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Arte em Movimento

Circo Poeira: memórias do picadeiro

 

 

Circo Poeira, premiado 17 vezes em apresentações nacionais e internacionais, fez a festa da criançada no Itaú Cultural 

Bruna Galvão

 

A poeira tende a se acumular naquilo que não é mais usado. Pó sobre pó ao lado da passagem do tempo, um dia chega-se a um ponto no qual não é mais possível dissociar a poeira do objeto: ela se incorporou a ele, a seu uso, a suas memórias. São, agora, uma coisa só.

No ramo das lembranças de um velho senhor, há muita poeira. Mas ele pretende sacudi-la, para ver se um pouco de seu pó, ao flutuar pelo ar, consegue dar vida nova a um mundo há muito vivido, onde elefantes, acrobatas e bailarinas se misturam a um mesmo cenário. Eis o Circo Poeira, apresentado no Itaú Cultural no último final de semana de outubro (26 e 27/10), na programação especial para crianças.

 

 

A peça, que traz circo, teatro e bonecos, é um convite para se adentrar no passado, onde as lembranças estão todas escondidas. Foi criada por Caio Stolai e Beto Lima e seu nome é uma referência à maneira como os artistas de circo se referem aos circos pobres e pequenos. O Circo Poeira já foi premiado 17 vezes em apresentações nacionais e internacionais.

Stolai, que também é o interprete da apresentação,  é versátil e delicado ao conduzir cada um dos bonecos que compõe o espetáculo. Vestido de negro, seu corpo é a alma dos bonecos, que se utilizam de suas mãos e de seus pés para se movimentarem. Seus diversos tons de voz dão singularidade aos personagens que surgem em cada apresentação. Mais uma vez, a magia do circo dá vida àquilo que parecia impossível no plano real.

 

 

Sentado em uma cadeira, o velho, cansado e fraco, lamenta-se pelo tempo que passou. Mal sabe ele que o passado tem forças quando muito se quer encontrá-lo. Com uma saudade intensa, o velho vê resquícios de seu circo no picadeiro ao redor e, ao encontrar um pequeno cavalo de brinquedo, suas memórias retomam aos períodos áureos, em que cavalos conduziam seus artistas em deliciosas acrobacias.  Neste ponto, Stolai é como a poeira remexida, que ajuda a dar lampejos de realidade ao que estava adormecido. Com muita graça, ele coloca os acrobatas nos cavalos, os quais giram lindamente acompanhados pela música.

Como o espetáculo não pode parar, eis que surge o mestre de cerimônias com sua voz alta e animada. Com todo o fôlego, ele grita um “Senhoras e senhores, senhoritas e senhoritos” e chama a próxima atração. Na sequência, o público vê um equilibrista chinês de passos curtos e apressados a girar seus pratos em varas, ajuda o malabarista maluco a encontrar suas espadas (o mesmo encontra-se de olhos vendados) para, em seguida, vê-lo jogá-las para o alto, sem que o mesmo “saiba” como pará-las.

 

 

Há ainda, os elefantes indianos que invadem o picadeiro para montarem uma enorme pirâmide. Estes são tão delicados quanto a bailarina de outro número, que saltita pelo palco com sua bela vestimenta cor-de-rosa. Mas nada se iguala ao capoeirista engolidor de fogos, que assusta crianças e adultos com sua repentina labareda. Stolai passa do estado suave ao agitado e retorna ao suave com extremo controle. Ao manipular os bonecos, lembra uma criança imersa em seu quarto a conduzir os seus brinquedos.

No final, as memórias do velho o levam ao elemento mais importante do circo: o público. “Sem ele, nada disto seria possível”, diz o velho com sua voz rouca. E o mestre de cerimônias (aquele do “senhoras e senhores, senhoritas e senhoritos”), pede aos presentes um grande grito de “Viva o circo!”.

 

Postagem: Alyne Albuquerque

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