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Encontro com o grande Petit

 

Ele atravessou 42 m em um fio esticado entre as torres do World Trade Center, em 7/8/74 

Ivy Fernandes, de Roma

Rostos fixos no céu, olhos arregalados, bocas abertas, respiração suspensa. Não é fácilfácil surpreender uma cidade como Nova York, mas o francês Philippe Petit conseguiu parar a capital do mundo na manhã de 7 de agosto de 1974.

 

Petit : por um fio, em 7/8/74, em NY/ Fotos acervo

Cerca de 100 mil pessoas acompanharam Petit caminhar por 42 metros em um fio de aço, esticado entre as torres gêmeas do World Trade Center, suspenso a 410 metros do solo. Após terminar sua performance, Petit foi preso e passou também pelo hospital Beekman para que fossem checadas sua saúde mental e física.

 

Petit foi preso após terminar sua perfomance e encaminhado a uma delegacia em NY/ Foto Acervo

 

Quarenta e um ano depois, o famoso funâmbulo desembarcou em Roma, em 20 de outubro, para apresentar o filme “The Walk” (A Travessia) em 3D, baseado em sua aventura no céu de Manhatan.

Poucos, como Petit, conseguem realizar um evento que atravessa não somente as fronteiras, mas os anos, e passa e ser incorporado à história. Minutos que valem séculos. 

 

 

A proeza inédita, agora apresentada no filme “A Travessia”, parecia antecipar a chegada dos ventos que varreriam os Estados Unidos.

No dia seguinte à façanha realizada com a ajuda de amigos, em 8 de agosto, o artista acordou com o país que adotou sendo marcado pela renúncia do presidente Richard Nixon, no escândalo conhecido como Watergate – espionagem e invasão dos escritórios do Partido Democrata comandadas pela equipe de Nixon durante o processo eleitoral.

 

Petit se prepara para ligar os cabos e habituar-se com a altura e o nevoeiro de Nova York / Foto Divulgação

 

Preparação de três meses 

Durante a coletiva de imprensa no Auditorium, Petit, aos 66 anos, explica que o filme descreve minuciosamente toda a preparação técnica, física e emocional que precedeu a sua aventura há mais de 40 anos.

“Analisando bem a previsão do tempo, que na América é quase perfeita, marquei a travessia para o dia 7 de agosto, ao nascer do sol. Tudo durou 45 minutos. Foi um percurso longo, de 42 metros, a distância de uma torre a outra. Para mim, um momento mágico. Tinha um pouco de nevoeiro. Foi um sonho que parecia impossível. O limite do absurdo.”

 

Travessia de Petit: fio estendido entre as torres do World Trade Center, em 7/8/1974 / Foto Divulgação

 

O filme mostra um Petit, interpretado por Joseph Gordon-Leavitt, que renasce na América após deixar a França. Com a namorada Annie (Charlotte Le Bon), uma artista de rua, Jean-Louis, seu grande amigo, interpretado por Clément Sibony, um fotógrafo e um antigo equilibrista, que ensinou os segredos da caminhada no aço, conhecido como papa Rudy (Ben Kingsley), o artista começa a trabalhar na realização de seu projeto.

 

Cena do filme "The Walk" (A Travessia) / Foto Divulgação

 

Philippe e Annie, sua namorada, que o acompanhou no projeto da travessia / Foto acervo

 

 

Os aventureiros  

Os amigos aventureiros foram determinantes para a realização do que havia idealizado. Liderados por Anne, conseguiram resolver todos os problemas durante a fase preparatória, que durou cerca de três meses.

“Realizamos mais de 200 visitas aos edifícios do World Trade Center. As construções ainda não estavam terminadas”, relembra o artista.

 

 

Para não levantar suspeitas durante as visitas ao prédio, Petit se passou por jornalista, fotógrafo francês de uma revista de arquitetura e acadêmico. 

“Tudo tinha de ser escondido, porque se a polícia soubesse que estávamos preparando uma aventura nos céus de Nova York, certamente, seríamos expulsos do país.”

Segundo Petit, o grupo concluiu que seria preciso usar um longo e “invisível” fio de corda que seria lançado com uma flecha de uma torre a outra, antes de colocar o cabo de aço. “Entramos no edifício na noite do dia 6 de agosto e passamos a madrugada montando o cabo. A travessia tinha de ser iniciada às 7 da manhã, para surpreender a cidade.” O mais difícil foi transportar todo o material pesadíssimo. “Somente o cabo, um total de 60 metros, pesava mais de 200 quilos”, explica Petit. 

O grupo foi de elevador até o 101.º andar e, dali para o topo do edifício, e todo o material teve que ser carregado pelas escadas. Com o “circo” armado no céu de Manhattan, não havia mais como a polícia impedir o espetáculo.

 

 

Petit: equilíbrio em um fio entre as torres da Catedral de Notre Dame (Paris) / Foto acervo

 

Petit já era conhecido por façanhas anteriores, como atravessar as duas torres da Catedral de Notre Dame, em Paris. Mas o espetáculo que proporcionou, no coração de Nova York, o elevou a um patamar jamais conhecido.

 

Balanço exato entre o corpo e a mente

Philippe Petit, no Auditorium, em Roma, durante coletiva para falar do filme "The Walk" / Foto Divulgação

 

O artista conta que, em algumas cenas, o ator Joseph Gordon-Levitt fica muito parecido com ele. “Fiz questão de encontrá-lo antes do início das filmagens, para tentar explicar as emoções quando se está completamente sozinho no espaço, perto das nuvens. Durante vários dias provamos juntos a experiência de caminhar num fio de aço, naturalmente, pouco elevado, para que ele pudesse sentir a pressão, o vazio, e se concentrar olhando somente para a frente. Alcançar a reta final.”

“Petit é incansável”, define Gordon-Levitt. “Me ensinou a caminhar no fio de aço com uma barra nas mãos, tentando encontrar o ponto exato do balanço entre o corpo e a mente.” 

A travessia do cabo de aço ligando as torres do World Trade Center, dramaticamente destruídas no atentado terrorista de 11 de setembro de 2001, idealizada por Petit, não era somente uma fantástica prova de habilidade, tenacidade, força de vontade, mas a metáfora da vida humana.

“Creio firmemente que cada um constrói, tijolo por tijolo, a própria existência. 

 

Se perder a concentração, perde o equilíbrio

Petit se exibe em Whashington Square, centro de New York / Foto Divulgação

 

A arte de caminhar sem perder o equilíbrio está na concentração, no que se está realizando, sem olhar nem uma vez para baixo, mas para frente. Essa concentração, no no meu ponto de vista, é a essência da própria existência humana. Se perder a concentração, se perde o equilíbrio. Um homem que sabe caminhar no cabo de aço, caminha também sobre a corda metafórica das dificuldades cotidianas da própria existência”.

Petit vive hoje nos arredores de Nova York, onde mantém uma escola de circo, onde ensina equilibrismo e malabarismo para crianças.  E continua a andar em um fio (treina três horas por dia) e a fazer apresentações na rua. 

 

Petit e o Oscar do documentário "Man on Wire"/ Foto Divulgação

 

 

O documentário “Man on Wire” (Homem no Fio), de James Marsh, que descreve sua façanha nos céus de Nova York, ganhou o Oscar, em 2012, como melhor documentário.  

Petit é também escritor e tem dez livros publicados. O artista volta à Itália em agosto do próximo ano para discutir o seu mais recente livro: “Criatividade – um crime perfeito”. “A criatividade é como o ar que respiramos”, afirma o autor.

 

Capa do livro de Philippe Petit: "Criatividade - um crime perfeito"

 

 

Ficha técnica:

Joseph Gordon-Levitt, no papel de Petit, em cena do filme "The Walk" / Divulgação

 

O filme “A Travessia” tem direção de Robert Zemeckis, de filmes como “Forrest Gump”, “De volta para o futuro”, “A morte lhe cai bem”. Os efeitos especiais são do especialista Kevin Baillie, de “Transformers: age of extinction” (Transformers: idade da extinção) “Star Trek into darness” (Star Trek na escuridão). A direção de fotografia é de Dariusz Wolski. O filme foi rodado, em parte, no Canadá e custou US$ 35 milhões. Entre os atores estão Joseph Gordon-Levitt, Ben Kingsley e Charlotte Le Bon.

 

Tradução do vídeo da capa: Relato da travessia de Petit feito pela CBN News, em 7/8/1974 

Âncora – Chris Kelley, da CBN News:

“Em mais uma manhã rotineira para o repórter de trânsito, no helicóptero em New York, ele tinha mais o que dizer para os seus ouvintes no rádio, afora falar como estava o tráfego na pista do West Side.

Repórter: Neal Bush

“Eu digo a vocês que sinto um frio na boca do estômago. É que no topo do World Trade Center tem alguém em um fio de arame estendido entre os dois prédios.”

Âncora- Chris Kelley

“Esse alguém é Phillipe Petit, um francês de 24 anos, que equilibrava-se em um arame a 510 metros de altura, sem rede por baixo. Ele e seus companheiros conseguiram se esconder no World Trade Center, durante a noite e bem cedo, nesta manhã, estenderam um cabo de arame entre os dois prédios, usando uma espécie de arco e flecha, para lançar esse cabo.

Petit fez com que centenas de pessoas ficassem olhando para ele mas a polícia considerou que ele estaria melhor e mais seguro algemado em uma cadeira.”

Repórter da CBN pergunta a Petit na delegacia: “Por que você fez isso”?

E ele responde: “Não havia outra maneira, quando eu vejo um lindo lugar como esse não consigo resistir e estico o arame.”

Repórter pede ao sargente Charles Daniels, que tirou Petit do arame após sua travessia, que descreva como viu a ‘grande apresentação’.

Policial Charles Daniels: Ele estava balançando sobre seus pés, e eles, realmente, estavam saindo fora do arame. Então, ele se ajoelhou no arame, depois deitou e colocou suas mãos atrás da nuca e ficou completamente relaxado: balançava uma das pernas com cuidado.

Repórter: Ele estava rindo?

Policial: Não, enquanto ele fazia a apresentação, ele só estava deitado e relaxado, como se quisesse tirar uma soneca.

Repórter: Como você classifica essa travessia?

Policial: Espetacular, de grande impacto.

Âncora Chris Kelly: Petit foi acusado de desordem e invasão e ganhou a sentença: realizar um show de graça para crianças no Central Park.    

 

 

 

 

 

Postagem – Alyne Albuquerque

 

 

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