Arte em Movimento
Palhaços brincam de ‘desmiolar’.
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“Desmiolar serve para deixar a vida conectar-se à arte sem se desconectar da realidade”, diz Rubra
Mônica Rodrigues da Costa*
Nesta entrevista Lu Lopes disse que é meia Lopes e meia Rubra, a depender do que o repórter pergunta. A pergunta à atriz foi: Será que desmiolar é fazer as reinações às quais Monteiro Lobato (1882-1948) atribuía à boneca de pano Emília e outros de seus personagens?
A palhaça, atriz e diretora Lu, com experiências na Cia. Jogando no Quintal e nos Doutores da Alegria, explicou que “reinações são mais práticas; nas ‘Reinações de Narizinho’, se os personagens desmiolavam alguma coisa, faziam as reinações acontecerem. As desmiolações acontecem mais dentro da gente, elas são uma pré-reinação talvez, sem a travessura. O desmiolar é mais onírico”.
Para que serve desmiolar? Lu Lopes define: “Serve para a gente deixar a vida se conectar à arte sem se desligar da realidade”.
Já a palhaça Rubra explica que “‘desmiolação’ é a prática que fazemos com nossa potência imaginativa desde que somos crianças. Nossa mente fantasia em cima do real. Isso vira uma desmiolação”.
A também cenógrafa, figurinista e autora da trilha sonora, com Fê Stok, descreve o espetáculo como a consciência propagada por três arautos. “São três palhaços que entram nas desmiolações e contam para o público o que aconteceu nas desmiolações da personagem do livro” – que tem ilustrações de Derdyk.
Lopes conta que a adaptação da obra para o teatro é coletiva, com as intervenções de Marcelo Romagnoli.
Lu Lopes explica que a peça é mais teatral do que circense: “O espetáculo traz algumas desmiolações e acaba desabrochando na plateia as lembranças e recordações das próprias desmiolações. A ideia é trazer os palhaços na sua versão mais angelical. São palhaços, mas delicados e arrebatadores. É uma releitura de um anjo, de um arauto, de um Hermes, de um grego. Estou envolvida em tirar o palhaço fora do contexto do circo e espalhar mais esse palhaço nas outras linguagens artísticas, e o espetáculo é mais teatral mesmo”.
Lu Lopes disse que o espectador criança, em geral, gosta do espetáculo porque reconhece que todo mundo desmiola o tempo inteiro. “Desmiolação é uma alta tecnologia humana, é uma potência humana valiosa. A molecadinha acha que os super-heróis tem superpoderes de voar… Desmiolar é um superpoder humano.”
Lu Lopes disse que seus espetáculos, como “Escalafobética” (2014), funcionam para os pais irem juntos com os filhos. “A gente fez um espetáculo para adultos no Sesc Pompeia e alguns pais levaram crianças e elas amaram.”
Lu Lopes é autora do livro “Criaturas” e informou que vai lançar mais um livro, um almanaque da Banda Gigante, grupo musical do qual é integrante e autora de composições musicais. “Criaturas”, conforme, Lopes, “é um show musical teatral onde as criaturas surgem achando soluções criativas para viver”. A peça voltará a cartaz em 2014.
Entre outros trabalhos, tem em repertório as montagens “Rubra Pop Show”, “Show de Variedades da Mesma Coisa”, “Rubra Natalino,” “A Quadrilha da Rubra”, “O Carnaval da Rubra”, “Mamíferas”, “Chick Show”, que exploram técnicas de palhaço, música e improviso. Foi palhaça-atleta e musicista do espetáculo “Jogando no Quintal”.
Palhaço clássico de nariz vermelho
Luiz Fernando Bolognesi representa o palhaço Comendador Nelson em uma cadeira de rodas no espetáculo “Desmiolações”. Ele considera os atores “contadores das histórias do livro, intermediários entre o livro e a plateia. As histórias são engraçadas, tristes, sensíveis, amedrontadoras, algumas mais emotivas, outras menos, há várias emoções misturadas”, explica o ator.
Bolognesi explica o significado de “desmiolação”: “Uma criança que vê um rosto desenhado num móvel de madeira isso vira uma desmiolação”.
O palhaço disse que usa nariz vermelho porque é adepto dos clássicos, já que nem todo palhaço usa nariz e nem todo nariz de palhaço é vermelho. O que o comendador diria a uma criança se ela dissesse a ele que desejaria ser palhaço? Bolognesi responde: “Que continue sendo, ela é uma criança e conforme o tempo for passando, ela vai sendo palhaço”.
Bolognesi disse que seu palhaço ensina o público a falar de trás para a frente e que a criança espectadora gostará de ver “Desmiolações” porque “vai perceber que adulto também é criança. Até hoje eu não consegui, mas acho que a molecada vai [aprender], porque muitas crianças brincam de falar as palavras de trás pra a frente”.
Bolognesi já participou do programa Doutores da Alegria, é integrante da Companhia do Quintal e trabalhou no cinema, televisão e teatro com diretores como Hector Babenco, Laís Bodansky, Fernando Meirelles, Celso Frateschi, Elias Andreato, José Rubens Siqueira e William Pereira.
O versátil Palhaço Adão
O ator Paulo Federal, integrante da Cia. do Quintal como o palhaço Adão, disse que está em “Desmiolações” porque a palhaça Rubra o convidou “para esse sonho”.
Paulo Federal explicou que há muitos assuntos na montagem, “são dez mil olações” [rsrs]. “O espetáculo traz o universo das crianças, de circular por várias situações, mudar de um ambiente para o outro, a brincadeira que sempre muda. Elas estão brincando de forte apache ou de carrinho, dali a pouco param para jogar pião, passam de modo muito rápido de uma coisa pra outra”.
O ator disse que o palhaço é uma especificidade do trabalho do ator e que “Desmiolações” é um espetáculo narrativo que destaca a liberdade de pensamento: “A gente pode pensar o que quiser e a gente conta histórias sobre isso. Só que a gente está contando histórias através dos palhaços, e os palhaços têm sempre uma janelinha aberta para a improvisação, conforme o que acontece. Se alguém pergunta alguma coisa da plateia, não dá para passar batido [sem resposta ao público]”.
Entre outros trabalhos, Paulo Federal é cenógrafo de “Jogando no Quintal” e atuou na peça “História de Dois Amores”, baseada em livro de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e representava um palhaço. É palhaço desde 1996. A primeira peça em que atuou em “Gota D’água” (1984), de Paulo Pontes e Chico Buarque, com direção de Robson Camargo. Já trabalhou com os diretores Marco Antonio Rodrigues, Mário Bortolotto e Beto Lima, entre outros.
Vá ver o espetáculo “Desmiolações”
Serviço
“Desmiolações” – Em cartaz no Teatro Alfa até 7/9. Sábados e domingos, às 17h30. Capacidade: 204 lugares. Duração: 60 minutos. Ingressos: R$ 15 e R$ 30. Endereço: Rua Bento Branco de Andrade Filho, 722, Santo Amaro, São Paulo, tel.5693-4000. Indicação: para crianças a partir de cinco anos.
Ficha técnica
“Desmiolações” – Adaptação: Lu Lopes e elenco, do livro “Desmiolações” (Sesi-SP Editora, 2013). Direção: Marcelo Romagnoli. Luz e cenário: Sylvie Laila. Palhaços/atores: Lu Lopes, Paulo Federal e Luiz Fernando Bolognesi. Videoarte: Raimo Benedetti. Trilha sonora: Fê Stok e Lu Lopes. Figurino: Lu Lopes. Produção: Carrapeta Produções. Realização: Instituto Alfa de Cultura e Carrapeta Produções.
Site: www.teatroalfa.com.br
*Mônica Rodrigues da Costa é jornalista, poeta e editora do selo Publifolhinha, da Publifolha.
Postagem: Alyne Albuquerque
Tags: Comendador, Cristiane Paoli Quito, Desmiolações, Edith Derdyk, Fernando Bolognesi, larice Lispector, lu lopes, palhaça Rubra, palhaço Adão, Paulo Federal
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