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O Rei do Show
Fernanda Araújo, especial para Panis & Circus
Criador do circo moderno, o americano Phineas Taylor Barnum conquistou a fama com lendárias falcatruas, deu luz aos excluídos e virou um empresário multimídia (uma revolução na época). Após ascensão e queda, driblou a exorbitância imobiliária e superou a crise montando um espetáculo que foi considerado espetacular em um terreno vazio, embaixo de uma grande lona. Os feitos de P. T. Barnum inspiraram O Rei do Show (The Greatest Showman), filme que estreou no Brasil dia 25 de dezembro de 2017, com Hugh Jackman no papel central, sob a direção de Michael Gracey. Longe de ser uma biografia, o musical seguiu uma inspiração romântica, sobre a indústria do entretenimento, tolerância e inclusão.
Dizem, por exemplo, que a primeira falcatrua de Barnum foi Joice Heth, uma escrava que jurava ter 161 anos. Com esse trunfo, o empresário saiu em turnê apresentando-a como “a mulher mais velha do mundo” e “ex-babá do presidente George Washington”. Após a descoberta da fraude, continuou a exacutá-la ao declarar que ela era uma espécie de máquina feito de osso de baleia e couro velho, atraindo a atenção de milhares de curiosos. A famosa mentira não está no roteiro cinematográfico.
O musical começa com P. T. Barnum (Hugh Jackman) adulto, relembrando a infância. O garoto segurava os alfinetes para que o pai colhesse as medidas do dono de uma mansão e sorriu para Charify (Michelle Williams), sua filha, distraindo-a durante a aula de etiqueta à mesa. O sorriso custou um tapa na cara do menino e a perda do trabalho do alfaiate.
Apesar da agressão (ou reforçada por ela), as crianças ficam amigas, seguem rumos diferentes e trocam cartas ao longo dos anos. Ele sofre com a perda do pai, precisando lidar com a fome, o abandono e a maldade das pessoas. Ela vai para um colégio interno.
Anos depois, Barnum consegue um empréstimo no banco e decide buscar a amada. O rapaz promete ao pai da moça que daria a mesma vida boa que ela tinha na mansão, apesar de ela dispensar o luxo em nome do amor.
O rapaz decide reabrir um museu de cera com figuras bizarras, mas o tempo passa e os visitantes não aparecem. As filhas nascem e as goteiras aumentam no velho apartamento. Barnum sonha com o sucesso; enquanto Charity, apesar do trabalho de casa, irradia felicidade. A cena dos lenções esticados no varal, no topo do prédio, projetando luzes e reflexos é um sublime exemplo da alegria e simplicidade vivida pela família no momento.
Na tarde em que os quatro tentam vender ingressos para o museu, uma das filhas tem a ideia que muda tudo: “as pessoas querem ver atrações vivas e não gente de cera”. Exato! Certo de que pessoas esquisitas chamam a atenção, Barnum parte em busca de novas atrações.
Todos aqueles que fugiam do perfil tradicional eram descriminados e não saíam de casa. Mas, Barnum lembrou-se de um anão que viu no banco ao lado da mãe em uma das vezes em que pediu empréstimo. A mãe negou a existência do pequeno jovem, mas ele ouviu do outro lado do cômodo e gostou da ideia de ser o “General” de pose napoleônica. A segunda atração, a Mulher Barbada, foi descoberta enquanto cantava, nos fundos de uma lavanderia.
Um cartaz convidando para a seleção de criaturas diferentes atraiu uma fila no museu. As atrações eram surpreendentes – ou ali se tornavam surpreendentes. Um homem se achava bizarro por ser gordo até que Barnum colocou um travesseiro em sua barriga e declarou-o com vários quilos a mais. Assim, “O Homem Mais Gordo do Mundo” ficou feliz e virou atração de verdade. O mesmo ocorreu com “O Homem mais Alto do Mundo”. E logo chegaram os gêmeos siameses e o casal de irmãos trapezistas e negros. Os primeiros shows atraíram os curiosos, até que um jornalista criticou o espetáculo de bizarrices e falcatruas.
Em busca de uma atração famosa, Barnum propõe uma parceria com Phillip (Zac Efron), ator rico, bonito e cansado das peças com muito público e pouco riso. A parceria teve vantagens e desvantagens para Baurnam: gerou ciúme entre seus artistas e deu visibilidade à alta sociedade.
Em um dos contatos, Barnum recebe um convite para visitar a rainha, na Inglaterra. No outro, conhece Jenny Lind (Rebecca Ferguson), cantora que ele resolve empresariar em turnê pelos EUA.
Enquanto isso, Phillip se apaixona por Anne Wheeler (Zendaia Coleman), uma das trapezistas, e encara o desprezo do pai que repudia a relação com a moça pobre.
Quando o showman volta para casa percebe que seu mundo está um caos. Cria, então, um novo espetáculo.
Vale dizer que o filme foi bastante criticado por romancear a história do criador do show business, deixando fatos importantes de lado. Pena. Mas trata-se de um bom musical e a faixa From Now On combina com a retomada de O Rei do Show. A produção também tem o mérito de trazer igualdade aos diferentes e promover a reflexão sobre a verdadeira felicidade.
P.T. Barnum: o verdadeiro Rei do Show
Phineas Taylor Barnum nasceu em 5 de julho de 1810, em Bridgeport, Connectictut/EUA, e trabalhou em diversas áreas até descobrir que era bom em enganar as pessoas. Dizem que ganhou dinheiro com “a mulher mais velha do mundo”, supostamente com 161 anos, e mesmo após a descoberta da fraude continuou fazendo sucesso – declarou que ela era uma espécie de máquina feito de osso de baleia e couro velho, atraindo a atenção de milhares de curiosos.
Barnum viajou com “aberrações” como o anão “General”, Tom Thumb, que cantava e fazia piadas conquistando fãs como Abraham Lincoln e a rainha Vitória, da Inglaterra. Quando decidiu fixar-se, em 1841, abriu um museu de curiosidades, em Nova York, com atrações como os restos mortais da “Sereia de Fiji” – um macaco costurado num rabo de peixe.
Em 1867 montou sob uma tenda um show itinerante “O Maior Espetáculo da Terra”, que ficou conhecido como “Ringling Bros. and Barnum & Bailey Circus”, uma espécie de circo, zoológico e museu de “freaks”. A principal atração, um elefante vendido como o “Maior do Mundo”, continuou famoso mesmo depois de ter morrido atropelado – o empresário mandou empalhá-lo e apresentava como se ele estivesse vivo.
O falsário superava até outros falsários. George Hull, um arqueólogo que forjou a descoberta do gigante de Cardiff – um fóssil humano que não passava de uma peça de gesso corroída por ácido – foi superado com “O Verdadeiro Gigante”.
Em um de seus discursos como político teria dito que “Uma alma humana não deve ser minimizada. Ela pode habitar o corpo de um chinês, um turco, um árabe… ela ainda assim é um espírito imortal!”.
Barnum foi prefeito de Bridgeport, em Connecticut/EUA e providenciou a melhoria do fornecimento de água, iluminação das as ruas e fundação do hospital. Morreu em 7 de abril de 1891 e ficou conhecido como “o pai do circo moderno”.
Hugh Jackman – o novo Rei do Show
No fim das filmagens, um vídeo de bastidor da produção de O Rei do Show viralizou na internet. Hugh Jackman estava recém-operado de câncer de pele no nariz quando os artistas se reuniram para gravação das faixas do musical. Por recomendação médica, o astro não deveria cantar, mas acabou não resistindo e soltou a voz em “From Now on”, uma espécie de hino para a retomada de seu personagem – e, quem sabe, da sua própria vida.
Legenda de Capa – Hugh Jackman, em O Rei do Show / Divulgação
Fotos da reportagem – Divulgação do filme