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Arte em Movimento

Bate-papo: trajetória da companhia La Mínima

 

Fernando Neves, Neyde Veneziano, José Wilson e Mário Bolognesi, no bate-papo / Fotos Asa Campos

 

Emoção, críticas e risadas embalam conversa   

 

Bell Bacampos

Alguns jornalistas não sabem o que dizem quando escrevem sobre palhaços, comenta Mário Bolognesi, professor, pesquisador e autor do livro “Palhaços”, durante bate-papo que revisitou a história de 15 anos do La Mínima, no Sesc Santo André, em 5/06. Foram convidados para o bate-papo os diretores Fernando Neves, Neyde Veneziano e o artista circense José Wilson, do Circo Escola Picadeiro.  

O comentário de Bolognesi estava ligado ao fato de os palhaços tradicionais terem sido descritos como aqueles que atuavam “apenas no entreato enquanto o picadeiro era  preparado para as atrações principais”, na revista “Serafina”, da “Folha de S.Paulo” (maio de 2013). Domingos Montagner, do La Mínima, trouxe a descrição “equivocada” da revista para ouvir a opinião dos especialistas nas artes circenses.  

“Trata-se de uma manifestação de preconceito que quer estabelecer um jeito único de atuação do clown. Dá as costas a toda uma tradição de palhaço”, ensina o professor.  

 

Fernando Sampaio e Domingos Montagner autografam o livro "La Mínima em Cena" / Foto Asa Campos

 

Segundo Bolognesi, o que se pretende como esse tipo de afirmativa enviesada é estabelecer uma única linha de atuação: a dos palhaços gestuais, como é a tradição de Slava Polunin e Oleg Popov, ambos russos.

“Em 1935, quando Popov veio conhecer o Ocidente, ele disse que os palhaços ocidentais só sabiam dar tapas e pontapés. É que a escola do gestual, que era a dele, era predominante na Rússia. Aliás, era uma estética única, muito bem feita, muito bem acabada, mas única”, afirma Bolognesi.    

Aqui, acrescenta o professor, “fiquemos com Mário de Andrade (escritor e integrante do Movimento Modernista dos anos 20 do século XX). Ele disse que a estética do Piolin chegava ser rude, brusca, improvisada, aparentemente mal feita, mas era de uma técnica rebuscada”.    

Improviso do riso  

Quem entende do improviso do riso e de sua técnica sofisticada é o La Mínima, concordam os debatores.

A seguir, o depoimento deles sobre a trajetória do grupo La Mínima.

 

José Wilson, da Escola de Circo Picadeiro

José Wilson / Foto Asa Campos

 

“Falar dos meninos Domingos e Fernando é difícil. É uma trajetória longa e bonita. Tem coisas que não vou  conseguir lembrar. Mas outras vêm ‘facinho’ à lembrança.  Em 1988, o Fernando foi fazer oficina no Sesc e lá indicaram a Picadeiro para ele continuar seus estudos circences. Domingos, com o grupo Pia Fraus, já era um ‘bonequeiro’ e queria ser trapezista. No Circo Escola Picadeiro eles eram obrigados a passar por todas as atividades. Não chegavam atrasados e se dedicavam ao máximo. Depois o Rogê Avanzi, o palhaço Picolino, ensinou aos dois como ser palhaço. Eles se transformaram nessa dupla genial.”

 

Cabaré da Central do Circo - 2000 / Foto Divulgação

 

“Um dia eles começaram a fazer aulas de dança e surgiu a esquete das bailarinas. Depois, foi a vez da criação do ‘Petit Volant das Bailarinas de Cancã’ (foto acima).  É um número de uma criatividade, de uma esperteza tão grande que fiquei impressionado.”

 

“Feia” e “O Médico e os Monstros”, com direção de Fernando Neves

Fernando Neves / Foto Asa Campos

 

Depois de José Wilson, é a vez do depoimento emocionado de Fernando Neves sobre a trajetória do “La Mínima”. 

“Eu nasci em uma família circense, mas foi com a comédia ‘Feia’ que constatei a importância do circo teatro. Tudo começou porque fui convidado para fazer uma pesquisa sobre o circo teatro e levei para o Fernando e o Domingos a comédia ‘Feia’, de Paulo Magalhães, que foi montada no  Circo Zanni, que é dos dois e de mais sete artistas.

O espetáculo foi feito nos moldes dos anos 20: primeira parte, de variedades, e a segunda parte, uma peça representada no picadeiro.

O Zanni estava com a lona à rua Augusta. Eu ia lá antes dos ensaios e tomava cafezinho no trailer de um e batia um papinho e depois ia para outro, mais papo e cafezinho. Nunca pensei que eu voltaria, como voltei àquela época, a minha essência da vida no circo. Estava em casa. Tive o circo de volta.”

Nesse ponto, o diretor emociona-se e chora baixinho.

 

Bel Mucci, Lu Menin, Maíra Campos e Domingos Montagner em "Feia", de 2006 / Foto Divulgação

 

“Era tudo muito envolvente. Tinha até três argentinos. [Na realidade são dois: Pablo Nordio e Marcelo Lujan.  Apesar do espanhol fluente, Lu Menin, casada com Pablo, mãe de Gael, é brasileira.]

‘Feia’ foi um processo todo de lona. Era tudo mágico. Apesar de ter artistas que nunca tinham feito teatro, todos eles eram extremamente talentosos. Foi um espetáculo que me deu muito prazer, não só artístico como sentimental.”

 

Cena de "O Médico e os Monstros" (2008) / Foto Divulgação

 

Dirigi também o La Mínima na peça “O Médico e o Monstro”, adaptada de R.L. Stevenson, que na nossa versão chamamos de “O Médico e os Monstros”. Era o La Mínima em todo seu potencial. Os dois em cena: Pelé e Garrincha.”

 

“Mistero Buffo”, com direção de Neyde Veneziano 

Neyde Veneziano / Foto Asa Campos

 

Após o Fernando Neves, Neyde Veneziano, diretora de “Mistero Buffo”, criação de 2012, afirmar que:

 “Ser La Mínima: uma bela escolha. Foi em 2009 que conheci Domingos Montagner. Ele chegou como preparador circense para o espetáculo que eu estava dirigindo. Fiquei impressionada. Não demorou para que começássemos a idealizar ‘Mistero Buffo’, de Dario Fo. Também não demorou muito para que eu ficasse encantada com outra figura da dupla: Fernando Sampaio. Domingos e Fernando têm inteligência corporal e Dario Fo era o dramaturgo perfeito para a dupla La Mínima.

 

Cena de "Mistero Buffo" (2012)/ Foto Divulgação

 

Eu já havia trabalhado com outro grupo de palhaços, mas eles se negavam a fazer outros personagens. Eram palhaços e ponto final. O Domingos e o Fernando têm os palhaços deles, mas faziam  personagens. Havia ainda a responsabilidade de encenar uma peça de  Dario Fo, que é um palhaço. Eles fizeram Dario Fo sem imitar o Dario Fo e sem trair a ideia do dramaturgo e palhaço.”

 

Inteligência na “tontice”

Mário Bolognesi / Foto Asa Campos

 

O professor Mário Bolognesi constata que os três debatedores Fernando Neves, Neyde Veneziano e José Wilson disseram que Domingos e Fernando são inteligentes. Bolognesi diz: “Deem uma olhada nesses cartazes [dos espetáculos “Palhaços Mudos”, “Athletis”, “O Médico e os Monstros”, “Feia”] pregados na parede e notem como eles têm cara de ‘tontos’. Em síntese, é a inteligência da ‘tontice’”.

Bolognesi resume a trajetória dos dois palhaços: “La Mínima é o máximo!”.

 

 

Lá Mínima em cena

Editora: Sesi-SP

Preço: R$ 35,00

 

 

 

 

 

Clique aqui para ler a reportagem do Panis & Circus sobre o espetáculo “Mistero Buffo”

Clique aqui para ler a reportagem do Panis & Circus sobre o livro “Palhaços”, de Mário Fernando Bolognesi 

 

 

 

Postagem: Alyne Albuquerque

 

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