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“O Palhaço” traça a melancolia da arte
Filme destaca signos sem valor de mercadoria
“O Palhaço” é um filme não-hollywoodiano porque nele predominam signos que não têm valor de mercado. Feito de tristeza e luz esmaecida de pôr-do-sol, que percorre cenas internas e externas, da cor da lona do Circo Esperança. A cor pálida se transforma e brilha na noite interiorana do espetáculo, com apenas 55 pagantes, e se funde com o quadriculado do terno do palhaço Benjamim (Selton Mello). A cor metafórica indica distanciamento do que está sendo visto, marca sua ausência.
No filme, cenas no picadeiro se alternam com essa atmosfera onírica e arranca aplausos da plateia de trabalhadores de baixa renda. O prefeito está entre elas e a mulher dele é uma cabeleireira. São pessoas do subúrbio na infância de quem viveu 40 ou 50 anos atrás. Elas moram em cidades que ainda existem no interior do Brasil. O menino engraxate, a adolescente voltando da escola, o moleque da praia, a mãe de uma família de cinco filhos, todos de seu Jurandir.
“O Palhaço” mostra um Brasil tão perto do imaginário popular na mente dos transeuntes que andam de metrô, mas tão distante dos centros urbanos com sky-line de prédios. Raramente se veem circos em bairros de classe média, estão sempre nas periferias.
O personagem Benjamim é o filho do dono do circo (Paulo José). Interpretado pelo ator Selton Mello, está cansado e precisa ter um amor e se arrancar dali, comprar um ventilador. Ele vai embora e experimenta outras maneiras de ser. O espectador infere os sentimentos do protagonista, o enredo é sutil ao opinar sobre os resultados dessas experiências.
O ritmo lento para a câmera em toda cena paradigmática do circo. Primeiro são os cartazes anunciando o espetáculo do Circo Esperança. Remetem à praça Roma, de Salvador, por exemplo, quando os circenses armavam a lona lá, no início dos anos 60. E às milhares de cidades brasileiras que iam ver circos como o dessa praça, ou o do filme. Depois do espetáculo, as mulheres da vida se aproximam à procura de paixão e dinheiro.
Também, antes de engrenar no número e no picadeiro vazio, muitos palhaços demonstram certa preguiça – ou depressão, que logo desvanece – de começar o show. Depois esquecem a dor tão intensamente identificada com o estado lírico – prolongamento emotivo da mensagem.
São signos do circo ainda o figurino das meninas, vestidas com roupas de domingo para ver o espetáculo. O reconhecimento do Esperança como arte popular brasileira é patente em “O Palhaço”, além da melancolia do Benjamin ou da submissão conformada do palhaço de Paulo José. Ambos os sentimentos originários da situação precária em que sobrevivem.
Paradoxalmente, o filme enfrenta o Oscar. É que o global só sobrevive e é sanguessuga da cultura local para lembrar aqui as ideias do estudioso de arte Moacyr dos Anjos.
(Mônica Rodrigues da Costa)
“O Palhaço”, dirigido por Selton Mello, disputará o Oscar de melhor filme estrangeiro
O filme será o representante brasileiro na disputa ao prêmio de melhor filme estrangeiro do Oscar 2013, nos Estados Unidos. A escolha foi feita em 20/09 por uma comissão de seis membros que se reuniu na representação regional do Ministério da Cultura, no Rio de Janeiro.
A decisão deu-se a partir de critérios artísticos e da capacidade de distribuição e promoção do filme no exterior. “Passamos por três horas de discussões e, consensualmente, esta comissão escolheu ‘O Palhaço’, da Bananeira Filmes, dirigido pelo Selton Mello, como representante brasileiro no Oscar 2013”, informou a secretária do Audiovisual, Ana Paula Santana.
O filme chegou a faturar no Brasil R$ 13,4 milhões, com 1,4 milhão de espectadores. Os bons resultados comerciais tiveram peso na escolha.
“O Palhaço” tem tido boa aceitação em festivais de cinema e recentemente abriu a mostra do 16° Festival de Cinema Brasileiro de Miami. Com essa indicação, inaugura nova fase de comercialização no exterior.
O filme teve o apoio de leis de incentivo e do Prêmio Adicional de Renda. Levantamento feito pelo Ancine indica que a obra recebeu R$ 3,4 milhões em incentivos fiscais, dos quais prestou contas.
“Não é uma má escolha, eu diria que é a única possível. É singelo, universal, divertido, ingênuo. Eu teria votado nele”, comentou Rubens Ewald Filho, crítico de cinema, em seu blog.
Os filmes que concorrerão com “O Palhaço” no Oscar devem ser anunciados em 10 de janeiro de 2013. A cerimônia de premiação será realizada em 24 de fevereiro, em Los Angeles, Estados Unidos.
(Raquel Benozzatti)