Pé na Estrada
Paris celebra “o livro dos livros”
Mostra reúne obras de arte do século 7 ao século 20
Ivy Fernandes, de Paris
O primeiro manuscrito dos contos “As Mil e Uma Noites”, conhecido como “o livro dos livros”, data do século 8 e tem 600 edições em mais de 30 línguas. Os personagens Shéhérazad, Sindbad, o Marujo, Aladim, da Lâmpada Maravilhosa, Ali Babá e os 40 ladrões, monopolizam por séculos a literatura europeia e influenciam até hoje artes como pintura, cinema, teatro, balé e circo.
Essa obra-prima da literatura mundial constitui uma ponte que atravessou as fronteiras entre o Oriente e Ocidente. Trata-se de um livro “sem fim” ou “com todos os fins”, como explica sua introdução: “Ce livre ‘sans fin’ ou ‘avec toutes les fins’”.
O Instituto do Mundo Árabe (Institut du Monde Arabe) de Paris, um edifício no centro da capital francesa, fundado há 25 anos, inaugurou a exposição, em 27/1/2012. A mostra percorre a travessia dos contos de “Mil e Uma Noites” e fica até 28 de abril de 2013 em cartaz.
A exposição apresenta 350 obras provenientes de 64 museus do mundo, além de coleções particulares, manuscritos antigos, cartazes, edições raras em várias línguas. Os objetos de arte expostos cobrem um longo período: do século 7 até o século 20.
“As Mil e Uma Noites” serviram de inspiração para artistas como o pintor Pablo Picasso (1881-1973), que participa da exposição com um quadro (aquarela), e o cineasta Pier Paolo Pasolini (1922-1975), com o filme “A Flor das Mil e Uma Noites”, rodado no Yêmen.
A história remonta a traição da rainha, que foi decapitada
A exposição mostra que a história começa no suntuoso palácio do rei Shahriyàr, onde janelas se abrem sobre o jardim, e, ao fundo, aparecem para se refrescar na fonte a rainha, acompanhada por 20 damas de companhia e 20 escravos. Todos se despem e se aproximam da fonte. A rainha chama o seu favorito, um alto e vigoroso escravo, e se entrega a ele.
Pela traição, a rainha é decapitada, e, assim, iniciam-se os contos de “As Mil e Uma Noites”. Trata das desventuras do desiludido rei Shahriyàr. Ele, a cada noite, pede a companhia de uma virgem que depois é decapitava. Em uma dessas noites, entra em seu leito a bela Shéhrézad, que começa a narrar histórias intermináveis, despertando a curiosidade do monarca e evitando que fosse decapitada.
Segundo o escritor Ítalo Calvino, que estudou os contos, “a arte que permitiu a Shéhrézad se salvar foi a sua habilidade de ligar um conto a outro e saber interrompê-los no momento exato”.
Segundo Aboubakr Chraibi, professor do Instituto Nacional de Línguas e Civilizações Orientais de Paris (Inalco), a origem de “Mil e Uma Noites” é persa e os contos foram traduzidos na metade do século 8. “A estrutura dos contos de Shéhrézad, como podemos ler no manuscrito mais antigo, ou seja, aquele do século 15 (porque os dos séculos precedentes são apenas fragmentos dos contos), foi construída com material proveniente da Índia e, a seguir, as histórias foram passadas à Pérsia e ‘adaptadas’ ao estilo persa. Encontram-se heróis com nomes persas, depois transferidos ao mundo árabe. A diferença não está apenas na língua, os contos são diversos em um manuscrito e outro.”
O professor Aboubakr Chraibi afirma que, “no decorrer dos séculos, os tradutores acrescentaram aos contos originais outras histórias, que se incorporaram às originais. Basta lembrar o caso do escritor, tradutor e editor francês Antoine Galland (1646-1715), que traduziu a obra do árabe para o francês, no início dos anos 1700, e os divulgou na Europa. Ao mesmo tempo, Galland adaptou os contos aos seus leitores: a aristocracia francesa e as damas de Versailles. Na origem, ele tinha a disposição de 35 contos, mas o público queria mais. Galland encontrou um intelectual, Hanna Diyab, vindo da Síria, da cidade de Allepo, e pediu o auxílio dele na tradução de alguns capítulos, e depois lhe perguntou se conhecia outros contos. Diyab incluiu outras histórias e personagens”.
“Nesse ponto, surgiram “Ali Babá e os Quarenta Ladrões”, “Aladim e a Lâmpada Maravilhosa”, “Sindbad, o Marujo”, e os contos se tornaram intermináveis”.
Até agora se tem conhecimento de 15 manuscritos, mas estudiosos garantem que existem mais de 120 deles. A Agência Nacional de Pesquisa (ANR, Agence National de Recherche), em Paris, tem um projeto para recuperar os diversos textos antigos inspirados nos contos das “Mil e Uma Noites” e os inesquecíveis personagens Haroun al-Rashid, Shahriyar, Shérézad, Aladim e Sindbad e suas aventuras nas cidades do Oriente .
Serviço
Exposição no Institut du Monde Arabe em Paris. Até de abril 2013. Horário: terça, quarta e quinta, das 10h00 às 18h00; sexta, das 10h às 21h30; sábados e domingos, das 10h00 às 19h00. Endereço: 1 Rue des Fossés Saint-Bernard 75005 Paris, France. Tel +33 1 40 51 38 38. Preços: 10,50 euros (adultos) e crianças – 8,50 euros (crianças).
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Tags: árabe, internacional, livros, mil e uma noites, Paris