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Oscar Pilagallo entra para time do Panis & Circus
Repórter premiado e editor de economia e cultura fala da carreira de escritor e das memórias de infância sobre circo
Paulistano, jornalista, editor e escritor, Oscar Pilagallo fez carreira na “Folha de S. Paulo” e é atual colaborador do jornal, o que somam mais de 30 anos. Em março de 2012, lançou “História da Imprensa Paulista – Jornalismo e Poder de D. Pedro I a Dilma”, pela editora Três Estrelas, novo selo editorial do Grupo Folha.
Formado pela FAAP-SP em jornalismo, morou em Londres de 1986 a 1991, período em que foi correspondente da “Folha” e da “BBC” (serviço brasileiro).
Em 1993, recebeu o Prêmio Esso de Reportagem Especializada com a reportagem “Anatomia de uma Licitação”. Atualmente, escreve para os jornais
“Folha” e o “Valor Econômico”.
A partir de agosto, Pilagallo é o novo colaborador do site Panis & Circus. Escreverá sobre livros dedicados às artes circenses.
Na estreia, Oscar Pilagallo comenta o livro “O Espetáculo Mais Triste da Terra” (Companhia das Letras, 2011), do também jornalista Mauro Ventura, de “O Globo”.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
Panis & Circus – Por que aceitou o convite para escrever no site uma resenha mensal sobre o circo?
Pilagallo – Tenho muito interesse nas coisas que eu conheço pouco. Circo, eu adoro circo. Depois do convite eu fui pesquisar fotos e estão no circo minha irmã, meus pais, e eu. Mas é um conhecimento mais afetivo do que teórico, vamos dizer e ai eu fiquei curioso. E eu gosto de escrever sobre coisas que eu não conheço e tenho muito interesse na pesquisa em si.
Circus – Por que o livro “O Espetáculo Mais Triste da Terra”?
Pilagallo – Quis começar por um livro que tivesse uma conexão um pouco maior com questões históricas. É uma história que se passa, em 61. O autor,
Mauro Ventura, jornalista, que trabalha no Rio de Janeiro, em “O Globo”, é dono de um texto muito bom. Uma narrativa sólida e cativante. Além de contar a história em si, a do circo que pegou fogo, uma tragédia terrível, ele fala um pouco da história do Brasil na época de 1961 quando o Jango [Goulart] tinha acabado de tomar posse [como presidente do Brasil].
Como minha formação é de história, pensei que poderia ser uma ponte para me levar para o universo do circo e ver a história do Brasil na época.
Mas isso é só uma moldura. O principal é o que aconteceu [o incêndio do Gran Circo Norte-Americano] e os papéis de vários personagens, entre eles, o do cirurgião plástico Ivo Pitanguy. Ele foi peça-chave no tratamento das pessoas que ficaram feridas fazendo enxertos de pele.
Tratei também com mais detalhes na resenha do Profeta Gentileza [leia na seção “Literatura”].
Ele já tinha, digamos assim, certa tendência, não para a conversão, mas para profecias, e, com o episódio do incêndio, largou tudo, família, bens, e acabou se tornando o Profeta Gentileza. Mauro Ventura traça um perfil interessante dele, que se tornou uma figura bem conhecida no Rio de Janeiro, [foi homenageado em músicas de Marisa Monte e Gonzaguinha].
Circus – Você se lembra do que gostava de ver no circo na infância?
Pilagallo – Eu gostava muito da parte dos animais, que hoje é a maior polêmica, mas, naquela altura, ou seja, há 50 anos, não existia o politicamente correto, então a gente podia ver os leões e tudo mais sem nenhuma culpa. E do trapézio, evidentemente, que todo mundo gosta e eu gostava muito mesmo.
Circus – Você é jornalista-escritor ou um escritor que foi antes jornalista?
Pilagallo – Sou jornalista. Basicamente, um jornalista que escreve livros. Publiquei vários livros, mas me considero principalmente jornalista.
Circus – Quantos livros você escreveu?
Pilagallo – O primeiro que escrevi chama-se “A Aventura do Dinheiro – Uma Crônica da História Milenar da Moeda” [2000], livro um pouco de crônica, mas voltada para história do dinheiro.
Depois eu fiz uma série que se chama “A História do Brasil no Século 20” [m cinco volumes, 2009], os livros “Roberto Carlos” [2008], “O Brasil em Sobressalto” [2002], que conta a história do Brasil em 80 anos, do ponto de vista do noticiário da “Folha de S. Paulo”, e agora “História da Imprensa Paulista”[todos da Publifolha].
Circus – Como tem sido a repercussão de seu último livro?
Pilagallo – O livro saiu há pouco tempo, no finalzinho de março, então, ainda está na época de divulgação e tem sido boa a reação. Saíram resenhas favoráveis nos principais jornais. É um livro também de nicho, que interessa, principalmente, a estudantes e jornalistas.
Circus – Ele foi discutido na Flip [Feira Literária Internacional de Paraty] que aconteceu em julho de 2012?
Circus – Na Flip fiz um debate com a Lilia Schwarcz, da Companhia das Letras, que é historiadora. Falamos sobre o papel do jornalista que escreve história e da historiadora, que tem uma interface com a mídia. Lilian escreve em jornais e outras publicações. Por isso, a gente conversou sobre essas funções com os dois pontos de vista.
São atividades que a gente considerou complementares, cada uma com sua embocadura e as duas contribuindo com a divulgação e compreensão maior da história.
Circus – Pretende escrever também sobre imprensa nacional?
Pilagallo – Falaram que eu deveria escrever um livro sobre a história da imprensa no Brasil. Mas não sei se, no momento, eu teria essa disposição porque exige fôlego. Fazer o livro da imprensa paulista exigiu um fôlego razoável, porque é uma história que começou em 1823 e vai até hoje, até a eleição da Dilma, que foi o última assunto que tratei. Ela é abrangente e requer muita pesquisa. Voltar a fazer isso agora acho que não, mas, no futuro, não descarto.
Circus – Fale da carreira no jornalismo e na literatura.
Pilagallo – No jornalismo, minha carreira foi, sobretudo, na “Folha de S.Paulo”. Comecei em 1982. Já tinha trabalhado em jornais menores antes, em jornais de economia também. Mas é com a “Folha”, por ser um grande jornal e coincidir com o período da implantação do Projeto Folha, que minha trajetória toda está ligada.
Circus – Quanto tempo trabalhou na “Folha de S.Paulo”?
Pilagallo – De 1982 até 2002 fiquei na redação. Daí, saí da redação, mas até hoje sou um colaborador frequente do jornal. De certa maneira é uma história que ainda não terminou, só mudou.
Quando saí do dia a dia do jornal, fiz uma revista que se chamava “EntreLivros”. Não era só uma revista de literatura, mas a literatura era o foco principal. A “EntreLivros” durou uns três anos, foi sucesso de crítica. Mas não se sustentou, pela estrutura do leitor brasileiro, não há número suficiente para sustentar uma revista desse tipo.
Circus – Quando foi isso?
Pilagallo – Em 2005, foi lançada e durou três anos mais ou menos. Tinha resenhas, reportagens sobre literatura, sobre autores. Era uma revista que tinha uma pretensão de ser mais didática, voltada para um público maior, que estava querendo um repertório mais consistente de literatura.
Por exemplo, a primeira capa foi a de Thomas Mann, romancista alemão que escreveu “A Montanha Mágica”. Embora seja popular, muita gente precisa de iniciação para lê-lo, saber como é o romance, quem escreve, em que época… A revista tinha essa intenção, fazer a ponte entre os leitores que queriam formar repertório e esses grandes clássicos.
Também falava de literatura contemporânea e de novos autores brasileiros. Havia um espaço, “Tinta Fresca”, onde a gente apresentava autores, divulgava o trabalho deles em primeira mão.
Circus – Como passou a escrever livros?
Pilagallo – Nos últimos 12 anos… comecei a escrever porque, quando eu deixei de ser editor de economia da “Folha”, me ofereceram um período sabático. Aceitei o período para escrever um livro de economia, já que eu acabava de ser editor de economia.
Por isso, eu queria consolidar o trabalho dos últimos quatro anos. Aí a “Folha” topou e escrevi “A Aventura do Dinheiro”, no período sabático. Tomei gosto, recebi encomendas para escrever outros livros, enfim, foi surgindo assim.
Circus – Os projetos daqui para a frente?
Pilagallo – Acabei de escrever “História da Imprensa Paulista”, que foi um projeto que consumiu muita energia. Vou dar um tempo. E tenho trabalhos para a “Folha”, o “Valor” e agora o site Panis & Circus.
A música de Marisa Monte fala do profeta Gentileza, retratado no livro “O Espetáculo Mais Triste da Terra”. A cantora diz que “apagaram tudo” porque o governo municipal havia mandado apagar as frases de Gentileza no viaduto Paulo de Frontin, no Rio de Janeiro. Houve protestos e as frases voltaram.
Links para os livros de Pilagallo das editoras Três Estrelas e Publifolha:
http://livraria.folha.com.br/catalogo/1177291/historia-da-imprensa-paulista
http://publifolha.folha.com.br/catalogo/livros/135454/
A maior tragédia circense da história
Dezessete de dezembro de 1961 foi o dia em que “Niterói” rimou com “dói”, como na letra sertaneja da dupla Garrancho e Graveto, em música gravada três anos mais tarde. Outros dois versos terminavam em “comédia” e “tragédia”. Havia ainda o contraste entre “alegria” e “maldito dia”.
A composição descrevia os eventos dolorosamente inesquecíveis de uma tarde de quase verão em um circo na então capital do Rio de Janeiro. Ingênua e simplória, a composição remetia ao horror: a morte de mais de quinhentas pessoas no incêndio do Gran Circo Norte-Americano.
A história, que a população local preferiria compreensivelmente não contar, é resgatada, em narrativa envolvente, pelo jornalista Mauro Ventura no livro “O Espetáculo Mais Triste da Terra” (Companhia das Letras, R$ 46, 320 páginas.).
Dez minutos de fogo provocaram a maior tragédia circense da história. Crianças carbonizadas, mulheres pisoteadas por elefantes, centenas de pessoas asfixiadas sob a lona em chamas – poucas vezes o clichê “inferno dantesco” seria mais apropriado.
Foi uma comoção mundial. Da Itália, a atriz Gina Lollobrigida doou sangue e o papa João XXIII mandou celebrar uma missa, além de enviar recursos para ajudar no tratamento dos feridos.
No Brasil, o presidente João Goulart – no período em que seu poder era tolhido pelo parlamentarismo que lhe viabilizou a posse, ao dobrar a resistência militar – esteve no local e expôs a perna defeituosa para consolar um menino que sofrera uma amputação.
O cirurgião plástico Ivo Pitanguy, que na época tentava convencer seus pares da relevância de sua especialidade, liderou uma equipe que fez enxertos de pele em vítimas que tiveram o corpo queimado.
A pessoa mais associada ao incêndio, porém, não foi a atriz, o político, o religioso ou o médico; não foi também o dono do circo ou o suspeito pelo crime. Mas foi José Datrino, pequeno empresário, casado, pai de cinco filhos.
Se ninguém ouviu falar de Datrino é porque ele morreu sem deixar muitos vestígios. Não morreu como os outros. Morreu simbolicamente. Morreu-lhe, na verdade, a identidade que tinha até então, e em seu lugar surgiu o Profeta Gentileza.
Gentileza não presenciou o incêndio. Ouviu a notícia, largou tudo para trás e, na véspera do Natal, chegou à área ainda com a presença de destroços. Passou a distribuir copos de vinho para a população, sem nada cobrar, bastava pedir “por gentileza” – daí o apelido. E foi morar no terreno em que o circo fora armado. Mais tarde viajou pelo país, fixando-se finalmente no Rio.
Tido por louco, Gentileza dizia coisas que tocavam parte da sociedade, sobretudo os jovens dos anos 60 e 70. Tornou-se um crítico do capitalismo, ou, em seu neologismo, “capetalismo”.
Ventura liga os fios soltos entre o incêndio e a nova vida de Datrino: “O fim trágico do circo, lugar por excelência da diversão e do entretenimento, simboliza, para Datrino, a derrota da inocência e a crise de valores no mundo”.
Figura paradoxal, Gentileza era também um moralista, do tipo que condenava a minissaia, por exemplo. Morto em 1996, sua memória foi idealizada em músicas de Gonzaguinha e Marisa Monte e como tema da escola de samba Grande Rio, criado por Joãozinho Trinta para o Carnaval de 2001.
As mortes e a destruição do circo mudaram a vida de Datrino. Mas o circo não morreu. Vinte dias depois do incêndio a trupe já se apresentava em Aparecida, em São Paulo, com a estrutura alugada de um circo pequeno que estava parado no Rio, o Big Top.
Contrariando as previsões, a casa esteve cheia. Com a receita, o dono, Danilo Stevanovich, remontou em São Paulo o Gran Circo Norte-Americano. Trapezistas, domadores, palhaços, mágicos e equilibristas nunca mais esqueceriam as cenas de pânico entre as labaredas, mas o show não podia parar.
(Oscar Pilagallo)
Link para o livro de Mauro Ventura:
http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=12823
bom demais!
admiro muito o trabalho de vcs!
nota milllllllllllllllllllllllllllllll!