Levantamento feito pela Folha de São Paulo mostrou que o ataque ao PT foi o tema dominante de suas entrevistas pós-vitória. Vale a comparação com Dilma que ignorou Aécio e anunciou que sua prioridade seria o combate à corrupção, que não deixaria ‘pedra sobre pedra, doesse a quem doesse’. Como se vê, acusá-la de estelionato eleitoral é injusto.
Bolsonaro e seu fiel escudeiro Paulo Guedes parecem não se terem dado conta de que a eleição acabou e que agora lhes cabe a dura tarefa de ser governo. O Czar da economia sugeriu uma ‘prensa’ no Congresso, demonstrou descaso absoluto pelo orçamento em elaboração e afirmou que contrariar suas ideias seria contribuir com o retorno do PT ao Poder.
Eduardo Bolsonaro, requintado como de costume, afirmou que o próximo presidente da Câmara “tem que ter um perfil trator, porque a gente sabe como vai ser a oposição da esquerda”. Contudo, se olhasse os números, o deputado concluiria que a esquerda foi batida nas urnas, que não terá força para barrar projetos do governo, incluindo os que exigirem quórum qualificado.
Moro incorporou-se de corpo e alma ao projeto de Bolsonaro
Até o momento, a despeito da profusão de propostas disponíveis, Guedes não se deu ao trabalho de apresentar detalhes de seu projeto para reformar a previdência. Propôs uma ‘prensa’ no Congresso por propor, um ato reflexo de quem tem o costume de tratar apenas com subordinados obedientes.
Mas o Czar precisará mudar seus hábitos e costumes para entender que seu posto, com ou sem a chancela Ipiranga, pede que ouça parlamentares eleitos pela sociedade para representá-la, parlamentares tão legitimamente eleitos pelas urnas quanto seu comandante.
De concreto, tudo que se ouviu de Guedes foi que ele teria sido o emissário do convite a Sergio Moro. Ou seja, o folclórico Posto Ipiranga virou uma franquia. Com a adesão de Moro, a equipe de Bolsonaro passou a contar com dois nomes de peso, celebridades com brilho próprio, capazes de ofuscar as notabilidades de aldeia — Onyx, Bebianno, Malta e outros menos votados– que cercam o presidente. O choque entre estes corpos de grandeza e órbita distintas é uma questão de tempo, crônica de uma morte anunciada.
O convite e o aceite de Moro dominaram o noticiário da semana. Provavelmente, este foi o mais alto e último ato da campanha de Bolsonaro. O magistrado incorporou-se, se é que já não o havia feito antes, de corpo e alma ao projeto político do presidente eleito. Na chegada, mostrando sua disposição para jogar para o time, perdoou Onyx Lorenzoni pelas propinas recebidas. Com certeza, o veterinário não será o único a receber o tratamento complacente reservado aos amigos que, imediatamente, deixam de ser brasileiros como os demais. Como declarou Bolsonaro no hospital, a questão central é a ideologia, não a corrupção.
O antipetismo radical e o conservadorismo moralista colocaram o capitão e o magistrado no mesmo barco. Moro não mostrou qualquer dificuldade para apoiar as propostas de Bolsonaro para a área da segurança pública, área em que se dará o verdadeiro combate ao crime organizado. Moro declarou ser favorável à redução da idade penal, ao porte de armas por civis e ao relaxamento do excludente de ilicitude.
Este último item é a mola mestra da proposta de Bolsonaro para a segurança pública. Seu ponto de partida se encontra na declaração do General Heleno, para quem “direitos humanos são para humanos direitos. Essa percepção muitas vezes não tem acontecido. Estamos deixando a desejar no combate à criminalidade”. Ou seja, há dois tipos de cidadãos, os direitos e os ‘vagabundos’ e a aplicação da lei deve levar em conta esta distinção fundamental. Aceita tal premissa, segue a conclusão de Wilson Witzel: “Também tem de morrer. Está de fuzil? Tem de ser abatido”. A visão de Bolsonaro – basta ver suas manifestações sobre a chacina da Candelária – segue a mesma toada.
Guardadas as devidas proporções, estes são os princípios que Moro usou ao privilegiar prisões preventivas como estratégia de combate à corrupção. Se o juiz está convencido do crime, não há porque adiar a execução da pena, pois tudo que resta à defesa é recorrer a chicanas legais para protelar a decretação da prisão. A possibilidade de o juiz formar juízo equivocado e agir de forma arbitrária é desconsiderada. E, no caso da Lava Jato, esta convicção passou a ser compartilhada com a Polícia Federal, como mostram os casos movidos contra as universidades federais de Santa Catarina e Minas Gerais.
Bolsonaro e os governadores eleitos no Rio e São Paulo querem que princípios análogos orientem a ação da polícia no combate à criminalidade. A premissa básica é a mesma: tudo que restaria aos ‘vagabundos’ seria a protelação da execução de suas penas. A diferença, contudo, é que caberá à autoridade policial fazer o julgamento e definir a pena que, no limite, pode ser a execução sumária. Em uma palavra, ‘vagabundos’ mereceriam ser tratados como cidadãos de segunda classe e como tais, na visão de Witzel, passíveis de serem abatidos com “tiros na cabecinha”.
Moro classificou esta e outras ideias do presidente eleito e seus aliados como moderadas e razoáveis. Ao fazê-lo, deixou claro que sua adesão ao governo tem raízes profundas, que é um conservador convicto e engajado e que, enquanto tal, defende dotar de poderes excepcionais as autoridades encarregadas de reprimir o crime organizado.
Ou seja, Moro e os conservadores a quem aceitou servir desconsideram a conhecida máxima liberal, aquela que diz que o poder corrompe e que o poder absoluto corrompe de maneira absoluta. A proposta Bolsonaro para a segurança pública, em última análise, dota a autoridade policial de um poder ilimitado. Não há um pingo de razão e moderação neste tipo de proposta. Antes o contrário.
Fernando Limongi é professor do DCP/USP, da EESP-FGV e pesquisador do Cebrap. Escreve às segundas-feiras
fplimongi@gmail.com
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Quinta-feira – 8.11.2018 – É preciso evitar confusão entre política e Justiça’, diz ex-juiz da Suprema Corte da Itália
O Estado de S.Paulo: Integrante da Operação Mãos Limpas, Gherardo Colombo defende quarentena para juiz ocupar cargo público
Marcelo Godoy, O Estado de S.Paulo
Parem de comparar a Operação Lava Jato com a Mãos Limpas. Este é o pedido feito pelo ex-juiz da Suprema Corte da Itália Gherardo Colombo, um dos procuradores que participou da operação que sacudiu o mundo político italiano nos anos 1990. Em entrevista ao Estado, Colombo afirma que o juiz federal Sérgio Moro, responsável pela condução da Lava Jato em Curitiba (PR), deveria ter cumprido um período de quarentena antes de aceitar o convite para comandar o Ministério da Justiça do governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).
A seguir, os principais trechos de sua entrevista:
Como o sr. vê a decisão do juiz Sérgio Moro de aceitar convite para ser o ministro da Justiça e da Segurança Pública no governo de Jair Bolsonaro?
Na Itália não existe proibição para os magistrados suspenderem suas funções a fim de exercer uma função pública, ainda que existam proposta de lei nesse sentido. Pessoalmente, acredito que para ocupar uma função na administração pública um magistrado deve se demitir definitivamente do seu trabalho, deixar passar um tempo consistente, entre a demissão e o início da sua atividade política, tanto mais consistente quando mais tenha adquirido fama em razão de seu trabalho. Na minha opinião há ainda outro problema. A junção das duas pastas – Justiça e Segurança Pública – é um contrassenso, pois se tratam de funções entre as quais podem surgir conflitos de interesse.
De seu ponto de vista, o que poderia ser feito nesses casos? Uma quarentena?
Na Itália, não existem regras que regulem esse problema, ainda que a opinião pública peça, pois é difundida a ideia que se deve evitar o que é entendido como uma espécie de confusão entre a política e a Justiça.
Depois de ocupar um cargo político, um magistrado pode voltar a trabalhar como juiz?
Sim, aqui ele pode e isso não levanta nenhum questionamento, quando se trata de pessoas que não eram conhecidas como juízes, mas incomoda a opinião pública no caso contrário.
O sr. esteve diversas vezes em debates no Brasil com o juiz Moro. Qual teria sido a sua decisão?
Eu não a teria tomado. Acho que estaria traindo a minha independência de magistrado, colocando em dúvida minha imparcialidade com a qual havia desenvolvido o meu trabalho. Em suma: não o teria feito. Mas, infelizmente, há tempos penso que um magistrado que adquiriu notoriedade desenvolvendo o seu trabalho não deveria dedicar-se à carreira política se não seguindo as regras que já mencionei.
Moro fez nesta terça-feira, 6, um paralelo entre a sua escolha de entrar no governo de Bolsonaro e a do juiz Giovanni Falcone quando Falcone decidiu aceitar o convite de Claudio Martelli (então ministro da Justiça na Itália), que lhe confiou a Seção de Negócios Penais do Ministério da Justiça. Para o sr., esse paralelo é possível?
Para mim, é absolutamente impossível. Giovanni Falcone foi desenvolver uma atividade de técnico e não de político. Creio que a Giovanni não agradaria de fato esse paralelo.
Martelli era um socialista que depois foi investigado pela operação Mãos Limpas por concurso em falência fraudulenta e no caso da maxipropina Enimont. Acabou condenado no caso Enimont. É este também um risco para o magistrado quando aceita um convite de um político?
Para dizer a verdade, Martelli foi investigado por Mãos Limpas somente no caso Enimont. Não sei como responder, salvo constatar que isso às vezes acontece, razão pela qual é ainda mais evidente que se deve ter cautela nesse caso. E gostaria ainda de lembrar que a disputa política deve ser realizado dentro da política e que a justiça penal deve servir exclusivamente para determinar responsabilidade pessoais. Eu seria, portanto, muito grato se, no futuro, as pessoas fossem mais prudentes ao estabelecer paralelos entre a Lava Jato e as Mãos Limpas.
Berlusconi convidou dois de seus colegas de Mãos Limpas para serem ministros da Justiça: Antonio Di Pietro e Piercamilo Davigo. Por que eles disseram não? O que eles disseram ao sr.?
Para ter certeza, seria necessário perguntar aos dois. Creio, porém, que as motivações deles são as mesmas que eu teria tido: tutelar a reputação de si mesmos e de seus trabalho. Eu me recordo que Davido — são são passados 24 anos —, me falou que não teria aceitado a proposta porque ela seria contrária à sua deontologia.
Di Pietro aceitou depois um cargo de ministro no governo de Romano Prodi…
O trabalho do magistrado e em particular o do juiz (recordo que Di Pietro desempenhava a função de procurador) é delicado até mesmo na questão da aparência, além da efetividade, da independência e imparcialidade. O fato de Di Pietro ter deixado passar um ano e meio entre o abandono das investigações e a aceitação do cargo e o fato de ele ser ministro de um governo presidido pela Democracia Cristã – partido cujo secretário estava preso no âmbito de nossa investigação, acusado de dezenas e dezenas de crimes de corrupção e financiamento ilegal – fizeram com que a sua reputação ou a de nossas investigações não sofressem nenhum arranhão, até porque os integrantes daquele partido haviam sido pesadamente afetados pela nossa apuração.
O que procura o mundo político quando convida um juiz a se tornar um político ou ocupar um cargo político?
Eu creio que a proposta possa ser feita de boa fé quando se leva em consideração que o magistrado tenha uma particular competência na matéria. Às vezes, quando o magistrado é conhecido pode haver uma motivo instrumental, no sentido de que o partido político quer atrair votos graças á fama do magistrado. Pode acontecer, e para mim é a situação mais grave, que exista uma comunhão de interesses entre o partido político e o magistrado enquanto este está desenvolvendo seu trabalho como juiz.
Para o sr., a participação de magistrados em cargos políticos desgasta a imagem de imparcialidade da Justiça?
Eu faria uma distinção: há magistrados que na Itália, sem serem famosos mas sendo muito preparados tecnicamente, desenvolveram muito proficuamente atividades políticas de um modo, digamos, tão independente, sem se tornar orgânicos de nenhum partido. Do exercício da função política da parte desses magistrados ninguém se queixa. Diferente é a situação de magistrados particularmente conhecidos, na crista da onda, que infelizmente estão desenvolvendo ainda as funções de juiz quando, de um dia para o outro, aceitam um cargo político de relevo, oferecido talvez por quem declarou ter sido favorecido pelas investigações. Para mim, a ideia de imparcialidade da magistratura fica prejudicada e não pouco com isso.
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Quinta-feira – 8.11.2018
Desilusões
Veríssimo
“Desilusão, desilusão… ” O samba do grande Paulinho da Viola, cantado pela grande Marisa Monte, seria um fundo musical perfeito para estes estranhos tempos. Poderíamos chamá-lo de “leitmotiv” da nossa desesperança, se quiséssemos ser bestas. A desilusão começou quando? Dá para escolher. No fim da ditadura que o Bolsonaro diz que nunca existiu, quando Tancredo ia tomar posse como o primeiro presidente civil em 20 anos, mas os germes hospitalares de Brasília tinham outros planos? Depois viria o entusiasmo seguido de grande frustração com Collor, o Breve, tão bonito, tão moderno, tão raso, a desilusão com o PT e a desilusão com os políticos em geral, agravada com as revelações de que até grão senhores da República levavam bola.
E a desilusão com o 7 x 1, e a desilusão com a seleção do Tite, e a desilusão com a votação maciça para presidente de um homem notoriamente despreparado para o cargo por eleitores desiludidos e iludidos. Agora os que claramente anseiam por heróis veem o Sergio Moro aceitar o Ministério da Justiça do novo governo, como recompensa (se não é, parece) por ter despachado o Lula para a cadeia ligeirinho e publicado a delação do Palocci contra o Lula dias antes da eleição. Até os mitos desiludem.
Por falar em escândalos… O samba do Paulinho também tem um verso que, ligeiramente adaptado, nos diz respeito. “Quando eu penso no futuro, não esqueço o passado.” Se essa eleição presidencial por grande maioria provou alguma coisa é que nosso passado não tem mais nenhuma relevância política. A ditadura foi esquecida, até os generais estão voltando. Bolsonaro pode ter razão, a ditadura pode nunca ter acontecido, o golpe de 64 pode ter sido apenas um movimento de tropas, como disse o Toffoli. Foi tudo um delírio, vamos esquecê-lo. Rubens Paiva, Stuart Angel, Vladimir Herzog, Manoel Fiel Filho e as centenas de supostos desaparecidos podem voltar. Acabou a farsa. E façam suas apostas: o que vai ser esclarecido primeiro, o caso da bomba no Riocentro, do qual nunca se ouviu mais nada, ou o caso da Marielle, que também não?
Quinta-feira – 8.11.2018
Folha: Na TV, Bolsonaro telefona para Silvio Santos
São Paulo – O presidente eleito Jair Bolsonaro ligou para o apresentador do SBT Sílvio Santos, na noite de sábado (10), durante exibição do Teleton —campanha para ajudar crianças em tratamento na AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente).
O dono do SBT elogiou Bolsonaro pela indicação de Sergio Moro para o Ministério da Justiça e falou da possibilidade de haver um governo de 16 anos, com o juiz ocupando a Presidência da República. stério da Justiça.
“O senhor nas primeiras medidas que tomou já começou acertando. Acho que nos próximos oito anos o senhor vai ficar no nosso governo. E depois nos próximos oito anos… Tenho a impressão, é um palpite, mas a sua escolha do juiz Moro… Acho que o senhor pode ficar oito anos e o Moro mais oito, e o Brasil terá 16 anos de homens com vontade de fazer o Brasil caminhar.”
Na semana passada, o SBT havia provocado polêmica ao exibir uma vinheta com um slogan que ficou marcado durante o regime militar: “Brasil, ame-o ou deixe-o”. A emissora retirou a peça do ar.
Quinta-feira – 8.11.2018
O Globo: Vinheta infeliz do SBT causa (justa) chuva de protestos
Patrícia Kogut
O SBT pôs no ar anteontem uma série de vinhetinhas alusivas à ditadura militar. Foi um susto para o público. Eram filmetes de alguns segundos — mas longos o suficiente para horrorizar uma multidão de espectadores. O público via aparecerem na tela imagens de paisagens famosas, do prédio do MASP às Cataratas do Iguaçu, ao som do Hino Nacional, de “Eu te amo, meu Brasil” e de “Pra frente, Brasil”. A assombração ficou ainda mais completa no fecho da peça publicitária, em que surgiam os dizeres “Brasil, ame-o ou deixe-o”, slogan nacionalista máximo da triste época do governo do general Médici (de 1969 a 1974).
O choque causado pelo afago nostálgico num período tão sangrento da História do país ultrapassou fronteiras. Entre os que reagiram instantaneamente no Twitter estava, por exemplo, Christoph Harig, professor da Universidade de Hamburgo, na Alemanha. Ele dizia, irritado, que, em alemão, tais vinhetas seriam classificadas como pronunciamentos “chapa branca” (“Hofberichterstattung”). Aliás, o SBT retirou do ar os filmetes, mas eles continuam disponíveis num link no perfil dele (@c_harig) para quem quiser constatar que o repúdio geral manifestado nas redes sociais se justificou amplamente. O nome de Silvio Santos também foi parar nos trending topics, igualmente carregado por comentários negativos, como o de @dallamentos, que escreveu: “Eu não acredito que o Silvio Santos está destruindo todo amor que eu sentia por ele”. Pois é.
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Quinta-feira: 8.11.2018
Jota.info – Após declaração de Moro, Requião apresenta lei Onyx para perdão de caixa 2
Proposta é provocação aos futuros ministros do governo Bolsonaro
O senador Roberto Requião (MDB-PR) apresentou um projeto de lei propondo novos critérios para o juiz conceder perdão judicial para quem for flagrado em crimes eleitorais, contra a administração pública e o sistema financeiro nacional.
O benefício poderá ser concedido caso o réu demonstre arrependimento; confesse a prática do crime; e apresente pedido público de perdão e de dispensa da pena. O senador propôs batizar a Lei de “Onyx Lorenzoni”, nome do futuro ministro da Casa Civil na gestão do presidente eleito Jair Bolsonaro.
O texto diz ainda que “caso seja nomeado para o cargo de ministro de estado, o juízo do feito criminal determinará de ofício o perdão judicial, desde que cumpridas as condições previstas no caput.”
O projeto é uma provocação ao juiz Sergio Moro, que se afastou da Operação Lava Jato desde que aceitou convite para assumir o Ministério da Justiça do governo Bolsonaro. Em entrevista coletiva, o magistrado minimizou a situação de Lorenzoni”, que admitiu ter recebido caixa dois.
“Tenho grande admiração pelo deputado Onyx Lorenzoni. ele foi um dos poucos deputados no momento das dez medidas [contra a corrupção] que defendeu a aprovação daquele projeto mesmo sofrendo ataques severos da parte dos seus colegas. Quanto aos erros, ele mesmo admitiu e tomou providências para repará-los”, afirmou Moro em entrevista coletiva.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, Onyx admitiu ter recebido R$ 100 mil da JBS sem declarar à Justiça Eleitoral para pagar despesas de campanha.
Na justificativa da proposta, Requião diz que a “Lei Onyx Lorenzoni” também pode ser aplicada para Paulo Guedes, que é investigado por fraudes em fundos de pensão.
“E por que não dar a esse perdão o caráter de ato de ofício para os colegas de Ministério do juiz Moro, não o limitando apenas ao Deputado Ônix Lorenozi? Limitar a Lorenzoni seria ato personalíssimo, que viola, portanto, o princípio constitucional da impessoalidade que deve reger a administração pública. Creio, ainda, que as mesmas vantagens, privilégios e prerrogativas ao perdão devem ser estendidas aos crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro. E por quê? A razão é simples: para poder estender o perdão a Paulo Guedes, futuro ministro da fazenda”.
Segundo o senador, a ideia é oferecer isonomia. “Portanto, com o presente projeto, pretendo dar isonomia com Ônix
Lorenzoni a todos aqueles que cometem crime eleitoral ou contra a administração pública ou contra o sistema financeiro nacional, concedendo, a alguns, o direito ao perdão, a critério do juiz. Outros, não precisarão passar pelo critério de qualquer juiz para receber ou o perdão ou a pena: para esses, os amici regis, ou amigos do Rei, a não haverá pena: bastará a tinta da pena do rei”.
O projeto foi apresentado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que avaliará a constitucionalidade do projeto. Está aberto prazo para o recebimento de emenda ao texto.
MÁRCIO FALCÃO – Editor / RAQUEL ALVES – Editora
Quarta-feira: 07.11.2018
Valor – Moro diz “admirar” colega de ministério que recebeu caixa 2 da JBS
Por André Guilherme Vieira e Rafael Moro Martins | Valor
CURITIBA – O juiz federal Sergio Moro disse ter “grande admiração” pelo deputado federal e futuro ministro da Casa Civil Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que admitiu ter recebido doações em caixa dois da gigante alimentícia JBS.
“Tenho grande admiração pelo deputado Onyx Lorenzoni. ele foi um dos poucos deputados no momento [da votação] das dez medidas [contra a corrupção na Câmara] que defendeu a aprovação daquele projeto mesmo sofrendo ataques severos da parte dos seus colegas. Quanto aos erros, ele mesmo admitiu e tomou providências para repará-los”, afirmou.
O juiz foi lembrado de que já chegou a considerar o crime de caixa dois eleitoral mais grave que o enriquecimento ilícito, pois ele tem o poder de desequilibrar eleições. “Eu disse isso nos casos descobertos na Lava-Jato, havia casos em que dinheiro era destinado a financiamento fraudulento [de campanhas], o que é até pior, pois afeta o jogo político-democrático”, ressalvou Moro.
A pergunta sobre Lorenzoni também mencionava os possíveis ministros Alberto Fraga e Magno Malta, que têm contra si respectivamente condenações e investigações criminais. O magistrado, porém, não fez qualquer comentário sobre ambos.
O futuro ministro da Justiça e Segurança Pública também foi questionado sobre as investigações contra o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes – ele é um dos suspeitos na operação Greenfield, que trata de fraudes em fundos de pensão.
“Não conheço as investigações [contra Guedes], o que está nelas, mas o que tenho de notícias é que são muito incipientes. Na atual fase, não é possível emitir qualquer juízo de valor”, disse Moro, numa declaração que não soaria estranha na boca de um político profissional.
Moro, que aceitou convite do presidente eleito Jair Bolsonaro para ser ministro da Justiça e Segurança Pública a partir de 2019, concedeu entrevista coletiva nesta tarde na sede da Justiça Federal em Curitiba.
Terça-feira – 6.11.2018
Veja – Blog do Noblat – Ou Moro é bobo ou se faz
Por Ricardo Noblat
Esta tarde, em entrevista coletiva de imprensa convocada por ele, o juiz Sérgio Moro, em transição para o governo Jair Bolsonaro, poderá explicar melhor o que disse ontem em meio a uma palestra que deu em Curitiba.
Moro disse:
– Eu, aqui, faço uma respeitosa divergência, não me vejo ingressando na política, ainda como um político verdadeiro. Para mim, é um ingresso num cargo que é predominantemente técnico.
E em seguida reforçou:
– Não pretendo jamais disputar qualquer espécie de cargo eletivo. Mas Ministério da Justiça e de Segurança Pública, pra mim, eu estou em uma posição técnica, pra fazer o meu trabalho.
Ministério algum é só técnico ou eminentemente técnico. Muito menos o da Justiça. Ali, Moro terá que tomar decisões políticas e atender a políticos que irão lhe pedir ou se queixar de um monte de coisas.
E o ministro não terá como dizer: “Não, isso não é comigo”. Não poderá delegar decisões que unicamente lhe competem. Salvo se preferir ser chamado de omisso ou pretender durar pouco no lugar.
Ou Moro não entendeu ainda o papel de ministro de Estado ou está se fazendo de desentendido. Ou é bobo ou se faz de bobo. Ou melhor: pensa que que o distinto público bobo é.
Quanto à promessa de “jamais disputar qualquer espécie de cargo eletivo”, o melhor é Moro não prometer mais nada. Ele também havia dito que não despiria a toga para servir a governos. É o que fará.
Segunda-feira: 5/11/2018
O Globo: FH responde a provocação de Bolsonaro no Twitter: ‘Cruz, credo!’
Troca de comentários começou no sábado com crítica à política externa e envolveu livro de ex-premier da China
SÃO PAULO – O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso(PSDB) e o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) trocaram provocações nos últimos dias. A série de comentários começou com uma crítica feita por FH sobre a eventual política externa brasileira e seguiu para as redes sociais, envolvendo uma foto do tucano lendo um livro de um ex-premiê chinês.
No sábado, durante um evento em Lisboa, Fernando Henrique disse que o governo Bolsonaro pode ser prejudicial à imagem do Brasil no exterior, ao responder a uma pergunta sobre a possibilidade de o Mercosul deixar de ser prioridade para a política externa brasileira.
– Será um impacto, no meu modo de ver, negativo (para a imagem do Brasil no exterior). Ele (Paulo Guedes, futuro ministro da área econômica) disse que o Mercosul não é prioridade, o que abala a relação do Brasil com parceiros do Sul. Foi dito que, eventualmente, o Brasil poderia cortar relações com certos países”, afirmou FH, durante o evento Fronteiras XXI, promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e a emissora RTP 3.
A jornalistas, Fernando Henrique disse ainda que não conhecia Bolsonaro para poder julgá-lo:
– Parece que foi parlamentar por 27 anos. Eu fui presidente durante oito, fui ministro durante dois, fui senador por mais não sei quanto tempo e não o conheço. Nunca o vi ou ouvi. Ouvi só agora, recentemente. Não tenho conhecimento pessoal para julgá-lo – disse.
Bolsonaro reagiu no domingo, publicando uma foto em que Fernando Henrique aparece deitado em uma poltrona lendo o livro “Prisoner of the State”, que reúne as memórias do ex-secretário-geral do Partido Comunista da China, Zhao Ziyang, deposto e preso após os protestos da Praça da Paz Celestial, em 1989.
Uma das respostas mais curtidas na publicação de Bolsonaro foi a do empresário Luciano Hang, dono da cadeia de lojas Havan: “FHC enganou a mim e a todos os brasileiros. É um comunista”, tuitou.
Fernando Henrique respondeu nesta segunda-feira: “A desinformação é péssima conselheira. Na foto do Twitter do presidente eleito, eu apareço lendo um livro de ex-premiê da China, deposto e preso, que critica o regime. Isso aparece como ‘prova’ de que sou comunista. Só faltava essa. Cruz, credo!”
Estado.com: A nova era Bolsonaro chegou
Marcelo Rubens Paiva*
Que semana…
A sociedade civil brasileira tem o direito de pedir serenidade ao futuro chefe de Estado. E suas entidades têm o dever de controlar abusos e incoerências dos eleitores. O candidato antissistema precisa repensar o que diz, afinal, ele é sistema agora.
Quatro alunos da Faculdade de Economia e Administração (USP) entraram com roupas militares, armas e as placas “a nova era está chegando” e “está com medo petista safada?” na faculdade e tiram fotos. A USP já identificou três e abriu sindicância.
Aluno da universidade de Bragança Paulista foi preso ao entrar com canivete, rifle de airsoft e bastão, e ameaçou colegas. A Guarda Civil o prendeu em flagrante. A universidade abriu uma sindicância para apurar. O aluno negou as ameaças, mas não explicou as armas.
Quatro apoiadores do presidente eleito invadiram assembleia do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, em Camboriú (SC). O empresário Emílio Dalçoquio, de Itajaí, exaltou-se e deu vivas ao ditador chileno Augusto Pinochet: “Matou quem tinha que matar”.
Segunda-feira, estudante do curso pré-vestibular Oficina do Estudante, de Campinas, levou uma arma de brinquedo e ameaçou os colegas. Disse que voltaria para matar estudantes homossexuais. Foi expulso.
Mãe jornalista de Natal (CE) fantasiou o filho de escravo para o Halloween da escola e postou fotos. Chegou a maquiar as costas do garoto com marcas de chicote. Queria abrasileirar a festa, contou: “Não leiam livros de história do Brasil. Eles dizem que existiu escravidão de negros no País, mas isso é mentira”. Pediu desculpas depois e apagou as fotos. O MP ainda não decidiu se instaura processo.
Deputada estadual recém-eleita, professora Ana Campagnolo, abriu um canal de denúncias na internet para fiscalizar “professores doutrinadores” que, em sala de aula, tivessem “manifestações político-ideológicas”. O juiz Giuliano Ziembowicz, da Vara da Infância e da Juventude de Florianópolis, determinou que a deputada retire a publicação, pois “fere o direito dos alunos de usufruírem da liberdade de expressão da atividade intelectual em aula, que deve ser exercida sem censura.”
O governador eleito do Rio, Wilson Witzel, pediu desculpas à família de Marielle Franco, depois de apoiar a quebra da placa de rua com o nome da vereadora do PSOL executada.
A Marcha do Chola Mais foi agendada pelo Facebook para “cantar e comemorar” a vitória de Bolsonaro pelas ruas da USP. Um dos organizadores, deputado estadual eleito (PSL-SP), Paulo Douglas Garcia, cofundador do movimento Direita São Paulo, não estuda na instituição. Rolou empurra-empurra.
Estudante da Faculdade de Direito do Mackenzie postou vídeos afirmando “estar armado com faca, pistola, o diabo, louco para ver um vagabundo com camiseta vermelha para matar logo”, e “essa negraiada vai morrer”. Pediu desculpas depois, disse que foi uma “bobagem”, um “impulso”, uma “fala completamente equivocada”: “Acabei externando nessas palavras completamente equivocadas, erradas, a pessoas que não tinham nada a ver com a minha indignação. Pelo contrário, não sou uma pessoa racista, muito menos violento”. O MP de São Paulo abriu inquérito.
Ele foi suspenso da faculdade e mandado embora da firma em que trabalhava, DDSA Advogados, que soltou: “Tomamos conhecimento, na tarde de hoje, de vídeo que circula nas redes sociais com declarações efetuadas por acadêmico de Direito que fazia estágio no escritório e imediatamente o desligou de seus quadros. O escritório repudia veementemente qualquer manifestação que viole direitos e garantias estabelecidos pela Constituição Federal”.
Jair Bolsonaro, por três décadas, criou um repertório grande de declarações misóginas, homofóbicas, racistas, somadas a ataques à imprensa e discurso de ódio, que avalizam o comportamento dos seus aliados.
Apoiadores de Bolsonaro entraram na Universidade de Brasília para comemorar a vitória do ex-capitão. Convidados a se retirar, quebraram o pau com estudantes do ICC (Instituto Central de Ciências). A segurança interveio.
Assessor parlamentar de imprensa do presidente eleito entrou num grupo no WhatsApp formado por jornalistas que cobriam a campanha e escreveu: “Vocês são o maior engodo do Jornalismo do Brasil!!!! LIXO”. Escreveu depois: “Gostaria de apresentar minhas sinceras desculpas junto aos jornalistas brasileiros, que por ventura se sentiram atingidos, no tocante ao meu excesso verbal. Agi de forma rude e equivocada para mostrar minha insatisfação na cobertura jornalística do cenário político nacional”.
O ministro Luís Roberto Barroso anunciou que STF se unirá em defesa de negros, gays, mulheres e da liberdade de expressão: “O Supremo pode ter estado dividido em relação ao enfrentamento da corrupção. Muitos laços históricos difíceis de se desfazerem, infelizmente. Mas em relação à proteção dos direitos fundamentais, ele sempre esteve unido”.
O grupo Ninguém Fica Pra Trás abriu conta no site de contribuição coletiva: “O ódio pode estar mais forte do que nunca, mas nossa resposta começa aqui, e agora. Vamos nos unir nesta enorme campanha de financiamento coletivo para apoiar iniciativas que acolhem pessoas vítimas de violência, intolerância, misoginia, homofobia e racismo… A eleição de Bolsonaro tem um efeito grave e imediato: o aumento dos crimes de ódio sobre grupos que foram hostilizados em seus discursos. Mulheres, negras e negros, população LBGTQI, povos tradicionais e refugiados sempre sentiram na pele os efeitos da intolerância – mas agora, com um presidente que incita o ódio publicamente, essas vidas estão ainda mais ameaçadas”.
A Associação Nacional de Jornais, OAB, ABI, Repórteres Sem Fronteiras, Federação Nacional dos Jornalistas, Comitê de Proteção aos Jornalistas e outras entidades repudiaram a entrevista ao Jornal Nacional em que o candidato eleito voltou a atacar a Folha de S. Paulo e afirmou que “por si só, esse jornal se acabou”.
Na quinta-feira, na sua primeira coletiva, foi vetada a presença de representantes dos jornais Estado, Folha, O Globo e agências internacionais. Que semana…
Marcelo Rubens Paiva é escritor, jornalista e escreve em O Estado de S.Paulo
Sábado: 3.11.208 – 4:03
Blog do Reinaldo Azevedo*
11 meses antes do ‘Sim’ a Bolsonaro e 7 antes de prender Lula, disse Moro: política poria em dúvida integridade de seu trabalho. Então, pôs!
No dia 27 de novembro do ano passado, o ainda juiz Sérgio Moro, futuro superministro do governo Bolsonaro — com mais poderes do que concentrou o antigo SNI no seu auge —, participou do “Fórum Veja” e foi entrevistado pela jornalista Thaís Oyama. Estamos falando de um evento ocorrido há 11 meses.
Thaís fez a pergunta que estava em todas as cabeças: ele pensava ou não em exercer um cargo político? Ainda que o contexto sugira que se está falando de função eletiva — e a resposta do então juiz deixa claro que ele próprio tinha em mente, em particular, a Presidência da República —, ouve-se uma negativa peremptória.
Ele descarta “qualquer espécie de cargo político” no presente ou no futuro. Por que não? O homem deixa claro: porque isso “poderia colocar em dúvida a integridade” do seu trabalho. Assistam ao vídeo. https://youtu.be/wUiFuPqVgp0htpps:
Eu transcrevo a fala em seguida e comento na sequência.
TRANSCRIÇÃO
MORO: O que eu coloco da minha inviabilidade de uma postulação dessa espécie — eu acho até que um magistrado, um ex-magistrado, pode ser um bom político, pode ser um bom ex-presidente (sic) — , mas eu entendo que, no momento, e eu não vejo isso também no futuro, NÃO SERIA APROPRIADO DE MINHA PARTE POSTULAR QUALQUER ESPÉCIE DE CARGO POLÍTICO PORQUE ISSO PODERIA, VAMOS DIZER ASSIM, COLOCAR EM DÚVIDA A INTEGRIDADE DO TRABALHO QUE EU FIZ ATÉ O PRESENTE MOMENTO”. ENTÃO EU ACHO QUE NÃO SERIA APROPRIADO. Eu acho que o Brasil precisa de fortalecimento das instituições; acho que o Brasil precisa de fortalecimento daquilo que nós chamamos de ‘rule of law’, ou de ‘governo de leis’, e uma candidatura, por exemplo, minha seria inapropriada para esse propósito…
TRAÍS: Neste momento?
MORO: É, mas no futuro também. No futuro, não vejo isso ocorrendo, mas, especialmente neste momento, seria absolutamente inapropriado”.
Retomo
Bem, as palavras fazem sentido, não? Onze meses depois daquela entrevista e sete meses depois de mandar prender Lula, Moro aceita o cargo de superministro da Justiça do governo Bolsonaro. Assim, levando a sério o que disse, há de se concluir:
– isso coloca em dúvida a integridade do trabalho que fez;
– a aceitação é “absolutamente inapropriada”;
– a tese de um “governo de leis” sai enfraquecida.
Quando decisões do então ex-juiz Moro chegarem aos tribunais superiores, os senhores magistrados certamente terão de levar em conta aquilo que ele próprio dizia sobre aceitar um cargo político. E, convenham, aceitou o mais político de todos eles, certo?
Não custa lembrar que, durante a campanha eleitoral, Moro se encontrou com Paulo Guedes, um dos homens fortes de Bolsonaro, e tratou de sua eventual ida para o governo. Enquanto isso, tomava decisões como juiz.
Sexta-feira – dia 2.11.2018
Folha de S.Paulo: Ministro Moro é Judiciário com partido
Reinaldo Azevedo*
Os protagonistas da Lava Jato estavam e estão envolvidos em um projeto político
“Consummatum est”! Sergio Moro fulminou a classe política e sai como um dos dois grandes beneficiários da razia que promoveu. Já é o primeiro na fila de sucessão —quando Jair Bolsonaro quiser, bem entendido.
Não é “fake news”. O futuro superministro da Justiça e agora ex-juiz encontrou-se com Paulo Guedes durante a campanha e recebeu o convite para chefiar um troço que faz o antigo SNI, mesmo em seus dias de esplendor, parecer brincadeira de criança. A conversa desta quinta com o presidente eleito foi uma formalidade. Alguém poderia objetar: “Não compare ditadura com democracia”.
Claro que não! Se, no entanto, num regime democrático, as leis são submetidas por togados a uma leitura de exceção, depois referendada por colegiados, cumpre que se questione qual é a diferença entre uma ditadura genuína e uma democracia degradada. Certamente as há. Mas nem um regime nem outro conduzem os países a um bom lugar.
Leitores desta coluna e do meu blog e os que me acompanham no rádio e na TV sabem que não tardou para que eu percebesse e apontasse que a Lava Jato era muito pouco reverente à Constituição e ao Código de Processo Penal. E isso para começo de conversa. Liberal, alinhado com o que entendo ser a direita democrática —ainda que seja esta, hoje, uma das vastas solidões do Brasil—, crítico severo das esquerdas e particularmente do petismo, passei a sofrer primeiro as restrições e depois o assédio moral daqueles que me viam como uma peça de propaganda de seus delírios autoritários.
Fazer o quê? Minhas convicções liberais me impõem o necessário formalismo no trato das questões de direito. Nego-me a transferir para demiurgos ou entes a arbitragem sobre a minha liberdade e a de meus adversários intelectuais. Meu herói nada secreto é o intelectual francês Raymond Aron. Submeteu o marxismo universitário a uma das mais impiedosas desconstruções de que se tem notícia e foi um duro oponente das esquerdas. Mesmo no tempo das ilusões armadas, Aron debatia com livros, retórica esclarecida e fatos. Não com pistolas, algemas e correntes.
Ocorre que o combate à corrupção —quem há de ser contra, exceção feita a seus beneficiários?— logo degenerou em ataque aos próprios fundamentos do estado de direito. Infelizmente, o enredo macabro se desenvolveu sob a vigilância rebaixada da imprensa. Passou a vigorar um certo “Padrão Witzel” de combate a criminosos do colarinho branco, reais ou supostos. Se é para pegar bandidos, procuradores e juízes podem atuar como “snipers”, recebendo, por princípio, o que Bolsonaro chama “excludente de ilicitude”. E os que se atreviam a apontar as ilegalidades eram logo tachados de lenientes com a corrupção. E a destruição se deu. Hoje, como resta evidente, a própria liberdade de imprensa virou matéria barata. A tentação da guilhotina sempre supõe que só a cabeça dos maus está em perigo. Errado. Desrespeitar a ordem legal para pegar criminosos é, desde sempre, uma advertência aos não criminosos.
O “Moro político”, que falou com Guedes antes da eleição sobre a possibilidade de integrar o governo, também é o “Moro juiz”, que resolveu liberar trechos da delação de Antonio Palocci. E o fez uma semana antes do primeiro turno. Atribuir a isso a vitória de Bolsonaro é bobagem —esta se deve a muitos outros fatores, incluindo as escolhas do PT, mas não cuido disso agora. O fato é um emblema do que não pode fazer um juiz. O que sempre me pareceu claro, embora fosse constatação quase solitária, revela-se agora de maneira escancarada: protagonistas da Lava Jato estavam e estão empenhados também em um projeto político. Sim, a maquinaria toda tem de funcionar, e as dificuldades são muitas. De toda sorte, o representante máximo do Partido da Polícia, já candidato à sucessão de Bolsonaro, terá nas mãos a ficha dos Três Poderes da República. E ele sabe como exercer o direito criativo.
Não há debates nos cemitérios. Mas os há nas universidades e escolas. Um lugar é, literalmente, a terra dos mortos. O outro é a vereda em que transitam os vivos. O Supremo deu uma resposta maiúscula àqueles que pretenderam usar a Lei Eleitoral, a 9.504, para rasgar os artigos 5º e 220 da Constituição, que garantem a liberdade de expressão, e o 207, que assegura a autonomia universitária. Ainda há juízes em Brasília. Tomara que resistam ao assédio daqueles que nos prometem um pouco mais de eficiência em troca de um pouco menos de liberdade.
Por uma Justiça Sem Partido!
Reinaldo Azevedo é jornalista, autor de “O País dos Petralhas” sobre o PT e escreve na Folha de S.Paulo
Quinta-feira – 1º/11/2018
Época: Conversa na Igreja Universal
Mônica de Boille*
“Da soleira do La Crónica, Santiago fita a Avenida Tacna sem amor: carros, edifícios desiguais e desbotados, esqueletos espalhafatosos de pôsteres flutuando na névoa, o meio-dia cinzento. Em que momento havia o Peru se arruinado?” Essa é a abertura de Conversa no Catedral, de Mario Vargas Llosa, um de meus romances políticos prediletos.
Outro de meus romances políticos favoritos é O leopardo, de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, belíssima crônica da unificação italiana no século XIX. Os atropelos e impasses políticos e a tentativa da aristocracia de manter sua relevância política em meio às grandes mudanças são muito bem resumidos pelo personagem Tancredi na célebre frase: “Para que tudo permaneça igual, é preciso que tudo mude”.
Nas eleições de 2018, houve impressionante renovação no Congresso brasileiro, incluindo a bancada evangélica, que cresceu — agora são 199 deputados e 4 senadores. A Frente Parlamentar evangélica, composta por diversas agremiações, é quatro vezes maior do que as bancadas do PT e do PSL individualmente, embora haja sobreposições. Recentemente, li o manifesto da frente evangélica lançado em 24 de outubro, intitulado O Brasil para os brasileiros — afinal, não apenas essa bancada tem significativa representação na Câmara, como também já havia declarado apoio ao presidente eleito Jair Bolsonaro antes do primeiro turno. O documento está estruturado em quatro eixos: a modernização do Estado, a segurança jurídica, a segurança fiscal e a “revolução na educação”.
Como parte do primeiro eixo, o manifesto defende a redução do número de ministérios para 15. Destacam-se o Ministério da Economia, englobando o Ministério da Fazenda e do Planejamento; o Ministério do Agronegócio, englobando o Ministério da Agricultura e o do Meio Ambiente; e o Ministério da Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia, um pot-pourri. Tudo bem alinhavado com o que tem defendido Bolsonaro.
O terceiro eixo, o da segurança fiscal, fala em obter superávits fiscais consecutivos, ao mesmo tempo que propõe a simplificação do sistema tributário, concentrando-o na renda, não no consumo. Diante da calamidade das contas públicas federais e estaduais, defender superávits e simplificações tributárias não são, no momento, objetivos compatíveis. A bancada evangélica defende ainda a independência do Banco Central para proteger a economia de “governos populistas e perdulários”, proposta também defendida por Bolsonaro a despeito de seu superministro da economia ter falado recentemente na gestão do câmbio e das reservas, ações que cabem ao Banco Central. A Frente Parlamentar também é a favor da reforma da Previdência e do combate aos privilégios, “com a igualdade de regras entre as aposentadorias do setor privado e do setor público”, evidentemente sem destacar quem são os principais beneficiários dos privilégios, como os militares que apoiam Bolsonaro.
A bancada evangélica, para minha surpresa, defende a abertura comercial sob diretrizes não apenas razoáveis, mas absolutamente recomendáveis. Se o Brasil realmente tiver como pauta tudo o que ali está, há espaço para uma ampla integração do país aos fluxos de comércio e investimento internacionais.
O quarto eixo, o da “revolução educacional” é, ao meu ver, o mais problemático. O Brasil está entre os piores colocados no exame Pisa, da OCDE, sobretudo em leitura e matemática. Há muito o que fazer para melhorar a educação no país. Contudo, o manifesto se perde em ideias tacanhas, como a de afirmar que “escolas e universidades públicas se tornaram instrumentos ideológicos que preparam os jovens para a Revolução Comunista”. Lembra a Guerra Fria que contextualizava a Conversa no Catedral, de Vargas Llosa. Fala numa “destruição de valores” que contribuiu para a “violência contra a civilização judaicocristã”. Quer “libertar a educação pública do autoritarismo da ideologia de gênero”. Ou seja, pretende-se, a partir desses anseios, usar argumentos que podem facilmente resvalar para a formação de jovens sem pensamento crítico, algo que já está em nítida falta entre a elite intelectual brasileira. Mudar tudo para nada mudar é o risco dessas propostas que integram a ideologia dos que estão no entorno do presidente eleito. O Brasil ficou para lá de complicado desde o último 28 de outubro.
Mônica Bolle é economista e escreve na revista Época
Quarta-feira – 31 de outubro de 2018
Editorial da Folha de S.Paulo: Acostume-se
“A imprensa não deixará de escrutinar o poder porque seus detentores adotam a tática da intimidação
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, parece obcecado com este jornal. No dia seguinte ao pleito, quando tradicionalmente candidatos vitoriosos desfilam com discursos magnânimos, ele se desviou do protocolo e voltou a ameaçar a Folha.
Ao Jornal Nacional, da TV Globo, reclamou de reportagem que em janeiro revelou o emprego indevido de uma servidora de seu gabinete da Câmara dos Deputados. Na época, afirmou, ela estava em férias e por isso foi localizada em Angra dos Reis (RJ), onde o deputado mantém uma casa de veraneio.
Bolsonaro deixou de dizer, no entanto, que exonerou a funcionária após nova visita de jornalistas da Folha ao balneário, em agosto, constatar que o desvio continuava. O Ministério Público abriu investigação para apurar se o deputado cometeu improbidade no caso.
Seria apenas mais um episódio desimportante de memória seletiva de um político se o presidente eleito não tivesse aventado se vingar da Folha quando assumir o Planalto, cortando-lhe verbas publicitárias federais. ‘Imprensa que se comportar dessa maneira indigna não terá recursos’, afirmou.
Pela primeira vez na história da Nova República, o eleito para servir à Constituição no cargo mais elevado sugere descumprir, uma vez empossado, o princípio constitucional da impessoalidade na administração. Está documentada a afronta, de resto reincidente.
Se mostra disposição para discriminar veículos da imprensa entre amigos e inimigos, que dirá quando os interesses em jogo tiverem mais vulto. Nessa toada logo surgirá a “bolsoburguesia”, composta de empresários palacianos abençoados pelo acesso privilegiado a fundos e regramentos federais.
Não foi ameaça, mas apenas crítica à Folha, tratou de aduzir o advogado Gustavo Bebianno, assessor do capitão reformado, talvez sentindo cheiro de questionamentos formais à frente. A distribuição da verba publicitária, afirmou, obedecerá a critérios técnicos. Este jornal vigiará os próximos lances em situação confortável, pois não depende de propaganda federal.
Depende do público leitor, parte do qual de pronto reagiu à truculência verbal de Bolsonaro e lançou uma campanha espontânea por assinaturas. Depende de seus anunciantes privados, que continuam a confiar na sua marca.
Depende da reputação decantada ao longo de décadas de fidelidade ao cânone do jornalismo profissional —gentilmente reconhecida pelo editor-chefe do Jornal Nacional, William Bonner, diante da parvoíce pronunciada por Bolsonaro.
Veículos como a Folha não deixarão de escrutinar o exercício do poder porque seus detentores de turno resolveram adotar a tática da intimidação. Jair Messias Bolsonaro não precisa aprender a lição. Basta que se acostume com o fato.
Terça-feira – 30 de outubro de 2018
Entidades condenam ameaça de Bolsonaro de retaliar jornais
Leia a reportagem de Luiz Raatz, no Estadão
A ANJ – Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira do Jornalismo Investigativo criticaram nessa terça-feira, 30, as declarações dadas pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, sobre o jornal Folha de S.Paulo. Ele acusa o jornal de propagar notícias falsas a seu respeito.
“É preocupante que o presidente eleito tenha manifestado a intenção de usar verbas publicitárias oficiais como forma de punição a um jornal por discordar de seu noticiário”, disse o presidente da ANJ, Marcelo Rech. “Os investimentos do governo em publicidade, como qualquer outra verba pública, devem seguir sempre critérios técnicos, e não políticos ou partidários”.
Já a Abraji disse receber com apreensão as declarações dadas por Bolsonaro a respeito da imprensa nos últimos dois dias. “O respeito à Constituição – à qual o presidente fará um juramento solene de obediência no dia 1º de janeiro de 2019 – não é pleno quando a imprensa se converte em objeto de ataques e de ameaças”, afirmou a entidade em nota.
O texto afirmou ainda que “fiscalizar o poder público – e, em particular, as ações do presidente da República – sempre foi e seguirá sendo uma função inerente ao jornalismo, exercida em nome do interesse público”. “Zelar por essa função é missão primordial da Abraji, assim como deve ser objeto de zelo de todo governo democrático.”
Jair Bolsonaro em entrevista ao Jornal Nacional Foto: TV Globo/Reprodução
Na entrevista dada ao Jornal Nacional, Bolsonaro prometeu respeitar a liberdade de imprensa, mas disse que o repasse de verbas da União seria uma coisa diferente. “Sou totalmente favorável à liberdade de imprensa, mas temos a questão da propaganda oficial de governo, que é outra coisa”, disse Bolsonaro. “Não quero que (a Folha) acabe. Mas, no que depender de mim, imprensa que se comportar dessa maneira indigna não terá recursos do governo federal. Por si só, esse jornal se acabou”, afirmou o presidente eleito.
Em sua conta no Twitter, o jornal respondeu ao presidente eleito. “Jair Bolsonaro, mesmo após eleito presidente, não deixa de ameaçar a Folha. Ainda não entendeu o papel da imprensa nem a Constituição que promete obedecer.”
Em outra iniciativa, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) chamou a atenção para mensagem distribuída por assessor da própria campanha de Bolsonaro com ataques a jornalistas.
A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu investigação por improbidade administrativa para apurar a contratação pelo gabinete de Bolsonaro na Câmara da ex-funcionária Walderice Santos da Conceição.
Conduzida sob sigilo desde setembro pelo procurador João Gabriel Queiroz, a investigação busca saber se a mulher, ex-secretária parlamentar de Bolsonaro, recebia salário da Câmara e trabalhava em uma loja de açaí na Vila Histórica de Mambucaba, em Angra dos Reis (RJ), onde Bolsonaro tem uma casa de veraneio. A informação foi publicada pela Folha, e é base das críticas que o presidente eleito tem feito contra o jornal.
Walderice era funcionária no gabinete de Bolsonaro desde 2003 e recebia R$ 1.416,33 antes de pedir demissão, após a publicação. Bolsonaro exonerou a secretária parlamentar, mas contestou a reportagem durante a campanha e após eleito. Ele nega que Walderice tenha sido funcionária fantasma e diz que ela trabalhava atendendo demandas da região.
Leia a nota da ANJ na íntegra
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) rejeita com veemência os termos e o teor das declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro ao reiterar ataques ao jornal Folha de S. Paulo, um dos diários fundadores desta entidade, criada há quase 40 anos na defesa da liberdade de expressão.
Eventuais inconformismos com noticiário de veículos de comunicação não podem ser confundidos com inaceitáveis retaliações a jornais por meio de uso de verbas publicitárias oficiais. Investimentos em publicidade por governos, como as demais verbas públicas, devem seguir expressamente critérios técnicos, e nunca políticos ou partidários.
A ANJ espera que o princípio da liberdade de imprensa, saudavelmente afirmado pelo presidente eleito em seu discurso após a vitória nas urnas, se manifeste na prática, o que inclui o respeito a opiniões divergentes e à independência editorial, fundamentos da pluralidade de visões e da democracia.
Marcelo Rech
Presidente da AN
Segunda-feira – 29 de outubro de 2018
Um dia depois das eleições presidenciais, a imprensa estrangeira noticia a subida de Bolsonaro ao Palácio do Planalto.
New York Times, Süddeutsche, Le Monde e El País, entre outros, destacam ‘extrema direita no poder’, segundo a coluna de Nelson de Sá, na Folha de S.Paulo.
Folha de S.Paulo: TODA MÍDIA – Nelson de Sá
Por jornais de âmbito global como New York Times e os econômicos Wall Street Journal e Financial Times, a vitória de Jair Bolsonaro foi anunciada com destaque para a mudança “radical” que representa para o Brasil e a América Latina.
“Depois de escolher presidentes esquerdistas em quatro eleições consecutivas, os brasileiros optaram por um novo rumo radical para a maior nação da América Latina”, noticiou o NYT 3, que classificou o novo presidente de “extrema direita” em seu enunciado digital, sem porém dedicar a manchete.
Na notificação para smartphone, o jornal americano repisou que o Brasil entra agora para “as fileiras de países que se inclinam para a extrema direita”.
No concorrente Washington Post, que também tratou Bolsonaro como extrema direita e evitou dar manchete, sua eleição “marca a mudança mais dramática da América do Sul para a direita desde o fim das ditaduras militares da Guerra Fria”.
WSJ e FT, ambos também usando a expressão em seus enunciados e também negando manchete, sublinharam respectivamente que deve “mudar a maior nação da AL agudamente para a direita” e fazer “o primeiro governo de extrema direita no maior país da AL desde o fim da ditadura militar”. (O WSJ, depois, trocou “extrema direita” por “anti-establishment”.)
Na chamada —sem maior destaque online— do Süddeutsche Zeitung, o principal jornal alemão, “Ultradireitista Bolsonaro se torna o presidente do Brasil”.
Nas manchetes
Na mesma linha, mas dedicando a manchete digital, o espanhol El País afirmou: “Vitória de Bolsonaro leva a extrema direita ao poder no Brasil”. O francês Le Monde e o argentino Clarín, também eles usando a expressão, levaram às suas manchetes a promessa de Bolsonaro de “mudar o destino” do Brasil. (O Clarín, depois, trocou “extrema direita” por “direita”.)
O mais extremista
O NYT destacou análises de Scott Mainwaring, professor especializado em Brasil na Escola de Governo Kennedy, da Unive- risade Harvard: “Esta é uma mudança realmente radical. Não consigo pensar em um líder mais extremista na história das eleições democráticas na América Latina.”
Se…
Sobre Fernando Haddad, Mainwaring afirma que a campanha “se centrou muito em Lula e pouco no futuro do país”. E que “parte importante do eleitorado brasileiro teria votado no PT se ele tivesse feito uma risca na areia e renunciado à corrupção do passado”.
‘Fascista’
De Martin Wolf, venerando colunista do FT: “Bolsonaro me parece ser simplesmente um fascista. Não acredito nem por um momento que queira curar nenhum dos males do Brasil e tenho certeza de que irá piorá-lo. O Brasil pode ser substituído por uma ditadura brutal e corrupta. Isso é muito triste”.
‘Nazista’
O semanário satírico chileno The Clinic 2 , na nova edição, retrata a ascensão de Bolsonaro com uma imagem do Cristo Redentor fazendo a saudação nazista, em contraste com aquela da revista The Economist nos anos Lula, em que a estátua levantava voo.
Verde-e-amarelo
O Drudge Report 4, farol noticioso da direita americana, evitou a expressão em sua manchete, “Bolsonaro ganha o Brasil”, com as letras em verde-e-amarelo, mas linkou para o despacho da agência Reuters, cujo título abre também com “extrema direita”.
Espelho de Trump
O Washington Times 1, jornal conservador da capital americana, publicou artigo saudando “Uma vitória contra o socialismo no Brasil”, ressaltando que a agenda de Bolsonaro “espelha” aquela de Trump e que ele quer “relações melhores com os EUA”.
Valores
Revista dos conservadores mais tradicionais dos EUA, a American Interest publicou longo texto sobre Bolsonaro, que representa o “ressurgimento da direita”. Afirma que “no coração da questão está uma reação coletiva contra as mudanças sociais que estavam substituindo valores familiares tradicionais, aos quais os latino-americanos se vinculam, e impondo secularismo, globalismo e individualismo”.
Ameaça
O canal Al Jazeera 5, do Qatar, dedicou reportagem a discutir a ameaça representada por um governo Bolsonaro à imprensa, partindo da reportagem da Folha sobre o uso da plataforma WhatspApp por sua campanha. O canal lembrou que “o torturador homenageado” por ele, o coronel Brilhante Ustra, teve jornalistas entre as suas vítimas.
Whatsapp Lá
Entre outros, dedicaram longas reportagens ao impacto do WhatsApp na disseminação de notícias eleitorais falsas no Brasil o WSJ, o Guardian e a Vice —esta sublinhando que a plataforma tentou monitorar a eleição sem sair da Califórnia.
Veja Online reproduz charge de jornal holandês que ironiza eleição de Bolsonaro.
Ilustração do diário ‘de Volkskrant’ relaciona vitória do capitão com a ascensão da ideologia nazista no Brasil
Da Redação
O jornal holandês de Volkskrant publicou em sua edição desta segunda-feira (29) uma charge ironizando a eleição de JairBolsonaro. Na imagem, uma suástica nazista é representada nas cores da bandeira do Brasil e construída com os tradicionais chinelos Havaianas.
A charge faz referência às muitas críticas recebidas pelo capitão de seus oponentes, que o acusam de ser o rosto da extrema-direita no Brasil e que o ligaram à ideologia fascista durante a campanha eleitoral.
A ilustração foi assinada pelo cartunista Bas van der Schot e publicada no site e na edição impressa do de Volkskrant, um diário de Amsterdã considerado de centro-esquerda.
Bolsonaro (PSL) venceu neste domingo o segundo turno das eleições presidenciais com 55% dos votos, contra 44% de Fernando Haddad (PT).
Além do de Volkskrant, grandes veículos da imprensa estrangeira repercutiram a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais. Boa parte dos sites se dedicaram a publicar matérias explicando aos leitores detalhes sobre quem é Bolsonaro, desde sua formação militar, passando por suas declarações controversas. Também descrevem a polarização no Brasil, até sobre como o resultado das urnas reflete as insatisfações da população com o Partido dos Trabalhadores.
The Economist
A revista liberal The Economist, que chegou a publicar uma capa chamando Bolsonaro de ameaça, começa seu texto sobre a vitória com a sucinta frase: “Os brasileiros fizeram uma péssima escolha”.
O texto aponta que Bolsonaro é um “apoiador de ditadores e de armas, que incita a polícia a matar suspeitos, que ameaça banir oponentes e diminui as mulheres, os negros e os gays”. Em seguida, a revista explica como o PT colaborou para o crescimento do conservador PSL, com os escândalos de corrupção, o desejo de se manter no poder e a depressão econômica que a política de Dilma Rousseff provocou no país.
New York Times
O jornal The New York Times seguiu o caminho dos concorrentes, lembrando falas polêmicas de Bolsonaro e apontando para o crescimento do conservadorismo da extrema-direita no mundo. “Bolsonaro, que vai conduzir o maior país da América Latina, é o mais à direita entre todos os presidentes da região, onde recentemente os países elegeram líderes mais moderados. Ele engrossa o movimento da extrema-direita que tem crescido no mundo, juntamente com a Itália e a Hungria.”
The Guardian
O britânico The Guardian, que acompanhou a apuração dos votos em uma longa reportagem atualizada em tempo real, foi às ruas no Brasil retratar as celebrações dos eleitores de Bolsonaro. Após destacar diversas frases de entrevistados, como a de um estudante de fisioterapia de 40 anos, que disse ter agora o “presidente que sempre esperamos, que teme a Deus e é genuinamente de direita”, o jornal ressaltou ao fim que o triunfo de Bolsonaro deixou milhões de brasileiros progressistas “profundamente perturbados e com medo da intolerância que vai tomar o país”.
BBC
Muitos veículos também compararam Bolsonaro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A emissora britânica BBC lembrou que as declarações do futuro presidente brasileiro, consideradas racistas, homofóbicas e misóginas por muitos, têm um tom muito parecido com as declarações do presidente americano.
Folha de S.Paulo – 29/10/2018 – foto de bandeira com o nome de Ustra, o coronel que é considerado torturador e foi saudado por Bolsonaro e também por manifestantes na avenida Paulista.
Um dia antes, sábado, 27/10/2018, da votação para presidente do Brasil, segue trecho do El País.
“Há algo que o Brasil já perdeu. E vai custar muito para recuperar. Com Bolsonoro ou sem Bolsonaro, descobrimos que vivemos num país em que a maioria dos brasileiros acha possível votar num homem como Bolsonaro. Sem nenhum drama de consciência, compactuam com todo o ódio que ele produz, são cúmplices do desejo de exterminar aqueles que são diferentes, apreciam as ameaças e os arrotos de poder, exaltam a ignorância e a brutalidade.”