Destaques
Luto. De mãos dadas para enfrentar tempos brutos após as eleiçoes. 20/01/2019
Domingo – 20.1.2019
O Globo – Elio Gaspari – Flávio quer anular provas de procuradores
A corrida do senador eleito Flávio Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal teve dois objetivos. O primeiro foi travar a investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro em torno dos “rolos” de seu ex-assessor Fabrício Queiroz. Daqui a poucos dias, o ministro Marco Aurélio Mello liquidará essa questão, destravando-a. O segundo, essencial, é a tentativa de anular as provas conseguidas pelos procuradores. Que provas? Isso não se sabe, pois o caso corre em segredo de Justiça e até bem pouco tempo Flávio Bolsonaro repetia que não está sendo investigado.
A nulidade das provas é o sonho de todo réu. Na última catedral da impunidade, a operação Castelo de Areia virou pó conseguindo-se anular as provas de que o Sol das roubalheiras nascia na caixa das empreiteiras. Depois dela vieram a Lava-Jato, Sergio Moro e deu no que deu.
Desde que os “rolos” de Queiroz se tornaram públicos, todos os seus movimentos ofenderam a boa-fé do público. Não atendeu a duas convocações do Ministério Público, passou por uma cirurgia e deixou-se filmar dançando. Já o senador eleito Bolsonaro considerou “plausíveis” as explicações que recebeu do exassessor. Que explicações?
Quem acompanhou a reação do comissariado petista diante das denúncias de corrupção nos governos petistas acredita que está num pesadelo. A melodia dos poderosos é a mesma. Onyx Lorenzoni diz que a oposição busca um terceiro turno. Em 2011, Dilma Rousseff disse a mesma coisa quando surgiu o rolo do patrimônio de Antonio Palocci, chefe de sua Casa Civil. A letra do samba é muito diferente, porque os “rolos” de Queiroz são cascalho quando comparados com as propinas bilionárias que rolaram durante o consulado dos comissários. O pesadelo estraga o sono de milhões de pessoas que votaram contra a roubalheira, o blablablá e a resistência dos petistas a uma autocrítica.
Todas as explicações dadas até agora partem da premissa de que a plateia é boba. Por exemplo: Fabrício Queiroz deixou de ser assessor de Flávio Bolsonaro no dia 16 de outubro, logo depois do primeiro turno da eleição, para cuidar do seu processo de aposentadoria. Por coincidência, sua filha, personal trainer no Rio e assessora de Jair Bolsonaro em Brasília, foi exonerada no mesmo dia (a essa altura a Polícia Federal já sabia que o Coaf estranhara a movimentação financeira de Queiroz.) Travas, silêncios, segredo de Justiça, corrida à “porcaria” do foro privilegiado e pedidos de nulidade das provas só servem para alimentar murmúrios maliciosos. Os promotores não tem pressa, só têm perguntas..
Sábado: 20 de janeiro de 2019
O Globo – Artigo de Dorrit Harazim – Não estava tudo dominado
Fosse o episódio de menor relevância, seria o caso de perguntar o que andam fumando os advogados de Flávio Bolsonaro — junto ou em separado do cliente. O pedido de suspensão pelo STF da investigação sobre movimentações financeiras atípicas de Fabrício Queiroz, o encrencado ex-assessor do então deputado estadual e hoje senador, mais parece fruto de uma bad trip do que uma estratégia de defesa de causídicos para o filho 01 do presidente da República. Ficou escancarado que tem uma nau à deriva. Como se sabe, o pedido de suspensão foi acatado pelo plantonista no atual período de recesso da Corte, ministro Luiz Fux, a quem caberá conviver comesse apêndice na biografia. A partir de1º de fevereiro, ocaso passa a ser examinado pelo relator Marco Aurélio Mello, a quem caberá apalavra final sobre o domicílio jurídico da investigação. O time Bolsonaro pleiteia que ela deve migrar para o Supremo sob escudo do foro privilegiado reservado a deputados federais e senadores. Ou então a investigação prossegue sob alupado Ministério Público fluminense, onde originou. Como previsto, caudalosos argumentos jurídicos dos dois lados não faltam, da mesma forma que sempre é possível desenterrar estatísticas radicalmente opostas a respeito de qualquer causa.
Mas chama a atenção no jabuti entregue a Fux, além do súbito apreço pela figura do foro privilegiado, que ainda em 2017 o hoje presidente Jair Bolsonaro tachava de “privilégio porcaria”, o pedido de “ilegalidade das provas e de todas as diligências de investigação determinadas a partir dela”. Como assim? Zerar tudo? Mas tudo o quê? A perplexidade faz voar alto a imaginação. Desde a revelação publicada no “Estado de S.Paulo” em dezembro sobre a movimentação bancária atípica de Queiroz, passando pela abertura da investigação de 28 deputados listados na planilha do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ), nada do pouco que chega ao conhecimento público parece fazer sentido. Sobretudo no caso de Queiroz, o ora esquivo ora loquaz ex-assessor parlamentar, dublê de motorista e auto declarado talento para fazer dinheiro. Qualquer advogado de porta de cadeia poderia prever que a curiosidade geral se afunilaria em personagem tão próximo do clã do presidente, e que seria imperioso tomar alguma dianteira, mesmo que apenas cosmética, para saciar o interesse.
Seja por presunção demando, por certeza de poder alterar a pauta da mídia ou domar a curiosidade nacional, o time de Bolsonaro escolheu o caminho inverso: o de varrer para debaixo do tapete uma trama na qual existe um cheque de R$ 24 mil de Queiroz na conta da atual primeira-dama, em que duas filhas e a mulher do ex-assessor têm protagonismo, e nove funcionários do gabinete do filho do presidente recém-eleito repassam dinheiro para Queiroz em datas suspeitas. Noves fora o resto. Primeiro Queiroz é sumido, não comparece a depoimentos agendados, e reaparece num quarto do hospital Albert Einstein em São Paulo, convalescendo inclusive de uma cirurgia. Flávio Bolsonaro, por seu lado, afirma ter recebido uma versão plausível dos fatos e desdenha dois convites do Ministério Público para prestar depoimento, enquanto outros deputados também convocados acham mais prudente “colocar-se à disposição das autoridades”. Em meio ao indigesto vendaval, o presidente surge um tanto atordoado com a evolução de um novelo que talvez esperasse aquietar-se.
A este respeito, cabe, aqui, ressuscitar um ponto levantado pelo deputado federal Paulo Pimenta sobre a data em que Queiroz foi exonerado do gabinete de Flávio Bolsonaro: entre o primeiro e o segundo turnos da eleição do ano passado. Mais precisamente, 20 dias antes do início da operação que investiga o esquema de ilícitos na Assembleia fluminense. O parlamentar gaúcho, por arguto ou por petista, estranhou o fato de uma filha de Queiroz, Nathalia, também ter pedido demissão do cargo que ocupava em Brasília no gabinete de Jair Bolsonaro, no mesmo dia que o pai. Alguém teria sido avisado da ação da Furna da Onça que seria desencadeada pela Polícia Federal em conjunto com o Ministério Público?
Se foi e achou que estava tudo dominado, perdeu.
Sábado: 20 de janeiro de 2019
O Globo – Artigo de Bernardo Mello Franco – Tem laranja no liquidificador
Na segunda-feira, Jair Bolsonaro recebeu três modelos enfeitadas com coroas de princesa e faixas de miss. As moças foram a Brasília divulgar a Festa da Uva, o tradicional evento de Caxias do Sul. O capitão sorriu para fotos e ganhou um caixote de uvas colhidas na cidade gaúcha. Mas foi o cheiro de outra fruta, a laranja, que passou a impregnar o gabinete presidencial.
Com menos de um mês de governo, Bolsonaro está emparedado pelos rolos de Fabrício Queiroz. Na quarta-feira, seu filho mais velho apelou ao foro privilegiado para suspender a investigação e esconder as contas do ex-assessor. Conseguiu a liminar, mas deu bandeira. Ficou claro que o laranjal era bem maior do que se pensava.
Na noite de sexta-feira, o Jornal Nacional deu uma amostra do que parece vir por aí. Em apenas um mês, a conta bancária de Flávio Bolsonaro recebeu R$ 96 mil em dinheiro vivo. A grana foi fracionada em 48 depósitos de R$ 2 mil. O senador eleito virou suco antes de tomar posse.
O relatório do Coaf foi sutil. Apontou uma “suspeita” de “artifício” para impedir o rastreamento dos depósitos. Em outra passagem, citou uma circular do Banco Central para explicar que esse tipo de operação pode “configurar indícios” de lavagem de dinheiro. Não seria o único crime na cena. Os depósitos em série reforçam a suspeita de que Flávio embolsava parte dos salários dos assessores. O esquema é comum no baixo clero da política, habitat natural da família do presidente. Se confirmado, caracteriza crime de peculato, o desvio de dinheiro público para uso pessoal. Uma das curiosidades do caso é a data dos depósitos. O Coaf detectou as operações atípicas entre junho e julho de 2017. Na época, a Lava-Jato fazia três anos e o pai de Flávio já rodava o país como pré-candidato ao Planalto. Outro descuido foi o uso de um caixa eletrônico na Assembleia Legislativa do Rio, onde há controle de entrada e câmeras de segurança.
A revelação joga no liquidificador tudo o que os Bolsonaro já disseram sobre o escândalo. Na ausência de um mordomo, o presidente tentou jogar a culpa no motorista. Agora ficou difícil separar os saques do funcionário dos depósitos na conta de Flávio. O Planalto alega que o rolo do primeiro-filho não seria problema do governo. O discurso poderia colar se Queiroz não fosse tão próximo do presidente e não tivesse assinado um cheque de R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro.
Hoje o colunista Lauro Jardim revela que a movimentação bancária do motorista foi muito superior ao que se sabia. A notícia enfraquece ainda mais a versão do presidente para o cheque em nome da primeira-dama. Com tanto dinheiro circulando em sua conta, Queiroz não teria nenhum motivo para pedir um empréstimo. Bolsonaro vai para Davos, mas o cheiro de laranja continuará no ar.
Sábado: 20 de janeiro de 2019
Manchete de O Globo: Coaf: ex-assessor de Flávio Bolsonaro movimentou R$ 7 milhões em 3 anos
Volume de depósitos em contas de Fabrício Queiroz superar o valor revelado em dezembro
Lauro Jardim
Foi de R$ 7 milhões, entre 2014 e 2017, a movimentação financeira nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). É o que consta os arquivos do Coaf, orgão federal de controle das atividades financeiras. Queiroz ecerceu funções no gabinete de deputado estadual de Flávio na Alerj até 15 de outubro de 2018. Em dezembro passado, foi revelado que, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, havia circulado R$ 1,2 milhão pela conta corrente de Queiroz. O Coaf registrou que passaram por sua conta R$ 5,8 milhões nos dois anos anteriores, totalizando R$ 7 milhões em três abnos. Até hoje Queiroz não apresentou explicação ao Ministério Público sobre a origem dos recursos. As investigações estão suspensas por decisão do ministro Luiz Fux, do STF.
Os R$ 7 milhões de Queiroz
O Coaf sabe muito mais do que já foi revelado sobre o caso Fabrício Queiroz, o ex-motorista de Flávio Bolsonaro. Nos arquivos do órgão federal de controle de atividades financeiras consta que Queiroz transacionou um volume de dinheiro substancialmente maior do que o que veio a público em dezembro.
Além dos famigerados R$ 1,2 milhão, movimentados atipicamente entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, passaram por sua conta corrente mais R$ 5,8 milhões nos dois exercícios imediatamente anteriores. Ou seja, no total Queiroz movimentou R$ 7 milhões em três anos. Segundo o próprio Jair Bolsonaro disse em entrevista, Queiroz “fazia rolo”. Haja rolo.
Pontas soltas
Flávio chegou a dizer, no início de dezembro, que ouviu de Queiroz “uma história bastante plausível” sobre o R$ 1,2 milhão. E enfatizou: “a gente não tem nada a esconder”, numa frase em que atrelou o seu destino ao de Queiroz.
O que dirá agora sobre essa montanha de dinheiro? Pela relação dos dois, imagina-se que o senador eleito saiba desses R$ 7 milhões. Quando o MP do Rio voltar a se debruçar sobre o caso —as investigações estão suspensas desde quinta-feira passada por uma decisão de Luiz Fux, mas a tendência é que sejam retomadas —as explicações de Queiroz sobre suas atividades paralelas terão que ser mais convincentes do que as dadas até agora em declarações ao SBT.
Entre os vários mistérios desse rolo, um permanece intacto: como alguém que movimentou tantos milhões de reais em três anos mora numa casa modestíssima de uma viela da Taquara, na Zona Oeste do Rio de Janeiro?