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Precisamos falar da Virada Cultural, afirma André Sturm
“Em texto publicado nesta Folha na semana passada, Nabil Bonduki, ex-secretário de Cultura de São Paulo, tece críticas à Virada Cultural realizada nos dias 20 e 21 de maio.
Logo no início de seu artigo, Bonduki afirma que o evento, “indiscutivelmente, teve a pior relação custo/benefício das suas 13 edições”.
Gostaria de saber por qual régua ele mede. Seria pelo total de público? Como fala em esvaziamento, parece-me ser o total de público o único benefício proporcionável.
Causa-me espanto que um ex-secretário valha-se desse critério para avaliar a relevância da cultura. Fosse assim, diversas manifestações estariam condenadas à extinção. E outras nunca surgiriam, pois não teriam apoio até ser “sucesso”.
É importante destacar, ainda, que neste ano a Virada recebeu seu maior patrocínio privado em 13 anos, oriundo de uma única empresa, o Bradesco, o que permitiu à prefeitura economizar R$ 4 milhões.
A descentralização em formato inédito, além de grandes atrações em espaços maiores como a Chácara do Jockey -que chegou a receber 30 mil pessoas num único show-, também trouxe a oportunidade para que o público conheça a rede municipal de equipamentos: centros culturais, casas de cultura, bibliotecas e teatros.
Ao contrário do que diz Bonduki, não se pretendeu “guetificar”. Insistir que esta gestão pretendeu confinar a Virada a Interlagos, “com visão segregadora”, mostra o desejo claro de ideologizar o debate.
O fato é: esta foi a Virada com o maior número de pontos com atrações, cerca de 900. E também a mais espalhada. Permitir que os moradores de bairros distantes conheçam e se apropriem de seus espaços culturais é segregação?
Na periferia, mais de 4.000 pessoas assistiram a shows no Centro Cultural da Penha. Outras 4.000 estiveram no Centro Cultural do Grajaú. Como admitimos, houve locais menos visitados, como o Anhembi, mas é claro que a inovação comporta parte de risco.
Mais fácil teria sido repetir uma fórmula guiada antes pela quantidade do que pela qualidade, como mostra a lógica de custos/benefícios já exposta no início deste artigo.
Nenhum “palco” (com infraestrutura e equipe) custou mais de R$ 700 mil. Nos anos anteriores, diversos artistas receberam, individualmente, mais de R$ 150 mil para uma apresentação de uma hora. Desta vez, nenhum recebeu mais de R$ 70 mil. Além disso, mais de 75% deles foram escalados a partir de um chamamento democrático aberto a todos os artistas da cidade.
Outra crítica descabida é tentar vincular a descentralização da Virada à ação policial ocorrida na Luz no dia 21. A data da Virada foi marcada pela antiga gestão. Nem Maquiavel pensaria que a Secretaria da Cultura já teria conhecimento da operação policial ao anunciar, em janeiro deste ano, as mudanças no evento.
Quanto à suposta intimidação dos artistas, acredito que o ex-secretário não frequentou a Virada neste ano e não esteve nas ruas lotadas do centro, ou no Anhembi, ou na Chácara do Jockey, onde presenciei inúmeras manifestações políticas.
Enfim, foi visível que todas as classes sociais, gêneros, idades e etnias se entrelaçaram numa grande festa. Alegria, ocupação de espaços públicos, diversidade, descentralização, bom uso dos recursos, sem cachês milionários. Parece que uma Virada de todos para todos incomoda muita gente!”
ANDRÉ STURM, cineasta, é secretário municipal de Cultura de São Paulo