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Bruno Edson, o “Pelé do Picadeiro”
Artista ganhou o apelido de “Pelé do Picadeiro”, na década de 70, com o número “O Homem Foca”, que apresenta até hoje, ao fazer peripécias com a bola
Por Bruna Galvão
Por volta das três horas de uma tarde quente de março deste ano, o equilibrista Bruno Edson seguia rumo a um hospital para visitar uma amiga.
— Me ligue dentro de duas horas, por favor — disse ele ao telefone à reportagem do “Panis & Circus”. — A visita que farei é para uma pessoa muito especial — continuou.
A pessoa a quem Bruno se referia é Ildomar Pimenta (ou “dona Ilda”, como ele a chama), de 89 anos, ex- bailarina, ex- contorcionista e, também, a responsável por introduzi-lo no mundo circense.
— Acho que ela viu nos meus olhos que eu tinha dom para ser artista — comentou, mais tarde, o equilibrista. Atualmente, Edson é um dos principais nomes do Brasil. Está hoje com 72 anos e tem de 50 anos de carreira.
O site “Panis & Circus” traz a história desse mineiro de Itabira, criado no interior de São Paulo, único artista de sua família, vencedor de diversos prêmios (o mais recente, “Governador do Estado”, recebido neste ano) e apelidado de “Pelé do picadeiro” pelo público.
Benjamin conhece dona Ilda
Em meados da década de 1940, o menino Benjamin Bruno do Carmo (que só viria a se tornar “Bruno Edson” anos mais tarde), filho mais velho de uma enfermeira e de um pedreiro, acompanhava os pais na passagem de circos na cidade paulista onde morava, Franco da Rocha. Bruno disse que, com quatro anos de idade, ia aos espetáculos e gostava muito dos números de equilibrismo e malabarismo. “Quando eu crescer, quero ser que nem eles”, dizia o pequeno à mãe. Dito e feito.
Foi em 1947, quando o Circo do Nhô Pai visitou Franco da Rocha, que Benjamin Bruno conheceu Ilda, a bailarina e contorcionista do picadeiro. Com sete anos, o futuro artista não se contentava em ir com os pais aos espetáculos noturnos: queria também ver o circo durante o dia e foi dessa forma que ele chamou a atenção da artista.
“Não fiz absolutamente nada [nenhum teste]. Mesmo assim, ela visualizou meu futuro artístico e, em poucos dias, foi conversar sobre isso com a minha mãe”, relembra Bruno Edson.
Certa do que fazia, na época, dona Ilda não apenas informou sobre a vocação da criança para a sua mãe, como também se propôs a cuidar do menino para ensinar a ele a arte do equilíbrio e do malabarismo. Assim, Bruno Edson mudou-se para o Circo do Nhô Pai e lá continuou a estudar (todas as crianças do circo estudavam) e aprendeu as técnicas das artes circenses.
“Para provar que eu não havia sido ‘roubado’ de minha família, toda segunda-feira, dia em que os funcionários do circo tinham folga de suas atividades, dona Ilda me levava até Franco da Rocha para que meus pais me vissem. Mas já no dia seguinte, ela me levava de volta, pois o circo precisava seguir em frente”, conta.
A estreia do menino Benjamin Bruno nos picadeiros não demorou a chegar: ocorreu no ano seguinte, 1948, com um número cômico de rola-rola.
Eis que surge o “Bruno Edson”
No segundo circo em que trabalhou, o Circo Revista Real, de propriedade do então artista circense Dedé Santana (marido, na época, de Ana Rosa Galego, filha de dona Ilda), surgiu o apelido de “Bruno Edson”.
“Até então, eu era somente ‘Benjamin’, mas o Dedé não achava que esse nome fosse comercial. Como de ‘Bruno’, meu segundo nome, ele gostava, pensou em algo que pudesse complementá-lo e o que veio em sua cabeça foi ‘Edson’”, conta o equilibrista sobre o nome artístico, ou apelido, que ganhou nos anos 1950.
A época em que permaneceu no Circo Revista Real (de 1957 a 1972) foi de intensa atividade para Bruno Edson e seus companheiros. Dedé levou o circo para Brasília, e os espetáculos fizeram sucesso na cidade, que ainda estava em construção.
“Foram tempos em que viajamos muito, trabalhamos muito e, também, ganhamos muito dinheiro”, recorda-se Bruno. Ele conta que, nessa época, apresentava seus números na extinta TV Nacional, além de ter parcerias do circo com outros artistas (algo comum na época), como com o músico Luiz Gonzaga.
“Mas, daí, veio o Renato Aragão [o Didi da TV] e atrapalhou tudo!”, lamenta o equilibrista, para, em seguida, continuar: “Ele [Renato Aragão] fez uma proposta ao Dedé de levá-lo exclusivamente à televisão e o Dedé, com vontade de ficar famoso, aceitou”, finaliza.
Se as atividades de Bruno Edson no Circo Revista Real encerraram-se por aí, começaram em outros picadeiros, por exemplo, no Circo Garcia, no Circo Águias Humanas, no Circo Mexicano, no Circo Norte-Americano e no Circo Real de Bengala.
O artista também se apresentou em pavilhões (muito populares naqueles tempos, já que substituíam os circos) e em canais de TV, como a Excelsior e a Tupi. Participou, entre outros, de programas do Sílvio Santos [TV Tupi, TVS e SBT], do Chacrinha e do J.Silvestre.
“Fui ficando conhecido e isso facilitou com que eu fizesse mais shows e ganhasse uns ‘trocos’ a mais”, diz Bruno. “O Sílvio Santos, até hoje, reconhece o meu trabalho”, afirma o equilibrista, que se apresenta, esporadicamente, na rede de televisão do dono do SBT.
“Antes de tudo, sou do circo”
Ao longo dos anos, Bruno Edson exerceu outras atividades no meio artístico, como a de ator de comédia e de drama, o que o levou a se apresentar em diversos teatros, tais como os antigos Santana e Alumínio (todos em São Paulo), além de fazer participações em filmes.
“Fiz uma ponta no filme ‘Carandiru’ [2003, de Hector Babenco], no papel de um bandido. Porém, mesmo atuando como ator, sempre gosto de frisar que, antes de qualquer coisa, sou do circo”, diz Bruno.
“Para trabalhar no mundo do circo, é preciso gostar muito dele”, aconselha o equilibrista, porque a atividade enfrenta barreiras.
Na opinião do circense, o circo [tradicional] no Brasil teve problemas relacionados a dois fatores principais: aos altos cachês que os proprietários tinham de pagar aos artistas (durante o auge do circo) e também ao espaço destinado ao público durante as exibições.
“Naquela época, o circo era palco para diversos tipos de artista e até mesmo o Roberto Carlos chegou a se apresentar em picadeiros. Com o sucesso, os artistas exigiam cachês cada vez maiores. Já na questão do espaço, este era destinado a somente 2.000 pessoas, em média, quando, fora do circo, esses artistas começaram a fazer shows para 10 mil espectadores”, explica.
Bruno Edson afirmou que o circo passou por outra dificuldade quando ocorreu a recente proibição do uso de animais em apresentações circenses em alguns Estados brasileiros. O Projeto de Lei 7291/2006 quer estender esta proibição para todo o Brasil; apesar de ter sido aprovada parcialmente, a proposta não foi votada por completo no Congresso Nacional.
“Antigamente, o público ia ao circo não somente para ver os espetáculos, mas também para ver os animais. Para muitos, aquela era a única oportunidade de ver um elefante ou uma girafa, já que quase não existiam zoológicos”, diz Edson.
Hoje, diz ele, “só os grandes circos, com recursos, ganham dinheiro”.
Mais equilibrista do que malabarista
Quando Bruno Edson relembra a carreira, a começar pelo menino Benjamin que queria ser artista, ele não demora a confessar: “Nunca fui bom em malabarismo”. Para não deixar frustrados seus fãs e os leitores do “Panis & Circus”, ele explica melhor: “Nunca fui tão bom em malabarismos; existem profissionais melhores do que eu”.
Com talento nato para o equilibrismo, Bruno, que é pai de cinco filhos e avô de doze netos, passou grande parte da vida no aperfeiçoamento do trabalho dele. Seus números variam com taças, pratos em varas ou dança sobre canos (o que inclui, aí, um pouco de malabarismo), mas o que lhe deu o apelido de “Pelé do Picadeiro” foi o número “O Homem Foca”, em que o equilibrista faz diversas peripécias com a bola.
“Este é um número antigo que faço até hoje. As pessoas começaram a me comparar com o Pelé porque, na época, ele estava no auge, e eu era tão bom com a bola no picadeiro quanto ele em campo. Além disso, nós temos a mesma cor de pele”, ri o artista, ao se lembrar das comparações.
O equilibrista conta que também adora “provocar” o público com sua arte. “Tem um número que eu faço, que é o de 12 pratos na vara. Quando os pratos estão equilibrados, eu sempre pergunto ao público: ‘Qual prato vai cair?’. É claro que eu sei qual deles está prestes a cair. E as pessoas gritam e se agitam, com medo que os pratos caiam”, diz o artista com entusiasmo.
Ao longo de mais de cinco décadas como equilibrista e malabarista, Bruno Edson viajou por quase todo o Brasil e também por outros países, como França, Arábia Saudita, Argentina, Peru, Paraguai e Uruguai, para apresentações que não se resumem somente a circos, mas que incluem clubes, cassinos e escolas. Como o circense tem vários empresários, isso permite que sua agenda esteja sempre cheia.
“Atualmente, eu me apresento também em hotéis-fazendas, clubes, escolas, Sesc, aniversários, na Virada Cultural, no Dia do Circo, no Dia do Palhaço e também em metrôs”, cita.
Muitos troféus enferrujados
Tamanho talento, aperfeiçoado em uma carreira longa, garantiu a Bruno Edson reconhecimento na área.
“Desde os anos 50 recebo troféus, e alguns até já enferrujaram!”, diverte-se o equilibrista.
O prêmio mais recente recebido por Bruno Edson lhe foi entregue no último dia 4 de fevereiro, quando Bruno Edson foi o vencedor na categoria Circo do Prêmio Governador do Estado de São Paulo, por meio do espetáculo “Equilibrista”. O troféu foi autografado pelo governador, Geraldo Alckmin, e representa muito para o artista e sua categoria.
“Todos os prêmios que já ganhei até hoje significam muito para mim porque não é uma vitória só minha, mas do circo. É uma forma de valorizar o trabalho circense”, afirma.
Fotos Bruno Edson feitas por Ligiane Braga/ 5º Festival de Circo Paulista
Foto capa: Divulgação
Tags: Bruno Edson, Circo do Prêmio Governador do Estado de São Paulo, equilibrista
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